DPN3 20-03-06

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LESÕES CORPORAIS

 

PARTE I - ANOTAÇÕES DA AULA

 

As anotações desta aula foram gentilmente cedidas pela Samira.

 

 

Art. 129 – crime contra a pessoa, crime de lesão corporal de natureza leve, crime de menor potencial ofensivo.

§ 1º - lesão corporal de natureza grave

Para haver lesão de natureza grave, deve haver perigo sério (ou concreto) de vida (perigo efetivo). Ex: disparo de PAF com dolo de ferir (não de matar, porque aí é homicídio – responde por homicídio ou tentativa).

 

Obs: dolo eventual – não quero matar mas assumi o risco de produzir o resultado morte. Art. 129, §1º, II, CP. Ex: atirou em direção à 30 pessoas.

 

Art. 129, CP, III – debilidade permanente de membro, sentido ou função.

 

IV – aceleração de parto, em razão da lesão corporal de natureza grave. Pena: reclusão de 1 a 5 anos.

 

Art. 129, § 2º - lesão corporal de natureza gravíssima

I – incapacidade permanente para o trabalho

II – Enfermidade incurável

III – Perda ou inutilização de membro, sentido ou função.

IV – deformidade permanente ® cabe tentativa de lesão permanente de natureza gravíssima (iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias a minha vontade – art. 14, CP, II).

V – aborto – dolo de causar lesão e não aborto, a conseqüência foi o aborto.

 

Lesão corporal seguida de morte (art. 129, CP, § 3º)

Dolo de causar lesão corporal (dolo contundente) e culpa no conseqüente em razão da minha imprudência. Ex: soco em Mélvio onde conseqüentemente o mesmo bate com a cabeça e morre e nem assumiu um risco, se não haveria dolo eventual.  Þ CRIME PRETERDOLOSO

Na culpa deverá haver dever de cuidado (acontece pela falta do dever de cuidar). – HOMICÍDIO PRETER DOLOSO.  Ex2: Na praia, acerta-se um soco no rosto de Mélvio, porém, embaixo da areia há uma pedra oculta. O indivíduo não responderá por lesão corporal seguida de morte, pois não se integralizou a culpa. (ATENÇÃO). Responderá somente por lesão corporal; não houve a previsibilidade da morte.

 

OBS:

Culpa consciente – Haverá certeza que a morte não irá ocorrer, nem assume o risco. Ex: atirador de faca que trabalha com isso há 25 anos.

Dolo eventual – Há previsibilidade do fator morte, porém o indivíduo não quer causar a morte.

 

Legítima defesa putativa

 

Ex: amanhã quando eu te encontrar vou te matar. No dia seguinte o indivíduo armado (ameaçado) se encontra com que fez a ameaça e o mesmo colocou a mão para trás. O ameaçado atira imaginando que o outro iria mata-lo, porém o que fez a ameaça só iria puxar a carteira.

 

Toda conduta típica é necessariamente antijurídica? Não, pois em certas ocasiões a lei autoriza matar (art. 23, CP)

§ 4º - diminuição de pena – lesão corporal privilegiada

§ 5º - substituição da pena

 

 

 

PARTE II - DOUTRINA

Mirabete

 

 

1 - SUJEITOS DO DELITO

 

Crime comum que é, a lesão corporal pode ser praticada por qualquer pessoa, mas a lei não incrimina a mera conduta da autolesão. Esta, entretanto, pode constituir o fato previsto pelo art. 171, § 2º, V, do CP, ou pelo art. 184 do CPM. Há crime de lesão corporal, entretanto, se um irresponsável (menor, insano mental etc.) ou uma pessoa totalmente embriagada ou drogada causa lesão em si mesmo por instigação do agente, respondendo este pelo delito.

 

Sujeito passivo é qualquer pessoa humana, que não o agente, referindo-se a lei com a palavra alguém ao fruto da fecundação a partir do início do parto.

 

 

2 - TIPO OBJETIVO

 

Crime de lesão corporal, nos termos legais, é qualquer alteração desfavorável produzida no organismo de outrem, anatômica ou funcional, local ou generalizada, de natureza física ou psíquica. O núcleo do tipo legal é o de ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem, ou seja, causar, de qualquer forma (violência física ou moral), mal físico, fisiológico ou psíquico à vítima, com dano anatômico interno ou externo (ferimentos, equimoses, hematomas, fraturas, luxações, mutilações etc.), não se exigindo derramamento de sangue. Pode-se reconhecer o crime inclusive na omissão daquele que tem o dever de agir para evitar o resultado (art. 12, § 2º). Havendo relação de causalidade entre a conduta comissiva ou omissiva e o resultado, o crime ocorre. Não é indispensável que se cause dor à vítima, mesmo porque certas ofensas à saúde mental não a causam. A simples presença da dor, sem comprometimento físico qualquer, não constitui o crime de lesão corporal, mas com agressão pode configurar outro ilícito, como a contravenção de vias de fato (art. 21 da LCP). O corte da barba e do cabelo, ainda que sem consentimento do titular, não configura também lesão corporal, mas pode caracterizar injúria real, constrangimento ilegal, vias de fato etc. O crime se configura na ofensa à saúde da vítima, ou seja, um prejuízo ao equilíbrio funcional do organismo (moléstias, estados de inconsciência, paralisias, neuroses, insanidade mental, choque nervoso, convulsões etc.). É crime, também, agravar uma lesão preexistente. Constituindo a integridade fisiopsíquica um bem indisponível, o consentimento da vítima não desnatura o crime, exceto, evidentemente, quando autorizado pelo direito, como no caso de cirurgias, inclusive transplantes de órgãos de pessoas vivas, o que caracteriza o exercício regular de direito.

 

 

3 - TIPO SUBJETIVO

 

O dolo do crime de lesão corporal é a vontade de produzir um dano ao corpo ou à saúde de outrem ou assumir o risco de produzi-lo (animus laedendi ou nocendi). A lesão corporal culposa é prevista pelo art. 129, § 6º.

 

 

4 - EXCLUSÃO DO CRIME DE LESÃO CORPORAL

 

Não há crime de lesão corporal se o agente atua ao abrigo de uma excludente da antijuridicidade (estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito). Não há exclusão de antijuridicidade ou culpabilidade nas lesões ocorridas em desavenças familiares, mas são freqüentes as absolvições nessas situações por medidas de discutível política criminal em favor da união doméstica, principalmente no caso de reconciliação. Se nas cirurgias para a cura do paciente e nos transplantes (disciplinados pela lei nº 9.434, de 4-2-1997, regulamentada pelo Decreto nº 2.268, de 3-6-1997) é evidente o exercício regular do direito, desde que obedecidos os requisitos legais, discute-se a possibilidade de intervenções mutiladoras para a mudança de sexo do paciente. A orientação moderna é de se reconhecer a licitude da operação desde que seja efetuada, com as cautelas que o caso exige, para corrigir desajustamento psíquico, tratando-se nesse caso de procedimento curativo.

 

 

5 - CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

 

Consuma-se o crime quando resulta para a vítima uma lesão à integridade física ou psíquica.

Embora já se tenha entendido que é juridicamente impossível a tentativa de lesões corporais, porque tal figura coincide inteiramente com a definição de vias de fato, é correto afirmar que é ela admissível quando nítido o dolo de ofender a integridade física ou psíquica da vítima, que não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. É possível, inclusive, a tentativa de lesão corporal de natureza grave se patente que o objeto do agente era causar um dos resultados previstos nos §§ 1º e 2º do art. 129.

 

 

6 - LESÃO CORPORAL LEVE

 

Identifica-se a lesão corporal leve por exclusão. Nos §§ 1º, 2º e 3º do art. 129 estão previstos os resultados que tornam a lesão grave, gravíssima ou seguida de morte, configurando-se o tipo básico de lesão corporal leve naquelas que não causarem qualquer dos eventos arrolados em seus incisos, com pensa de detenção, de três meses a um ano. Se a lesão corporal é decorrente de violência doméstica, a pena é de seis meses a um ano, nos termos do § 9º. É possível, porém, nas lesões mínimas, o reconhecimento do princípio da insignificância, que exclui a tipicidade do fato. Por força do art. 88 da Lei nº 9.099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, a instauração de inquérito policial e a ação penal dependem de representação do ofendido ou de seu representante legal.

 

 

7 - INCAPACIDADE PARA AS OCUPAÇÕES HABITUAIS POR MAIS DE TRINTA DIAS

 

Nos incisos do § 1º do art. 129 a lei prevê as hipóteses em que se identifica a lesão corporal de natureza grave, cominando-se a pena de reclusão, de um a cinco anos. A primeira delas é a de resultar da lesão a incapacidade da vítima para suas ocupações habituais por mais de 30 dias. Por ocupações habituais tem-se entendido não só o trabalho diário, como também a atividade funcional habitual do indivíduo, pouco importando sua espécie, econômica ou não, como trabalho, estudo, laser, etc. Só não está protegida a ocupação ilícita. O fato de não estar inteiramente superada a lesão no prazo referido, não prejudicando porém as ocupações habituais do ofendido, desclassifica o crime para sua forma do caput. Por outro lado, se a vítima volta à suas ocupações com sacrifícios, por não estar ainda em condições de desempenhá-las, a lesão é de natureza grave. Nos termos do art. 168 e parágrafos do CPP, a gravidade da lesão deve ser comprovada por exame complementar a ser realizado no dia seguinte ao 30º da data do fato, embora a ausência ou deficiência do laudo possa ser suprida por prova testemunhal.

 

 

8 - PERIGO DE VIDA

 

É também grave a lesão que provoca perigo de vida para o ofendido. Embora, em tese, qualquer lesão possa ocasionar complicações que acarretem perigo de vida, a lei penal refere-se, evidentemente, a um perigo efetivo, concreto, constatado no exame de corpo de delito, revelado por coma, choque traumático, hemorragia grave, etc. Tem-se entendido que o perito, no caso, verificando uma realidade objetiva, deve fazer um juízo de probabilidade da ocorrência do resultado morte, fundamentando esse prognóstico. Desnecessária, no caso, a realização de exame complementar; verificado o perigo de vida pelo perito, fundamentando sua conclusão, a pronta recuperação da vítima é irrelevante.

 

 

9 - DEBILIDADE PERMANENTE DE MEMBRO, SENTIDO OU FUNÇÃO

 

No inciso III, do § 1º, do art. 129, a lei refere-se à causação de debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou seja, a uma redução na capacidade funcional, a uma diminuição das possibilidades funcionais da vítima. 

Membros são os apêndices do corpo, superiores (braços) e inferiores (pernas). 

Sentidos são as funções perceptivas do mundo exterior (visão, audição, olfato, gosto e tato).

Função é a atividade desempenhada por vários órgãos (respiratória, circulatória, digestiva, secretora, locomotora, reprodutora, sensitiva, etc.).

Órgão é a parte do corpo humano que tem determinada capacidade funcional. A perda de um órgão duplo (como a de um olho) é considerada debilidade de membro, sentido ou função e não sua perda. Também a perda de dentes pode acarretar a debilidade da função mastigatória, mas só a apreciação objetiva de cada caso permite julgar a gravidade da lesão. Não importa que o enfraquecimento do membro, sentido, função ou órgão possa ser suprido por aparelhos de prótese ou qualquer instrumento, persistindo a gravidade ainda que o ofendido recupere funções com o auxílio destes.

 

 

10 - ACELERAÇÃO DE PARTO

 

No último inciso do § 1º, menciona a lei a "aceleração de parto", ou seja, quando se antecipa o nascimento, sendo o feto expulso antes do termo final da gravidez. Há o aumento da pena porque o parto prematuro é perigoso tanto para a criança como para a mãe. Ainda que a criança nasça antes do termo final da gravidez em razão da lesão sofrida pela mãe e a morte ocorra posteriormente, não se caracteriza o aborto, que tornaria gravíssima a lesão (§ 2º). A ciência do agente de que a vítima estava grávida é indispensável para a caracterização dessa condição de maior punibilidade pois exige-se, no caso, a previsão do resultado (art. 19).

 

 

11 - INCAPACIDADE PERMANENTE PARA O TRABALHO

 

No § 2º do art. 129 a lei menciona outras hipóteses de lesões graves, na doutrina denominadas de gravíssimas para diferenciá-las daquelas previstas no parágrafo anterior, sendo a primeira delas a ocorrência de incapacidade permanente para o trabalho. Trata-se, segundo a doutrina, de uma incapacidade perpétua para qualquer atividade profissional remunerada e não para o trabalho específico da vítima, o que torna difícil a aplicação do dispositivo, embora a lesão possa ser considerada grave pela ocorrência de uma das conseqüências mencionadas em outros incisos.

 

 

12 - ENFERMIDADE INCURÁVEL 

 

Torna grave a lesão a ocorrência de enfermidade incurável, ou seja, de qualquer estado mórbido de evolução lenta que não apresente maiores probabilidades de cura integral. A transmissão do vírus da Aids pode constituir, portanto, o crime de lesão corporal gravíssima.

 

 

13 - PERDA OU INUTILIZAÇÃO DE MEMBRO, SENTIDO OU FUNÇÃO

 

A perda de membro, sentido ou função são os resultados mencionados no inciso III, do § 2º. Pode ser mutilação (causada pela violência dos golpes), amputação (por cirurgia necessária), ou mesmo a inutilização, em que o membro ou órgão, apesar de ligado ao corpo, não mais tem capacidade funcional. Entretanto, a perda de um dos órgãos duplos caracteriza lesão grave e não gravíssima.

 

 

14 - DEFORMIDADE PERMANENTE

 

É também gravíssima a lesão quando resultar deformidade permanente. A deformidade é o prejuízo estético, adquirido, visível, indelével no corpo do ofendido. Deve haver uma modificação que cause dano estético de certa monta e capaz de causar impressão de desagrado, vexatório para a vítima. Não há necessidade, assim, de que ocorra um aleijão ou ferimento horripilante. Pouco importa, porém, a sede da lesão, desde que seja ela visível em qualquer situação normal da vida humana segundo os costumes vigentes. Também é irrelevante que a deformidade possa ser removida por cirurgia estética, pois ninguém está obrigado a ser a ela submetido, além  dos riscos inerentes a esse procedimento. Nem mesmo a possibilidade de dissimular-se a deformidade por cremes, perucas, próteses, indumentárias adequadas, etc. desclassifica o ilícito. A deformidade permanente deve ser positivada por meio de exame pericial, sendo considerado praticamente indispensável que seja o laudo instruído com fotos do ofendido para apreciação das partes e do julgador.

 

 

15 - ABORTO

 

 A última das hipóteses é o aborto como conseqüência do crime de lesão corporal (aborto preterintencional). É evidente a necessidade de que fiquem comprovados gravidez e o aborto conseqüente das lesões, ou seja, o nexo causal entre a lesão praticada e o resultado. O agente atua com dolo de lesão corporal mas o aborto era previsível pelo seu conhecimento da gravidez da vítima. Se há dolo quanto ao resultado aborto, haverá concurso de crimes com a lesão corporal.

 

 

16 - LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE

 

O § 3º do art. 129 refere-se ao homicídio preterdoloso ou preterintencional. O agente atua com dolo no crime de lesões corporais, podendo prever o resultado morte, que não quis ou assumiu o risco de produzir. Há, portanto, dolo no que se refere ao crime de lesão corporal e culpa com relação à morte. Essa é a diferença com o homicídio culposo, em que na conduta há um fato em si penalmente indiferente ou no máximo a vontade de desforço físico. Evidentemente, como sempre, é necessário que haja a relação de causalidade entre a conduta do agente e a morte da vítima.

 

 

17 - LESÃO CORPORAL PRIVILEGIADA

 

Sob a rubrica de "diminuição de pena", o art. 129, § 4º, menciona duas hipóteses de lesão corporal privilegiada. Em primeiro lugar, menciona o crime por motivo de relevante valor social ou moral, em relação idêntica ao do homicídio privilegiado, valendo aqui as anotações a ele referentes. Também é reduzida a pena de um sexto a um terço se o agente atua sob a influência de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima. A causa de diminuição de pena é idêntica àquela do homicídio privilegiado. Reconhecida uma das causas de diminuição de pena, é imperativa a redução da pena, segundo opinião dominante, sejam as lesões leves ou graves. Não se aplica concomitantemente, entretanto, a atenuante genérica prevista pelo art. 65, III, c, do CP.

 

 

18 - SUBSTITUIÇÃO DA PENA

 

No § 5º, a lei permite a substituição da pena de detenção por multa, em duas situações. A primeira delas é de lesões corporais privilegiadas, se apenas de natureza leve, de acordo com o disposto no parágrafo anterior. A substituição, ao contrário da diminuição da pena, é facultativa, cabendo ao juiz decidir, ou não, pela sua aplicação. A substituição por multa também é prevista, genericamente, no art. 60, § 2º, desde que preenchidos os requisitos legais.

Na segunda hipótese, cabe a substituição se as lesões são recíprocas. Se o acusado também sofreu lesão corporal, pode o juiz aplicar a substituição, mas o benefício só é cabível se a pessoa a quem lesou também foi condenada. Se esta foi absolvida por legítima defesa, as lesões que causou ao agressor são lícitas e não possibilitam a substituição da pena. Entretanto, prevalece na jurisprudência a orientação de que a substituição é possível ainda que o outro contendor não tenha sido denunciado ou tenha sido absolvido. Tratando-se de mercê facultativa, pode o juiz, de acordo com as circunstâncias, conceder o benefício apenas a um dos contendores.

 

 

19 - LESÃO CORPORAL CULPOSA

 

Pune a lei também a lesão corporal causada culposamente. Quanto à conduta típica culposa da lesão corporal, é a mesma do homicídio, valendo para ela as considerações anteriores. Assim, se da imprudência, negligência ou imperícia do agente derivou não a morte, mas lesão corporal na vítima, o agente é punido com pena de detenção de dois meses a um ano, não importa qual sua gravidade, que só terá influência na fixação da pena. Sendo a lesão insignificante, também se tem aplicado o princípio da bagatela. Por força da Lei nº 9.099/95, a lesão culposa passou a estar na competência do Juizado Especial Criminal, sendo objeto de ação penal pública condicionada à representação da vítima (art. 88). A lesão corporal causada na direção de veículo automotor passou a ser regida pelo art. 303 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503, de 23-9-1997), cominando-se para o tipo básico a pena de detenção, de seis meses a dois anos, além de restrição de direitos.

 

 

20 - LESÃO CORPORAL CULPOSA QUALIFICADA

 

Nos termos do § 7º do art. 129, aumenta-se a pena de um terço se ocorrer qualquer das hipóteses do art. 121, § 4º. Assim, há lesão corporal culposa qualificada se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências de seu ato ou foge para evitar a prisão em flagrante.

 

 

21 - LESÃO CORPORAL DOLOSA QUALIFICADA CONTRA MENOR

 

Também por referência ao art. 121, § 4º, aumenta-se a pena de um terço na lesão corporal dolosa quando o crime é praticado contra pessoa menor de 14 anos, valendo aqui também as anotações anteriores (homicídio doloso qualificado contra menor). Exige-se, no entanto, por força do art. 155 do CPP, seja comprovada por documento civil a idade da vítima.

 

 

22 - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

 

Nos §§ 9º e 10º do art. 129, acrescentados pela Lei nº 10.886, de 17-6-2004, sob a nova rubrica "Violência Doméstica", prevêem-se outras formas qualificadas de lesão corporal dolosa. No § 9º, que se aplica à lesão corporal leve (art. 129, caput), descrevem-se como qualificadoras que elevam a pena mínima para seis meses de detenção algumas circunstâncias que já eram previstas como agravantes genéricas (art. 61, II, e e f, 2ª parte) e que se referem à vínculos de parentesco, casamento, relação doméstica, de coabitação ou de hospitalidade, as quais já foram examinadas. Acrescentam-se, porém, as relações com companheiro ou pessoa com que conviva ou tenha convivido o agente, evitando-se a discussão nas hipóteses de união estável ou outro vínculo de relacionamento amoroso ou de estarem os cônjuges ou companheiros divorciados ou separados, judicialmente ou de fato, situações nas quais, por ausência de expressa previsão legal, ou porque não mais subsiste a necessária relação de fidelidade, no segundo caso, vinha-se afastando a agravante genérica. Deve-se incluir, porém, no alcance da norma também a vítima com quem desfrutava o agente de um convívio doméstico, ainda que de natureza diversa da relação conjugal ou de união estável, como enteados, parentes, etc. As mesmas circunstâncias constituem causa de aumento de pena, nos termos do § 10, quando se cuida de crime de lesão corporal grave ou seguida de morte (§§ 1º a 3º).

Prevê a Lei nº 9.099/95, de 26-9-95, que, em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, o afastamento do autor do fato do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima (art. 69, parágrafo único). A norma é aplicável, em princípio, nos casos da competência dos Juizados Especiais Criminais, que abrange a lesão corporal leve qualificada (§ 9º), por se tratar de infração de menor potencial ofensivo. Nada justifica, porém, a exclusão da medida na violência doméstica da qual resulta lesão corporal grave (§ 10).

 

 

23 - DISTINÇÃO

 

Distingue-se o crime de lesão corporal da tentativa de homicídio pelo dolo: animus necandi denuncia a tentativa, animus laedendi, o crime de lesão corporal. Com relação ao crime de maus tratos, a distinção está em que, neste, o agente visa corrigir a vítima. Na violência que não causa ofensa à integridade corporal configuram-se as vias de fato. A lesão causada por tortura pode constituir este crime autônomo quando praticado nas circunstâncias elementares previstas no tipo (art. 1º da Lei nº 9.455/97).

 

 

24 - CONCURSO DE CRIMES

 

As lesões praticadas para a consecução de outro crime são por este absorvidas quando se tratar de crime complexo (arts. 157, 157, 219), a não ser que haja disposição expressa em contrário (arts. 163, parágrafo único, 228, § 2º). A lesão corporal de natureza grave torna alguns crimes qualificados pelo resultado (arts. 157, § 3º, 158, § 2º, 159, § 2º). Se o agente pratica crime de abuso de autoridade (Lei nº 4.989, de 9-12-1965), produzindo lesões corporais na vítima, há concurso formal, embora já se tenha reconhecido no caso concurso material. Nada impede o reconhecimento de crime continuado, ainda que em se tratando de vítimas diversas. Vários ferimentos causados à mesma vítima, em uma mesma conduta, perfazem uma unidade, constituindo crime único. Nada impede que, de uma mesma conduta, resultem dois ou mais crimes de lesão corporal, dolosa ou culposa, reconhecendo-se então o concurso formal. Evidentemente, se de uma mesma lesão decorrer resultado que a torna grave e outra que a classifica como gravíssima, o agente pratica crime único, pela capitulação mais grave, e não concurso formal.

 

 

25 - PERDÃO JUDICIAL

 

Nos termos do art. 129, § 8º, aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º, art. 121, persistindo as razões da dispensa da pena tal como no homicídio, a critério do juiz. 

 

 

 

DA PERICLITAÇÃO DA VIDA E DA SAÚDE

PARTE I - ANOTAÇÕES DA AULA

As anotações desta aula foram gentilmente cedidas pela Samira.

Art. 130 – O agente passivo não necessariamente deverá pegar a doença. Porém, está expondo o outro (é crime de perigo).

 

Lei penal em branco. A lei não diz o que é doença venere; deverá se buscar uma norma na listagem do Ministério da Saúde sobre quais são as doenças.

 

Relações sexuais – cópula vaginal

Pênis no ouvido (sacanagem) – não é cópula vaginal Þ ato libidinoso

Portinha Þ atentado violento ao pudor

 

O indivíduo sabe ou deve saber que está contaminado (agente ativo).

 

Blenorragia = gonorréia

 

Art. 131 – Perigo de contágio de moléstia grave.

Ex: AIDS

 

PARTE II - DOUTRINA

Celso Delmanto

 

 

PERIGO DE CONTÁGIO VENÉREO

 

Divisão: O art. 130 contém 3 figuras:

o agente sabe estar contaminado (caput, 1ª parte)

não sabe, mas devia saber achar-se contaminado (caput, 2ª parte)

sabe e tem a intenção de transmitir a moléstia (§ 1º do art. 130).

 

Objeto jurídico: A incolumidade física da pessoa.

 

Sujeitos ativo e passivo: Qualquer pessoa, homem ou mulher.

 

Tipo objetivo: A ação de expor (arriscar, colocar em perigo) deve ser praticada mediante relações sexuais ou qualquer ato sexual (delito de forma vinculada). Não há modalidade omissiva. A conceituação do que seja moléstia venérea é questão médica.

 

Crime impossível: Haverá crime impossível (CP, art. 17), por falta de perigo, se o ofendido já estiver igualmente contaminado.

 

Tipo subjetivo: É diverso para as três figuras:

Na primeira parte do caput ("de que sabe") é o dolo de perigo.

Na figura da segunda parte ("deve saber"), a locução verbal empregada parece indicar tratar-se de culpa. É essa a opinião da doutrina majoritária. Todavia, como os casos de culpa devem ser expressos (CP, art. 18, II, parágrafo único) e o princípio da reserva legal (CR/88, art. 5º, XXXIX; CADH, art. 9º; PIDCP, art. 15,  1º; CP, art 1º) não pode ser desrespeitado, parece-nos mais seguro apontar o dolo eventual e não a culpa. Também o núcleo empregado no tipo ("expor") e a previsão do § 1º reforçam essa nossa orientação.

Na figura do § 1º ("se é intenção") há dolo de dano (direto).

 

Consumação: Com a prática do contato sexual, independentemente do efetivo contágio que, se ocorrer, será simples exaurimento do delito.

 

Tentativa: Entende-se possível.

 

Concurso de Crimes: Haverá concurso formal se a exposição ocorrer junto com crime contra os costumes.

 

Confronto: Se não há contato sexual, o delito poderá ser o do art. 131 ou 132 do CP.

 

Classificação: É crime comum quanto ao sujeito, doloso (com dolo direto ou eventual, conforme a figura), de forma vinculada, de perigo (art. 130, caput) ou formal com dolo de dano (§ 1º), comissivo e instantâneo.

 

Pena: É alterativa na figura do art. 130, caput: detenção, de três meses a um ano, ou multa. Na figura do § 1º: reclusão, de um a quatro anos, e multa.

 

Ação Penal: É pública, mas condicionada à representação do ofendido, em qualquer das três figuras.

 

 

 

PERIGO DE CONTÁGIO DE MOLÉSTIA GRAVE

 

Objeto Jurídico: A incolumidade física da pessoa.

 

Sujeito ativo: Qualquer pessoa contaminada por moléstia grave.

 

Sujeito passivo: Qualquer pessoa, desde que não esteja infectada por igual moléstia.

 

Tipo objetivo: A ação punida é praticar ato capaz de produzir o contágio. Trata-se de forma livre, que abrange qualquer ato, desde que idôneo a transmitir a doença; a conduta pode ser direta ou indireta. Moléstia grave: o conceito é médico e ela deve ser transmissível por contágio; a gravidade e a possibilidade de contágio devem ser constatadas pericialmente.

 

Crime impossível: Haverá crime impossível (CP, art. 17) se o ofendido sofrer de idêntica doença.

 

Tipo subjetivo: Dolo de dano (direto e não eventual) e o elemento subjetivo do tipo que é o especial fim de agir: "com o fim de transmitir". É o "dolo específico", na corrente tradicional. Não há forma culposa.

 

Consumação: Com o ato capaz de contagiar, sendo indiferente que a transmissão se efetive.

 

Tentativa: teoricamente, é possível.

 

Classificação: Delito formal com dolo direto de dano, comum quanto ao sujeito, de forma livre, comissivo (para alguns também omissivo) e instantâneo.

 

Confronto: Se a moléstia for venérea e a exposição tiver sido por contato sexual, a figura será a do art. 130. Em caso de perigo comum, podem tipificar-se as infrações do art. 267, § 2º, ou 268 do CP.

 

AIDS: A Aids não pode ser considerada, rigorosamente, moléstia venérea. A sua transmissão pode se dar por inúmeras formas, tanto por pessoas contaminadas quanto não contaminadas; além da via sexual, pela própria gravidez, pelo uso de material cirúrgico e odontológico contaminados, pelo emprego de seringas usadas, por transfusão sanguínea, pelo ato de efetuar tatuagem ou acumputura com agulhas infectadas, por agressões com objetos cortantes ou perfurantes contaminados, etc.  Tratando-se de agente contaminado (único que pode ser sujeito ativo do delito do art. 131) e que agiu com especial fim de transmitir a doença (dolo de dano, direto e não eventual), haverá a incidência deste art. 131, e não do art. 130 (perigo de contágio venéreo). Havendo, todavia, efetiva transmissão da doença, o agente contaminado não incidirá no crime do art. 131, mas em outros tipos penais: lesão corporal gravíssima (art. 129, § 2º, II), lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º), homicídio doloso, tentado ou consumado (art. 121, caput). Tais tipificações dependerão da existência ou não de animus necandi, a ser apurado em cada caso concreto. Como lembra Carlos Maria Romeo Casabona, a comprovação, sempre difícil, do dolo do sujeito, nos indicará se é o delito de lesões corporais ou de homicídio o aplicável". Quanto ao eventual e tardio efeito morte, há autores como Bernd Schunemann, que entendem que esse resultado "é imprevisível" e "escapa por completo ao controle do autor", o que o tornaria impunível. Já entre nós, ao contrário, Hungria, muito antes do aparecimento da Aids sustentava que "é de presumir-se... o animus necandi, toda vez que o resultado morte é conseqüência normal da moléstia transmitida". Ressalte-se que, em qualquer caso, o eventual consentimento do ofendido em assumir o risco é indiferente, por serem a vida e a saúde bens indisponíveis. Tratando-se de agente contaminado que, agindo com culpa, transmitiu a Aids, igualmente não se configurará este art. 131 (que exige dolo direto), mas sim, lesão corporal culposa (art. 129, § 6º) ou homicídio culposo (art. 121, § 3º). Na hipótese de agente não contaminado (que não pode ser sujeito ativo do crime deste art. 131) e havendo efetiva transmissão da Aids, há que se distinguir se ele agiu com culpa ou dolo, bem como, no último caso, se houve animus necandi, para então verificar se a tipificação será a de lesão corporal culposa, homicídio culposo, lesão corporal gravíssima, lesão corporal seguida de morte ou homicídio doloso, consumado ou tentado.

 

Pena: reclusão de um  a quatro anos, e multa.

 

Ação penal: pública incondicionada.