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dez/99
O BONDE DAS ONZE
Bruno F.Reis Malburg (1969)
Até meados da década
de 60 as Ruas São Clemente e Voluntários da Pátria
eram de mão-dupla e por ambas passavam os bondes. Foi o famoso Coronel
Américo Fontenelle quando Diretor do DETRAN que implantou a mão
única em ambas as ruas, com a São Clemente passando a ter
o sentido Praia de Botafogo - Humaitá mantido até hoje. Foi
uma medida ousada e inicialmente muito criticada, mas que revelou-se absolutamente
necessária para viabilizar o tráfego em Botafogo que já
se tornava caótico.
De qualquer forma, o que
importa aqui é que os alunos do Santo Inácio que moravam
para os lados do Humaitá, Jardim Botânico, Gávea, Lagoa
e Leblon tomavam o bonde para vir ao colégio, pois era mais barato
que o "lotação" (para quem não sabe, este era o nome
dos pequenos ônibus da época, com motor dianteiro, enorme
grade de radiador com a estrela da Mercedes Benz na tampa à frente,
e onde não se podia viajar em pé).
Naquela ocasião, no
período da tarde, tinham aula os alunos do Admissão e Ginásio
(correspondentes hoje às séries de 5.ª à 8.ª).
Apesar das aulas começarem ao meio-dia, a entrada era das 11 às
11h36min, quando o Padre Chaves fechava o portão.
A fachada do Colégio,
de frente para a Rua São Clemente, era mais afastada da rua, pois
não existia o prédio onde ficam hoje a Recepção
e o Gabinete do Reitor, sendo este espaço, mais o do pequeno estacionamento
de lajotas atual, ocupado por um largo e poeirento pátio de terra.
Era uma fachada nitidamente inacabada, onde apareciam tijolos sem revestimento,
revelando já haver a intenção de executar-se um projeto
para a entrada, o qual só viria a ser implementado, se não
me engano, na década de 70. O aspecto não deixava de ter
o seu charme para o observador mais esclarecido, pois era semelhante ao
de muitos prédios históricos, termas e igrejas da Roma de
hoje, que são preservados nas condições em que ficaram
após as destruições parciais provocadas pelos fatos
que marcaram a vida da Cidade Eterna.
Encravado nes-ta fachada,
mais ou menos na direção de onde fica hoje o letreiro metálico
com o nome do Colégio, havia o portão de entrada ao qual
se tinha acesso por uma escada de madeira provisória, mas que ali
ficou durante muitos anos. Após abrir o portão, pontualmente
às onze horas, o Padre Chaves se postava à sua frente, de
modo que os alunos ao entrar tinham que formar duas filas divididas por
ele, seguindo em frente pelo longo corredor à esquerda do pátio
interno, com a imagem de Nossa Senhora das Vitórias ao fundo. Ultrapassado
o portão, o silêncio era obrigatório, e controlado
rigidamente pelo Padre Chaves que era o Prefeito Geral, ou seja, o encarregado
da disciplina.
O Padre Chaves não
transigia com os assuntos disciplinares. Era sempre implacável,
e para ele não existia "SEM RECREIO": o castigo mínimo aplicado
por ele era o "RETIDO", ou seja, o infeliz era obrigado a permanecer no
Colégio durante uma hora após o término das aulas.
Só vi a Pe. Chaves
"aliviar" com o Bonde das Onze.
Acontecia o seguinte. O bonde
Jockey Club era o mais freqüentado pelos alunos que vinham daquelas
bandas da Zona Sul. O ponto final era na esquina da Rua dos Oitis com José
Roberto de Macedo Soares, juntinho à Praça do Jockey, atrás
do hoje popularíssimo Bar e Restaurante Hipódromo que, aliás,
já existia no mesmo local e com o mesmo nome, bem ao lado da padaria
do Seu Ernesto.
Os alunos mais preocupados
em não se atrasar pegavam o bonde que saía do ponto às
10h30min, e que devia sua pontualidade ao Motorneiro (motorista do bonde),
pois o Condutor (este era o nome dado ao cobrador dos bondes) cujo apelido
era Camundongo, aproveitava a parada de dez minutos no ponto final para
"calibrar sua máquina", entornando umas duas doses de "purinha"
no balcão do Hipódromo. Sabendo disso, o Motorneiro arrancava
no horário, virava a esquina da praça e, em frente ao bar,
dava uma reduzida para o Camundongo embarcar de olhos vermelhos e com o
quépi desalinhado na cabeça.
Como o Bonde das Dez-e-Meia
chegava no Santo Inácio antes das onze horas, com o portão
ainda fechado, o das Onze era o preferido. Acontece que ele normalmente
chegava em frente ao Colégio em cima da hora, às 11h34 ou
35min, e de dentro do bonde nós podíamos ver o Pe. Chaves
lá no alto, na soleira da porta, já com um dos batentes fechado
e segurando o relógio, como para avisar aos retardatários
que corressem, olhando para a rua, pois sabia que o BONDE DAS ONZE vinha
cheio de alunos.
Ao passar em frente ao Colégio,
o Motorneiro dava uma "meia-trava" para o pessoal saltar e correr antes
que o Pe. Chaves fechasse a porta. Por estes o Pe. Chaves esperava, mas
os que ficassem no bonde até a parada no ponto (ficava após
a igreja, na esquina da Rua Eduardo Guinle), ou os que insistissem em atravessar
calmamente, sem correr, o pátio poeirento, não tinham direito
a qualquer benevolência: a porta era fechada atrás do último
que ele tivesse visto saltar e se esforçar para não se atrasar,
e no nariz do primeiro que achasse que o mundo esperaria por ele.
E para encerrar, aí
vai uma informação para meus colegas do bonde que chega agora,
através do interessante e bem-humorado livro "Dupla Exposição:
Sérgio Stanislau Porto Pontepreta" (testemunho de uma das estudantes
freqüentadoras do bonde, transcrito à pág. 45 do livro):
"A gente ia de bonde, aquele que tinha reboque aberto, de Copacabana até
Botafogo, de olho no pessoal do Colégio Santo Inácio, os
mais cotados".
Espero que os garotões
de hoje mantenham nossa fama, comprovada e registrada preto-no-branco por
testemunha insuspeita.
nov/99
TUDO FOI MUITO BOM E NÃO PODIA TER SIDO MELHOR
Ricardo Hofstetter - "Jesus" (1978)
Não sei se felizmente
ou infelizmente, mas faço parte do grupo de sofredores que estudou
no Santo Inácio desde o primeiro ano primário. Isso quer
dizer que passei por todas as fases do colégio. Se foi bom? Acho
que sim porque lembro com saudades daqueles tempos. Mas podia ter sido
melhor, muito melhor...
No primário estudávamos
no prédio novo, pequeno e verde e nos sentíamos humilhados
por causa disso. O barato na época era ser mais velho e estudar
no prédio grande, velho e cinza, com suas escadas de madeira gastas
por décadas e décadas de pés subindo e descendo. Havia
as peladas no campão, uma ou outra guerra de amêndoas e aquela
professora moreninha da outra turma que era uma delícia de ficar
olhando. Atrás do campão, outro campo, um pouco menor. O
ginásio e as quadras de cimento ainda não existiam. Naquela
época todas as diferenças se resolviam depois da aula na
Mariana (rua Dona Mariana). Que bom se ainda pudéssemos resolver
os nossos problemas numa simples e bucólica porrada na Dona Mariana!
Lembro de uma galera mais
velha que adorava vir do prédio velho pra curtir com a nossa cara.
Um grupo em especial gostava de me sacanear porque eu ficava furioso e
partia pra cima deles dando pontapés e socos. A cada porrada que
levavam, caíam na gargalhada. Nunca entendi esse prazer meio masoquista.
Talvez eu ficasse muito engraçado, baixinho daquele jeito e furioso.
Não sei. O que sei é que um dia acertei um chute no saco
de um deles e o cara caiu no chão chorando de dor. Passado o trauma
inicial, o marmanjo se levantou e saiu correndo atrás de mim com
os olhos injetados de ódio. Minha sorte é que sempre corri
muito e o grandalhão era lento como todos os grandalhões.
Depois desse dia eles nunca mais vieram me provocar. Moral da história?
Às vezes um bom chute no saco pode resolver o problema. Aprendizado
bem jesuíta!
Havia também os títulos
de nobreza. Quem tirava boas médias no ano tinha direito a um título,
com grau hierárquico proporcional à nota tirada. Começava
com o de conde, depois vinha o de duque, príncipe e finalmente o
de imperador. Era uma grande babaquice, mas todo mundo queria ganhar um.
O negócio era pomposo, feito num papel grosso todo decorado e repleto
de letras góticas douradas que teimavam em rodopiar pra lá
e pra cá. Lembro que ganhei muitos, mas o que eu mais cobiçava,
o de imperador, nunca consegui. Podia ter sido melhor, muito melhor...
Fui dos que fizeram admissão.
O pessoal da turma A gostava de nos chamar de otários, afinal fizemos
um curso que deixou de existir no ano seguinte. Mas nos sentíamos
superiores àqueles pirralhos: o ano a mais tinha nos dado uma experiência
de vida que eles nunca teriam. A lembrança mais forte que tenho
do admissão era a gente aprendendo a cantar seu hino: "Admissão,
Santo Inácio! Admissão, admissããããããõ".
Aprendizado extremamente útil e fundamental pra nossa vida futura.
Quando entramos no ginásio
ele também já não existia mais: tinha desaparecido
no meio da mesma reforma que levara o Admissão e o transformara
nas 5.ª, 6.ª, 7.ª e 8.ª séries. Agora estudávamos
à tarde e vieram as obras no pátio, o campo grande de trás
se transformou em quadras de cimento e no ginásio coberto. Ou as
obras aconteceram antes? Não me lembro muito bem. O que lembro com
grande certeza é que no 2.º ano ginasial (6.ª série!)
surgiu a grande novidade: "ano que vem o colégio será misto".
Uma mudança radical.
Até então,
pra ver uma menina precisávamos ir até o Colégio Jacobina.
O bom e velho Jacobina! Era um programa mágico caminhar aqueles
2 ou 3 quarteirões pra ver as meninas saindo. Até hoje guardo
essa imagem na cabeça: as pernas delicadas e deliciosas das meninas,
meio à mostra, meio escondidas por aquelas saias pregueadas, de
uma cor que eu nunca consegui definir. Elas saíam em bandos, bandos
de pernas e saias pregueadas que o vento tornava ainda mais interessantes.
Nunca namorei uma menina do Jacobina, mas os que conseguiam essa façanha
garantiam que não havia na da mais sublime no mundo. Até
hoje sou um frustrado atávico por nunca ter namorado uma menina
do Jacobina. Se tivesse namorado uma menina do Jacobina tudo teria sido
melhor, muito melhor...
Mas agora íamos ter
nossas próprias meninas! Nunca mais precisaríamos andar aqueles
quarteirões pra ver um belo par de pernas. Foi um grande avanço,
muito mais importante do que a TV a cores ou o mimeógrafo, as sensações
tecnológicas da época. Durante um ano inteiro imaginamos
como seriam as nossas meninas. É claro que não admitiríamos
nada abaixo de uma Leila Diniz, uma Betty Faria ou uma Regina Duarte, os
símbolos sexuais da época: as meninas do Jacobina iam morrer
de ciúmes!
No ano seguinte elas entraram.
Não havia nenhuma Leila Diniz, nenhuma Betty Faria ou uma Regina
Duarte, mesmo porque, no dia a dia, nem a Leila Diniz consegue ser a Leila
Diniz. Havia umas bonitinhas, eu lembro, mas em outras turmas. As bonitinhas
nunca estavam na nossa turma, sempre na dos outros! O mundo era muito injusto
naquela época!
Injusto mesmo: lá
fora a ditadura comia solta, matando, seqüestrando, torturando e expulsando
do país quem tivesse um pensamento diferente. Somos uma geração
que se formou sob a ditadura. Será que é por isso que há
tão poucos artistas entre nós? Ditadores não gostam
de artistas. Artista cria muito problema. Temos muitos engenheiros, muitos
advogados, muitos médicos. Mas escritores, atores, músicos,
são muito poucos. Hoje acho o ensino do colégio naquela época
medíocre. Em vez de abrir horizontes praqueles moleques ensebentos
de dúvidas, fechava-se um túnel que tinha na saída
apenas as faculdades de direito, engenharia e medicina. Enfim, era um ensino
bom, mas podia ter sido melhor, muito melhor...
Depois veio o 2.º grau.
O que se pode falar dele? Era divertido, mas
podia ser melhor, muito melhor...
No final do 2.º grau,
o vestibular (naquela época igualzinho ao carnaval: eram só
quatro dias, uma vez por ano). Alguns ficaram felizes, outros mais ou menos,
mas a verdade nua e crua é que, pra gente, o Santo Inácio
tinha acabado. Acabou como muitas outras coisas acabaram e ainda vão
acabar em nossas vidas. Mas que ficou um gostinho de "quero mais", não
tenho dúvida.
Volta e meia tenho um sonho
estranho: sonho que volto a estudar no colégio, não sei exatamente
por que motivo, alguma coisa relacionada à difusa idéia de
fazer tudo de novo, só que agora muito melhor. Aí me vejo
naquelas velhas carteiras pretas e pesadas, no meio da molecada, com a
idade, altura e experiência de vida que tenho hoje. Nunca consegui
definir se é um sonho bom ou um pesadelo. A sensação
quando acordo também é indefinível, uma mistura de
sentimentos bons e ruins indecifrável. Talvez seja apenas um flash
da vida, que afinal de contas não passa disso: uma mistura de coisas
boas com coisas ruins. Ou uma tentativa inútil de fazer com que
o que foi bom fique ainda melhor. Não sei...
O que importa é que
faz vinte anos que nos formamos e eu lembro com carinho e saudades de tudo
aquilo e de todos vocês. Foi bom! Quando abrirmos os olhos novamente
estaremos fazendo trinta anos de formados, quarenta, cinqüenta...
meu Deus!, essa merda não pára nunca?! Não, não
pára e não adianta reclamar. Meu único desejo é
que nas próximas comemorações a sensação
mude e prevaleça a idéia de que tudo foi muito bom e não
podia ter sido melhor.
out/99
PREPARANDO-SE PARA SER JESUÍTA
Paulo Lisbôa SJ (1953)
Como eu era na época
"aloisiano"(interno no Seminário dos Jesuítas que era conhecido
como "Aloisianum"), devia freqüentar as aulas no Colégio Santo
Inácio. Isso para mim foi uma graça particular do bom Deus,
pois pude estar em contato com vários jesuítas famosos na
época, como o P.Leonel Franca, para citar apenas um.
Esses jesuítas famosos
e até os mais simples como alguns Irmãos e Mestres ("Prefeitos"
das séries) que atuavam mais diretamente com os alunos, me deram
a conhecer melhor a Companhia de Jesus, onde eu desejava ingressar e viver.
Lembro-me da disciplina forte
que nos era proposta e que aceitávamos tranqüilamente: as filas
dos alunos em silêncio pelos amplos corredores, os estudões
discretamente olhados pelos "Prefeitos" e os finais de recreios interrompidos
imediatamente a um sinal dado.
Ficou sempre na minha lembrança,
desde que tive que deixar o Colégio em 1950, as Missas dominicais
para os alunos, seja na Igreja (mais freqüentes), seja as campais,
no Pátio Interno. A farda de gala chamava atenção
pela combinação das cores: o branco, o dourado dos botões
e o vermelho do cinto. Eu sentia muito orgulho quando eu me via assim engalanado,
especialmente quando isso acontecia em minha cidade natal, no interior
de São Paulo. Para mim, a farda de gala apresentava o que eu buscava:
acertar com aquilo que Deus queria sobre o meu futuro.
Não deu outra... hoje
sou Jesuíta, com a graça de Deus!
set/99
MARIMBONDOS DE CHAVES...
Carlos Alberto Pires de Castro (1969)
Lembra-me, devia ser 1964
ou 1965, anos idos. Era o segundo ou terceiro ano ginasial do Colégio
Santo Inácio do Rio de Janeiro. Última aula, o bedel da vez
já passava um pano molhado no quadro negro, digo verde escuro, para
as aulas do dia seguinte.
Bem, até hoje não
entendi porque isso era feito, visto que o pano impregnado de pó
de giz, vindo das limpadas anteriores, servia apenas para tornar o quadro
mais e mais uniformemente verde claro. Acho que era, na verdade, uma desculpa.
Supondo ir molhar o pano no banheiro, o bedel espairecia um pouco nos esplêndidos
corredores e jardim interno do Colégio.
O saudoso Professor Nelson
dava sua aula de Geometria. Discorria excitado sobre a construção
dos sólidos geométricos, ponto fundamental da disciplina,
usando-se madeira de caixas de fósforo e a recém lançada
colar polar. Diga-se de passagem, era uma verdadeira aula de marcenaria,
ou madeiraria e colaria. Ele nos informava que, após o desmonte
da caixa de fósforo, a madeira deveria ser lavada e secada numa
prensa, para depois forrar os sólidos já montado em papel,
tudo colado e com o soberbo acabamento da cola polar. Um estouro!!!
A pachorra era geral. Era
um fim de tarde, acho que quase final de ano, pois estava calor. Além
disso, o Professor Nelson estava em ritmo lento, tentando e conseguindo
enfim, que o programa da matéria batesse com o final do ano.
A sala de aula era o estudo.
Ou seja, aquela sala que servia para reunião de todas as turmas
da mesma série, mas que no horário de aula,servia como sala
para uma das turmas. Isso agravava a impressão de infinito, sono.
Tudo começou com um
detalhe pequeno. Uma das cortinas, que ficava presa na janela através
de duas alças, estufada devido ao vento, soltou e começou
a panejar. Ato contínuo, um dos colegas que sentava junto a ela,
levantou-se para prendê-la.
Entrou um marimbondo voando!
Claro, eu não sei
como são os marimbondos hoje em dia no Colégio, mas naquela
época, contavam que, os padres punham redes de vôlei nas janelas
para não serem atacados à noite. Certa vez, disseram-me,
um deles, dos marimbondos não dos Padres, comeu um pombo!
Segundo o Zé, que
limpava a piscina desde que ela foi construída e inaugurada pelo
Padre Van Berger, (quem não sabe, procure se informar quem era)
nadando 100 metros debaixo d'água, a vizinhança começou
a alimentar os marimbondos a Toddy para botar a garotada a correr, tal
a algazarra na hora do recreio.
Pois muito bem, o marimbondo
começou a dar vôos rasantes, como um avião caça,
sobre a cabeça da garotada. Era ele voando para baixo e garotos
voando para todos os lados.
Pânico geral já
instalado, o Professor Nelson procurou se esconder junto à cátedra.
Na dúvida, entraria embaixo dela. Agravava o fato dele, com sua
calvície acentuada, ser apelidado pelos alunos de Aeroporto de Marimbondos.
Poderia finalmente ser reconhecido realmente como tal.
Tumulto instalado, já
completamente fora do controle, sólidos geométricos esparramando-se
pelo chão, Corpo de Bombeiros já chamado, eis que na porta
surge...
- O que é isso!?!?!?
Era ele... aquele ser gélido
e arrepiante... oriundo das profundezas dos corredores frios do local...
que lia interminavelmente aquele breviário, já seboso de
fétido veneno nas bordas, como Em Nome da Rosa... Ele! Padre Chaves!
- O que vocês estão
pensando...?!?!? Está todo mundo retido, ou melhor, suspenso...Expulsos!!!
berto a nossa solicitação,
apesar da referência desastrada sobre o Flamengo...
Como a garotada não
quis nem saber, já todos correndo de um lado para o outro, o Professor
Nelson se apressou.
- Oh, meu caro Padre Chaves
- zing...- estamos sofrendo um ataque - zaangggg... - desse inseto, não
sei bem porque - zung....
Padre Chaves soltou fumaça,
quiçá gás lacrimogêneo, pelas suas narinas abissais.
- Quietos todos! - o marimbondo,
andou para ele.
Padre Chaves se arma de um
Jornal dos Esportes do Professor Nelson, que trazia na capa uma manchete
sobre o Flamengo. Furioso, parte para o malfadado marimbondo. Afinal, matéria
sobre o Flamengo só serve para matar mosquito mesmo...
Mas o Padre, que pulava e
desferia golpes fulminantes, quase um Ninja, não conseguia acertar
o arredio voador. A garotada atônita, estava em delírio!
O Padre sorria, quase ria.
Às vezes parava por alguns segundos, com uma mão no queixo,
parecendo estudar uma melhor estratégia de ataque, mas na verdade
devido às cãibras que, em conseqüência dos risos
contidos, tinha no maxilar.
Finalmente, num golpe magistral
e certeiro, atingiu o dito cujo. Colocou o esperneante (o marimbondo) no
chão. Com uma pisada - creckshiiiii... - esmagou-o!
Ovações gerais!
Professor Nelson surge do interior da cátedra. Padre Chaves sorri,
missão cumprida, vitoriosa... nova cãibra no maxilar.
- Shisssss! Vamos voltar
à aula...
O bedel volta a limpar o
quadro. O Professor Nelson passa a avaliar extasiado os sólidos
que eu fiz com cartolina e pintei com a tinta comprada na Hobbylândia,
que eu usava para os meus modelos Revells (ou Reveis?).
Padre Chaves se afasta, célere,
lendo seu breviário, pelo corredor misterioso. De repente, quando
ele passa, uma aranha fulminada cai do teto....
ago/99
EU "DERRUBEI" O PREFEITO GERAL DO CSI!
Luiz Fernando de Medeiros Maia (1953)
1953.
Estava cursando o 3.°
Clássico.
Ano do cinqüentenário
do CSI!
Como parte das festividades,
os alunos iriam encenar a peça teatral "O Filho Pródigo".
Cabia a Antonio Olinto interpretar o personagem título e a mim,
o irmão "certinho" dele.
Em uma das cenas, após
violenta discussão, tinha eu a missão de sacudir meu irmão
e arremessá-lo em um sofá.
Em um dos ensaios, o Olinto
faltou e, então, o temível Padre Barreto, Prefeito Geral
do CSI, se ofereceu para substituí-lo.
Na cena, ao cumprir o meu
papel, parti para o P.Barreto, segurei os seus ombros, mas faltou coragem...
- era óbvio - para derrubá-llo e parei!
P.Barreto, com a voz firme
de sempre e a costumeira arrogância, virou-se e disse-me, textualmente:
_ Aqui não sou o Prefeito
Geral e sim o filho pródigo. Siga o seu "script".
Não tive dúvidas!
Repetindo a cena, arremessei o P.Barreto no sofá, mas com tanta
força que o sofá quebrou-se e o "nosso" improvisado "filho
pródigo" caiu de costas no chão do palco.
Preocupado, fui pedir desculpas
e eis que o P.Barreto me saiu com esta:
_ A cena foi perfeita! Mas
nos dois dias de apresentação, não exagere tanto porque
o Olinto poderá se machucar, pois as minhas costas estão
doloridas.
Após o ensaio, todos
que trabalhávamos na peça, rimos bastante do fato ocorrido
e hoje - passados 46 anos - talvez possa dizer que fui o único aluno
que, com um empurrão forte, e sem sofrer penalidade alguma, arremessei
ao chão um Prefeito Geral do Colégio Santo Inácio!
jul/99
SAUDADE
Claudio Pires de Moraes (1971)
Gostaria tanto de poder escrever
mais sobre a Fazenda Santa Bárbara, mas o que ficou mesmo foi a
casa de Correas - linda casa, campo de futebol, mais à mão,
compacta - fácil de controlar... A pobre fazenda parece que acabou
ou virou não sei o quê.
Aquele açude... parece
que estou sentindo o gosto da água... A barca Santa Bárbara
e a Santiago, grande de metal... O Santiago Cardona fazia o manejo dos
bambus com os quais se impulsionava a Santiago. Quando tinha regata, a
mais rápida era a Santa Bárbara. Fazíamos as procissões
na água e cantávamos "oi leva eu, minha saudade" e o José
Antonio, falecido, irmão do Tadeu e do Guga, respondia com a voz
grossa "leva eu"...
O José Gomes, voz
de soprano do Coral do Aloisianum, uma vez no morro da caixa d'água,
cortando umas ramas, me acertou o polegar direito com o facão.
O Luíca era muito
bom cavaleiro, tinha jeito em cima do animal. Eu, ele e o Pepe (José
Cardona) éramos os encarregados dos cavalos. Cuidávamos não
só deles, como também dos freios. bridões, selas,
bicheiras... Um dos cavalos era o Guarani, um macho inteiro que depois
mandaram para castração - deixou de ser aquele Guarani. O
Mimoso era um tordilho que dizíamos ser o mais velho de todos, talvez
pela sua pelagem branca.
Tinha um andar duro, tanto
no trote como no galope. Custava deslanchar.
O Seu Ari era o motorista
do caminhão que levava as bagagens e ia nos esperar na estação
de trem, em Paulo de Frontin (Paracambi). Colocavam os bancos do refeitório
no caminhão e íamos bem sentados. Sempre cantávamos.
Uma vez, um toró nos pegou numa volta de Mendes.
Quem cuidava da farmácia
era o Irmão Aleixo e numas férias foi o Padre Guy nos dar
aulas de trabalhos manuais: entre outras coisas, pintávamos cascas
de ovos.
A piscina era de cimento
sem azulejos e se carregava com a água do açude por um cano
de 10 polegadas que usávamos de apoio para os pés, na parte
funda. Parecia que ali a água era mais fria.
Tínhamos, vamos chamar
assim, olimpíadas internas com diversas provas que valiam prêmios
em "dinheiro" que podíamos usar depois no leilão. Cheguei
a ganhar duas provas: uma de corrida da colher e outra de saltos ornamentais,
estilo anjo.
Relembrando os quadrúpedes,
a égua Garbosa era a mais veloz e que andava melhor; o Tinguá,
que para aceitar a montaria tínhamos que levantar a sua cabeça
para que não escoiceasse - cheguei a montar nele sem ajuda, de tanto
que a gente já se conhecia; o Pepe, uma vez, levou um tombo no dia
seguinte da chegada e voltou mais cedo com fratura no antebraço
- direto para cirurgia.
A capela era muito linda
com os sinos que tocavam de manhã para despertar todos nós.
jun/99
UM NOVO DIA DE UM NOVO TEMPO
Malu Fernandes (1982)
A Cidade do Rio de Janeiro
possui uma beleza natural exuberante, em que montanhas convivem harmoniosamente
emoldurando rios, lagos e um magnífico mar que privilegia a beleza
inigualável de nossas praias. Estudos para o Plano Maravilha concluíram
que o turista que ama o sol e tem devoção pela praia possui
a experiência e a recomendação de amigos como os fatores
que mais o influenciam na escolha para onde ir nas férias. É
claro que há também o turismo de congressos, de incentivos
e de circuitos. Mas a cultura popular, o glamour da cidade, a figura do
carioca e a melhoria progressiva da cidade não são suficientes
para combater o trânsito caótico em direção
às praias e a poluição urbana, das águas, lagoas
e praias. Só no Rio de Janeiro um pai brinca na areia com o seu
filho e acabam achando um revólver que estava enterrado. Mata-se
por nada em Ipanema, antigo sinônimo de bossa nova e romantismo.
Se os governantes têm sua parcela de culpa, não podemos nos
eximir das responsabilidades sociais.
Muitos problemas são
crônicos e mais difíceis de solucionar, mas outros são
simples e não custam muito. Nada é impossível. Seria
desnecessário, por falta de sinalização turística
na cidade, um motorista com placa de Ribeirão Preto, que ia no sentido
Niterói, perguntar se estava indo no caminho certo para Copacabana.
Os veranistas não querem ver marcha pela paz em Ipanema. Querem
calma, ar puro, ondas revigorantes e caminhada tranqüila.
Enquanto finalizamos os anos
90 vendo os governos estadual, municipal e federal crescerem como nossos
"sócios", já que deixamos grande parte da nossa renda em
pagamentos de IPTU, IPVA, Imposto de Renda, Darf, etc.., lembro-me dos
meus banhos na Praia da Urca 25 anos atrás. São Conrado era
a minha favorita nos tempos de Colégio Santo Inácio, até
o início da década de 80. Hoje, dá pena ver aquela
língua negra escorrendo do esgoto da Rocinha desembocando ao lado
dos banhistas. Da Praia do Leblon, recordo dos mergulhos na época
da PUC. Quem perguntar aos mais velhos, os verá falar até
da Praia de Ramos, uma das mais limpas nos anos 50.
Onde vamos parar? No dia
30 de janeiro, oito dos 19 pontos de praia divulgados no site da Prefeitura
na Internet estavam impróprios para banho. No dia 28 de janeiro,
este número estava na casa dos nove. Um ou outro, representa aproximadamente
a metade de nossas áreas. Saber que as opções estão
se afogando é uma situação que beira ao desespero.
Nunca vi situação parecida em nenhum dos 14 estados que conheço
no Brasil e nenhum dos 38 países que visitei. Do Leme à Barra
da Tijuca, os turistas enfrentam um oceano de problemas, enquanto nas praias
do Caribe, Ilhas Fidji e Austrália, o visitante não tem lixo
na areia nem barracas clandestinas de ambulantes, muito menos poluição
das águas pelo lançamento de detritos no mar. Se o carioca
está preocupado, imagine a imagem que levará para o exterior
cada turista que estamos investindo pesado para cativá-lo por aqui.
Não adianta o Plano
de Comunicação ser maravilhoso se o produto não ajudar.
Os dois funcionam como queijo e goiabada: um sem o outro não tem
o mesmo sabor. Que tal a gente aproveitar o "gancho" do Rio de Janeiro
ter sido eleito pela empresa de consultoria Arthur Andersen e pela Revista
Fortune como a melhor cidade para negócios? Nós e nossos
dirigentes tomaríamos vergonha na cara e iniciaríamos ainda
hoje uma nova era do marketing da cidade. Ainda há tempo. De acordo
com a Associação Brasileira de Indústrias de Hotéis,
no ano 2001, estima-se que o estado receba 1,8 milhão de turistas
estrangeiros e 5 milhões de turistas nacionais. Se Santos conseguiu,
por que não nós? A cidade do litoral paulista tinha praias
imundas até dez anos atrás. Um programa da prefeitura conseguiu
limpá-las e hoje serve de modelo para os balneários vizinhos.
Em época de crise cambial e dinheiro curto, esta seria, a partir
de hoje, a melhor, mais barata e saudável opção de
lazer na cidade. Como diria a musica, hoje seria um novo dia de um novo
tempo que começou...
mai/99
INSÓLITO
Gustavo Leal de Meireles (1975)
Numa época em que
já começávamos o 2.° grau distribuídos
em turmas de acordo com nossas pretensões no vestibular, não
me causou surpresa encontrar, na sala de "medicina", um colega cujo pai
era um renomado dermatologista, o tio um clínico conceituado e o
bisavô dava nome a um famoso hospital da cidade.
Tímido, a ponto de
ficar vermelho com qualquer assunto, sofrendo de constante rinite alérgica
e muito solitário nos recreios, aquele colega titubeou quando, numa
tentativa minha de conversa, resolveu revelar que na verdade pensava em
prestar concurso para economia, com o quê me espantei:
- Mas... você tem algum
parente economista? Pôxa, com tantos médicos na família...
- Não, não
tenho; mas acho que é o que gosto, mesmo...
- Então... por que
você está nesta turma, de "medicina"?
- Bem, é para o caso
de eu vir a mudar de idéia, até o 3.° ano; além
disso, todo mundo diz que aqui as aulas são mais "puxadas"; também
a maioria dos que conheço estão nesta turma, então...
Daquele dia até o
vestibular, fui um dos muitos que tentaram convencê-lo a fazer medicina.
Tudo em vão. Ele acabou aprovado em 1.° lugar para economia
da PUC-Rio, e depois nunca mais o vi - a não ser agora, pela televisão.
O nome dele é Armínio
Fraga Neto.
abr/99
MEMÓRIA
Martha Silveira Cohen (73)
Entrei para o Colégio
Santo Inácio quando este ficou misto.
Foi muito esquisito olhar
para tantos rapazes, já que eu vinha de um colégio estritamente
feminino - Stella Maris.
Aos poucos, tudo foi ficando
natural e muito agradável; o convívio tanto com os meninos
quanto com os professores era muito legal.
Entrei para o time de voleibol
feminino sob a orientação do "técnico" Marcelo Tompson,
da 3.ª série, muito simpático, que conseguiu formar
um time unido, onde não faltavam amizade, coleguismo e boa vontade.
No final do ano organizaram
um Campeonato Intercolegial, no qual nosso time sagrou-se campeão.
Eu era levantadora e Milita (Emília), a cortadora.
Além do campeonato,
houve a comemoração pela visita da réplica da Taça
Jules Rimet ao CSI, bem como a inauguração do novo ginásio.
Fui então convidada a "trabalhar" no evento como recepcionista.
Lembro ainda que o "Encontro
de Jovens com Cristo" ocorrido em Correas deixou-me profundamente impressionada
e muito feliz.
fev/99
EMOÇÕES
Vera Maria Menezes Ferreira dos Santos (1973)
Paim, estou lhe escrevendo
primeiro para parabenizá-lo pela nossa festa de 25 anos.
Quando entrei na capela,
me senti uma estranha. Não conseguia reconhecer as pessoas. Pouco
a pouco, em meio as carecas e grisalhos, fui identificando e achando que
todos estavam exatamente iguais. Foi uma sensação muito gostosa,
como se por algumas horas eu tivesse voltado a me sentar naquelas salas
de aula.
No fundo, os anos passam,
a vida nos separa, mas não tira de cada um as suas características
mais marcantes. O mais compenetrado e formal, continua formal; o mais gaiato
continua gaiato. E isso foi engraçado de ser constatado. Cheguei
à conclusão que vinte e cinco anos não é tanto
tempo assim.
Por coincidência, Carol,
minha filha, se formou este ano. Sempre sonhei com esta formatura. Lembro
quando a levei para o exame de seleção ao Jardim. Naquela
época, a minha expectativa era grande. Não tinha a certeza
de que o que tinha sido bom para mim seria também para ela. Hoje
sei que assim como aconteceu comigo, o Santo Inácio também
a conquistou. Estou orgulhosa de ter conseguido dar a ela a educação
e formação que sempre sonhei. Acho que no vestibular da vida,
ela pode não passar em primeiro lugar, mas com certeza está
bem preparada. Só posso agradecer a Deus e ao Colégio essa
filha maravilhosa que eu tenho.
Fiquei emocionada quando
você entregou a ela a camiseta do antigo-aluno e não fosse
o tumulto daquele dia, teria ido pessoalmente a você, agradecer tudo
o que você fez por mim e que ajudou a Carol a continuar no Colégio.
Enfim, Paim, vou ser eternamente grata. |