As plantas competem entre si?

As incompatibilidades e os favorecimentos entre nossas plantas.

Muitas vezes já escutamos jardineiros, ou outras pessoas acostumadas a lidar com a terra, dizerem que uma certa planta “não vai para frente” quando é plantada junto com outra. A planta não cresce bem, ou morre sempre que a outra existe na vizinhança. É como se uma competisse com a outra. Por exemplo, existem agricultores que recomendam não se plantar abóbora com batatas, nem alho com ervilhas e feijão. Por outro lado, dizem que o alho favorece as roseiras, protegendo-as contra pragas e melhorando seu aroma. Já a cenoura vai bem quando associada à ervilha, alface, tomate, rabanete...

O que diz a ciência sobre esses fenômenos observados?

De fato, os cientistas têm observado uma interferência causada por algumas plantas sobre o desenvolvimento de outras. Um grupo de pesquisadores da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), Universidade de São Paulo, demonstrou que a erva daninha Cyperus rotundus, a conhecida tiririca, reduz drasticamente a produção e o peso dos frutos da abobrinha Cucurbita moschata.

Desde a ápoca de Plínio (23-79 d.C.), é conhecido o efeito de algumas espécies de nogueira (Juglans spp.), inclusive a espécie produtora das conhecidas nozes, sobre outras plantas que crescem próximas. Segundo os relatos, seus efeitos adversos atingem pinheiros, macieiras, batatas e cereais. 

Em 1925, pela primeira vez a ciência começou a explicar as causas do fenômeno, quando A.B. Massey observou que morriam todos os tomatinhos plantados a uma distância de até 16 metros do tronco da nogueira, enquanto os pezinhos de tomate plantados além dessa distância se desenvolviam bem. Como essa distância coincidia com a extensão das raízes da nogueira, ele supôs que as raízes liberassem no solo uma substância tóxica para outras plantas. Depois descobriu-se que a área da copa da árvore também influía no fenômeno e demonstrou-se que as folhas da nogueira produziam uma substância que era extraída pela umidade e, ao penetrar no solo, sofria hidrólise e oxidação, transformando-se em uma naftoquinona, toxina que recebeu o nome juglona.

A substância produzida era inofensiva para a própria nogueira, porém, uma vez no solo, passava a ser extremamente tóxica para outras plantas, levando-as à morte e, inclusive, inibindo a germinação de sementes.

Foi H. Molisch que, em 1937, interpretou esse tipo de interferência como sendo uma defesa química que a planta usaria contra outras plantas vizinhas. Foi ele quem usou pela primeira vez o termo alelopatia, referindo-se às interações bioquímicas entre as plantas.

A alelopatia teve grande desenvolvimento nos EUA, durante os anos 1939-1945, época da segunda guerra mundial, quando muitos fisiologistas, trabalhando em projetos bélicos, fizeram um grande número de descobertas acidentais sobre interações alelopáticas, nas plantas do deserto da Califórnia. Uma dessas plantas, pesquisada como uma possível nova fonte de borracha, fornece um bom exemplo de como a alelopatia pode ser um fator limitante para a própria espécie da planta: Parthenium argentatum, da família das Compositae, conhecido como “guayule”, ou planta da borracha. Observou-se que os pés de guayule que ficavam na borda da plantação sempre cresciam melhor do que os pés que ficavam no meio, e o fenômeno não se devia a competição por água ou sais minerais, pois rega extra ou aplicação extra de minerais não eliminava o problema. A causa era uma toxina exsudada pelas raízes do guayule, que causava auto-inibição e parecia não afetar outras plantas. As mudinhas que não conseguiam se desenvolver sob plantas grandes de Parthenium, se desenvolviam muito bem sob a copa de outros arbustos. Foi identificado o ácido cinâmico como sendo a toxina responsável pelo efeito, presente no exsudato das raízes. O ácido cinâmico é cem vezes mais tóxico para o próprio guayule do que para outras espécies de plantas, como o tomate, por exemplo. O resultado prático desse conhecimento é que, para garantir uma boa produção de borracha, o guayule deve ser plantado com um espaçamento mínimo entre as mudas, de modo a não acontecer a auto-inibição. Talvez no ambiente nativo da planta, a toxina produzida sirva para inibir o crescimento de competidores de outras espécies.


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