ABSURDO
Parte IFabiano Viana Oliveira
Arnold andava pela rua à noite, estava quente e ele não agüentou ficar em casa vendo TV.
Ele não chegou a sair de sua vizinhança, segura e familiar, mas se afastou o suficiente para cruzar com um grupo de "night bikers". Foi estranho, ele não tocou em nenhum deles, não sentiu nada enquanto eles passavam, mas era como se aquele barulho de catracas travadas, misturado com o calor e a umidade da noite, tivesse penetrado em sua alma. Atônito, ele não sabia mais para onde estava indo, por um segundo até esqueceu quem era; então ele se vira e anda de volta para casa.
Na primeira esquina que ele cruza, ele nota uma coisa curiosa, algo que nunca tinha notado antes; era uma espécie de bar, iluminado; não conseguia imaginar como tal lugar podia estar ali, no seu bairro, sem ele jamais ter notado. Ele se aproxima; por uma janela de vidro ele vê pessoas bebendo, mulheres semi-nuas, um jovem cheirando cocaína numa mesa e até um casal fazendo sexo no chão, bem no meio do bar e o pior é que ninguém parecia ligar. Ele olha para o barman e esfrega os olhos para ver melhor, era Freddie Krueger, ou alguém fantasiado, mas era muito real e ele estava com azeitonas recheadas presas nas garras, preparando martinis. "Que lugar bizarro era aquele afinal?" Ele pensa. E uma mão toca seu ombro, fazendo ele se virar e em seguida gritar de susto... Era uma criatura marrom, semelhante a um urso, só que sem pelos e com uma espécie de língua que saía de um buraco na testa, pingando uma coisa branca todo o tempo. Ele achou repugnante, mas ainda assim ficou lá o tempo suficiente para ouvir a pergunta do elemento: "Esse é o único bar aberto por aqui? As pessoas parecem estranhas!"
Arnold não respondeu, mas em sua admiração e surpresa, com uma coisa que perguntava com uma boca e fazia exclamações com outra; ele produziu um som parecido com "Eh!" E então a criatura agradece e entra no bar. Ainda de boca aberta, Arnold dá mais uma olhada pela janela e em seguida continua seu caminho, fingindo que estava tudo bem.
Dois quarteirões se passam e o assustado Arnold se depara com algo tão ou mais inesperado; era uma nave espacial do tipo disco-voador; ela estava aberta e de dentro saíram às dezenas, pessoas ou pelo menos pareciam pessoas, todas exatamente iguais a Kiko, da série mexicana "Chaves", e todos estavam usando os ridículos terninhos de marinheiros. Por um minuto Arnold achou graça, mas lhe veio à cabeça que aquilo era uma invasão do espaço e que os alienígenas só estavam disfarçados e provavelmente seriam perigosos para a Terra. Ele se aproxima mais e nota que os "Kikos" estavam saindo da nave e entrando numa lanchonete McDonald’s; eles entravam, comiam e depois viravam uma esquina, em seguida aparecendo um a um do outro lado, um tanto menos espécies apáticos que os outros e então entravam de novo na nave por uma porta do lado contrário à outra, por onde eles saiam. Arnold fica observando aquilo um tempo, sem saber o que pensar: "Por que alienígenas viriam à Terra, na forma de Kiko, só para ficar comendo e voltando para a nave, o tempo todo?" E o pior que os funcionários da, lanchonete não ligavam, só serviam e pegavam mais e mais dinheiro. Cansado daquilo. Arnold diz a si mesmo: "Que se dane! Kiko é idiota mesmo. Um planeta cheio deles, só pode ser um planeta cheio de idiotas." Então ele se vira e continua seu caminho para casa.
Uma quadra antes de chegar, ele nota mais uma coisa estranha; deixada na calçada. Era uma espécie de cabide, como as de tirar foto, só que com uma cortina na frente e outra atrás, como um túnel. De acordo com os acontecimentos da noite, ele não sabia o que esperar; passou um tempo e nada. Ele não sabia se olhava dentro ou não; mais uma quadra e ele estaria em casa, em paz ou então ele olhava e matava a curiosidade. Arnold se aproxima, acanhado e cuidadoso, então... uma voz ecoa na noite silenciosa; alguém grita seu nome e com o susto ele se joga para dentro da cabine e para sua surpresa nada havia acontecido, ele só sente um mero mal-estar, provavelmente causado pelo susto. Mas passado o mal-estar ele nota que não havia mais cabine e que ele estava no mesmo lugar onde havia começado, ele ainda podia ver os "night bikers" no final da rua. "O que aconteceu? Ele pensa. Teria sonhado aquilo; acordado e de pé? Muito confuso ele começa a fazer o seu caminho de volta para casa, desta vez um pouco mais rápido, pois o quanto antes ele chegasse em casa, mais rápido poderia descansar e esquecer essa noite tão estranha.
Mas o estranho poderia estar só no começo. Novamente, lá estava o bar iluminado, só que desta vez com uma figura bem diferente parada em frente à janela de vidro, era ele, de novo. E lá estava a criatura entrando no bar e ele saindo, andando para casa. Arnold não sabia o que fazer. Ele anda até o bar e olha para dentro, estranhou não ver a criatura lá dentro, mas ao se virar para ir embora dé de cara com a mesma e desta vez nem fala nada só sai andando, com o monstro novamente entrando no bar.
Arnold estava assustado, não sabia o que pensar, o que fazer, só continuou seu caminho, agora já quase correndo; encontrando logo a muito familiar invasão de "Kikos" ao McDonald’s.
Não foi difícil para Arnold notar outra figura conhecida observando a "porta dos fundos" do disco-voador, por onde os "Kikos" entravam; novamente era ele; um gelo tomou conta do seu corpo, lágrimas se formam nos seus olhos, ele não conseguia se mover ou ao menos falar: "O que está acontecendo?"
Após alguns minutos ele segue caminho; já sabe ou pelo menos imagina o que vem adiante e então surge, de novo, a cabine e novamente lá estava ele próximo a ela, olhando; desta vez ele tem forças para dar um grito e dizer seu próprio nome, o que faz o outro Arnold se assustar e se jogar na cabine. Ele corre até ela, mas não sabe o que fazer. Agora ele sabe o que a cabine faz, ele poderia ir para casa e esquecer tudo, mas como esquecer que o outro ele está passando produto de novo. Então Arnold decide ir atrás dele para evitar que ele entre na cabine de novo. Ele entra na cabine, chegando a ouvir alguém gritar seu nome, muito alto; mas ao se virar só o que vê são os "night bikers", novamente lhe provocando um mal-estar. Ele olha para os lados e vai em direção do bar; correndo, desesperado, tentando se alcançar; mas ao chegar lá só vê aquela criatura entrando no bar, sem nenhum sinal dele. Arnold agora corre para tentar se alcançar na nave. A noite que estava quente e úmida se tornou um gelo, com o pavor que ele sente.
Arnold chega a nave a tempo de se ver paralisado diante da mesma, agora era a chance se alcançar; mas no seu desespero ele não notou que vinha sendo seguido e que esse elemento estava para se manifestar; novamente, gritando seu nome. Arnold. Ele se assusta, olha para trás e vê outro ele, aparentemente mais assustado e desesperado que ele, então ele se vira para o outro ele que ele perseguia e vê que esse já havia seguido. Por um momento Arnold ficou confuso sobre o que deveria fazer, então olhou para o ele que lhe havia gritado e decide se virar e correr atrás do outro ele, para impedi-lo de entrar na cabine, novamente; mas foi tarde demais quando ele chegou lá, pois o outro ele já havia entrado. Arnold não sabia o que fazer. Parou um momento e pensou: "Tem outro eu vindo logo atrás de mim. Eu só tenho que esperá-lo e assim ele poderá me impedir de entrar na cabine, mas eu já sei disso. O que vai acontecer então? "E em voz alta: "Vai haver dois de mim?" E da escuridão da rua surge uma voz que diz: "Três!" E depois: "Quatro!" E outra: "Cinco!" E mais uma: "Seis!" "Sete!" "Oito!"... E de todos os cantos surgiram Arnolds dizendo um número, cada vez maior e que não parava de crescer.
Arnold olhou ao redor, assustado, apavorado, bestificado. Parecia que o mundo estava povoado por ele e ele não podia fazer nada para consertar a situação. E um deles diz: "Eu não sei de "vocês" mas eu estou com fome! "E outro diz: "O McDonald’s está aberto! "Outro diz:" "E os kikos?" E outro:" Então, vamos em outro lugar. Existem muitos!" E eles vão em várias direções diferentes, em grupos, divergindo para todos os lados, deixando lá, só, Arnold, confuso. Ele se aproxima da cabine sem saber o que fazer... e é quando alguém grita seu nome e com o susto ele cai na cabine, indo parar... no mesmo lugar... de novo.