7- Espectrometria de RMN do carbono 13
Embora o 13C corresponda a apenas 1,1% do carbono natural, o fato do núcleo desse isótopo do carbono provocar um sinal de RMN tem grande importância para a análise de compostos orgânicos. O principal isótopo do carbono, o 12C, com abundância natural de cerca de 89,9% não tem spin magnético, e por isso não gera sinais de RMN. De certa maneira, os espectros de RMN 13C são, usualmente, menos complicados que os espectros de RMN 1H e mais fáceis de interpretar. Devido ao fato de o 13C existir naturalmente em porcentagem tão baixa, os sinais de RMN gerados pelos seus núcleos não poderiam ser visualizados no espectro. Porém, a técnica utilizada nos aparelhos de RMN 13C consiste em irradiar um pulso curto e potente de radiofrequência, que excita todos os núcleos de 13C existentes na amostra. Os dados são digitalizados automaticamente e guardados em computador e uma série de pulsos repetidos, que acumula os pulsos, construindo os sinais.
Ao contrário do espectro de RMN 1H, que necessita apenas algumas miligramas de amostra, na RMN de 13C é preciso de 10 a 200 mg em 0,4 ml de solvente deuterado. Essa grande diferença é necessária para compensar a baixa porcentagem de 13C, e permitir o acúmulo de sinais. Além disso, enquanto no espectro de RMN 1H a faixa de absorção magnética dos prótons varia de 0 a 14 ppm, no espectro de RMN 13C a faixa varia de 0 a 240 ppm.
7.1) Os sinais do espectro de RMN 13C:
Um aspecto que simplifica bastante a interpretação do espectro de RMN 13C é o fato de cada tipo de átomo de carbono produzir apenas um pico (singleto). Não há acoplamentos carbono-carbono que provoque o desdobramento do sinal em picos múltiplos. Por isso pode-se utilizar aparelhos de RMN mais simples, de 30 ou 60 MHz, já que não é necessária grande precisão para distinguir sinais desdobrados. Nos espectros de RMN 1H, os prótons que estão próximos uns dos outros (separados por um máximo de 3 ligações) acoplam-se entre si e geram sinais desdobrados. Isso não ocorre com carbonos adjacentes, pois apenas um em cada 100 átomos de carbono tem o núcleo de 13C (cuja abundância é de aprox. 1,1%). Assim, a probabilidade de dois átomos de carbono 13 estarem adjacentes é de 1 em 10.000 (isto é: 1,1% x 1,1%), o que elimina, em princípio, a possibilidade de dois carbonos vizinhos desdobrarem mutuamente os respectivos sinais.
Embora não ocorram interações carbono-carbono, os núcleos dos hidrogênios ligados ao carbono podem interferir e desdobrar os sinais de 13C em picos múltiplos. É possível, entretanto, eliminar os acoplamentos H-C por uma técnica que irradiação seletiva (técnica de desacoplamento). Eliminadas as interações próton-carbono, num espectro de RMN 13C completamente desacoplado, cada tipo de carbono produz apenas um pico.
7.2) O deslocamento químico do 13C:
Conforme vimos anteriormente, nos espectros de 1H, o deslocamento químico de um certo núcleo depende da densidade relativa de elétrons em torno do átomo. Baixas densidades eletrônicas em torno de um átomo expõe o núcleo ao campo magnético e provoca o aparecimento de sinais em campos baixos (ppm maiores, para a esquerda da escala) no espectro de RMN. Densidades eletrônicas relativamente altas em torno de um átomo blindam o núcleo contra o campo magnético e provoca o aparecimento de sinais em campos altos (ppm menores, para a direita da escala) no espectro de RMN. Assim, carbonos que estão ligados exclusivamente a outros átomos de carbono e de hidrogênio, têm blindagem elevada diante do campo magnético. Por outro lado, carbonos ligados a grupos eletronegativos, ou seja, grupos "retiradores de elétrons", estão relativamente desblindados. Existem tabelas dos intervalos aproximados do deslocamento químico de carbonos com diferentes substituintes. O padrão de referência, com zero ppm nos espectros de RMN 13C, é também o tetrametilsilano (TMS). Os carbonos do TMS (equivalentes) absorvem energia em 60 ppm (o zero é somente para servir de referência).
7.3) Cálculos teóricos de deslocamento químico do 13C:
Cada tipo de carbono dá um pico particular no espectro, e por isso, cada um destes picos tem seu valor específico de deslocamento químico. Os alcanos absorvem energia em campos mais baixos do que o TMS, na faixa de até cerca de 60 ppm. Dentro dessa faixa pode-se prever o deslocamento químico de 13C de hidrocarbonetos lineares ou ramificados. É possível realizar cálculos teóricos simples de absorção dos carbonos, que nos permite comparar com os dados experimentais das tabelas e confirmar a presença de cada carbono. Veja o procedimento abaixo, para o seguinte hidrocarboneto:
Os valores de deslocamento químico observados experimentalmente para estes carbonos são: C1 e C5 (11,3), C2 e C4 (29,3), C3 (36,7), C6 (18,6). Os carbonos C1 e C5 e também os carbonos C2 e C4 têm mesmo deslocamento químico porque são equivalentes na molécula, pois têm a mesma vizinhança e a molécula é simétrica.
O cálculo teórico dos deslocamentos químicos (d) é feito pela fórmula d = -2,5 + S nA, onde:
-2,5 - deslocamento químico do 13C
do metano
n - número de átomos de carbono que causa
determinado efeito (carbonos a, b, g, d).
A - parâmetro de deslocamento aditivo, em
ppm (veja na tabela abaixo).
13C | (A) |
a | + 9,1 |
b | + 9,4 |
g | - 2,5 |
d | + 0,3 |
e | + 0,1 |
1o (3o)* | - 1,1 |
1o (4o)* | - 3,4 |
2o (3o)* | - 2,5 |
2o (4o)* | - 7,2 |
3o (2o)* | - 3,7 |
3o (3o)* | - 9,5 |
4o (1o)* | - 1,5 |
4o (2o)* | - 8,4 |
* As notações 1o (3o) e 1o (4o) significam, respectivamente, um carbono primário ligado a um terciário e um carbono primário ligado a um quaternário. As notações 2o (3o) e 2o (4o) significam, respectivamente, um carbono secundário ligado a um terciário e um carbono secundário ligado a um quaternário, e assim por diante. O primeiro número (fora dos parêntese) é o carbono que se está analisando. Para cada carbono desses deve-se acrescentar ao cálculo o valor dado na da tabela (A).
Devemos antes nos lembrar que carbonos a são aqueles ligados diretamente ao carbono analisado, os carbonos b são aqueles ligados ao carbono a, e assim por diante. Desta forma temos:
Para
C1 e C5: um carbono a, um carbono b,
dois carbonos g e um carbono d.
Cálculo de d: -2,5 + (9,1 x 1) +
(9,4 x 1) + (-2,5 x 2) + (0,3 x 1) = 11,3
Para
C2 e C4: dois carbonos a, dois carbonos b e um carbono g.
Além disso, C2 é um carbono secundário
ligado a um terciário [2o(3o) =
-2,5].
Cálculo de d: -2,5 + (9,1 x 2) +
(9,4 x 2) + (-2,5 x 2) + (-2,5 x 1) = 29,5
Para
C3: três carbono a
e dois carbonos b. Além disso, C3
é um carbono terciário ligado a dois carbonos
terciários [2o(3o) = -3,7].
Cálculo de d: -2,5 + (9,1 x 3) +
(9,4 x 2) + (-3,7 x 2) = 36,2
Para
o C6: um carbono a,
dois carbonos b e dois carbonos g. Além disso, C6 é um
carbono primário ligado a um terciário [1o(3o)
= -1,1].
Cálculo de d: -2,5 + (9,1 x 1) +
(9,4 x 2) + (-2,5 x 2) + (1,1 x 1) = 19,3
Compare agora os valores obtidos nos cálculos com os valores observados (veja que são iguais ou muito próximos):
C1 e C5: 11,3 (observado), 11,3 (calculado)
C2 e C4: 29,3 (observado), 29,5 (calculado)
C3: 36,7 (observado), 36,2 (calculado)
C6: 18,6 (observado), 19,3 (calculado)
Química 2000 - Wagner Xavier Rocha, 1999