História de São Paulo


 

CAPITANIA DE SÃO VICENTE

O renascimento agrícola, iniciado na segunda metade do século XVIII, deu novos rumos ao desenvolvimento paulista. As lavouras de açúcar ocuparam o Litoral Norte e a região entre Itu e Sorocaba.

A colonização de São Paulo começou pela vila de São Vicente, a mais antiga do Brasil, que emprestou o seu nome à capitania. A vila foi fundada por Martim Afonso de Souza em1532, e era a povoação mais remota da colônia. Fora do centro de atenções de Portugal, voltado para os bons lucros da lavoura canavieira exportadora estabelecida no Nordeste, a capitania, marginalizada, dedicou-se à agricultura de subsistência no planalto e ao apresamento de índios para o mercado interno de escravos.

Na metade do século XVI, a vila de São Paulo tornou-se o centro da capitania, local de onde partiam as expedições de caça aos índios. Nesse período, os paulistas devastaram tribos indígenas estabelecidas no litoral e no interior do atual Estado, defrontaram-se com a Confederação dos Tamoios - episódio em que ocorreu o cativeiro de Hans Staden, artilheiro alemão que ficou conhecido pelos desenhos que fez dos tamoios - e participaram das lutas para expulsar os franceses do Rio de Janeiro. No século seguinte, ainda em busca de índios, as bandeiras de apresamento voltaram-se para as missões jesuíticas estabelecidas no Sul e Centro-Oeste do Brasil e, no seu processo de interiorização, romperam os limites do Tratado de Tordesilhas e lançaram as bases das atuais fronteiras brasileiras.

No século XVII, três episódios marcaram particularmente a história paulista: o conflito entre as famílias Pires e Camargo, envolvendo toda a sociedade paulista na luta pela hegemonia política e pelo poder; a expulsão dos jesuítas; e a aclamação de Amador Bueno, "o homem que não quis ser rei" - uma tentativa de estreitar os vínculos da colônia com a coroa espanhola, depois da restauração da soberania portuguesa, ocorrida em 1640. Nessa época, na segunda metade do século XVII, estava em pleno apogeu o bandeirismo de contrato. Os paulistas passaram a prestar serviços em vários cantões do Brasil, colaboraram na destruição de quilombos - como o famoso quilombo dos Palmares -, acabaram com rebeliões indígenas, realizaram viagens de reconhecimento ao interior e buscaram metais e pedras preciosas.

No final do século, com a descoberta do ouro em Minas Gerais, em 1694, iniciou-se a ocupação efetiva do interior do Brasil, primeiro por Minas Gerais, no Sudeste, e, logo após a Guerra dos Emboabas, o Centro e o Sul do país. Em 1718 e 1726, seria descoberto ouro em Mato Grosso e Goiás. Com as novas descobertas começavam as monções, movimentos de população e mercadorias que partiam de São Paulo pelo rio Tietê, passavam pelo rio Paraná e, seguindo outros afluentes, chegavam, alguns meses depois, às longínquas minas. Paralelamente, os paulistas ocuparam o sul da colônia, primeiro para caçar e depois para criar gado para os mercados mineiros.

Durante esses três primeiros séculos de colonização, o número de índios e mamelucos superou em muito o de europeus. Até meados do século XVIII, o tupi era a língua mais falada na região. No período da união das coroas ibéricas, entre 1580 e 1640, estima-se que o espanhol foi a segunda língua da vila de São Paulo. Após a independência, os africanos representavam algo em torno de 25% da população, e os mulatos, mais de 40%. A presença de índios nas zonas ocupadas pela colonização já era insignificante.

O renascimento agrícola, iniciado na segunda metade do século XVIII, deu novos rumos ao desenvolvimento paulista. As lavouras de açúcar ocuparam o Litoral Norte e a região entre Itu e Sorocaba. A capitania recuperou a perspectiva agroexportadora do início da colonização. Na virada do século XVIII para o XIX, as plantações de café começaram a substituir as de açúcar e a preparar a província para ocupar o primeiro plano na economia nacional. Em conseqüência, a sociedade sofreu grandes transformações.

Ao longo do período colonial, os limites geográficos de São Paulo sofreram grandes alterações. Inicialmente, compreendia três das 12 capitanias que Portugal criou no Brasil.
Destas, no entanto, apenas São Vicente se desenvolveu, absorvendo as outras duas, as de Santo Amaro e Santana. Em 1710, englobava desde a região das Minas Gerais até Sacramento, no extremo Sul da colônia, e passou a denominar-se Capitania de São Paulo e Minas do Ouro. Dez anos depois, Minas foi desmembrada, mas São Paulo se manteve com uma área imensa. No entanto, não tardou a perder o controle sobre quase todo o resto: Santa Catarina e Rio Grande do Sul (1738), Mato Grosso (1744), Goiás (1748) e, finalmente, Paraná (1852).

 

A PROVÍNCIA IMPERIAL

Os imigrantes trouxeram para São Paulo, além de sua cultura e de novas tecnologias, o ideário da revolução industrial e do capitalismo em ascensão.

Com a Independência do Brasil, a antiga capitania tornou-se uma província do Império. Apesar do processo conservador de independência, esses 67 anos foram um período de grandes transformações, marcadas, entre outras, pelo final da escravidão e a chegada em massa de imigrantes - que, além de sua cultura e de novas tecnologias, também trouxeram para São Paulo o ideário da revolução industrial e do capitalismo em ascensão.

Nesse período, o Brasil tornou-se área de influência do imperialismo inglês, que nos reservou a condição de país produtor de gêneros agrícolas - café, açúcar e algodão entre os principais - e extrator de matérias-primas. Nesse contexto econômico, São Paulo assumiu uma posição de destaque no cenário nacional, com o avanço dos cafezais, que encontraram na terra roxa do noroeste da província o solo ideal, e, na seqüência, com a chegada das estradas de ferro, o complemento fundamental da expansão cafeeira.

Além de trazer milhares de imigrantes para resolver o problema da mão-de-obra, esse movimento permitiu a ocupação do interior. Criaram-se as condições necessárias para que pequenas fábricas, subsidiárias do café, dessem os primeiros passos em direção à industrialização, processo que aguardaria a República para encontrar suas formas mais definitivas.

As transformações no período assumiram múltiplas facetas. Em 1822, as pequenas vilas ainda se pareciam em quase tudo às do século anterior, mas logo ganhariam nova organização e feição, refletindo o crescimento econômico e os novos moldes que o capitalismo impunha aos perfis urbanos. Em meados do século, São Paulo, a capital da província, já era bem diferente da pacata cidade descrita por Saint-Hilaire às vésperas da Independência. Os primeiros lampiões de rua queimavam óleo de mamona ou de baleia, os criminosos enfrentavam polícias urbanas especializadas, muitos réus respondiam por seus crimes em moderna penitenciária, os sepultamentos abandonavam o interior das velhas igrejas, deslocando-se para cemitérios na periferia das zonas centrais. A cidade contava com um bem-cuidado jardim, o Jardim da Luz.

Circos, companhias de teatro, cantores, poetas e livrarias ganhavam o cotidiano da paisagem urbana e, com eles, outra novidade: os jornais periódicos. As vilas passavam a contar com classes de primeiro grau, principalmente para os meninos. Os edifícios públicos multiplicavam-se: assembléia, câmaras, fóruns, escolas, quartéis, cadeias, abrigos para crianças desamparadas, o Gabinete Topográfico - primeira escola a formar engenheiros -, a Escola Agrícola de Santana e dezenas de igrejas espalhavam-se por toda parte. Nas últimas, improvisavam-se vacinações públicas e realizavam-se as eleições de paróquias, agitando a estreita faixa de homens livres com ganhos suficientes para terem o direito de voto.

Calçamentos, pontes, aquedutos e chafarizes, além de tributos, delimitação territorial e a elevação de vilas à condição de cidade ganhavam o cotidiano das câmaras e da assembléia. Porém, o centro de atenção dos legisladores voltava-se para a construção das estradas: "governar é construir estradas", já diziam, visualizando a interiorização dos cafezais e a prosperidade.

Toda essa modernidade conviveu com o velho - com os pelourinhos, agitados pontos de venda de escravos, símbolo colonial de autoridade.

Mais do que em qualquer outro ponto do país, viveu-se em São Paulo a síntese entre o novo e o velho. No plano político, logo o Império veria a Proclamação da República.

 

ESTADO E REPÚBLICA

A grande novidade no período foi a forma intensa como tudo se multiplicou, desde a imigração para o campo até o desenvolvimento das cidades, que levavam São Paulo, a economia mais dinâmica da Federação, a perder sua feição provincial.

Com a chegada da República e até 1930, São Paulo, agora Estado da Federação, manteve as mesmas bases econômicas consolidadas nas últimas décadas do Império. A ferrovia puxava a expansão da cafeicultura, atraía imigrantes e permitia a colonização de novas áreas, enquanto nas cidades a industrialização avançava, criava novos contornos urbanos e abria espaço para a burguesia, o operariado, a classe média - enfim, para a modernidade.

A singularidade desse período foi a forma intensa com que tudo se multiplicou, desde a imigração para o campo até o desenvolvimento das cidades, que levavam São Paulo, a economia mais dinâmica da Federação, a perder sua feição provincial. Nesse período, a aristocracia cafeeira paulista viveu o seu apogeu. A aliança com a oligarquia de Minas e de outros Estados, que teve sua expressão maior na política do café-com-leite, tornou o país uma autêntica república do café.

O Estado fervilhava. As novidades eram muitas: a eletricidade substituía o lampião a gás, chegavam os primeiros carros - o primeiro de todos foi o do pai de Santos Dumont, em 1892 -, cresciam as linhas de bondes elétricos, construíam-se grandes obras urbanas, entre as quais o Viaduto do Chá e a Avenida Paulista, ambas no coração da capital.

O Estado todo se transformou. Santos, Jundiaí, Itu, Campinas e diversas outras vilas passaram a conviver com o apito das fábricas e com uma classe operária que chegava a trabalhar 16 horas por dia, de segunda a sábado, quando não durante os sete dias da semana.

As greves ilegais e as "badernas de rua" tornaram-se assunto cotidiano dos boletins da polícia, ao mesmo tempo que começava a saltar aos olhos a precariedade da infra-estrutura urbana, exigida pela industrialização: déficit no número de habitações, insuficientes redes de água e esgoto e falta de transportes coletivos.

Nessa nova conjuntura, um dos graves problemas passou a ser a geração de energia, centro de atenção das autoridades estaduais que mandaram realizar um grande estudo para saber qual o potencial energético dos rios de São Paulo. Para isso, expedições foram enviadas aos mais remotos rios, e até mesmo ao rio Paraná, no extremo oeste do Estado. Mais de uma dezena de pequenas hidrelétricas começaram a ser construídas, principalmente com capitais estrangeiros.

Em 1900, foi inaugurada a Light, empresa canadense e principal responsável pelo setor em São Paulo até 1970. Dessa maneira, o Estado passou a ter uma significativa capacidade de geração de energia, o que foi decisivo para o grande desenvolvimento industrial verificado entre 1930 e 1940.

Antes do final da República Velha, em 1930, os trilhos chegaram às proximidades do rio Paraná e a colonização ocupou mais de um terço do Estado. As cidades se multiplicavam.


Socialmente, o Estado, com seus mais de um milhão de imigrantes, tornou-se uma torre de babel, profundamente marcado pelas diferentes culturas trazidas de mais de 50 países. Até na fisionomia o paulista mudou: ele perdeu a morenitude anterior, que era marcante na Bahia e em Pernambuco.

Na última década da República Velha, o modelo econômico e político mostrava seu esgotamento. O movimento tenentista em São Paulo e no resto do país prenunciava o seu fim, que chegou com a Revolução de 1930. Nesse momento, a aristocracia paulista, despojada do poder, reagiu e promoveu a Revolução Constitucionalista de 1932, fracassada aventura militar de São Paulo. O país viveu um período de instabilidade que favoreceu a instalação da ditadura de Getúlio Vargas, período obscuro de oito anos que terminou juntamente com a Segunda Guerra Mundial, abrindo um período de democratização.

Na economia paulista, o café superou a crise por que passou no início da década de 1930 e foi estimulado por bons preços durante a guerra. Mas, agora, era a vez da indústria despontar, impulsionada, entre outros motivos, pelos capitais deslocados da lavoura. Logo, outro grande salto seria dado, com a chegada da indústria automobilística em São Paulo, carro-chefe da economia nacional desde a década de 1950.

No plano político, terminada a ditadura Vargas, São Paulo viveria o período do populismo, primeiro com Ademar de Barros e, depois, de uma forma mais elaborada, com Jânio Quadros. Mais tarde, em 1964, o país cairia em outra ditadura, a ditadura militar, que se prolongou por longos e obscuros vinte anos.

Com a redemocratização, assumiu o poder em São Paulo o PMDB, principal herdeiro da grande frente que congregou as várias tendências da oposição ao regime autoritário. Foram anos difíceis, saldo dos desmandos do período anterior, que produziu um expressivo desenvolvimento econômico com imenso desequilíbrio social.

Após as eleições de 1994 abriu-se uma nova etapa de desenvolvimento social, político e econômico para São Paulo, agora em sintonia com as grandes diretrizes do Governo Federal, uma vez que Fernando Henrique Cardoso, o presidente eleito, do PSDB, promete a estabilidade financeira perdida há muitos anos, ao lado do resgate da gigantesca dívida social existente no Brasil.

 

 

Patrimônio Cultural

Apesar de rico e abrangente, o patrimônio cultural paulista não reflete a importância histórica dos primórdios de São Paulo: primeiro local a ser colonizado (São Vicente, 1530), primeiras cidades mineiras (Vale do Ribeira, início do século XVII) e centro irradiador do desbravamento do interior do país. Pela pobreza e caráter simples de sua população, São Paulo não produziu, como era de se esperar, monumentos de porte e riqueza que perdurassem. Da mesma forma, ao contrário do que se supõe, o patrimônio natural de florestas primitivas que cerca uma das maiores cidades do mundo é extraordinariamente rico e preservado.


Do patrimônio edificado mais antigo restam principalmente ruínas (Abarebebê em Peruíbe, convento de Itanhaém, Engenho dos Erasmos em Santos etc.) e, com o avançar na história, temos remanescentes nas cidades litorâneas de Cananéia, Iguape, Santos, São Sebastião, Ilhabela, Ubatuba, subindo no Vale do Ribeira, em Iporanga e no planalto, além de igrejas e casas bandeiristas em São Paulo, Itu, Santana do Parnaíba e Campinas.

O número de edifícios significativos aumenta muito a partir do período do café: iniciando-se no limite do Estado do Rio de Janeiro, avança pelo Vale do Paraíba em direção a São Paulo e penetra no interior.

São centenas de fazendas com suas instalações senhoriais, verdadeiros feudos onde, além do café, praticamente tudo era produzido, desde os instrumentos de trabalho e alimentos, até móveis, tecidos e vestuário dos escravos e empregados, permitindo a auto-suficiência. Esse surto econômico se reflete na urbanização e surgem os edifícios públicos, as escolas, teatros, igrejas, instalações portuárias, mercados etc. e o início da influência européia, a princípio "cultura" importada e, posteriormente, fundida no comportamento pela imigração. Culturalmente, esse período é rico: a arquitetura evolui das primeiras casas de fazenda de sóbria concepção colonial portuguesa, passando pelo francesismo e entrando por este século com a art nouveau e art déco. São significativas as fazendas do Vale do Paraíba e suas cidades como Bananal, Areias e São Luís do Paraitinga e as regiões de Campinas, Itu e Piracicaba. Cidades tardias, como Socorro, preservam ainda o ambiente do começo do século.

A imigração e a industrialização enriqueceram o patrimônio cultural de São Paulo com a fusão de culturas, a introdução e o desenvolvimento de tecnologias. São inúmeros monumentos que guardam as características dos países de origem, porém é mais significativo o resultado dessa fusão que resulta numa linguagem estética própria, compondo um vasto conjunto de obras do mais alto significado cultural.

O patrimônio natural se compõe de florestas primitivas de uma biodiversidade extraordinária, em razão da localização do Estado entre o Sul, mais frio, e o Norte, mais quente, além da topografia, que vai do nível do mar ao planalto e à região de serras, possibilitando o desenvolvimento de flora e fauna das duas regiões. Ao longo de todo o litoral se desenvolve a Serrra do Mar que, no Sul do Estado, se une com as matas do Alto Ribeira. Em torno da capital existe um cinturão verde preservado, tombado pela Unesco como Reserva da Biosfera, patrimônio mundial. A 8 km do centro de uma das três maiores cidades do mundo, na Serra da Cantareira, encontramos floresta primitiva preservada, com cerca de 300 diferentes espécies de pássaros, bugios etc. Estas matas, constituídas em sua maior parte por parques estaduais, encerram verdadeiros tesouros não apenas de diversidade biológica, mas também de qualidades paisagísticas e turísticas a serem cuidadosamente exploradas. O Alto Ribeira, por exemplo, possui mais de 400 cavernas importantes cadastradas, constituindo-se num paraíso para espeleólogos e arqueólogos. Algumas são abertas à visitação pública, contando com serviço de guias especializados.

A riqueza do patrimônio cultural paulista é surpreendente, mesmo para aqueles que tratam do assunto.

São florestas, serras, praias, edifícios históricos, desde as ruínas jesuíticas e bandeiristas até a arquitetura contemporânea; os acervos artísticos e documentais, os sítios arqueológicos; o patrimônio industrial; as represas e fazendas do interior. O conjunto de bens tombados, protegidos por lei, não é mais do que uma amostra de sua magnitude, não podendo ser mostrados em espaço tão breve.

A fundação de São Paulo insere-se no processo de ocupação e exploração das terras americanas pelos portugueses, a partir do século XVI. Inicialmente, os colonizadores fundaram a Vila de Santo André da Borda do Campo (1553), constantemente ameaçada pelos povos indígenas da região. Nessa época, um grupo de padres da Companhia de Jesus, da qual faziam parte José de Anchieta e Manoel da Nóbrega, escalaram a serra do mar chegando ao planalto de Piratininga onde encontraram "ares frios e temperados como os de Espanha" e "uma terra mui sadia, fresca e de boas águas". Do ponto de vista da segurança, a localização topográfica de São Paulo era perfeita: situava-se numa colina alta e plana, cercada por dois rios, o Tamanduateí e o Anhangabaú.

Nesse lugar, fundaram o Colégio dos Jesuítas em 25 de janeiro de 1554, ao redor do qual iniciou-se a construção das primeiras casas de taipa que dariam origem ao povoado de São Paulo de Piratininga.

Em 1560, o povoado ganhou foros de Vila e pelourinho mas a distância do litoral, o isolamento comercial e o solo inadequado ao cultivo de produtos de exportação, condenou a Vila a ocupar uma posição insignificante durante séculos na América Portuguesa.

Por isso, ela ficou limitada ao que hoje denominamos Centro Velho de São Paulo ou triângulo histórico, em cujos vértices ficam os Conventos de São Francisco, de São Bento e do Carmo.

Até o século XIX, nas ruas do triângulo (atuais ruas Direita, XV de Novembro e São Bento) concentravam-se o comércio, a rede bancária e os principais serviços de São Paulo.

Em 1681, São Paulo foi considerada cabeça da Capitania de São Paulo e, em 1711, a Vila foi elevada à categoria de Cidade. Apesar disso, até o século XVIII, São Paulo continuava como um quartel-general de onde partiam as "bandeiras", expedições organizadas para apresar índios e procurar minerais preciosos nos sertões distantes. Ainda que não tenha contribuído para o crescimento econômico de São Paulo, a atividade bandeirante foi a responsável pelo devassamento e ampliação do território brasileiro a sul e a sudoeste, na proporção direta do extermínio das nações indígenas que opunham resistência a esse empreendimento.

A área urbana inicial, contudo, ampliou-se com a abertura de duas novas ruas, a Líbero Badaró e a Florêncio de Abreu. Em 1825, inaugurou-se o primeiro jardim público de São Paulo, o atual Jardim da Luz, iniciativa que indica uma preocupação urbanística com o aformoseamento da cidade.

No início do século XIX, com a independência do Brasil, São Paulo firmou-se como capital da província e sede de uma Academia de Direito, convertendo-se em importante núcleo de atividades intelectuais e políticas. Concorreram também para isso, a criação da Escola Normal, a impressão de jornais e livros e o incremento das atividades culturais.

No final do século, a cidade passou por profundas transformações econômicas e sociais decorrentes da expansão da lavoura cafeeira em várias regiões paulistas, da construção da estrada de ferro Santos-Jundiaí (1867) e do afluxo de imigrantes europeus. Para se ter uma idéia do crescimento vertiginoso da cidade na virada do século, basta observar que em 1895 a população de São Paulo era de 130 mil habitantes (dos quais 71 mil eram estrangeiros), chegando a 239.820 em 1900!). Nesse período, a área urbana se expandiu para além do perímetro do triângulo, surgiram as primeiras linhas de bondes, os reservatórios de água e a iluminação a gás.

Esses fatores somados já esboçavam a formação de um parque industrial paulistano. A ocupação do espaço urbano registrou essas transformações. O Brás e a Lapa transformaram-se em bairros operários por excelência; ali concentravam-se as indústrias próximas aos trilhos da estrada de ferro inglesa, nas várzeas alagadiças dos rios Tamanduatey e Tietê. A região do Bexiga foi ocupada, sobretudo, pelos imigrantes italianos e a Avenida Paulista e adjacências, áreas arborizadas, elevadas e arejadas, pelos palacetes dos grandes cafeicultores .

As mais importantes realizações urbanísticas do final do século foram, de fato, a abertura da Avenida Paulista (1891) e a construção do Viaduto do Chá (1892), que promoveu a ligação do "centro velho" com a "cidade nova", formada pela rua Barão de Itapetininga e adjacências. É importante lembrar, ainda, que logo a seguir (1901) foi construída a nova estação da São Paulo Railway, a notável Estação da Luz.

Do ponto de vista político-administrativo, o poder público municipal ganhou nova fisionomia. Desde o período colonial São Paulo era governada pela Câmara Municipal, instituição que reunia funções legislativas, executivas e judiciárias. Em 1898, com a criação do cargo de Prefeito Municipal, cujo primeiro titular foi o Conselheiro Antônio da Silva Prado, os poderes legislativo e executivo se separaram.

O século XX, em suas manifestações econômicas, culturais e artísticas, passa a ser sinônimo de progresso. A riqueza proporcionada pelo café espelha-se na São Paulo "moderna", até então acanhada e tristonha capital.

Trens, bondes, eletricidade, telefone, automóvel, velocidade, a cidade cresce, agiganta-se e recebe muitos melhoramentos urbanos como calçamento, praças, viadutos, parques e os primeiros arranha-céus.

O centro comercial com seus escritórios e lojas sofisticadas, expõe em suas vitrinas a moda recém lançada na Europa. Enquanto o café excitava os sentidos no estrangeiro, as novidades importadas chegavam ao Porto de Santos e subiam a serra em demanda à civilizada cidade planaltina. Sinais telegráficos traziam notícias do mundo e repercutiam na desenvolta imprensa local.

Nos navios carregados de produtos finos para damas e cavalheiros da alta classe, também chegavam os imigrantes italianos e espanhóis rumo às fazendas ou às recém instaladas indústrias, não sem antes passar uma temporada amontoados na famosa hospedaria dos imigrantes, no bairro do Brás.

Em 1911, a cidade ganhou seu Teatro Municipal, obra do arquiteto Ramos de Azevedo, celebrizado como sede de espetáculos operísticos, tidos como entretenimento elegante da elite paulistana.

A industrialização se acelera após 1914 durante a Primeira Grande Guerra mas o aumento da população e das riquezas é acompanhado pela degradação das condições de vida dos operários que sofrem com salários baixos, jornadas de trabalho longas e doenças. Só a gripe espanhola dizimou oito mil pessoas em quatro dias.

Os operários se organizam em associações e promovem greves, como a que ocorreu em 1917 e parou toda a cidade de São Paulo por muitos dias. Nesse mesmo ano, o governo e os industriais inauguram a exposição industrial de São Paulo no suntuoso Palácio das Indústrias, especialmente construído para esse fim. O otimismo era tamanho que motivou o prefeito de então, Washington Luis, a afirmar, com evidente exagero: "A cidade é hoje alguma coisa como Chicago e Manchester juntas".

Na década de 20, a industrialização ganha novo impulso, a cidade cresce (em 1920, São Paulo tinha 580 mil habitantes) e o café sofre mais uma grande crise. No entanto, a elite paulistana, num clima de incertezas mas de muito otimismo, frequenta os salões de dança, assiste às corridas de automóvel, às partidas de foot-ball, às demonstrações malabarísticas de aeroplanos, vai aos bailes de máscaras e participa de alegres corsos nas avenidas principais da cidade. Nesse ambiente, surge o irrequieto movimento modernista. Em 1922, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Luís Aranha, entre outros intelectuais e artistas, iniciam um movimento cultural que assimilava as técnicas artísticas modernas internacionais, apresentado na célebre Semana de Arte Moderna, no Teatro Municipal.

Com a queda da bolsa de valores de Nova Iorque e a Revolução de 1930, alterou-se a correlação das forças políticas que sustentou a "República Velha". A década que se iniciava foi especialmente marcante para São Paulo tanto pelas grandes realizações no campo da cultura e educação quanto pelas adversidades políticas. Os conflitos entre a elite política, representante dos setores agro-exportadores do Estado, e o governo federal, conduziram à Revolução Constitucionalista de 1932 que transformou a cidade numa verdadeira praça de guerra, onde se inscreviam os voluntários, se armavam estratégias de combate e se arrecadavam contribuições da população amedrontada mas orgulhosa de pertencer a uma "terra de gigantes".

A derrota de São Paulo e sua participação restrita no cenário político nacional coincidiu, no entanto, com o florescimento de instituições científicas e educacionais. Em 1933, foi criada a Escola Livre de Sociologia e Política, destinada a formar técnicos para a administração pública; em 1934, Armando de Salles Oliveira, interventor do Estado, inaugurou a Universidade de São Paulo; em 1935, o Município de São Paulo ganhou, na gestão do prefeito Fábio Prado, o seu Departamento de Cultura e de Recreação.

Nesse mesmo período, a cidade presenciou uma realização urbanística notável, que testemunhava o seu processo de "verticalização": a inauguração, em 1934, do Edifício Martinelli, maior arranha-céu de São Paulo, à época, com 26 andares e 105 metros de altura!

A década de 40 foi marcada por uma intervenção urbanística sem precedentes na história da cidade. O prefeito Prestes Maia colocou em prática o seu "Plano de Avenidas", com amplos investimentos no sistema viário. Nos anos seguintes, a preocupação com o espaço urbano visava basicamente abrir caminho para os automóveis e atender aos interesses da indústria automobilística que se instalou em São Paulo em 1956.

Simultaneamente, a cidade cresceu de forma desordenada em direção à periferia gerando uma grave crise de habitação, na mesma proporção, aliás, em que as regiões centrais se valorizaram servindo à especulação imobiliária.

Em 1954, São Paulo comemorou o centenário de sua fundação com diversos eventos, inclusive a inauguração do Parque Ibirapuera, principal área verde da cidade, que passou a abrigar edifício diversos projetados pelo arquiteto Oscar Niemeyer.

Nos anos 50, inicia-se o fenômeno de "desconcentração" do parque industrial de São Paulo que começou a se transferir para outros municípios da Região Metropolitana (ABCD, Osasco, Guarulhos, Santo Amaro) e do interior do Estado (Campinas, São José dos Campos, Sorocaba).

Esse declínio gradual da indústria paulistana insere-se num processo de "terciarização" do Município, acentuado a partir da década de 70. Isso significa que as principais atividades econômicas da cidade estão intrinsecamente ligadas à prestação de serviços e aos centros empresariais de comércio (shopping centers, hipermercados, etc). As transformações no sistema viário vieram atender a essas novas necessidades. Assim, em 1969, foram iniciadas as obras do metrô na gestão do prefeito Paulo Salim Maluf.

A população da metrópole paulistana cresceu na última década, de cerca de 10 para 16 milhões de habitantes. Esse crescimento populacional veio acompanhado do agravamento das questões sociais e urbanas (desemprego, transporte coletivo, habitação, problemas ambientais ...) que nos desafiam como "uma boca de mil dentes" nesse final de século. No entanto, como dizia o grande poeta da cidade, Mário de Andrade:

"Lá fora o corpo de
São Paulo escorre
vida ao guampasso
dos arranhacéus"