A COISA DENTRO DA CRIPTA
1.OLHOS VERMELHOS
Durante dois dias os lobos o seguiram através da floresta,e agora estavam novamente se aproximando.Olhando por cima do ombro, o menino os avistou:formas peludas, pesadas, de um cinza escuro, saltando entre os troncos negros negros das árvores, como olhos que queimavam como carvões em brasa na penumbra crescente.Dessa vez, ele sabia que não poderia afastá-los como havia feito antes.Ele não conseguia enxergar muito longe , pois à sua volta se avolumavam, como soldados silenciosos de algum exército enfeitiçado, os troncos de milhares de abetos negros.A neve ainda cobria de manchas brancas as encostas das colinas voltadas para o norte, mas o borbulhar de milhares de córregos formados pela neve e pelo gelo derretido pressagiava a chegada da primavera.Era um mundo escuro, silencioso e sombrio, mesmo no meio do verão; e agora , enquanto a tênue luz da tarde esmaecia com a aproximação da noite, parecia mais sombrio que nunca.
O fugitivo continuava a correr encosta acima em meio a um espesso matagal, como havia corrido durante dois dias desde que conseguiu se livrar do abrigo de escravos em Hiperbórea.Embora fosse um cimério legítimo,ele fizera parte de um bando aesir de saqueadores,que assolava as fronteiras hiperborias.Os altivos guerreiros louros daquele país obscuro haviam encurralado e esmagado o grupo atacante; e o menino Conan, pela primeira vez em sua vida, havia experimentado a amargura das correntes e do chicote, destino comun do escravo.
No entanto , ele não permaneceu na escravidão por muito tempo.Trabalhando à noite enquanto os outros dormiam,ele havia desgastado um dos elos de sua corrente até conseguir arrebentá-la.Em seguida, libertou-se durante uma tempestade violenta.Matara, a golpes de sua corrente arrebentada, o guarda e um soldado que saltou em seu caminho , desaparecendo no aguaceiro.A chuva que escondia de vista também desorientou os cães da equipe de busca mandada ao seu encalço.
Embora livre no momento , o jovem se encontrou separado de sua Ciméria natal por metade da extensão de um reino hostil.Então , ele fugiu para o sul, para a terra selvegem e montanhosa que separa os pântanos ao sul da Hiperborea das planícies férteis da Brithunia e as estepes de Turania.Em algum lugar ao sul, disseram-lhe , existia o fabuloso reino de Zamora -Zamora com suas mulheres de negras cabeleiras e torres misteriosas.Ali havia cidades famosas: Shadizar ,a capital, chamada de Cidade da Maldade; Arejun, a cidade de ladrões; e Yezud,a cidade do deus-aranha.
No ano anterior , Conan havia experimentado pela primeira vez os prazeres da civilização quando, acompanhados a horda dos cimérios sedentos de sangue que atravessara os muros de Venarium,participara do saque daquele posto fronteiriço de Aquilônia.Isto atiçou seu apetite para querer mais.Ele não tinha uma ambição definida nem um programa de ação; nada a não ser vagos sonhos de aventuras desesperadas nas ricas terras do Sul.Visões de ouro e de jóias reluzentes, de comida e bebida à vontade , e dos calorosos abraços de belas mulheres de origem nobre eram os prêmios por sua coragem que passavam por sua ingênua cabeça jovem.No Sul, ele pensava, seu tamanho e sua força de alguma maneira lhe trariam fama e fortuna entre os fracos habitantes .Assim ele rumou para o Sul , em busca de seu destino com nada mais que uma túnica esfarrapada e grosseira e um pedaço de corrente.
E então os lobos captaram seu cheiro.Normalmente um homem em suas plenas forças tinha pouco a temer dos lobos.Mas era final de Inverno; os lobos ,famintos após uma estação ruim, estavam desesperados por qualquer possibilidade de alimento.
Da primeira vez que eles o alcançaram, ele usou a corrente com tanta fúria que deixou um lobo cinzento debatendo-se e uivando na neve com as costas quebradas e outro lobo morto com o crânio despedaçado.Sangue vermelho manchou a neve derretida. A famigerada alcatéia havia se afastado desse jovem de olhos ferozes brandindo a terrível corrente para, em vez disso , se refestelar com seus próprios irmãos mortos, e o jovem Conan fugira para o Sul.Mas, em breve eles estavam ao seu encalço novamente.
No dia anterior, ao pôr-do-sol, eles o alcançaram perto de um rio congelado nas fronteiras de Brithunia.Conan havia lutado com eles sobre o gelo escorregadio, girando a corrente sanguinária como um malho, até que o lobo mais corajoso conseguiu prender na mandíbula sinistra os elos de ferro, arrancando a corrente de sua mão amortecida.Então a fúria da batalha e o peso da alcatéia rompeu o gelo embaixo deles.Conan se viu afogando na correntesza gelada.Vários lobos haviam caído junto com ele- ele viu de relance um lobo , meio imerso , arranhando desesperadamente a borda gelada com suas garras , tentando sair da água - mas ele jamais soube quantos conseguiram se arrastar para fora e quantos haviam sido tragados pela correnteza debaixo do gelo.
Batendo os dentes, ele se içou para fora do outro lado , deixando a alcatéia uivante para trás.Seminu e semicongelado,passou a noite toda fugindo para o sul, atravessando as colinas cheias de florestas, e o dia seguinte também.Agora eles o alcançaram de novo.
O ar frio da montanha queimava seus pulmões esgotados, cada respiração era como inspirar o fogo de alguma fornalha infernal .Insensíveis,suas pernas de chumbo se moviam como pistões.A cada passo, seus pés calçados com sandálias afundavam na terra encharcada e saíam novamente fazendo ruídos de sucção.
Ele sabia que, de mãos vazias, tinha pouca chance contra uma dúzia de peludos assassinos de homens.No entanto, continuava a caminhar sem parar.Sua sombria heraça ciméria não lhe permitia desistir mesmo em face da morte certa.
A neve voltou a cair -flocos grandes e úmidos caíam com um leve mas audível ruído sibilante , cobrindo a molhada terra preta e os esguios abetos negros com uma infinidade de pontos brancos.Aqui e ali , grandes montes despontavam da terra atapetada de agulhas dos abetos ; a região se tornava cada vez mais rochosa e montanhosa.E ali, pensava Conan , poderia estar sua única chance de soreviver.Ele poderia apoiar as costas num rochedo e afugentaros lobos quando estes o atacassem.Era uma chance mínima -ele conhecia bem a rapidez ferrenha daqueles corpos ágeis , sinuosos , de 45kg de peso- mas era melhor que nada. A mata escasseava na medida em que a encosta ficava mais íngreme.Conan saltou para uma enorme massas de rochedos que apontava na encosta da colina, semelhante à entrada de um castelo soterrado . Então os lobos apareceram na borda da mata espessa e correram atrás dele, uivando como dêmonios vermelhos do Inferno perseguindo e derrubando uma alma penada.
CONTINUA....daqui ums dias..