cinema "Uma onda no ar" - Cinema na praça e o povo no cinema Domingo, 14 de setembro: mais um evento do Projeto Cine Arte. Cinema e outras manifestações culturais no teatro de arena da praça Sérgio Pacheco. Já é característica a presença de um público característico a cada filme-evento realizado. Além daquele já conhecido grupo que gosta de arte, desta vez os manos do hip-hop de Uberlândia encheram o local. Antes da exibição do filme “Uma onda no ar” do diretor mineiro Helvécio Ratton uma apresentação-manifesto do grupo Original C mandou ver na arena: DJS, rap e dança - algumas das manifestações do movimento hip-hop. Eu, do alto da minha ignorância de classe média, nem rico nem pobre, confesso que me senti meio fora do lugar. Não sabia também da existência de um movimento tão forte aqui na cidade. Quando acabou a apresentação fiquei observando a movimentação. Será que vão ficar para ver o filme? Ficaram, gostaram e participaram. E pude confirmar que o principal problema do cinema brasileiro é o desencontro com o seu público. Desencontro aqui ao pé da letra: o cinema não vai onde o povo está. Não está certo relegar nosso cinema só aos templos do consumo, leia-se “shopping centers”. Começa a exibição do filme, que narra a história da rádio favela de Belo Horizonte. Para quem não conhece, esta rádio foi uma iniciativa de meninos de uma favela de BH que estavam cansados de ouvir coisas que não eram destinadas a eles. A identificação com aqueles meninos na tela, suas músicas, linguagem e problemas é quase instantânea. O público começa a partilhar daquela história. Aplausos aos primeiros acordes de uma boa “black music”. O filme de Helvécio Ratton, realizador veterano, é fiel ao que se propõe fazer. Não fica devendo nada do ponto de vista técnico e impressionou pela sua fotografia de alta qualidade. Mas o roteiro e os atores são, sem dúvida, os responsáveis pelo sucesso junto ao público. Os personagens não são vistos aqui como heróis ou coitados, constante em vários filmes nacionais. Vemos uma história de pessoas reais, que enfrentam o racismo na sala de aula, no embate infundado com a polícia e nas rádios que são obrigados a ouvir. O dia a dia no morro é mostrado sem querer ser espetáculo e as pessoas que ali vivem não são folclores, elas desejam, choram, sofrem e gozam. Não posso deixar de registrar algumas manifestações espetaculares: a menininha de uns dois anos de idade que ao rolar um baile funk na tela tentou imitar os passos de break, o mendigo já conhecido que ora ou outra entrava na arena para dançar e uma “tia” na platéia que também dançava sensualmente ao som das músicas do filme. Isso sim é popular! Cinema do povo para o povo.
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