O advogado e poeta Afif Jorge Simoes Filho, chamado a defender um pequeno ladrão de batatas, no foro de São Sepé, cidade de que é natural e onde reside, resolveu faze-lo em versos, conseguindo absolvição do  réu:

  

Voltando de uma caçada

Dentro da noite silente

O acusado João Vicente

Cometeu uma insensatez

De agarrar umas batatas

Numa lavoura lindeira

Furtando pela primeira

E também ultima vez

 

É de bons antecedentes

Como a defesa supunha

Pois não falta testemunha

Que lhe abone o proceder

É um índio de pouca prosa

Honesto, simples, pacato

Que mora a beira do mato

Plantando para viver

 

Mas todos tem o seu dia

De culo – como lá diz

E o índio pobre e infeliz

Tentado por satanás

Poe nos bolsos as batatas

De vinte a trinta, calculo

E no seu dia de culo

Foi descoberto no más

 

E foi um deus nos acuda

Seu quarto foi revistado,

Veio um sargento fardado

Com pose de general

E João Vicente Pacheco

Pacato, simples, honesto

O filho do seu Mudesto

Foi processado afinal

 

E agora aqui me concentro

Nestas linhas sem beleza

Para fazer a defesa

De tão pequeno ladrão

Abro os códigos da lei

Como se diz la por fora

E peço sem mais demora

A sua absolvição

 

João Vicente é inocente

E não merece condena

Ele está isento de pena

Pelo código penal

Pois nestes tempos modernos

De roubos e negociatas

Quem furta trinta batatas

É um retardado mental

 

Que então basta uma multa

Porque o furto praticado

De tão pequeno e minguado

Cabe em dois bolsos normais

Que importa à parte lesada

Mesmo pobre em bens terrenos

Umas batatas a menos

Umas batatas a mais?

 

Por falta de dolo ou culpa

Que o crime caracterize

Deixe passar o deslize

Ate sem multa, doutor!

Vossa Excelência é sensível

Tem sentimento e grandeza

E a maior batata inglesa

 Não vale um gesto de amor

 

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