ISOMERIA ÓPTICA


          1- A luz polarizada

          Uma lâmpada incandescente emite uma luz que é constituída de ondas eletromagnéticas, que se propagam com vibrações em infinitos planos, formando, teoricamente, um movimento espiralado. Esse movimento é resultado da composição das diversas vibrações em vários planos. Se "filtrarmos" essas vibrações de modo que se tenha vibração em apenas um plano, teremos a chamada luz polarizada. Veja o esquema abaixo:

polarização da luz

          Os dispositivos capazes de "filtrar" os planos de propagação da luz são denominados polarizadores. Existem muitas maneiras de polarizar a luz. Uma delas é utilizar o prisma de Nicol - um cristal transparente de CaCO3 denominado espato da Islândia, que possui a propriedade de produzir a dupla refração da luz. Para cada raio incidente saem dois raios refratados. Esses dois raios refratados são polarizados, porém, em planos diferentes. Para obter a luz em um único plano de vibração é preciso eliminar um desses raios. Para isso o prisma é cortado segundo um plano diagonal e em seguida as partes cortadas são coladas com uma resina transparente denominada bálsamo do Canadá. Essa resina é mais refringente que o cristal; um dos raios atinge o bálsamo com um ângulo de incidência maior que o ângulo limite e, consequentemente, é refletido. Somente um dos raios é capaz de atravessar o prisma. Temos então a luz polarizada:

prisma de Nicol


          2- A atividade óptica

          Algumas substâncias, sólidas ou líquidas, possuem a capacidade de produzir um desvio no plano da luz polarizada. São chamadas substâncias opticamente ativas. Quando esse desvio é para a direita (no sentido horário) dizemos que a substância é dextrógira (representada pela letra d ou pelo sinal +). Quando o desvio é para a esquerda (no sentido anti-horário) dizemos que a substância é levógira (representada pela letra l ou pelo sinal -). Quando uma substância opticamente ativa é atravessada pela luz polarizada, ocorre uma rotação no plano de vibração, que é então passado por um analisador, que faz a leitura do ângulo de rotação (desvio do plano). A atividade óptica se manifesta nos seguintes casos:


          3- Assimetria e Quiralidade molecular

          Por exemplo, num par de sapatos, o pé esquerdo não serve no pé direito e vice-versa. Logo o par de sapatos é composto por duas formas diferentes, ou seja, não coincidentes. Observe ainda que um pé direito do sapato diante de um espelho é a imagem do pé esquerdo e vice-versa. Dizemos que esta é a imagem especular do objeto. Já uma xícara, uma faca ou uma bola possuem uma imagem especular que coincide com o objeto, pois apresentam pelo menos um plano de simetria. O mesmo pode ser aplicado para moléculas. Veja a comparação entre uma molécula simétrica (cloro-metano) e uma molécula assimétrica (ácido láctico), ambas diante de um espelho imaginário:

imagem especular

          O par objeto-imagem de uma molécula assimétrica é denominado par de enantiômeros ou antípodas ópticas. O fenômeno que impede a sobreposição da imagem especular da molécula com seu objeto é denominado quiralidade molecular e as moléculas são ditas quirais. Um fator determinante da quiralidade molecular é a presença do carbono assimétrico. Carbono assimétrico é um átomo de carbono saturado (hibridação sp3), que apresenta quatro radicais diferentes ligados a ele. Com essa estrutura, a molécula não apresenta nenhum plano de simetria e sua imagem especular terá estrutura não coincidente (Obs: O carbono assimétrico é marcado com um asterisco: C*). Observando a representação da molécula do ácido láctico abaixo podemos constatar que a sua imagem especular não coincide com o objeto:

ácido láctico

          Perceba que, sobrepondo a imagem com o objeto, as estruturas não coincidem. Concluímos então que essa molécula é quiral e existem para ela duas estruturas possíveis no espaço.

          Muitas vezes é difícil enxergar a impossibilidade de sobreposição. À primeira vista, olhando para o desenho, em duas dimensões, podemos pensar que é possível sobrepor as duas estruturas, porque não visualizamos as três dimensões tão facilmente. Para fazer essa verificação é muito importante usar modelos moleculares. Construa um modelo tetraédrico com uma esfera de cor diferente em cada vértice. Depois construa um outro modelo que seja a imagem especular do primeiro. Então tente sobrepô-las rotacionando à vontade (sem partir ligações) as duas estruturas. Com certeza todas as dúvidas serão eliminadas.


          4- Rotação específica

          Os enantiômeros possuem propriedades físicas e químicas idênticas, pois são o mesmo composto, com igual número e tipo de átomos e ligações. Registra-se apenas uma característica diferente: a rotação causada no plano da luz polarizada. Apenas o sentido da rotação é diferente. A magnitude da rotação é a mesma. Se, por exemplo, num dos isômeros, a rotação específica é de + 5,756o, no outro é de - 5,756o.

polarímetro

          Quando se misturam os enantiômeros em quantidades iguais, tem-se uma mistura racêmica ou racemato, opticamente inativa. Isso porque as moléculas levógiras anulam o efeito das dextrógiras sobre a luz polarizada e vice-versa. Numa substância opticamente ativa, não contaminada pelo respectivo enantiômero, a rotação provocada pelas moléculas não é anulada, já que nenhuma molécula pode ser considerada como imagem em espelho plano de outra, seja qual for a distribuição em que elas se encontrem no espaço.

          A rotação específica pode ser dada pela relação:

  [a] = a / l.e  

          Onde:

          [a] - rotação específica
          a - desvio no plano da luz polarizada (em graus)
          l - comprimento do tubo
          e - concentração da substância (em g/ml)

          OBS: Caso se trate de uma substância pura não diluída, a concentração é substituída pela densidade dessa substância.


          5- Elementos de simetria molecular

          Os principais elementos de simetria molecular são o plano, o eixo e o centro. As moléculas que apresentam pelo menos um desses elementos são simétricas e, consequentemente, não têm atividade óptica, ou seja, não desviam o plano da luz polarizada. São por isso ditas opticamente inativas. No entanto, moléculas que apresentam apenas o eixo de simetria (não possuem plano nem centro de simetria) podem apresentar atividade óptica. Estas moléculas são ditas dissimétricas.

          As moléculas que não apresentam nenhum desses elementos de simetria são assimétricas e ditas opticamente ativas, pois têm atividade óptica.


          5.1) Plano de simetria:

          Vamos exemplificar com uma molécula simples, de geometria tetraédrica. Para maior facilidade de visualização vamos considerar cada vértice do tetraedro como um átomo distinto, ligado ao átomo central. Podemos ter quatro situações possíveis (chamaremos o átomo central de A e os ligantes de B, C, D e E):

          Veja as representações abaixo. A molécula ABCDE é a única que não resulta duas metades equivalentes quando cortada por um plano que passe por duas ligações. Por não ter nenhum plano de simetria, moléculas desse tipo são ditas assimétricas.

plano de simetria


          5.2) Eixo de simetria:

          Existe um eixo de simetria quando a molécula é girada de um ângulo de 360o ao redor de um eixo e a situação é equivalente à inicial. Veja como exemplo a molécula do trans 1,2 - dibromo ciclobutano. Pode-se traçar um eixo no centro da molécula de modo que, girando a estrutura 360o ao redor desse eixo, obtemos a mesma disposição inicial dos átomos. A molécula apresenta, portanto, um elemento de simetria, porém, sua imagem especular não é sobreponível. A molécula é dita dissimétrica, e existe como um par de enantiômeros, ou seja, apresenta atividade óptica. Veja:

eixo de simetria


          5.3) Centro de simetria:

          Se pudermos identificar na molécula um ponto pelo qual se pode traçar uma linha que ligue partes iguais em lados opostos, podemos dizer que a molécula é simétrica e não apresenta atividade óptica Veja os exemplos:

centro de simetria


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Química 2000 - Wagner Xavier Rocha, 1999