Patrícia Moitinho
Pedro Silva
ISEG - Instituto Superior de Economia e Gestão
INTRODUÇÃO
Apesar de ser um tema bastante actual hoje em dia os processos de fusões e aquisições (F&A) tiveram ao longo do tempo avanços e recuos, aos quais a literatura económica chamou de grandes movimentos históricos. No presente trabalho não pretendemos analisar este facto, mas sim compreender quais os motivos que levam as empresas (ou sociedades) a fundirem-se ou a adquirirem outras.
Pretendemos sim apresentar algumas teorias para as F&A, ou seja, os principais motivos porque se recorre às fusões e aquisições em detrimento de outras formas de actuação.
Assim optámos por dividir a nossa exposição em quatro grandes grupos de teorias explicativas de fusões e aquisições. As chamadas teorias de eficiência, o «Hubris», os problemas da agência e a redistribuição de valor, são aquelas que nos pareceram serem mais consensuais e abrangentes, sendo esta divisão tão válida como outra qualquer.
Dentro destes quatro grandes grupos, existem diversas teorias que pretendem ligar os objectivos das empresas e dos empresários à criação de valor perspectivada nos projectos de fusão ou nas propostas de aquisição.
É de apontar que ao considerarmos os motivos para as F&A fazemos uma análise ceteris paribus , ou seja, consideramos o efeito isolado, pois na realidade ocorrem uma multiplicidade de situações em que se torna difícil discriminar qual o motivo inicial e qual a reação desejada.
Teorias sobre o aumento do valor total
A estas teorias optámos por chamar teorias sobre o aumento do valor total dado que existe sempre criação de valor quando ocorre uma fusão e aquisição, o que nem sempre sucede como veremos adiante.
1.1 Teorias de eficiência
Estas teorias tentam explicar as fusões e as aquisições com base na parte operativa das sociedades e como estas podem trazer benefícios sociais através de um reaproveitamento de potencialidades até aí descuradas por uma ou pelas sociedades intervenientes.
1.1.1 A teoria da diferença de eficiência na gestão
A principal teoria é a chamada teoria da diferença de eficiência na gestão, segundo esta teoria se uma empresa for mais eficiente ao nível de gestão que outra, então tem condições, se assim o pretender, para fundir-se ou para adquirir a outra sociedade. A teoria defende que desta forma a eficiência da sociedade adquirida iria aumentar pelo facto de ser gerida por uma administração mais eficiente. Teríamos desta maneira a sociedade alvo a operar a um nível de eficiência perto ou igual ao nível de eficiência da sociedade incorporante (adquirente).
Existem algumas reservas que se colocam ao funcionamento desta teoria. Primeiro, se pensarmos em termos negativos, a sociedade mais eficiente na gestão pode não conseguir elevar o nível de gestão da sociedade alvo. Neste caso, pode até diminuir a sua eficiência na gestão produzindo custos em vez de benefícios para a sociedade. Mas, como o nosso estudo incide sobre os motivos que levam as empresas a fundirem-se ou adquirirem outras, não interessa no presente texto aprofundar esses estudos.
Em segundo lugar, uma das maiores insuficiências desta teoria, deve-se à possibilidade teórica de, no extremo, ficar apenas uma sociedade a operar no mercado. Se pensarmos em N sociedades no mercado, e a sociedade X for mais eficiente que as N-1 sociedades do mercado pode atingir uma situação de monopólio desde que seja sempre mais eficiente na gestão que as restantes empresas existentes. Se bem que, em termos práticos, tal situação dificilmente aconteceria devido aos problemas de coordenação, em termos teóricos revela-se uma incoerência pois se a teoria pretende melhorar a eficiência no mercado e com isso aumentar os benefícios sociais quando atingida uma situação de monopólio iríamos ter custos em vez de benefícios sociais.
Em terceiro lugar, esta teoria pressupõe que as fusões e aquisições sejam realizadas no mesmo sector de actividade. Pelo exposto anteriormente torna-se fácil a compreensão deste aspecto, pois só é possível detectar se uma sociedade não produz de uma forma eficiente se a sociedade incorporante e adquirente conhecer bem o mercado. Por outro lado só é possível falar na possibilidade de um monopólio se estivermos a pensar no mesmo sector de actividade.
Existem autores que consideram a teoria da diferença de eficiência na gestão como hipóteses de sinergia de gestão. Isto sucede quando uma empresa dispõe de uma equipa de gestão mais eficiente que a de outra empresa a operar no mesmo mercado, mas neste particular as capacidades deste grupo estão a ser subavaliadas devido ao excesso de recursos de qualidade que a empresa dispõe. Então, é possível obter sinergias de gestão se estes recursos forem empregues onde existir déficit deles, ou seja, em empresas com um nível de eficiência na gestão mais baixo.
Esta teoria também não está isenta de críticas, já que está sujeita às indivisibilidades que as economias de escala apresentam. Assim a dissolução de grupos de trabalho podem resultar em perdas de eficiência e em desperdício de recursos humanos porque existem grupos que valem pelo seu conjunto e não pelas individualidades.
Apesar de na prática apresentar algumas deficiências este é um dos motivos mais invocados para a ocorrência de fusões e aquisições.
1.1.2 A Teoria da Ineficiência de Gestão
A teoria da ineficiência de gestão é semelhante à anterior, difere no ponto em que a gestão segundo esta teoria não chega até às potencialidades que pode chegar. Então é possível existir um grupo que gere melhor do que a actual administração. Por outro lado se quase ninguém consegue fazer melhor do que a actual gestão da empresa alvo, temos possibilidades de realizar uma fusão do tipo conglomeral, pois uma sociedade bem administrada torna-se apetecível para um grupo económico que aposte numa atuação em diferentes áreas de negócio.
Contrariamente à teoria anterior que servia de base para a realização de fusões horizontais, a teoria da ineficiência de gestão ajuda a explicar porque é que ao longo da história das fusões e aquisições as sociedades optaram por diversificar os seus negócios.
Esta teoria pressupõe algumas hipóteses para se verificar:
1º Os accionistas têm dificuldade em substituir os gestores, não por ser demasiado custoso ou por incapacidades destes, mas porque os gestores são um recurso escasso (se os gestores fornecerem a escassez de capacidade de gestão que as sociedades necessitam então a teoria é igual à da diferença de eficiência na gestão).
2º Se o principal motivo das fusões é a substituição dos gestores então não era mais eficiente manter a sociedade como subsidiária. A resposta é não porque os motivos que levam à fusão são vários e nunca um problema isolado.
3º Sempre que houver uma fusão o gestor da empresa alvo é substituído.
Apesar de conseguir explicar algumas das razões responsáveis por fusões ou aquisições a teoria ao contrário da anterior por si só não consegue explicar as fusões e aquisições de empresas.
1.2 Sinergias
A sinergia traduz-se na capacidade que uma combinação de empresas tem em ser mais lucrativa que a soma dos lucros das empresas consideradas individualmente , é o chamado efeito "2 + 2 = 5". Assim, no âmbito das teorias das fusões e aquisições, é benéfico realizar uma aquisição quando o efeito da sinergia é superior aos custos da aquisição que são compostos pelo prémio pago pela empresa-alvo e os custos de transacção, ou seja:
1.2.1. Sinergia Operativa
Esta traduz-se, essencialmente, em ganhos de eficiência ou economias que resultam de integrações horizontais, verticais ou mesmo conglomerados. Estas permitem a redução de custos através das economias de escala, economias de variedade ou diminuição de incerteza.
Para certas indústrias existem problemas de indivisibilidades ou de necessidade de grandes investimentos para se atingir uma dimensão mínima, assim através das aquisições torna-se possível realizar economias de escala. Estas normalmente ocorrem devido à especialização do trabalho e da gestão, ao uso mais eficiente do equipamento de capital, às despesas de marketing e de investigação e desenvolvimento (I&D). Mas há que ter em atenção o problema das deseconomias de escala, como saber qual a dimensão óptima?
As economias de variedade podem resultar da partilha da mesma linha de montagem, do uso do mesmo capital técnico para produzir outros produtos.
Um outro tipo de aquisições, que tem por base a obtenção de sinergias deste tipo, está ligado aos custos de comunicação e contratação. Estes poderão ser reduzidos com a integração das empresas permitindo uma maior eficiência e coordenação a vários níveis.
No entanto surge um possível problema que consiste em saber como combinar e coordenar os diversos elementos das empresas fundidas por forma a obter os resultados previstas da sinergia.
1.2.2. Sinergia Financeira
Esta resulta da possibilidade de reduzir o custo de capital pela combinação de empresas.
A redução do custo de capital pode resultar do facto da fusão proporcionar uma redução da flutuação dos fluxos de caixa pela combinação das empresas, diminuindo o risco de falência e insolvência tornando assim o custo de endividamento externo mais barato.
As sinergias financeiras também permitem reduzir o custo do endividamento interno. Isto deve-se às economias de escala financeiras que beneficiam da redução dos custos de transacção e da flutuação da cotação dos títulos (devido ao menor risco), que por sua vez diminuem a taxa de juro das obrigações emitidas, tal como reforçam o aspecto referido de diminuir o custo dos empréstimos.
1.3.Diversificação
Pode-se comparar esta estratégia ou teoria para as fusões e aquisições com a teoria da diversificação das carteiras de activos detidas por parte dos investidores.
Os investidores diversificam as sua carteiras para obter o maior rendimento possível ao menor risco, assim como os gestores tentam diversificar a actividade da empresa de forma a aumentar o rendimento e/ou diminuir o risco.
Assim, quando uma empresa decide expandir-se pode optar pela aquisição de uma empresa (ou várias) ou pela expansão interna. No entanto a empresa pode ter esgotado a capacidade interna para realizar essa função internamente, ou ainda, o momento ideal para concretizar o projecto é o futuro próximo e a única forma de assumir essa posição nesse espaço de tempo é comprar uma empresa que já opera no sector em que se pretende investir. Em qualquer destes casos a opção resume-se às fusões e aquisições.
Poderá também diversificar com o intuito de entrar em indústrias mais lucrativas do que a sua área de negócio. A questão relevante é que nada garante que esses lucros de que hoje a indústria beneficia se mantenham após a aquisição, e, por outro lado, discute-se até que ponto será esta uma estratégia válida no longo prazo, dado que segundo a teoria económica só em indústrias que existam condições anormais como barreiras à entrada é que é possível a obtenção de rendas económicas (ou seja, é possível manter o preço acima dos custos marginais) e se esse não for o caso da indústria alvo então os lucros irão desaparecer. No entanto, a realidade tem mostrado que o longo prazo é algo que se pode adiar, por exemplo, pelas inovações técnicas em que se altera o formato do produto fornecido que vai permitir criar poder de mercado (assunto que vai ser discutido num ponto mais à frente).
O objectivo da diversificação também pode residir na realização de benefícios financeiros. Um exemplo típico deste tipo de benefícios é a aquisição, por parte de uma empresa cujos rendimentos tenham uma natureza cíclica, a uma outra, em que os rendimento seguem uma tendência contra-cíclica, e vice-versa; através das aquisições e fusões é possível diminuir a volatilidade do fluxo dos rendimentos dando origem a um efeito de co-segurança (coinsurance effect) que resulta da correlação imperfeita dos rendimentos das empresas envolvidas no processo.
Também aqui é possível aumentar a capacidade de endividamento devido à diminuição do risco verificada.
Entre os dois autores estudados em relação às teorias das fusões e aquisições existe uma aparente divergência de opiniões em relação à validade do motivo de diversificação para as teorias de F&A.
Gaughan indica que a diversificação não deve ser apontado como motivo já que o resultado que se pretende obter com esta estratégia não é nada que os accionistas não fizessem melhor sozinhos, ou seja, por forma a reduzir o risco os accionistas já diversificam a sua carteira de activos pelos vários existentes no mercado. Por outro lado acrescenta que uma empresa ao entrar noutra área de negócio que não a sua está a pressupor que a gestão que mantém pode-se alargar à nova área de negócio e isso pode não ocorrer.
Weston já considera a diversificação como importante nas teorias das F&A, pois os trabalhadores de uma empresa não têm capacidade de diversificar as suas fontes de rendimento salarial e por outro lado o seu trabalho é muito mais valorizado por uma empresa específica que é aquela à qual estão vinculados. Assim a empresa ao diversificar a sua actividade diminuindo o risco de falência, aumentando as possibilidades de lucro entre outras, permite estabilidade ao trabalhador, maiores oportunidades de especialização e de promoção por parte do mesmo.
Explica-se então porque é que a divergência de opiniões é aparente: Gaughan analisa a questão tendo em conta a visão dos accionistas, enquanto que Weston tem em conta outros detentores de interesses da empresa que são os trabalhadores.
Mas porque é que uma empresa recorre às fusões e aquisições para se diversificar e não aposta no crescimento interno? Poderiam-se apontar várias razões que permitissem explicar este facto mas as mais relevantes são de facto a indisponibilidade de recursos por parte da empresa adquirente para o fazer, a falta de capacidade interna de gestão, técnica, de recursos financeiros e ainda outra quanto a nós talvez a mais imediata que é a questão do timing. Nos tempos que correm entrar na indústria certa na altura certa torna-se crucial para o sucesso de uma empresa; assim torna-se mais fácil diversificar comprando uma empresa que já exista no sector para o qual se pretende entrar do que optar pela criação de uma empresa nova.
1.4.Integração Vertical
Este é um outro motivo económico para as F&A e que consiste na aquisição de empresas a montante ou a jusante do processo produtivo em que se situa a empresa adquirente.
As razões que levam as empresas a proceder desta forma normalmente são assegurar uma fonte segura de fornecimentos, não só em termos de necessidade de fornecimentos regulares, como é o caso de quem utiliza inventários do tipo "just-in-time", como também em termos de qualidade. No entanto a integração de uma empresa com a qual realizamos compras e vendas levanta um problema que consiste na determinação do preço interno de transferência do fornecedor para o comprador de forma a que não exista a ilusão do valor criado pela fusão para qualquer das empresas. Se se escolher um preço de transferência, do comprador para o vendedor, menor que o valor justo reduz-se os custos da empresa que compra tornando esta mais lucrativa de forma artificial, enquanto que a empresa que fornece vê os lucros reduzirem-se e aparenta ter reduzido a sua performance após a aquisição.
A integração vertical também permite diminuir os custos de transacção pois uma empresa ao adquirir um fornecedor, por exemplo, evita a incerteza do fornecedor parar de lhe fornecer os bens e/ou serviços pretendidos e sujeitar-se a negociar outro contracto com outros fornecedores que podem exigir outras condições de fornecimento menos favoráveis.
Uma outra razão que se aponta deriva da anterior e acontece quando a empresa necessita de inputs especializados para a realização da sua actividade normal. Também aqui poderá ser-lhe favorável adquirir o fornecedor de forma a assegurar o fornecimento e não ficar à mercê do seu fornecedor.
Também o reforço da posição competitiva face a um consumidor pode ser apontada como um motivo para as F&A, isto porque, por exemplo, num caso em que os produtores incorram em elevados custos de reconversão do sistema de produção, e caso um fornecedor esteja interessado nessa reconversão, poderá então adquirir essa empresa e forçar a reconversão de forma a introduzir as mudanças desejadas e podendo até introduzir no mercado uma nova linha de produtos. Esta situação pode-se compreender melhor com o exemplo dos fabricantes de alumínio que pretendiam que os responsáveis pelo vasilhame das bebidas passassem da produção de garrafas de vidro para as latas de alumínio. Como é lógico essa reconversão envolvia elevados custos, pelo que não estavam dispostos a realizar essa alteração, então os fabricantes de alumínio compraram os responsáveis pela embalagem das bebidas e procederam à alteração.
1.5.Integração Horizontal
Esta consiste na aquisição de empresas que actuem na mesma área de negócio da empresa adquirente e proporciona uma aumento da quota de mercado.
A integração horizontal torna-se motivo de Fusões e Aquisições quando uma empresa tem como objectivo criar poder de mercado, assunto este que também se encontra ligado à redistribuição e se encontra desenvolvido nesse capítulo.
A expansão geográfica também poderá justificar a integração entre empresas do mesmo ramo de actividade pois, por forma a entrar em mercados em locais geograficamente diferentes daquele em que actua, a empresa poderá adquirir uma outra que actue numa região diferente. A empresa procede desta maneira quando o mercado em que opera está saturado ou a concorrência que enfrenta é muito forte, entre outras razões.
1.6. Realinhamento Estratégico às Mudanças Ambientais
Como se depreende do título a estratégia consiste na aquisição de novas técnicas de gestão para ajustar-se a novas áreas de negócios ou áreas em crescimento e adaptar-se às mudanças competitivas dos mercados. Também aqui as fusões e aquisições ajudam a ultrapassar problemas com o funcionamento interno das empresas, apresentando inovações nas estratégias a seguir, e gerando novas oportunidades de criação de valor. Mais uma vez aqui a lógica do crescimento externo contrapõe-se à do crescimento interno sendo mais fácil mais uma vez suprir essas carências a partir do exterior através de técnicas comprovadas e de sucesso. Permite assim um ajustamento mais rápido às necessidades da empresa.
1.7.Subvalorização / Subavaliação
Quando o mercado não reflecte o verdadeiro valor de uma empresa diz-se que esta está subvalorizada. Isto pode ocorrer quando existe alguém que detém informação que o mercado não dispõe, informação essa que o leva a valorizar a empresa mais que o mercado. Alguns autores consideram também aqui o caso em que a gestão não actua no seu máximo potencial mas aqui já estamos a falar de gestão ineficiente assunto tratado na primeira parte do presente texto.
Uma outra situação que se insere nesta teoria é quando o valor de mercado dos activos difere do seu custo de reposição. Esta diferença pode ser analisada pelo rácio de Tobin que consiste no rácio entre o valor de mercado da empresa e o custo total de repor os activos da empresa. Se o rácio for inferior à unidade, ou seja, se os custos de repor os activos da empresa forem superiores ao seu respectivo valor de mercado, então torna-se vantajoso para a empresa que possui este rácio adquirir outra empresa, como forma de aumentar os activos, do que comprar esses activos directamente no mercado. Um exemplo é quando existe uma inflação alta que torna o custo dos activos também maior e por outro lado também leva a baixos valores das cotações das acções no mercado.
1.8. Teoria da Informação e Sinalização
Esta teoria tenta explicar porque é que as acções de uma sociedade cotada reagem positivamente a uma oferta pública de aquisição (OPA) quer esta venha a ter sucesso ou não.
O anúncio de uma OPA resulta em nova informação que está a ser gerada. Existe com o lançamento de uma OPA um cuidado redobrado por parte do mercado na avaliação do título e dá-se uma reavaliação permanente da sociedade.
A oferta de aquisição transmite informação ao mercado a dois níveis. Primeiro, as acções da sociedade alvo estão subavaliadas e a oferta permite ao mercado reavaliá-las. Desta forma cria-se valor para os accionistas. Segundo, a oferta obriga a gestão da sociedade a actuar de uma forma mais eficiente, aliada a isso basta pensar na teoria da ineficiência de gestão que combinada com esta, leva a que a fusão seja encarada com pessimismo por parte dos gestores das empresas alvo.
Outra forma de descrevermos esta teoria é representá-la como o valor esperado da empresa alvo, pelo comprador, por forma a realizar uma combinação com a sociedade incorporante que lhe permita obter sinergias.
Ainda dentro desta teoria podemos considerar a sinalização, numa primeira fase desenvolvida para os mercados de trabalho, onde os níveis de educação dos trabalhadores de uma sociedade são uma forma de sinalizar maiores capacidades e maior preparação no trabalho. O mercado observa e tende a reflectir esses sinais emanados das sociedades através de uma maior valorização.
Quando uma sociedade é alvo de uma OPA o mercado é informado que existe um potencial comprador que valoriza mais a sociedade que o mercado. Existe normalmente associado a isto um prémio de aquisição.
Para além desta forma de sinalização existem outras, tal como as formas de pagamento propostas na OPA e os próprios objectivos propostos aos acionistas da empresa alvo.
HUBRIS
Esta teoria tem em conta o elemento humano no processo de fusões e aquisições. Ao contrário das teorias anteriores que pressupunham um aumento de valor, esta teoria admite que existem possíveis ganhos de valor pela empresa adquirida mas também perdas de valor pela empresa adquirente sendo o efeito sobre o valor total nulo.
A teoria do Hubris foi proposta por Richard Roll e esta tenta explicar porque é que os gestores cometem erros de avaliação das empresa alvo por excesso de optimismo e orgulho e assim não são os motivos económicos os principais factores que levam a certas aquisições, mas sim os motivos pessoais dos gestores.
Esta teoria vem permitir explicar porque é que alguns gestores pagam um prémio por uma empresa alvo quando esta está correctamente avaliada pelo mercado (note-se que esta teoria assume a hipótese de mercados eficientes na forma forte, isto é, toda a informação disponível e relevante, quer pública quer privada, é totalmente conhecida pelo mercado, senão caímos na situação de subavaliação descrita no ponto 1.7. em que o gestor detém informação relevante que o mercado desconhece).
Segundo Roll, se esta hipótese explicar a aquisição ocorrem três coisas após a mesma:
O preço das acções da empresa adquirente diminui.
O preço das acções da empresa adquirida aumenta.
O efeito combinado das premissas tem que ser negativo (tendo em conta os custos de aquisição).
Também se aponta o Hubris como um dos factores para o fenómeno que chamamos a "maldição do vencedor" (winners curse) que consiste numa situação em que existe uma espécie de leilão em existem muitos compradores para um objecto de valor incerto. Assim quanto mais ofertas, maior será o preço desse bem. Quando por fim o bem for adquirido o seu preço geralmente excede o valor real do bem e assim o adquirente tem um prejuízo, daí o nome de maldição do vencedor.
Problemas da Agência
Designamos por problemas da agência um conjunto de teorias ligadas à vida interna da sociedade, em especial à relação nem sempre pacífica entre accionistas e gestores. Estes problemas colocam-se sobretudo quando a gestão da sociedade não coincide com a propriedade. Colocam-se problemas ao nível dos objectivos pretendidos quer pelos gestores quer pelos accionistas quando estes não coincidem ou quando são antagónicos.
3.1. Teoria do Principal e do Agente
É normalmente esta a teoria mais generalizada; considera-se os accionistas como o principal e os gestores como o agente. Existe um problema de risco moral para o principal quando o agente actua em proveito próprio maximizando os seus objectivos.
O facto de existirem contratos que normalmente envolvem custos elevados, resultam em custos de bem-estar para o principal.
Neste caso o principal é obrigado a incorrer em custos adicionais para superar este problema, quer monitorizando a actividade da gestão quer criando incentivos de produtividade ou de performance de modo a diminuir esse mesmo risco.
Importa considerar o papel que podem as fusões e as aquisições realizar por forma a evitar subaproveitamento das capacidades empresariais e a destruição de valor verificadas com o conflito de interesses entre o principal e o agente. Como já foi referido anteriormente as fusões e as aquisições colocam pressão sobre a gestão da sociedade estando estes ameaçados por uma possível substituição. Por outro lado a nova sociedade pode introduzir essas formas eficientes de controlar o comportamento dos gestores por exemplo através de uma política de salários baseados na reputação destes.
3.2. Problema da gerência
Ainda dentro da abordagem dos problemas da agência podemos encontrar um outro motivo explicativo das fusões e aquisições o problema da gerência. Neste caso ao contrário do problema do principal e do agente que vê na fusão ou aquisição duas formas de solução do problema, aqui as fusões e aquisições são manifestações dos problemas das sociedades.
Segundo esta teoria os gestores agem em benefício próprio por forma a aumentar a sua compensação, criando problemas nas sociedades e destruindo valor.
3.3. Fluxos de caixa
A teoria dos fluxos de caixa livres insere-se também nesta relação antagónica entre gestores e accionistas. Desta forma o nível de fluxos de caixa a serem distribuídos aos accionistas é o principal ponto de discórdia entre ambas as partes. Quanto mais fluxos de caixa são distribuídos menores recursos existem ao serviço do gestor. Assim o gestor tendo menor liquidez é obrigado a realizar investimentos estritamente necessários.
A facto desta teoria defender um maior endividamento das empresas deve-se ao facto de garantir um controlo da gestão por parte das entidades financiadoras obrigando os gestores a não "desperdiçar dinheiro".
Redistribuição
Este conjunto de teorias tem subjacente a ideia que nas F&A existem detentores de interesses que se apropriam do valor detido por outros detentores de interesses. Estas não pressupõem um aumento de valor, o mais comum é manterem o valor passando esse a ser reafectado entre os diversos grupos de interesse na sociedade. Esta situação contrapõe-se a uma situação de uma melhoria Paretiana já que não é possível melhorar o bem-estar de um conjunto de agentes sem piorar o bem-estar de outros.
4.1.Redistribuição de valor
As últimas teorias ou motivos que explicam as fusões e aquisições prendem-se com a questão da redistribuição de valor que estas permitem. Este motivo levanta algumas questões sobre se o valor realmente aumenta por essa redistribuição.
Nesta teoria os ganhos em valor para a sociedade e, claro, para os seus accionistas são feitos à custa dos detentores de interesses. Podemos considerar como detentores de interesses de entidades como o estado, os trabalhadores e as respectivas ordens profissionais e os obrigacionistas.
Os efeitos sobre os impostos que uma fusão ou aquisição gera pode representar uma redistribuição do governo ou do cobrador de impostos (Autarquias, por exemplo) para a sociedade. Essa redistribuição, pode ser vista através de uma diminuição de impostos se pensarmos que é possível deduzir prejuízos das sociedades fundidas nos lucro tributáveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante. No caso de uma aquisição acontece através da manipulação dos preços internos de transferência entre a sociedade adquirente e a adquirida, possibilitando aumentar ou diminuir lucros destas.
Existem ainda outros aspectos que permitem justificar o facto pelo qual existe redistribuição de valor do Estado para as sociedades. Convêm referir que nem todos são aceites pela legislação portuguesa sendo interessante do ponto de vista teórico pensar neles. Quando uma fusão possibilita à sociedade incorporante aumentar a base tributável dos activos da sociedade adquirida para o justo valor de mercado, e a partir desta realiza amortizações mais elevadas, torna-se possível libertar mais fluxos de caixa e criar valor. Outra situação sucede quando é possível transferir crédito de imposto para investimentos para exercícios futuros.
O efeito sobre os impostos que as fusões e aquisições têm, apesar de ser importante, não é causa isolada que motive as fusões devido à necessidade de provar, perante o tecido económico, o interesse e os objectivos da fusão.
Alguns autores, consideram também importante a redistribuição de valor dos trabalhadores para os accionistas.
Se observarmos com especial atenção os últimos processos de fusão internacionais, reparamos que um dos principais focos de interesse no projecto abrange os custos laborais eventualmente a ser tomados. Muitas vezes estes são compreensíveis devido à complementaridade entre ambas as sociedades e à possibilidade de obter economias de escala.
Outra das considerações a tomar é quanto à política salarial, no caso da sociedade incorporante quebrar os contratos com os trabalhadores da sociedade adquirida, esta está sujeita a perder a confiança destes e a sofrer aumentos dos seus custos de produção devido a maiores exigências salariais futuras.
No caso do sector não estar fortemente influenciado por sindicatos e os trabalhadores enfrentarem grande concorrência no mercado de trabalho devido às qualificações deficientes, a medida anteriormente preconizada torna-se positiva. É positiva pois cria maior competitividade no mercado através da redução de preços.
Em suma, a redistribuição dos trabalhadores para os accionistas pode revelar-se benéfica quando o poder sindical é demasiado forte e existem rendas monopolísticas para os trabalhadores. Essas rendas, desta forma, diminuem e esse valor perdido pelos trabalhadores é apropriado pelos accionistas. Por outro lado, se existir uma gestão ineficiente, esta redistribuição torna-se prejudicial devido estarmos a realizar uma reafectação ineficiente de um sector criador de valor para um setor perdedor de valor. A solução passa por introduzir maior eficiência na gestão (já falado em outras teorias anteriormente).
Outro tipo de redistribuição ocorre quando os accionistas, num processo de fusão, se apropriam de valor enquanto os obrigacionistas são impedidos de o fazer. Isto acontece quando os accionistas da sociedade adquirida são recompensados pelas partes de capital que detêm enquanto que os obrigacionistas da sociedade incorporante passam também a ser responsáveis pelos passivos da sociedade fundida, estão neste caso sujeitos a maior risco.
Apesar destes motivos serem relevantes, normalmente eles complementam, num processo de fusão, outros motivos mais fortes normalmente ligados a problemas estruturais e a indefinições estratégicas.
4.2. Poder de Mercado
Embora faça parte da teoria da integração horizontal enquadrámos esta teoria na redistribuição, pois o aumento do poder de mercado pode ser visto como uma redistribuição entre consumidores e fornecedores. O poder de mercado traduz-se na capacidade de estabelecer e manter o preço acima do nível concorrencial, ou seja, acima do custo marginal (tem poder monopolista), e quando isso acontece o fornecedor captura parte do excedente do consumidor, para além de provocar um custo social pelo chamado "dead-weight loss", ou seja, quando existe uma perda de ambos os excedentes do consumidor e do produtor.
No entanto, nada garante que, por uma empresa aumentar o seu poder de mercado, isso vai-lhe permitir aumentar o preço, pois se o mercado verificar uma maior concentração pode-se dar a situação inversa, ou seja, pode-se evoluir para uma concorrência mais feroz.
Podem-se definir, em termos gerais, três fontes de poder de mercado: a diferenciação do produto, a existências de barreiras à entrada e a amplitude da quota de mercado.
Se uma empresa produzir um produto diferenciado em relação às concorrentes então consegue manter o preço acima do custo marginal sem que por isso perca todos os seus clientes, pois não existem produtos substitutos perfeitos no mercado; no entanto, se não existirem barreiras à entrada, como a actividade vai gerar lucros económicos então ir-se-á registar uma entrada de novos concorrentes até se anularem os lucros.
Se a fonte de poder de mercado for uma quota de mercado significativa também aqui nada garante que se possa manter um poder monopolista sem a existência de diferenciação do produto e/ou a existência de barreiras à entrada.
Um indicador que permite medir o poder monopolista de uma empresa é o Índice de Lerner que mede a magnitude da diferença entre o preço e o custo marginal relativamente ao preço e que se representa por:
I L = (Preço - Custo Marginal)/Preço
No entanto, não é fácil (se não impossível) medir os custos marginais de uma empresa pelo que em termos práticos este índice não é funcional. Por vezes, recorre-se aos custos médios como medida alternativa aos custos marginais como forma de ultrapassar esta dificuldade.
As fusões e aquisições proporcionam uma maior concentração produzindo efeitos de colusão e de monopólio.
A maior concentração pode resultar de uma competição mais forte que obriga as empresas a adaptarem-se mais rapidamente à evolução do mercado. Assim nada nos permite afirmar que a maior concentração, e por seguinte, maior poder de mercado irá ter resultados positivos para as empresa e resultados negativos para os consumidores, pois pelas razões apontadas, uma maior concentração poderá levar a um número reduzido de competidores fortes e resultar numa competição mais agressiva.
Conclusão
Podemos pensar que, apesar de serem muito interessantes, do ponto de vista teórico, algumas destas teorias não são, na prática, suficientemente explicativas da fusões e aquisições. Por vezes, sucede o inverso já que algumas delas revelaram-se contraproducentes quando confrontadas com testes empíricos.
Apesar de apresentarem algumas desvantagens, dos grandes grupos de teorias que analisámos consideramos as que aumentam o valor total (sinergias, diferença da eficiência na gestão,...) como as mais preponderantes na decisão das empresas crescerem externamente. As razões fulcrais da nossa escolha prendem-se com o facto de estas se preocuparem, sobretudo, com razões estruturantes e operacionais das empresas.
Estas teorias têm a virtude de servirem de fio condutor a um processo, que apesar de complexo, surge hoje como incontornável no contexto da economia mundial. As fusões e as aquisições têm hoje uma importância redobrada no redimensionamento das empresas, com vista a enfrentar, de uma forma competitiva, a globalização cada vez mais crescente, o que leva a que novos motivos explicativos possam surgir de acordo com a especificidade de cada empresa e de cada mercado.
Assim, no contexto da economia contemporânea, as fusões e aquisições (F&A) tornaram-se um importante instrumento para o desenvolvimento de novas áreas de negócios e também para permitir a continuação de outros.
Bibliografia:
Carvalho das Neves & Associados (1999), ABC das fusões e aquisições, IAPMEI, Lisboa
Gaughan, P. (1996), Mergers, Acquisitions and Corporate Restructurings, John Wiley & Sons, N.Y.
Weston, J.; et al (1990), Mergers and Corporate Governance, Prentice Hall, Englewood Cliffs.
Fonte: http://pascal.iseg.utl.pt/~jcneves/textosfare/fare15.htm.
Agosto/2000