RECÉM-SAÍDO DO MBA



Prof. Roberto Minadeo


Francisco Almeida Gonçalves estava pensando nas alternativas que se lhe apresentavam: terminara o MBA e a experiência fora satisfatória. Tinha aprendido muito sobre a arte de dirigir uma empresa. Para Francisco tinham sido significativas as idéias sobre gestão de pessoas, pois neste campo as suas dificuldades e limitações eram evidentes. Logo antes do curso, Francisco percebera duas coisas.

Primeiro, que já não se sentia mais motivado pelo trabalho em uma área técnica. Ingressara em uma importante fábrica de cimento, após concluir a Engenharia Civil, tendo tido antes um estágio em uma concessionária estatal de eletricidade. O trabalho em uma estatal não agradara a Francisco. Queria ver o resultado final de seus esforços, e um trabalho na indústria poderia trazer resultados visíveis.

O que atraiu Francisco à fábrica foi a possibilidade de crescimento na empresa – uma grande multinacional. A oportunidade de trabalhar em diversas áreas, de viajar, de aprender e dominar várias línguas tinha sido decisiva ao escolher um trabalho depois da formatura. A opção tinha sido boa: o grupo cresceu, e seu nível de no Brasil chegou perto do meio bilhão de dólares. Francisco tinha trabalhado bastante; tinha aprendido muito; tinha conhecido todos os estágios da fabricação, operado em vários departamentos das diversas fábricas. Agora estava a meio da casa dos trinta – com doze anos nessa empresa. Necessitava de desafios. No entanto, os problemas técnicos já tinham deixado de ser atrativos para ele.

Levara mais tempo para perceber algo pior: muita gente já lhe tinha dito que não era bom dirigente. Ora, Francisco sempre pensara que era um bom chefe: afinal, tinha passado por diversas áreas na empresa, e por várias fábricas, trabalhado com diversos chefes, e ganho diversas promoções. Contudo, as pessoas continuavam a dizer-lhe que não era bom chefe e que era apenas um bom engenheiro que via tudo quadrado e que confiava apenas no que poderia se tornar concreto algum dia – brincavam com ele, afinal, trabalhava em uma fábrica de cimento. Tinha começado a achar que tinham razão. Vários comentários do seu chefe e dos seus colegas prepararam o caminho, mas foi uma explosão emocional de um dos seus subordinados que lhe fez ver a realidade das suas limitações. De repente viu que não sabia nada de gestão de gente. Francisco começou a ler sobre o tema e depois resolveu inscrever-se em um MBA. Surpreendentemente, seus chefes o apoiaram, e terminaram fazendo a empresa pagar o curso.

A indústria de cimento significava um negócio de produção, rentável e baseado em tecnologia dominada. A maior parte do pessoal de lá eram profissionais não universitários, na casa dos 35-50 anos, que tinham crescido com o negócio.

Algumas coisas fizeram-no ver que não sabia nada do que é uma empresa. Pensava que se preocupava com as pessoas que trabalhavam com ele, mas não se interessava pelas suas metas. Contratava engenheiros e se servia deles como técnicos. A maior parte do que escreviam, era refeito, sem se preocupar com os seus sentimentos. Não os ajudava a reformular as coisas: simplesmente as reescrevia. Era uma pessoa dominadora, não deixando espaço aos que o cercavam. Se havia dificuldades com alguém, cortava-o. Usava o ditado: “defunto pobre não merece vela”. Infelizmente, não podia fazer isto com o seu chefe. Ficava aflito durante dias quando tinha que entrar em contato com ele.

Por fim ganhou mais responsabilidades e reparou que, por muito impulsivo que fosse, não podia fazer tudo. Teve que dividir com a equipe parte da responsabilidade, e viu que isso não era nada fácil. Começou a ler e reparou que precisava se formar para dirigir um negócio, porque o aspecto técnico já não poderia ajudá-lo.

Seu pai fora funcionário público federal, desde os anos 60. Francisco era o mais velho de três irmãos, nascidos nessa década. A família era carioca da gema, primeiro na Tijuca, e depois se mudara para a Barra. O pai se aposentara no final dos anos 80, e passara a cuidar dos netos e de uma casa em Saquarema, e passando a viajar mais tempo com a esposa.

Cursou o MBA enquanto trabalhava na sede da empresa, no centro do Rio. Pediu um ano de calma nas viagens, para poder fazer o curso. Agora, a empresa queria rever esse investimento, e o designou para cuidar de três fábricas – uma no sul da Bahia, outra em Santa Catarina e a terceira no Nordeste. Sua rotina passaria a ser de avião para aeroporto, e depois para supervisionar operações industriais em fábricas. Ele estava totalmente desinteressado na proposta, e não sabia se devia procurar head-hunters para procurar algo melhor para ele, algo com mais contato humano desta vez, e com menos concreto...

Estaria fugindo? Ou seja, será que no fundo, no fundo, tinha medo de fracassar no tema do relacionamento? Apenas se aquietava desta perplexidade – ou se justificava – ao sugerir que haviam sido muitos anos na mesma empresa, mais de uma década, e as pessoas já o conheciam, já sabiam de seu potencial...



QUESTÕES

1) Francisco deve contratar um head-hunter?

2) É anti-ético sair da empresa que pagou seu MBA, logo após terminá-lo?

3) Os riscos de sair dessa empresa não seriam altos demais – afinal, havia financiado seus estudos, e havia uma possível carreira para ele?