![]() |
||
|
||
VILMA DE OLIVEIRA
Os melhores momentos eram os que passávamos com o Sr. Ortalli.
Talvez tão bons por que não fossem costumeiros e sim raros.
Era sempre um dia feliz quando ele vinha. Sua carriola tinha de tudo, até o que não pensávamos. E ele, era a própria encarnação da alegria.
Você pode tentar imaginá-lo, pensando num ator de picadeiro, fantasioso, colorido e belo, que some e aparece num jogo de luz, que anda e pinoteia, ao mesmo tempo estende a mão – “como vai ?” – e tira uma flor do chapéu, e tropeça nos pés compridos, e ao cair já se levanta e solta uma gargalhada e você quase não o acompanha, mas fica preso a contemplá-lo, a segui-lo, morrendo de medo que desapareça.
Pois naquele tempo, assim era nosso contato com o Sr. Ortalli. Ouvir o toque de sua corneta anunciando sua chegada, era a liberação total do que havia de mágico em nós.
Nesse dia não era preciso comer, nem beber, nem mais nada, por que tudo estava completo. Corríamos para ele e nos deixávamos ficar, em volta da carriola e tudo era belo e era bom. Não sei contar o que desapareceu primeiro, se foi a fantasia que deixou de existir, ou se foi o Sr. Ortalli que não apareceu mais.
Isso aconteceu em torno de tempo chamado “idade da razão”, e embora more com honra nos confins da minha memória, confunde-se de tal modo com brinquedos, estórias, amiguinhos, que torna-se um amálgama completamente inseparável, verdade-imaginação.
Os toques da corneta nos precipitavam com loucura.
- “Sr. Ortalli, quero o algodão doce amarelo !”
- “Sr. Ortalli, deixa eu segurar o cavalinho branco ?”
- “Sr. Ortalli, canta a música do barco que vai partir !”
- “Sr. Ortalli, olha como aquela nuvem parece uma baleia !”
- “Sr. Ortalli, gosto de você.”
- “Não vá embora, é cedo... - Quando você volta ?”
- “Sr. Ortalli, quando você vier de novo... Sr. Ortalli, ... ... ... ... ... ... ... ... ....”