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ENTREVISTAS
O MEIO INEXPLORADO
por William A. Christensen e Mark Seifert
- Novembro de 1993
Entrevista publicada originalmente na Wizard #27, Páginas
42-45
ALAN MOORE fala sobre o que o faz trabalhar como um escritor de
quadrinhos tão aclamado.
Alan Moore é o autor daquele que é, indiscutívelmente,
o trabalho mais aclamado pela critica e também a HQ mais influente
já criada: Watchmen, publicada pela DC Comics. Ele
também provou ser um dos mais competentes exploradores do meio,
examinando uma ampla diversidade de tópicos, como política
(V de Vingança), super-heróis (Miracleman
e Watchmen), humor (Maxwell, o Gato Mágico, publicado
nos EUA pela Acme Press), erotismo (Lost Girls), e horror
(Monstro do Pântano) com a mesma intrepidez. Depois de uma
estendida ausência nos quadrinhos de super-herói, Moore
recentemente retornou com a mini-série 1963, publicada pela
Image Comics, na qual ele examina a evolução do gênero.
Ele está atualmente trabalhando em Lost Girls com Melinda
Gebbie, Do Inferno com Eddie Campbell, e a mini-série
do Violador com Bart Sears. Recentemente, a Wizard
teve uma chance de falar com Alan sobre as suas excursões
pelos quadrinhos e além deles.
Wizard: Você parece ter um interesse pelo meio dos quadrinhos
mais do que tudo. Por que Alan Moore é um escritor de quadrinhos
em vez de novelista ou escritor de cinema?
Moore: Acho que uma razão por eu estar tão interessado
em quadrinhos é que, basicamente, é um meio inexplorado.
A maioria das outras mídias foram completamente exploradas. O Cinema
teve o seu Cidadão Kane, a literatura teve a sua Guerra
e Paz. Não que eu esteja dizendo aqui que não haverá
outros grandes trabalhos nessas mídias, ou que elas não
sejam dignas de ser exploradas, mas os quadrinhos são relativamente
inexplorados. Houve alguns trabalhos notáveis, mas provavelmente,
nós ainda temos que produzir a primeira grande Novela Gráfica.
Isso me excita como um artista - a sensação de que você
pode fazer uma diferença real nos quadrinhos porque você
ainda está lá na base deles. Você pode realmente influenciar
o modo no qual os quadrinhos serão vistos, o modo no qual eles
crescerão; tudo isso é muito, muito tentador para um artista.
Isso não quer dizer que eu não tenha interesses em outros
campos. No momento estou escrevendo meu primeiro romance sem quadros.
Uma vez, eu escrevi um roteiro para um filme. Eu entreguei um script,
e o filme jamais foi feito, porque até que eu tivesse pego a chance
de fazê-lo, eles já tinham tido três outros escritores,
e o filme já tinha utrapassado seus prazos finais e seu orçamento,
e assim, como muitos outros projetos em Hollywood, nunca foi feito. Embora
isso tenha sido agradável, percebi que estava provavelmente satisfeito
pelo filme nunca ter sido feito, porque o filme não teria mais
nada do meu roteiro. Foi por isso que adiei a oferta de escrever o filme
sobre Watchmen. Eu contei para Terry Gilliam que ele não
deveria tentar fazer um filme sobre Watchmen, porque era impraticável.
Foi por isso que quando me pediram que escrevesse o roteiro de RoboCop
2, eu pedi para ficar fora disso, e quando me pediram que fizesse
roteiro do filme do Surfista Prateado, eu disse que não
queria fazê-lo. Eu não estou interessado em escrever filmes;
não por não achar que os filmes tenham muito potencial,
mas por causa do modo como são feitos pela indústria. Percebi
que qualquer roteiro que eu escrevesse provavelmente seria dado a outros
escritores para ser reescrito, porque Hollywood tende a supor que se uma
coisa for escrita uma vez, será boa, e se for escrito duas vezes,
ficará bem melhor, e se for escrita três vezes, então
será excelente. Ao final do dia, o que vai aparecer na tela só
vai ter uma leve semelhança do roteiro que o escritor original
realizou. Nos quadrinhos, tenho ocontrole completo, e independente de
quem serão os artistas que irão trabalhar comigo, eles sempre
serão respeitados e estimados. Todo parágrafo e toda vírgula
que eu colocar naquele roteiro vão estar no quadrinho finalizado,
e há pouco parece tolice renunciar qualquer pedaço desse
controle apenas pela persuasão financeira de Hollywood. O dinheiro
sempre foi muito bem-vindo, mas ao mesmo tempo, isso nunca foi o motivo
principal. O motivo principal é ter um trabalho criativamente divertido.
Wizard: Como foi o seu início nos quadrinhos?
Moore: Foi por volta de 17 anos atrás. Sempre tive interesse
em escrever e desenhar desde que era criança, e tinha nutrido uma
vaga idéia que, um dia, seria bem divertido trabalhar nos quadrinhos.
Eu realmente nunca tinha feito nada com seriedade a respeito disso até
a idade de aproximadamente 25 anos, num ponto em que me achava casado,
com uma filha a caminho, trabalhando como um balconista em um posto de
gásolina local (de uma conhecida companhia de distribuição
de gasolina dos EUA). Eu pensei que realmente não queria estar
fazendo isso pelo resto de minha vida. Basicamente, me demiti e me lançei
na clemência do sistema de seguro social por uns dois anos. Um dos
jornais da época publicava tiras de quadrinhos de meia página
todas as semanas. Eu criei uma tira chamada Roscoe Moscou que era
um detetive particular surrealista. Ela foi publicada durante uns dois
anos. Não trouxe muito dinheiro, mas trouxe mais do que o seguro
social estava me entregando, o que era assustador - que eu estava de fato
ganhando a vida fazendo quadrinhos. Na ocasião, também fiz
uma tira de humor de cinco quadrinhos para um jornal local, chamada Maxwell,
O Gato Mágico. Depois de aproximadamente um ano, comecei a
perceber, para meu repentino horror, que eu não podia desenhar
de fato e nunca poderia seguir nenhum tipo de carreira como desenhista,
apesar de que naquela época, ter conseguido aprender algo sobre
narração visual (N. do T.: o chamado storytelling),
somente por manter aquele prazo final a cada semana.
Comecei a enviar meus roteiros para a 2000 AD e para a Dr.
Who Magazine. Eu comecei ter meus roteiros aceitos - não muitos
- mas não era um trabalho regular. Depois de um tempo, eu comecei
a ter mais e mais encomendas de roteiros, e percebi que eu podia eventualmente
deixam de desenhar e me concentrar completamente em escrever. Essa foi
a minha entrada no campo. Não era como entrar pela porta da frente
da Fleetway ou da Marvel ou da DC. Era mais mais
como rastejar pela porta dos fundos, envenenar os cães de guarda
e subir por cima da cerca.
Wizard: Miracleman, chamado de Marvelman naquele
momento, e publicado na Warrior Magazine, foi provavelmente seu
primeiro grande trabalho.
Moore: Aquilo foi uma velha idéia que eu tive quando tinha
aproximadamente 11 anos. Pela primeira vez, eu tinha comprado uma edição
encadernada da MAD feita por Harvey Kurtzman. Lá,
havia uma tira do SuperDuperman que foi uma maravilhosa experiência
transformadora. Ela simplesmente me deu uma percepção diferente
dos super-heróis que eu lia desde que tinha sete anos. Ela mudou
totalmente as coisas para mim. De repente, você podia ver as suas
ridículas falhas e fraquezas. Quando tinha 11 anos, o que eu quis
fazer foi plagiar com a minha própria e amadora maneira - Isso
não foi uma publicação - eu quis fazer uma coisa
semelhante à paródia que Harvey tinha feito ao Super-homem,
com um super-herói da casa, o britânico Marvelman,
que tinha estado por aí desde os anos cinqüenta. Ele era uma
cópia descarada do Capitão Marvel. O que aconteceu
foi que a companhia britânica Al Miller & Co. tinha publicado
os quadrinhos Capitão Marvel da Fawcett em uma série
de reimpressões britânicas em preto-e-branco. De repente,
o processo do Super-homem/Capitão Marvel aconteceu, e nos
50, o Capitão Marvel foi posto pra escanteio, o que repentinamente
significava que a Al Miller & Co. não tinha mais tantos
quadrinhos. Eles trouxeram um senhor chamado Mick Angelo, e eles
conseguiram que propusesse uma substituição. Basicamente,
ele usou um modelo da família Marvel para criar uma nova
família com personagens britânicos que eram muito, muito
parecidas. A palavra Shazam se tornou a palavra Kimota;
Dr. Sivana tinha ganhado uma fofa peruca preta e se tornou Dr.
Gargunza. De certo modo, eu achei aqueles quadrinhos fascinantes,
porque eram tão ingênuos e estranhos, como muitos quadrinhos
britânicos do período. Eu tinha mencionado em uma entrevista
para uma revista de ilustradores de tiras que sempre tive um vago desejo
de fazer uma nova versão do Marvelman. A Warrior
entrou em contato comigo, e perguntou se eu gostaria de fazer aquilo pra
eles, porque eles estavam em um processo de acertar a situação,
e parecia isso com a falência da Al Miller no início
dos anos 60, os direitos do personagem estavam disponíveis. De
forma que foi a primeira chance que tive de escrever uma série
regular e contínua, onde eu poderia desenvolver bastante um personagem
até o final da história. Também foi a primeira chance
que tive de escrever uma revista de super-herói - mostrar o que
eu poderia fazer com os super-heróis - o modo pelo qual eu pensava
que um super-herói poderia ser desenvolvido. Eu queria mostrar
os absurdos dos super-herói do mesmo modo que Harvey mostrou.
Sob vários aspectos, fez os super-heróis mais reais ao mostrar
personagens que comentam seus absurdos. O que eu estava fazendo era usar
a mesma coisa básica que Harvey tinha feito, mas em vez
de usar isto para efeito humorístico, como ele tinha feito tão
brilhantemente, eu estava tentando usar isto para efeito dramático.
Foi um tipo de nova margem sombria para os super-heróis que eu
não tinha experimentado antes, embora eu deva dizer que os super-heróis
constantemente estão sendo revisados. Stan Lee foi um revisionista
de super-heróis. Miracleman, penso eu, representou a primeira
revisão importante na natriz dos super-heróis que tinha
avançado após muito tempo. Foi colocado no mundo real, havia
emoções reais, havia pelo menos um enredo lógico
e acreditável. Foi uma experiência muito emocionante, e eu
tive muito sorte e privilégio ao trabalhar durante o percusso com
alguns artistas excelentes, inclusive Gary Leach e Alan Davis.
Foi provavelmente onde eu fixei os alicerces com os quais eu gostaria
de lidar com os super-heróis.
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