Texto de Carlos Gorjão, proprietário do Culver V (*)
Associação de Aviação Experimental: "Lusitanos"
O Culver V, também designado por Mooney 17, é um pequeno avião que reflecte o estado da arte do fim da década dos anos 40. A interpretação que "gurus" da indústria aeronáutica americana, Al Mooney, Walther Beech e Pappy Yankey faziam do mercado do pós guerra, era de criar um avião seguro, cómodo, fácil e rápido.
Foi com estes pressupostos em mente, que Al Mooney desenhou o seu décimo sétimo avião, o Mooney 17, antecessor do famoso Mooney 20, que em 1976, com designação de Mooney 20J, quebrou uma barreira importante no que diz respeito a performances: fazer mais de 200 mph com 200 HP. Mais precisamente, 201 mph, daí ter-se designado Mooney 201 20J, tendo contribuído para isso o famoso Roy Lo Presti. 1 milha par cada 1 HP é, segundo os especialistas, um indicador de excelência (atenção que a relação entre a potência e a velocidade é cúbica...)
O Culver V é um avião bilugar, todo em madeira, asa baixa, trem com retracção eléctrica, motor Continental de 85 HP com injecção e hélice de passo controlável hidraulicamente. Dispõe de flaps de grande dimensão, curiosamente interligados com o estabilizador horizontal. Quando se configura o avião para a aproximação, ao meter flaps, o avião é automaticamente compensado.
Trata-se dum avião bastante rápido para a potência que dispõe, fazendo 125 mph em cruzeiro a 75%. A aproximação deverá ser feita a 80 mph e a aterragem a 70 mph, em condições normais. Estas velocidades têm a ver com um factor de carga relativamente elevado. Este facto dá um certo prazer na pilotagem dado o seu comportamento ser semelhante a um avião maior. Dado o seu peso, 800 kg, e a sua diminuta potência, 85 HP, tem uma descolagem comprida, mas logo que está no ar e já com o trem recolhido sobe à razão de 600 pés por minuto a 75 mph.
Deixem-me então contar como é que este aparelho aparece em Portugal; o Culver V foi importado por uma empresa do Norte em 1947 e comprado pelo Casimiro de Oliveira, famoso piloto nortenho de automóveis de corrida, irmão do conhecido cineasta Manoel de Oliveira.
Em 1954 foi vendido ao Cmdt Douwens Vicente e mais tarde, em 1958, o nosso amigo Rui Grancha adquiriu-o. Na sequência de transformações que o actual proprietário queria introduzir no sentido de o simplificar e reduzir peso, retirando-lhe os sistemas de retracção do trem, gerador, motor de arranque e torná-lo de passo fixo, a DGAC apresentou alguns obstáculos, pois alterava o que estava previsto no Certificado Tipo. Assim o avião ficou parado largos anos.
Em 1979, quando pretendia localizar um avião tipo Cub para restaurar, descobri o Culver totalmente desmontado em Tires. Após a sua aquisição, desenvolvi longa pesquisa ao nível nacional e nos EUA para recolher o máximo de informação. Dado tratar-se de um avião raro - neste momento existem 6 a voar nos EUA- essa pesquisa levou-me a contactos com o FAA, e a uma deslocação aos EUA para contactar proprietários.
Em 1989 tinha então já tudo sobre o avião, informação e material. Após as formalidades com a DGAC no sentido de se fazer revisão geral, foram iniciados os trabalhos nas Indústrias Aeronáuticas de Coimbra.
Em Novembro de 1992 o nosso amigo Cmdt. Georgino fez o voo de ensaio. Em Fevereiro de 1993, após certificação, iniciei uma fase de testes em voo que levariam a anular todos problemas inerentes a um avião que acabou a revisão geral, e com o qual pouca experiência havia.
Hoje, depois de voadas três dezenas de horas, e tendo percorrido todos os aeródromos do litoral, de Espinho a Vila Real de St António, posso dizer que valeu a pena.
Não quero terminar sem deixar de agradecer:
aos responsáveis e técnicos do INAC, das Indústrias Aeronáuticas de Coimbra, da Aerosistemas, da Aerohélice, da Aerotécnica, do Aeroclube de Torres Vedras, do Aero Clube de Portugal;
ao Silvino, ao Ferreira Martins, ao Grancha, aos meus amigos americanos, Paul Ristine, Mat Risoldi;
e especialmente a minha mulher,
todo o apoio que me deram e que sem eles não teria levado a cabo este meu projecto. Também o meu agradecimento para o amigo Abílio Matos que desde a primeira hora me estimulou.
Texto publicado na Revista do Ar em 1994
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