Cotidiano
de Belém está
retratado no Ver-o-Peso
Esta
construção histórica escolhida para retratar o aniversário
de Belém é, na verdade, um monumento vivo. A contemplação
é possível, mas o “rosto” do Ver-o-Peso é, mesmo, a dos
trabalhadores e clientes que fazem o dia-a-dia do mais famoso
cartão postal da cidade. São mais de dez categorias
profissionais em atividade na área.
O Ver-o-Peso
acorda por volta das 4 horas. As categorias vão despertando
gradativamente. Às vezes, o encerramento do trabalho de uns
é só o início do batente para outros. É o caso dos
vendedores de peixe. Começa com os barcos que trazem a
mercadoria.
O pescado é
desembarcado na chamada “pedra do peixe”. Entram em cena
os carregadores. São todos homens que circulam do barco até
o caminhão com os tabuleiros equilibrados na cabeça. Ao peso
da peça em madeira é somado o da carga que pode chegar a 100
quilos.
O trabalho
é sacrificante, mas os trabalhadores não se lamentam. José
dos Anjos de Souza ainda se mantém firme aos 73 anos. Pelos
seus cálculos, chega a dar 50 voltas entre as 4 horas e as
7h30, quando volta para casa. Tem sido assim há 40 anos.
Desse
período, conta que a venda já foi melhor, na década de 90.
Hoje, a concorrência é a maior e o ganho, menor. Mas o
trabalho permitiu que ele criasse os dez filhos. Agora pensa
em parar, só não sabe exatamente quando, porque para os
informais não há aposentadoria.
A
instabilidade financeira para quem quer parar ou para quem é
obrigado a parar é um dos problemas de quem trabalha no
Ver-o-Peso. “Isso aqui é uma aventura”, diz o carregador
Manoel de Jesus Maciel, de 47 anos, ao lembrar que, com 20
anos de trabalho, um tio quebrou a perna no trabalho e não
pôde mais continuar na profissão ou obter benefício
previdenciário.
Porém, a
feira, como tantos outros trabalhos informais, ainda é
atrativa para quem precisa trabalhar. Marinaldo Favacho
Soares, 31 anos, chegou há menos de um ano. Ele acorda às
2h30, no Benguí, para preparar o mingau que vai vender das 4
às 7 horas.
Enquanto ele
se prepara para ir embora começa o trabalho dos vendedores do
mercado de peixe. As barracas nos outros setores também
começam a ser montadas, como a dos salgados, das frutas, das
ervas e das comidas. Começa o serviço de Evanildo Araújo
Gomes, que permanece no mercado por cerca de sete horas. O
horário de maior pique é por volta das 9h30.
No entanto,
em 30 anos de Ver-o-Peso, afirma que todo o tempo é bom para
a venda porque trabalha feliz e trata o freguês com
educação. Já o vendedor de frutas, Anésio dos Santos, 63
anos, zela pela limpeza de sua barraca e dos vizinhos. O
problema é a falta de colaboração de alguns e a falta de
segurança.
Mas, como
garotos propaganda, todos afirmam que o Ver-o-Peso é o melhor
porque vende mais barato em qualquer dos setores. A dona de
casa Elvira Santos, de 43 anos, prefere conferir os preços em
várias barracas. Também prefere comprar o peixe quando o dia
ainda não está claro.
Moradora do
bairro da Cidade Velha, a dona de casa afirma que não se
incomoda com a confusão na “pedra do peixe”. Mas ela é
quase a única mulher a circular no local em que para comprar
é preciso desviar das bancas dos vendedores e dos
carregadores com seus tabuleiros na cabeça.
Complexo
viveu épocas de abandono
Em toda a
sua história, o Ver-o-Peso intercalou períodos de reformas
com abandono. A última reforma ainda está em andamento e,
como nas outras etapas, as últimas são retardadas não só
pela falta de recursos, mas também pela articulação dos
trabalhadores que terão seus espaços reformulados.
A última
reforma do Ver-o-Peso já custou R$ 14,6 milhões. Começou em
1999 com a recuperação do mercado de ferro, Solar da Beira e
Praça do Pescador. Dois anos depois foram entregues os
setores de ervas, hortifrutigrangeiros e caranguejos. A Praça
dos Estivadores também foi reformada.
As barracas
de comidas e alimentos secos demoraram mais um ano e a dos
importados só foi entregue ano passado, concluindo a reforma
do complexo até o final da Castilho França. Faltou a Praça
do Relógio, mercado de carne, pedra do peixe e Feira do
Açaí.
O início
dessa última etapa emperrou diante dos protestos dos
trabalhadores da praça e da Feira do Açaí que temem perder
o ponto após a conclusão. As reclamações e protestos
pontuaram as fases anteriores também quando foi necessário
fazer o remanejamento de barracas para espaços provisórios
nas ruas do centro comercial.
Por
enquanto, o conflito continua a impedir a próxima fase.
Patrimônio
arquitetônico foi construído
72 anos após a fundação de Belém
O Ver-o-Peso
foi criado em 1688, 72 anos depois da fundação de Belém.
Inicialmente funcionou como entreposto fiscal, quando a área
ainda era formada pelo igarapé do Piri. As mudanças mais
profundas foram executadas já no século XX quando a área
tomou o formato atual com seus mercado e praça.
Conforme os
escassos relatos da época, o local abrigou um porto de onde o
navegador Pedro Teixeira partiu com sua frota em direção ao
Amazonas, para cruzar a linha de Tordesilhas. Com o passar dos
anos, a criação do entreposto fiscal foi solicitada pela
Câmara de Belém.
Seria o
local onde se poderia pesar a mercadoria que deixava a cidade.
O nome Ver-o-Peso acabou se solidificando, mas as alterações
continuaram. O igarapé Piri, por exemplo, foi aterrado no
início do século XIX e, na sua foz foi construída a doca do
Ver-o-Peso.
No século
seguinte, o complexo voltou a sofrer alterações
impulsionadas pelo ciclo da borracha. O mercado de carne foi
ampliado e o Mercado de Ferro foi construído com material
pré-fabricado na França. Também
Historicamente,
o Ver-o-Peso é apontado como o local onde os revolucionários
da Cabanagem aportaram antes de chegar até o Palácio do
Governo.
Extraído
de Oliberal
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