CRÍTICAS

Jornal: Estado de Minas

Belo Horizonte, 28 de Janeiro de 2004.

“ADAPTAÇÃO DE “O ALIENISTA”, DE MACHADO DE ASSIS, PELA CIA FORTE DE TEATRO, FAZ JUSTIÇA AO AUTOR E DIVERTE A PLATÉIA.

A ALTURA DO ORIGINAL

Janaína Cunha Mello

Machado de Assis não se arrependeria. A adaptação do conto “O Alienista”, dirigido por Carlos Delgado, preserva do texto o que ele tem de melhor: ironia, humor e aquele rastro de sarcasmo que com tanta elegância o autor desferia a cada palavra engatilhada. E com as vestes da Cia. Forte de Teatro, a história do ilustre doutor que faz surgir o primeiro hospício da história ganha vitalidade. Dizer que pelo talento dos jovens atores seria demérito. Resultado assim só mesmo com muita leitura, pesquisa de linguagem, disciplina no fazer artístico e o entendimento de que o teatro e as artes em geral não dependem de inspiração, mas de entrega ao trabalho.

Os cinco atores em cena não exibem sincronismo perfeito nas marcações de cena, nas coreografias. Tampouco declamam suas falas com correção impecável. Felizmente. Eles fazem teatro com ritmo, com redenção e com todos os pequenos tropeços que a naturalidade exige. Em todo o espetáculo, sugerem encontros de linguagem com a ópera bufa, com a vitalidade circense e com a literatura, que pouco a pouco revelam o temperamento de cada personagem, alternando pontos de tensão com os momentos em que o leitor /espectador respira.

Consciente ou não de todos os recursos que experimenta, a companhia envolve a platéia em situações de graça, sem a obrigação da comicidade. Mas não se desfaz na horizontalidade e consegue conduzir os picos de reflexão sem o olhar sisudo da hipocrisia intelectual. Ao critério machadiano, muitas histórias se confrontam entre a loucura e a sanidade. Algumas com mais delicadezas, outras menos generosas, mas todas partes do cotidiano inevitável.

Para garantir a plasticidade de cada ambiente proposto pelo texto original, direção e produção apresentam soluções práticas, de fácil manejo e com resultado satisfatório. Longe do convencional, não precisam de água para chuva e lágrimas. Menos ainda de figurino sofisticado. Para isso contam com luzes bem pensadas, caras, trejeitos, movimentos e um olhar fixo na platéia, quase incomodativo.

Assistir à peça, no entanto, não dispensa a leitura do conto. Por mais bem acabada que seja a montagem, literatura e artes cênicas são obras distintas, não-complementares, ainda que este caso tenha resultado um casamento em que ambos se decifram sem culpas. Como um encontro raro”.

 

Jornal: Diário da Tarde

Belo Horizonte, 21 de fevereiro de 2003

TEATRO

“BOAS OPÇÕES ESTÃO NO ROTEIRO DA CAMPANHA

Marcelo Paolinelli

Nesta reta final da Campanha de Popularização do Teatro e da Dança, é possível que muita gente possa estar indecisa sobre quais peças priorizar no último final de semana do evento. Pensando nisso, o DT elabora uma espécie de “perfil” de alguns espetáculos, para que o leitor possa fazer suas opções.

Adaptação do conto homônimo de Machado de Assis, um dos maiores nomes da literatura brasileira, O Alienista é uma comédia deliciosa, que denuncia a loucura que cada um de nós traz. O diretor Carlos Delgado (que também atua na peça) conseguiu imprimir um tempo de comédia eficaz: não é aquela que o público ri o tempo todo, mas comobem disse a grande dama do teatro brasileiro, Bibi Ferreira, “fazer comédia é como tocar piano: não se pode apertar demais as teclas”.A história do cientista que, ao tentar retirar do convívio social todos os portadores de algum tipo de loucura, acaba concluindo que a norma é ser “anormal” é interpretada a contento pelo elenco, com boa movimentação de palco e direito a “pegadinhas” com pessoas da platéia. Tudo com humor, sem apelação”.

 

Jornal: Estado de Minas

Belo Horizonte, 06 de fevereiro de 2003.

“MONTAGEM DE “O ALIENISTA” RESPEITA O ESPÍRITO DA OBRA DE MACHADO DE ASSIS, COM SUA IRONIA EM TORNO DA LOUCURA

CLÁSSICO REVISITADO

Clara Arreguy

Uma boa surpresa entre os espetáculos desta segunda etapa da Campanha de Popularização do Teatro e da Dança é a montagem de O Alienista. Adaptada da obra de Machado de Assis, a peça basicamente respeita o original, embora se permita, em alguns momentos, apelar desnecessariamente para anacronismos, como ao citar personagens e situações do presente, como Itamar Franco ou George W. Bush, embora se passe na virada do século XVIII para XIX.

O Alienista é uma pequena novela, mas não deixa de ser uma das obras-primas do escritor brasileiro. Conta a história de Simão Bacamarte, cientista interessado em entender, catalogar e separar todos os tipos de loucura, para retirar do convívio social os portadores de qualquer psicopatia identificável. Á medida que aprofunda suas pesquisa, Simão Bacamarte vai constatando que mais e mais pessoas são loucas, até chegar ao paroxismo de concluir que a norma é ser “anormal”, e, portando, loucos seriam os normais.

Para dar voz à denuncia que Machado de Assis já fazia, com ironia genial, há mais de 100 anos, a Cia Forte de Teatro conta com um elenco preparado para se revezar em diversos papéis, sempre com graça e domínio da cena. A direção é de Carlos Delgado, que também interpreta o personagem principal e outros papéis. Embora predomine o equilíbrio entre os atores, Gláucia Enes é o destaque, principalmente quano faz Evarista, a mulher de Simão Bacamarte. Mas Elisângela Souza, Ronílson Otávio e Rubens Xavier também desincumbem-se bem das diversas situações cômicas do espetáculo.

Contribuem para a qualidade da montagem elementos como os figurinos e adereços de Márcio Gato, que ajudam a dar movimento e cor às cenas. Mas atenção: para quem tem medo daquelas cenas “interativas”, em que atores mexem com a platéia, é bom saber que a Cia Forte de Teatro usa este recurso com pelo menos três espectadores. Para uns é “pagar mico’, para outros, mera diversão. Para quem está assistindo, este é um dos momentos mais engraçados do espetáculo.