O CAPITÃO

LUÍS GONÇALVES LOUREIRO

Notas de
João Paulo de Castro e Mello Trovisqueira
                

Luís Gonçalves Loureiro (1), Cavaleiro-Fidalgo da Casa Real (5), Cidadão
do Porto (6), Capitão de Azurara, foi uma figura relevante no concelho 
da Maia. Viveu longo anos, pois já em 1620 dizia " que era muito velho,
passava dos 70 anos" (5) e só veio a falecer em 22.06.1634, portanto com
85 anos ou mais (4).  Chamavam-lhe "O Chave-de-Ferro".

Era filho de Belchior Gonçalves Corrêa, Cavaleiro (5), Capitão de
Infantaria, Guarda-Mór das naus e navios, Juiz dos Órfãos, Ouvidor
e Provedor da Misericórdia de Azurara (3), armador de  navios de grande
porte que serviram nas armadas de África e nas Ilhas "de Baixo"  e da
Madeira (3); não há no entanto a certeza de quem foi sua Mãe, que
segundo alguns autores (2) teria sido Mónica de Loureiro, ou uma sua
filha. Contudo, está provado que Belchior Gonçalves foi casado com
Maria Fernandes Monteiro (1)(8), mas na escritura de revogação de
testamento que ambos fizeram em 1593, Luís Gonçalves Loureiro não figura
entre os filhos citados no documento, o que poderá corroborar a tese
acima; Maria Fernandes seria então a segunda mulher, como diz
D. João de Castro (2). Esta senhora morreu em 18.1.1603 (1) e
Belchior Gonçalves em 6.11.1597, com testamento (1), instituindo uma
capela de que nomeou administrador o seu filho Licº Francisco Corrêa,
que parece ser, este sim, filho de Maria Fernandes (8); foi Vigário de
Mosteiró da Maia (1590), e depois Abade de Ferreiró (1599) e Reitor
de Azurara (1610) (1).

Pelo que fica dito, e pelo uso do apelido Loureiro, pode admitir-se
realmente que Luís Gonçalves Loureiro é filho de um primeiro
casamento de Belchior Gonçalves Corrêa com Mónica de Loureiro ou com
uma filha desta.

Mónica de Loureiro, por sua vez, era filha de Maria de Loureiro e
Diogo Lopes Rebelo; Maria de Loureiro é filha bastarda de Henrique de
Loureiro, havida em  Dona Joana de Lemos. Deste último é filho legítimo
o grande Capitão Luís de Loureiro, Adaíl-Mór e Capitão de Mazagão (9).

Parece interessante seguir a carreira de Luís Gonçalves Loureiro:

Nos documentos mais antigos do AVVC é designado por "piloto", 
nomeadamente na Escritura de dote (11.2.1580) para casar com Marta 
Francisca Monteiro, filha de Francisco Gonçalves Monteiro, também ele
piloto, e Maria Pires.
Consorciaram-se, de facto, em Azurara, dois dias depois, a 14.2.1580.
Nota-se que Marta Francisca Monteiro, nascida no Porto, era já viúva
de Manuel Luís, que lhe deixou uma filha menor, Luísa Manuel (1)(10),
que foi criada pelos avós maternos. Sabe-se que Marta faleceu em
27.10.1623 (1).

Viveu na sua Quinta do Paço da Chave-de-Ferro, em Azurara, e tinha
também uma casa na Rua do Porto, além de outras propriedades.

Em 1593 foi nomeado Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Azurara,
mas "pediu escusa". Também teve o cargo de Ouvidor do Julgado.

Em 1597 sucedeu a seu Pai como Capitão de Azurara (1). Antes disso
era Alferes, na Companhia comandada por seu Pai, que tinha a seu cargo
a "vigia dos fachos" que avisavam a aproximação, então frequente, de
navios corsários às costas de Azurara e Vila do Conde.
No ano de 1619, numa exposição que faz a El-Rei D. Filipe I (4)
relata os acontecimentos relacionados com a missão anterior e
a sua acção na defesa da costa e diz que serviu de Guarda-Mór de 
Azurara,
"avemdo neste Reino e no da guallissa pestes gramdes". Também, no
mesmo documento, descreve as vicissitudes que teve quando as gentes
de Azurara e Vila do Conde disputaram entre si a posse do Rio Ave.

Luís Gonçalves Loureiro era considerado "rico". Comprou muitas terras,
e algumas herdou de seus pais, como o Campo do Pindelo (comprado
em 1576). Das que adquiriu, existem no AVVC várias escrituras de compras
em Azurara, Bagunte, Pindelo, Aveleda, Germude etc. (de 1588 a 1608),
na freguesia de Amorim (1598 a 1623), em Santa Maria de Prado e seu
termo, onde tinha muitas rendas; para a recolha do produto delas,
comprou em 1600 uma casa térrea na Rua Direita desta vila (11), que
ampliou, provavelmente para servir também de habitação, pois quando
morreu a casa já era "sobradada" (12). Esta morada deu, depois de
várias transformações, origem à chamada agora "Casa da Vila", que
ostenta na sua fachada uma pedra-de-armas como brasão dos Loureiros.
(Ignora-se quem a colocou, mas parece ter sido já na segunda metade do
do século XVII (13)).

A receita líquida do seu inventário, conforme a carta de partilhas de
seu filho, o Padre Francisco Monteiro Corrêa (12), foi avaliada em
3 316 058 reis.  Do mesmo documento constam vários bens de raíz, que 
totalizam 2 662 833 reis.
Note-se que anteriormente tinha dotado as suas filhas Maria e Ana com
um total de 636 605 reis, importância que veio à colação para a
repartição da sua herança.

Além disso, no seu testamento instituiu três Capelas em modo de
morgado (14):

- Na primeira vinculou várias propriedades que rendiam 150 medidas de
  pão meado , 4 de trigo e 6 galinhas, com a obrigação de se tirar do
  seu rendimento o necessário para o vinho e hóstias de que os Padres
  Capuchos do Mosteiro de Nossa Senhora dos Anjos, de Azurara,
  necessitassem. O remanescente ficaria para sua filha Mónica, em quem
  nomeia a Capela;

- na segunda, nomeada na sua filha Ana, vinculou terras que rendiam
  86 alqueires, com obrigação de uma missa semanal por sua Alma;

- a terceira Capela era constituída pela propriedade de uma casa
  terreira em Azurara (chamada "casa da cal") que legou a uma
  Leonor Antónia, pelos muitos serviços que lhe fez.

 
Do seu casamento com Marta Francisca Monteiro teve geração:

- O P.e António Monteiro Corrêa, coadjutor de Azurara em 1633.
- Ana Monteiro, b. 8.3.1584, f.c..
- O P.e Francisco Monteiro Corrêa, n. 30.1.1686, que foi cónego loio
  com o nome de Francisco de S. João (16). F. na Rua do Porto, com
  testamento (16), em que instituiu uma Capela, em 15.1.1652.
- O P.e Luís Monteiro de Vasconcellos, n. 4.12.1588. Foi Cura de Árvore.
- Maria Monteiro Corrêa, n. 28.10.1590 e f. 7.9.1670. Casou com
  Amador Álvares de Varzim, piloto e Capitão de Azurara. S.g. (17)
- Ana Monteiro Corrêa, n. 11.10.1592. e f. 6.6.1673. Casou com o
  Capitão Manuel Dinis Mendes de Vasconcellos e teve conhecida geração.
  (18).
- Mónica Monteiro Corrêa n. 28.1.1595, f. com testamento (19) em
  casou com o Cap. Manuel Caminha Dantas. C.c.g. (nossos antepassados)

Concluindo: Luís Gonçalves Loureiro foi, com certeza um homem arrojado,
tanto nas lides guerreiras como na administração de seus bens.
Navegador, continuou a tradição familiar, fortemente ligada ao mar e
à cosmografia (seu bisavô Belchior terá vindo de Castela para este
reino para dirigir uma das naus de Pedro Álvares Cabral (2)); suas
filhas deram continuação a esta tradição casando com homens de armas e
do mar - já que os seus filhos varões foram todos sacerdotes.

                                      Oeiras, Março de 2000.


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Notas:

(1) - "Azurara, Subsídios para a sua Monografia"-Junta da Província do
do Douro Litoral-Porto 1948- pags. 233 e seguintes.
(2) - AVVC- Ms. de D. João de Castro
(3) - AVVC- Petição dirigida a El-Rei D. Filipe I por Belchior Gonçalves
Corrêa (Azurara, 6.12.1595)
(4) - AVVC- Petição e Instrumento de Luís Gonçalves Loureiro sobre os
serviços que ele e seu Pai, Belchior Gonçalves prestaram
na defesa da barra e costas de Azurara (26.6.1619)
(5) - AVVC- Petição a El-Rei D.Filipe I por Luís Gonçalves Loureiro
para intervir numa causa a julgar no Porto por seus procuradores
"por ser muito velho, com mais de 70 anos..."
(Azurara, Maio de 1620)
(6) - AVVC- Instituição de 3 Capelas por Luís Gonçalves Loureiro
(Azurara, 1634)
(3) - AVVC- Petição dirigida a El-Rei D. Filipe I por Belchior Gonçalves
Corrêa (Azurara, 6.12.1595)
(8) - AVVC -Revogação de Escritura e declaração de Belchior Gonçalves
Corrêa e sua mulher Maria Fernandes Monteiro
(Azurara, 9.12.1593). Nela são citados como filhos,
o Licº Francisco Corrêa, Frei António, e "outros".
(9) - "Frei Gonçalo Velho" - Ayres de Sá - Vol.II, pag.155 e seg.
(10) - AVVC -Escritura de dote de casamento de Marta Francisca Monteiro
e Luís Gonçalves Loureiro (Azurara, 11.2.1580)
(11) - AVVC -Compra de uma casa térrea, sita na R. Direita, em Prado,
a Pero de Almeida, viúvo (Prado, 22.9.1600)
(12) - AVVC -Carta de partilhas do P.e Francisco Monteiro Corrêa, por
morte de Luís Gonçalves Loureiro (Azurara, 31.7.1634).
(13) - O brasão, semelhante ao que está na muralha de Marzagão, difere
deste num pormenor do 1º quartel: a torre está encimada por uma
"espada" em vez da "escada" que nela se apoia, como consta da
carta de armas, dada ao Adaíl-Mór desta praça. Trata-se de um
"erro de leitura". Como parece que os conhecimentos heráldicos
dos nossos antepassados eram tirados da "Nobiliarchia Portugueza"
de Antonio de Villasboas e Sampaio", obra publicada em 1676,
(há outros exemplos de lapsos semelhantes), não será de estranhar
se pedra de armas da Casa da Vila for posterior a esta data.
A diferença repete-se num sinete, também da mesma época, que
ostenta as armas dos Loureiros em chefe.
(14) - AVVC -Instituição de 3 Morgados por Luís Gonçalves Loureiro,
Azurara, 1634 (Treslado de 26.8.1825)
(16) - AVVC -Contrato e Composição amigável entre o P.e Francisco de
de S. João Monteiro e sua irmã (Maria) e cunhado
(Porto, 17.8.1627).
(17) - AVVC -Testamento de Maria Monteiro Corrêa (Azurara, 20.3.1670)
(18) - AVVC -Testamento de Ana Monteiro Corrêa (Azurara, 9.2.1660) e
Codicilo de 1.10.1672).
(19) - AVVC -Testamento de Mónica Monteiro Corrêa (Azurara, 25.2.1654)

AVVC =
Arquivo dos Vasconcellos de Vila do Conde.
 
   ANTECEDENTES  FRANCISCO DE VASCONCELOS   DONA HELENA DE SOUSA  
 GERAÇÕES CASAS E SOLARES  AUTORES E OBRAS

Vasconcelos de Vila do Conde


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