NAMO BUDDHAYA - NAMO DHARMAYA - NAMO SANGHAYA !

A MEDITAÇÃO BUDISTA – textos diversos

A Paz ao Alcance de Todos 
Bhavana (Meditação) Budista
Instruções para a meditação
Resumo da Prática

Trecho do livreto A PAZ AO ALCANCE DE TODOS
do monge Theravada Mangalo, Sociedade Budista do Brasil, págs. 5 e 6.

A prática da Concentração é uma das práticas básicas do Budismo. O Budismo é famoso pela clareza da sua aproximação não dogmática na questão relativa à realização da Verdade. Não surpreende, portanto, encontrarmos no coração do Budismo uma ênfase especial na necessidade do treinamento da mente, a fim de se atingir maior consciência e acuidade mental. Isto é obtido através de recursos razoáveis e práticos, relacionados com nossa vida diária, que permite à mente estar focalizada no presente, naquilo que é, aqui e agora. 

Isto é mais do que um simples assunto de treinamento e discussão filosófica. É o Caminho para conhecermos a Verdade, e a Verdade é aquilo que é, aqui e agora. 

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BHAVANA (MEDITAÇÃO) BUDISTA
pelo Ven. Shanti Bhadra Thera, monge Theravada.

Introdução: 

A palavra “bhavana” provém do verbo “bhavati” , em língua Páli, que significa “praticar, cultivar” . Se levarmos em consideração a sua definição pelo comentário e uso no Tipitaka (Cânon) em Páli, a palavra tem um sentido mais amplo, ativo e extenso do que sua tradução por “meditação”, como é freqüentemente traduzida em inglês e português. É realmente uma tradução substituta muito precária. A palavra “Bhavana” tem sido traduzida pelos seguintes termos : produzindo, adquirindo domínio; desenvolvimento, cultivo, reflexão, meditação.

A finalidade da Bhavana budista é a de purificar a mente de todas as suas impurezas, tornando-a saudável e íntegra. O agente causador de todas as inumeráveis doenças e distúrbios da mente é representado por “lobha” (avidez, cobiça), “dosa” (aversão, ódio), e “moha” (ignorância).  A combinação dessas três produz outras impurezas da mente tais como: ciúme, inveja, avareza , preconceito, obstinação, temor, intolerância, etc. São elas que deturpam e condicionam todas as nossas interpretações do mundo fenomenal e nos colocam num estado chamado “vipallasa” (alucinação, distorção) em nossa percepção, nosso pensamento e visão. Nesse estado de distorção somos levados a imaginar que o que é “anicca” (impermanente) seja “nicca” (permanente); que o que é “dukkha” (sofrimento) seja  “sukkha” (fonte de prazer), e o que é “anatta” (impessoal) seja “atta” (pessoal, real, uma entidade auto-existente). 

A meditação budista nos ajuda a conseguir um conhecimento mais que intelectual dessa verdade, a ver as coisas como elas são na realidade (yattha bhuta) e nos liberta da ilusão em que nos encontramos, pondo fim à ignorância e ao desejo. Se, através da meditação, não conseguirmos a diminuição do apego, da ambição e da ignorância em nossa vivência, então podemos estar certos que algo está errado em nossa maneira de meditar. Somente depois que as ilusões são corrigidas, as enfermidades mentais curadas, as impurezas removidas e a mente tornada íntegra e sadia, é que a Verdade Última - Nibbana - que está além de toda a lógica e conhecimento humanos, bem como sem limitação no tempo e fora dos estímulos mentais e sensoriais - pode ser realizado. 

No Budismo são conhecidos mais de quarenta objetos ou assuntos para meditação (kammattana) que se relacionam com os diferentes temperamentos das pessoas. Desses, daremos uma pequena explicação e um método para a prática de duas meditações muito simples, conhecidas e adequadas para aqueles que tem um dia-a-dia movimentado, neste nosso mundo moderno tão veloz, perturbado e desencontrado. 
I) 
o chamado "Anapanasati" (atenção sobre o processo respiratório) é adequado para pessoas que tem mente imaginativa e os que estão sempre transtornados pelas emoções sensoriais. 
II)  o outro é sobre "Metta" (caridade afetiva, amor fraterno e desinteressado). É um tipo de meditação discursiva e protetora, que pode ser praticada por qualquer um, em sua labuta diária, trazendo ao praticante resultados imediatos e proveitosos. 

O Buddha sempre realçou a importância e o valor dessas duas meditações em vários de seus "Suttas" discursos). 

 “Os sábios, dedicados à meditação, sempre tranqüilos e perseverantes, realizam o Nibbana, que é a máxima e a completa liberdade” - Dhammapada , 23 . 


ANAPANASATI BHAVANA

Um dos métodos mais populares, práticos e de uso geral para desenvolver a concentração é o chamado “Anapanasati” -  a conscientização do ar inspirado e expirado. 

A palavra “Anapanasati” pode ser dividida da seguinte forma: “Ana” significa “inspirar” , “Apana”, “expirar” , e “Sati” significa “atenção”, e assim temos a tradução literal que é “atenção na inspiração e na expiração”. É recomendado pelo Buddha como um método integral para a realização do Nibbana ( em sânscrito: Nirvana ), a Felicidade Absoluta. É chamado a Sublime Morada (arya vihara), a Morada Divina   ( brahma vihara ) e a Morada dos Buddhas (Tathagatha vihara ). É considerado o Muhakammattana (o exercício original) para atingir o Jhana (absorção) e é um dos primeiros assuntos de meditação registrados na literatura Páli. 

O Buddha disse: “Esta concentração obtida pela atenção no movimento respiratório, quando desenvolvida e praticada com persistência, é pacificadora e sublime, um estado de felicidade sem mácula e duradoura, no qual será banido imediatamente e neutralizado qualquer pensamento indesejável e maléfico no preciso momento em que surja” . 

Para o caso particular dessa meditação, é prescrita uma postura bem definida; trata-se da chamada “postura de lótus”, isto é, sentado com as pernas cruzadas em frente, formando um x, com a coluna ereta e a atenção vigilante. Aqueles que acharem a postura de pernas cruzadas incômoda, poderão sentar-se confortavelmente numa cadeira com altura conveniente, de modo a manter os pés apoiados no chão. A cabeça não deve ficar pendente e o pescoço deverá ficar reto, de modo que o nariz fique na mesma perpendicular do umbigo. Em qualquer circunstância, o importante é manter uma posição cômoda e descontraída, mas ereta e equilibrada. 

Uma pessoa está sempre respirando, de modo contínuo, dia e noite, mas em geral, dá pouca ou nenhuma atenção a esse fato. O que tratamos de fazer agora é simplesmente isto: concentrar sua atenção no alento sem procurar interferir no processo respiratório. A respiração é usada apenas como ponto de referência sobre o qual  voce fixa  a sua atenção, na entrada das narinas ou no abdômen. A pessoa deve vigiar estes pontos, onde for mais fácil, atento na inspiração e na expiração. 

À mente que está acostumada a acompanhar os objetos percebidos pelos sentidos pode ser difícil ser “amarada” a um objeto tão delicado como o ar respirado; ela fugirá da trilha como um novilho selvagem, não domado. O pastor quando quer domesticar um novilho separa-o da mãe e prende-o a uma estaca. Ele fica inquieto e tenta libertar-se, mas a corda o mantém preso, e assim, finalmente, ele se acalma junto à estaca. De igual maneira, aquele que deseja conquistar sua mente, tem de afastá-la dos objetos dos sentidos e concentrá-la na respiração, até que ela se torne dócil e a concentração fácil e agradável. Quando a pessoa continua praticando esse exercício de concentração por um prazo bastante longo, haverá uma ocasião em que, subitamente, como num lampejo, uma experiência será sentida de que se está totalmente concentrado na respiração e completamente desligado do meio ambiente externo. Esta será uma  experiência formidável, memorável, de completa satisfação e tranqüilidade; será um incentivo para continuar com o exercício até que sejam atingidos diferentes estados de Jhana (lê-se “djiana”, absorção) . Jhana é essencial para qualquer  modalidade de profunda compreensão, penetração e visão interior, da realidade das coisas, e para a realização do Nibbana - a maior felicidade. 

Além disto, os benefícios imediatos desta meditação são muitos. A saúde se tornará melhor; o sono será saudável e restaurador. Será um alegre e saudável relaxamento, uma vez que a pessoa se acostuma a fazê-la; a pessoa estará apta a ir para seu trabalho diário com alegria e eficiência, removerá o tédio e a inquietação; desenvolverá a calma e a tranqüilidade. Naqueles momentos em que se sentir nervosa e excitada, arrasada ou dominada pelos problemas da vida, dois minutos da prática serena desse exercício restaurarão o equilíbrio e a paz mental da pessoa.

O Visudhimagga (O Caminho da Purificação) , escrito pelo sábio budista Buddhaghosa de Sri Lanka, explica vários métodos ligados a este tipo de meditação, métodos esses que são muito usados desde há muito tempo nos países budistas. Como um auxílio aos principiantes, a fim de melhorar a concentração da mente num ponto, um método de contagem das respirações é utilizado. Tendo-se sentado confortavelmente como já se foi falado, o ar viciado dos pulmões deve ser exalado lentamente pela boca, que deve ser fechada em seguida. Então a pessoa inspira o ar normalmente e conta mentalmente: “um” . De igual maneira, expira e conta: “dois”- e assim por diante, até dez, sempre concentrada no processo respiratório e sem permitir que vagueie; este método de contar deve prosseguir até que a pessoa sinta que é capaz de continuar na meditação com a mente concentrada e sem a ajuda da contagem.  Nota: a contagem também poderá ser regressiva. 

À medida que a pessoa desenvolve a concentração e se aproxima da quietude mental, parece que a respiração se torna cada vez mais fraca, a ponto de ficar imperceptível.  A pessoa deve continuar observando atentamente a respiração, sem qualquer movimento, então ela poderá sentir-se inundada de paz, o corpo e a mente podem tornar-se muito leves , como se fossem subir ao céu. Gradualmente a prática leva à descoberta de que essa coisa  a que chamamos corpo e sustentada pelo simples respirar e que esse mesmo corpo sucumbe quando cessa a respiração. A natureza da impermanência acena com toda a sua realidade; a pessoa chega à compreensão de que onde há constante mudança não pode existir uma entidade permanente ou qualquer substância fixa (atta ou alma). Essa intuição, quando desenvolvida, ajuda a pessoa a realizar Nibbana - a maior felicidade. 


METTA BHAVANA

“Metta” significa literalmente “amizade”. “Mitassa bhavo metta”, em páli, que dizer “metta é o estado de ser amigo”. Afeição fraternal, amor ilimitado, sem qualquer apego causado pela luxúria, isto é “metta”.  Sua característica é de promover  a bondade e a benevolência; a essência é agir para o bem-estar e a prosperidade do próximo; seu efeito consiste na remoção do ódio do coração e sua substituição pelo amor; ele aproxima e liga duas pessoas pelos laços do amor e da benevolência; ele suprime a inimizade e é um antídoto para a raiva. 

Metta é a primeira das quatro “Brahma Viharas” (qualidades divinas ou maneiras sublimes de viver) pregadas e exemplificadas pelo Buddha.  É  também um tipo de meditação de efeito seguramente benéfico. Por ela a mente fica revigorada, sua força fica maior, e por fim fica sublimada. O mundo descontrolado e perturbado em que vivemos precisa mais desta meditação do que em qualquer  outro período da história.  A verdadeira paz será conseguida no dia em que todas as pessoas incorporarem esta meditação em suas vidas; ela é um ensinamento fundamental em todas as religiões e reúne  a humanidade num todo, transcendendo todas as diferenças de credo, cor, raça e país de origem. A maior contribuição que qualquer indivíduo isolado pode prestar à paz mundial é sua prática regular na vida quotidiana. 

Um dos belos e populares sutras (discursos, sermões) do Buddha é justamente o Karaniya Metta Sutta - Sermão do Amor Universal. Este sermão indica com toda a clareza a atitude mental que deve ser desenvolvida.  Além de ser um objeto ou suporte de meditação, é também uma reza de proteção. Suas palavras são para ser visualizadas em meditação, de olhos fechados e sentados de maneira confortável, como já descrito aqui anteriormente. A seguir, damos uma tradução deste sutra sobre o “Metta”. 

“ Eis o que deve ser feito por aquele que se aplica à prática do bem e deseja realizar o caminho da Paz: ele deve ser diligente, íntegro, correto, meigo, gentil, dócil , desprovido de orgulho, contente e alegre, sem se deixar vencer pelas dificuldades do mundo, sem ambições excessivas, com os sentidos calmos, inteligente, sem arrogância e sem cobiça por dádivas.
Que ele nada faça de vil, ou qualquer coisa que possa ser censurada pelos sábios. E que agora ele deseje que todos os seres sejam felizes, que seus corações estejam alegres e se sintam seguros. Que sejam felizes todos os que tem vida, sejam eles fortes ou fracos, altos, médios ou baixos, grandes ou pequenos, visíveis ou invisíveis, próximos ou afastados, nascidos ou por nascer.
Que ninguém engane outrém ou trate com desprezo qualquer ser e que, acometido de raiva, não deseje o mal a ninguém. 
Assim como uma mãe protege seu único filho, mesmo com o risco da própria vida, que seja o seu desejo de possuir a mente liberta, com amor incondicional e ilimitado, dirigido para cima, para baixo, e para os lados. Estando desperto, seja de pé, andando, sentado ou deitado, que ele deseje manter firme estes pensamentos - a isto se chama o Supremo Modo de Viver. 
Que ele não seja levado à falsa compreensão, que seja virtuoso, dotado de visão interior e livre do desejo pelos prazeres dos sentidos e, dessa forma, que ele jamais retorne a um ventre, ficando livre dos renascimentos “

A prática do Amor Universal deve começar pela própria pessoa, porque se alguém despreza e odeia a si mesma, torna impossível, evidentemente, estender amor e benevolência aos outros. Se pensarmos sobre isto, verificaremos que existe, de fato, uma profunda verdade psicológica. A atitude para consigo deve ser saudável para que a prática de metta se torne fácil. 

Inicia-se a meditação de metta com  o pensamento: “Que eu esteja livre da inimizade; Que eu esteja livre da maldade; Que eu esteja livre do sofrimento; que eu seja feliz” .  Depois disto bem repensado e repetido na mente, estes pensamentos devem ser dirigidos a uma pessoa amiga; em seguida a uma pessoa pela qual não tenhamos nem amizade nem hostilidade; e finalmente, devem ser dirigidos a alguém que nos seja desagradável. 

Quando se consegue fazer isto com alguma facilidade, o próximo passo é estender esses pensamentos-sentimentos , alargando e expandindo mentalmente, a todos os seres. 

Paz. Muita paz. 

“É pela Vigilância que se atinge o estado imortal. A negligência é o caminho da morte. Os que estão sempre atentos não morrem; mortos já estão os negligentes” . 

“Aquele que tem energia, está sempre vigilante, é puro nas ações, sabe discriminar, possui autocontrole e vive atento dentro dos Ensinamentos -  a sua glória está sempre aumentando” .

“ Não se deixe levar pela negligência; não seja dado aos prazeres fugazes. A pessoa vigilante e meditativa recebe felicidade em abundância”. - Versos do Dhammapada, números 21, 24 e 27. 
 

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RESUMO DA PRÁTICA
por Kor Khao-suam-luang

(Kor Khao-suam-luang (1901-1978) foi uma das maiores mestras mulheres leigas da Tailândia moderna, onde chefiava um centro de meditação. Este é o primeiro capítulo do seu livro Looking Inward, Observations on the Art of  Meditation, lançado em Kandy, Ceilão, pela Buddhist Publication Society, 1991, traduzido por Punna Upasaka) . 

Aqueles que praticam o Dhamma (Ensinamentos do Buddha) devem treinar a si próprios para compreender linearmente os seguintes estágios:

O treinamento que é fácil de aprender, dá resultados imediatos e é conveniente em qualquer tempo, qualquer lugar, para pessoas de qualquer idade e sexo, deve aprender na escola deste corpo - de tantos metros de altura, um espaço cúbico e de pequena duração, com sua percepção própria. Este corpo tem várias coisas, que vão do mais grosseiro ao mais sutil, que devem ser bem conhecidas. 
 
1.  Começar com o conhecimento de que este corpo é composto de várias propriedades materiais, as maiores tendo as propriedades da terra, da água, do fogo e do ar;  as menores sendo aspectos que aderem às maiores, coisas como cor, cheiro, forma.  Estas propriedades são instáveis,  desgastam-se e estão cheias de sujeira. Se voce olhar para dentro disso profundamente, você verá que ali nada tem substância própria. São simplesmente condições e fenômenos impessoais, que em nada podem ser chamadas de “eu” ou “meu”.  Quando voce puder perceber claramente o corpo nestes termos, voce estará apto a deixar quaisquer aderências a isto ou àquilo como se fosse uma entidade permanente, seu eu, ou alguém mais. 
2.  O segundo passo é tratar dos fenômenos mentais: sentimentos, percepções, formações do pensamento e a consciência. Compreender a verdade de que eles se caracterizam por nascer, perdurar por um certo tempo, e desaparecer. Em outras palavras, sua natureza é nascer e desaparecer, repetidamente. Quando sua investigação vir esta verdade, voce estará apto a deixar de ser levado pelo seu apego aos fenômenos mentais, como se fossem  uma entidade, como seu eu alguém mais, isto ou aquilo. 
3.  O treinamento no nível da prática não significa somente estudar, ouvir ou ler. Voce tem de praticar dessa maneira, para ver de modo claro. Com sua própria mente, seguindo os passos seguintes. 


Começar por limpar todo o local externo concernente à prática, e a seguir olhar para dentro da mente, até que voce possa saber de que maneira ela é clara ou suja, calma ou ansiosa. A maneira de fazer isto é ter plena atenção, de maneira que voce possa manipular corpo e mente enquanto treina para estabilizar-se firmemente num estado de calma.


Uma vez que a mente esteja num estado de calma , voce verá as formações mentais ou preocupações na sua natural maneira de aparecerem e desaparecerem. A mente ficará vazia, neutra e tranqüila. Nem prazer nem desprazer, e verá os fenômenos físicos e mentais como eles nascem e desaparecem naturalmente, de acordo com sua atividade e maneiras próprias. 


 Quando o conhecimento de que não há “eu” em nenhuma dessas coisas ficar bem claro, voce encontrará alguma coisa que existe um pouco mais dentro, além de todo sofrimento e cansaço, livre dos ciclos de mudança -- imortal -- livre tanto do nascimento e da morte, já que todas as coisas que nascem tem a natureza de envelhecer, adoecer e morrer. 


Quando voce vir esta clara verdade, a mente ficará vazia, não aderindo a nada. Não haverá além disso a pretensão da mente ser alguma coisa, não conseguirá ser coisa alguma. Tudo o que restará é a pura condição da Mente. 


Aqueles que virem esta pura condição da Mente, em sua completa claridade, saltarão e aparecerão desencadeados dos repetidos sofrimentos da vida. Quando eles sabem a verdade do mundo, e a totalidade do Dhamma, eles vêem claramente os resultados, mesmo no presente, de que algo existe que está além do sofrimento. Eles saberão disto sem ter perguntado ou recebido por fé de alguém, porque o Dhamma - o Ensinamento do Buddha - é paccatam  - pode ser connhecido por cada um em particular, visível aqui e agora. Aqueles que virem esta verdade dentro de si mesmos poderão sempre atestar isto. 

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INSTRUÇÕES PARA A MEDITAÇÃO
por Joseph Goldstein

Sente-se confortavelmente, com as costas retas, mas não rígidas nem tensas. Tranqüilamente, feche os olhos e atente para as sensações da respiração quando o ar passa pelas narinas ou pelo lábio superior. As sensações da inspiração aparecem de modo simples e natural. Observe como ela começa. Ou então, você pode optar por sentir o movimento do seu peito ou de seu abdômen à medida que o ar entra e sai do seu corpo. 

Sempre que você optar por acompanhar as sensações da respiração, pouco importando se for nas narinas ou no movimento do peito ou do abdômen, treine sua consciência para se conectar claramente com o primeiro momento do início da inspiração. Em seguida, mantenha a atenção durante a duração apenas dessa inspiração. Faça novamente a ligação com o início da expiração e mantenha sua atenção fixa até o final. 

É importante não ser ambicioso. Todos temos a capacidade de sentir completamente uma respiração. Mas se tentarmos fazer mais do que isso, se acalentarmos a idéia de que ficaremos atentos à nossa respiração durante meia hora, isso será um exagero. Pois conservar a atenção continuamente durante todo esse tempo é algo que está muito além da capacidade de nossa mente do dia-a-dia, e logo podemos desistir. Estabeleça a ligação e mantenha-a durante apenas uma respiração...e depois durante outra. Dessa forma, você poderá trabalhar segundo a sua capacidade, e sua mente começará a se concentrar de modo mais simples e fácil. 

Por vezes, outros “objetos” (assuntos)  virão à luz: sensações físicas, pensamentos, imagens, emoções. Observe como todas essas aparições afloram e se modificam na consciência aberta da mente. Freqüentemente, ficamos distraídos, perdidos na experiência, sem a atenção. Assim que se lembrar, volte ao estado simples da consciência. 

No início pode ser de grande ajuda concentrar-se primeiro, mas não de forma exclusiva, na respiração. A concentração desse tipo ajuda a estabilizar a atenção, mantendo-nos atentos e alertas. Trazer a mente de volta a um objeto fundamental, como a respiração, exige certa qualidade de esforço, e esse esforço acaba acumulando energia. É como fazer um exercício repetitivo com a finalidade de desenvolver a força muscular. Você continua fazendo isso e o corpo vai ficando cada vez mais forte. Voltar ao primeiro objeto da atenção é um exercício mental. Voltamos constantemente à respiração e, pouco a pouco, a mente vai ficando mais forte e mais estável. Nosso nível de energia aumenta. Depois, quando nos abrimos para uma consciência com menos opções de escolha, percebemos as coisas de um modo mais aprimorado e eficaz. 

Se às vezes você sentir certa constrição ou tensão durante a prática, será útil se acalmar e abrir o campo da consciência. Abandone a respiração por algum tempo e simplesmente observe, alternadamente, o que aflora em cada uma das seis “portas” sensoriais ( os cinco sentidos físicos e a mente): audição, visão, pressão, excitação, pensamento. Ou então, você também pode permanecer com a consciência aberta e natural, dando atenção apenas aos sons que aparecem e desaparecem. Ampliar assim o centro da atenção ajuda a mente a atingir um estado de equilíbrio e um espaço maior. 

Você também pode usar a técnica da “anotação” ou “nota” mental, para desenvolver a consciência atenta. A arte da anotação mental, como instrumento da meditação, exige prática e experiência. Rotular os objetos da experiência na medida em que eles emergem ajuda a atenção de vários modos diferentes. 

A anotação deve ser feita muito tranqüilamente, como um sussurro mental, mas com precisão e exatidão suficientes para estabelecer uma relação direta com o objeto. Por exemplo, você pode rotular cada respiração, dizendo em silêncio: “entrando”, “saindo”, “levantando” , “caindo”. É sempre uma palavra, e no tempo presente (gerúndio). Quando pensamentos afloram, rotule: “pensando”. Se as sensações físicas se tornarem predominantes, rotule: “pressão”, “vibração”, “tensão” - ou o que for que estiver sentindo. Se os sons ou imagens vieram ao primeiro plano, rotule: “ouvindo”, “vendo”. 

A própria “anotação” ou “rótulo”  pode ser considerada uma outra aparição na mente, apesar de funcionar de modo a impedir a distração. A rotulação, como a colocação de uma moldura em torno de um quadro, ajuda você a reconhecer o objeto mais claramente e dá  mais foco e precisão à sua observação. 

A anotação mental ajuda a atenção de outra maneira, mostrando-nos quando a consciência é reativa e quando ela está realmente atenta. Por exemplo, podemos ter consciência da dor no corpo, mas por meio do filtro da aversão. Sem o instrumento da anotação, muitas vezes deixamos de reconhecer a aversão, que pode ser uma coisa sutil que esteja revestindo a dor propriamente dita. O tom de voz empregado nas anotações mentais revela muito a respeito da nossa mente. Você fica sentado anotando, “dor”, “dor”, mas talvez conferindo à anotação o tom de quem está rangendo os dentes com raiva; o tom deixa óbvio o verdadeiro estado mental. É impressionante constatar que a simples mudança do tom de voz da anotação muitas vezes pode modificar seu estado mental. A anotação serve para aprimorar a qualidade da atenção, essa consciência particular e não-reativa. 

A rotulação mental também fortalece o fator esforço-energia na mente. Como a anotação exige um esforço especial, algumas pessoas encontram dificuldade em fazer isso no início. No entanto, o esforço supera o torpor  e a indolência; o próprio esforço para rotular calmamente cada objeto que surge desperta energia, o que mantém a prática em desenvolvimento e em aprofundamento. 

O uso habilidoso da anotação mental nos mantém com muita energia, exatos e atentos. Tente essa técnica na sua próxima sessão de meditação, nem que seja por um curto período de tempo no início. Simplesmente, anote cada objeto que surgir à medida que for se conscientizando dele: “aumentando”, “caindo” , “pensando”, “pensando”, “dor”, “dor”, “aumentando”, “caindo”. Enquadre cada momento da experiência com uma ponderada anotação mental e observe a diferença na qualidade da sua atenção. 

Seja paciente ao aprender a usar esse instrumento da prática. Por vezes, as pessoas fazem observações com vozes muito altas, o que acaba influenciando a experiência. Por vezes, as pessoas se esforçam demais, ficando tensas e presas por causa do esforço. Deixe que a observação flutue, pousando sobre o objeto, tal como uma borboleta pousa sobre uma flor, ou deixe-a flutuar junto com o objeto, tal como uma bolha de sabão que se ergue no ar. Seja alegre, seja calmo, saboreie o momento. 

Faça experiências com a técnica das anotações para encontrar a maneira mais eficaz de usá-la. Num determinado momento da minha prática de caminhadas, quando fazia cada passo de forma lenta e atenta, abreviei todas as anotações às sua primeiras letras. Em vez de anotar “levantando (o pé)”, “movendo”, “colocando”, eu passei a anotar “l”, “m”, “c”, “l”, “m”, “c”. As anotações pareciam surgir  sem nenhum esforço no ponto máximo da cada passo. No entanto, a finalidade da observação - manter a mente fixa e estável durante toda a duração do passo ou da respiração - foi atingida. 

Investigue a técnica para si mesmo. Se às vezes você achar que nada está interferindo de maneira excessiva, ou se for lento demais para as mudanças, deixe de lado a rotulação por algum tempo. Veja o que acontece. Brinque com o volume, brinque com as abreviações. Compreenda que isso é um instrumento e aprenda qual é a melhor maneira, no seu caso, para empregá-lo. Observe se ele o ajuda a conservar a atenção. Descubra por si mesmo como a anotação funciona. Seja flexível, e procure ter prazer ao fazer estas explorações. 

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