Por PEDRO RIBEIRO
O disco foi apresentado num palácio neoclássico com o ambiente de uma festa do "jet set", mas as suas canções são acústicas e de raízes tradicionais. Os executivos da editora de Dulce Pontes falaram de estratégias de mercado e globalização, mas a cantora discorreu sobre a espiritualidade e a "verdade" da sua música. O novo álbum de Dulce Pontes chama-se "O Primeiro Canto", tem como ponto de partida os quatro elementos, e foi ontem apresentado em Sintra. Chega às lojas na segunda-feira. "Estou aqui não como apresentador de televisão mas sim como um admirador da Dulce Pontes. Pedia a todos uma salva de palmas para ela, pela grande qualidade do trabalho apresentado." Eládio Clímaco abriu assim a conferência de imprensa de apresentação do novo álbum da cantora, "O Primeiro Canto", que teve lugar ontem, no Palácio de Seteais, em Sintra. No cenário de um hotel de cinco estrelas, num ambiente mais requintado do que o habitual no lançamento público de um disco, os jornalistas presentes escutaram o quinto álbum de Dulce Pontes. A cantora fez-se esperar, mas respondeu a todas as perguntas de uma forma descontraída e orgulhosa - afinal, "O Primeiro Canto" é a sua "melhor experiência musical até agora". O disco tem como ponto de partida os quatro elementos - água, terra, fogo e ar -, utilizando quase exclusivamente instrumentos acústicos. "Queria transmitir uma busca da nudez, da essência tão simples destes instrumentos e sonoridades." A busca de Dulce Pontes levou-a a recorrer a músicos de várias partes do mundo, mas também a grupos tradicionais como o coro alentejano Ganhões de Castro Verde, as Adufeiras de Idanha-A-Nova ou o Rancho Folclórico de Riachos, "forças telúricas, do povo, que não se explicam, fazem parte do sangue". Não é só das "forças telúricas" da música tradicional portuguesa que "O Primeiro Canto" é feito. A cantora contou com a ajuda de artistas como Kepa Junkera (País Basco), Justin Vali (Madagascar), Wayne Shearer (Estados Unidos), Leonardo Amuedo (Uruguai) ou Waldemar Bastos (Angola), entre outros. E também com uma variadíssima gama de instrumentos, do saxofone ao litófono cromático, da gaita de foles sueca ao violoncelo, da "trikitixa" ao contrabaixo. O elo em comum entre todos é o facto de serem instrumentos acústicos, com excepção de um baixo eléctrico. "O conceito deste trabalho era explorar a pureza dos sons, que não pode haver num sintetizador ou numa guitarra eléctrica - não que eu tenha nada contra eles", contou Dulce. A caminho do sucesso de Bocelli "O Primeiro Canto" foi produzido por um "trio magnífico": a própria Dulce Pontes, com o holandês Albert Boekholt e o português António Pinheiro da Silva, que a acompanhou na apresentação. Do outro lado de Dulce Pontes sentavam-se dois executivos da sua editora, a Universal. Rudy Steenhuisen, administrador da Universal portuguesa, referiu que as lojas já compraram 30 mil cópias do álbum, que assim, na próxima semana, "deverá chegar à platina". A seguir, explicou o motivo porque o disco é editado pela divisão holandesa da Universal: "Permitimos a esta companhia assinar o contrato com a Dulce Pontes porque eles têm mais experiência a lançar artistas deste calibre, a nível mundial, como é o caso de Andrea Bocelli. Uma artista como a Dulce merece esta equipa holandesa, porque pode tornar-se num grande sucesso". Steenhuisen disse ainda que o futuro da música passa pelo "fim das fronteiras em todo o mundo", dando como exemplo o actual sucesso da música latino-americana ou o facto de o próximo álbum de Sting ser influenciado pela música de Marrocos e da Argélia. "Estamos a ter agora um grande sucesso [internacional] com artistas não anglo-saxónicos, porque há uma abertura a novos sons. A língua é só um elemento que dá cor à música, esta é global, transcende fronteiras." Para Dulce Pontes, há quatro anos, se calhar, isto não acontecia. "Este movimento começou pelo público. É bom haver música 'fast food', mas também é bom ouvir música de qualidade, em qualquer língua, desde que seja verdadeira [é interrompida pelo toque de um telemóvel; divertida, comenta "já estava a sentir falta disto..."], porque a função da música é transmitir paz e sentimento". A ideia de uma música "verdadeira" foi repetida pela cantora a propósito de "O Primeiro Canto". "Este é o caminho que eu quero seguir", diz. "Quando comecei, tinha uma grande identificação com o fado, apesar de quebrar regras, usando sintetizadores, bateria ou guitarras eléctricas. Antes de gravar, costumava ouvir a Amália na minha cabeça, é uma coisa que está nos genes, a Amália ou o Carlos do Carmo. Não é uma imitação consciente, mas é uma influência. Agora encontrei-me como cantora, se calhar por ter chegado aos 30 anos..." Apesar da sua satisfação com a direcção que seguiu em "O Primeiro Canto", Dulce não enjeita participar em projectos diferentes - por exemplo, em bandas sonoras de Hollywood, ou com o italiano Ennio Morricone, com quem canta em inglês. Afinal, como contou Rudy Steenhuisen, um dos objectivos pelo qual Dulce assinou pelo ramo holandês da Universal é permitir a sua internacionalização. E essa internacionalização prossegue já no início do próximo mês, com uma longa "tournée" de Dulce Pontes pelas principais cidades espanholas, a que se seguirão vários concertos na Holanda. Uma digressão com problemas logísticos difíceis de resolver, dado o grande número de artistas convidados em "O Primeiro Canto". Apesar disso, ficou prometido para Portugal "um grande concerto" no norte do país, talvez ainda este ano.
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