ENTREVISTAS

O MEIO INEXPLORADO

por William A. Christensen e Mark Seifert


Wizard: Quando você deixou a série, você sentia que você tinha feito tudo o que pôde com o personagem?

Moore: Eu sentia que tinha feito tudo que estava interessado em fazer com o personagem, porque naquele ponto, eu estava começando a ficar muito chateado com os super-heróis, e basicamente senti que não tinha nada mais a dizer depois de Watchmen. Eu tive que terminar Livro 3 de Miracleman após Watchmen, o que significa dizer que, após já ter dado minha última opinião sobre os super-heróis, eu teria que propor uma nova última opinião sobre os super-heróis. Isso foi um pouco problemático. O terceiro livro de Miracleman foi o mais longe que pude ir. Depois disso, foi muita sorte ter Neil Gaiman para assumir as rédeas. Neil foi minha escolha como substituto porque eu ainda acho que ele é o mais talentoso dos novos escritores de quadrinhos mainstream. Eu acho que a história do Andy Warhol em Miracleman é possivelmente o melhor texto solo de Neil de todos os tempos.


Wizard: De onde você tirou a idéia de fazer o personagem de John Constantine?

Moore: Basicamente, quando assumo o controle de algo como escritor, sempre tento trabalhar o mais próximo que puder com os artistas do título. Então imediatamente fiz o meu melhor para começar uma amizade com Steve Bissette e John Totleben. Eu lhes perguntei o que gostariam de fazer no Monstro do Pântano. Ambos me enviaram resmas de material. Coisas que eles sempre tiveram vontade de fazer no Monstro do Pântano, mas jamais pensaram que podiam realizar. Eu incorporei isso ao meu esquema de coisas, e tentei juntar tudo num contexto.

Um dessas breves notas era que ambos queriam fazer um personagem que se parecesse com o cantor Sting. Acho que a DC ficou com medo que Sting os processasse, embora ele já tivesse visto o personagem e comentado na Rolling Stone que tinha adorado a idéia. Ele ficou muito lisonjeado por haver um personagem de quadrinhos que se parecesse com ele, mas a DC ficou nervosa com tudo isso. Eles começaram a erradicar todos os rastros de referências nas introduções das primeiras revistas do Monstro do Pântano para que John Constantine só lembrá-se Sting. Assim, posso declarar categoricamente que o personagem só existiu porque Steve e John quiseram fazer um personagem que se parecesse com Sting. Tendo determinado esse desafio, como eu poderia colocar Sting no Monstro do Pântano? Tenho uma idéia de que a maioria dos meus personagens de quadrinhos são pessoas geralmente mais velhas, muito austeras, muito formais e muito classe média sob muitos aspectos. Eles não são funcionais nas ruas. Ocorreu-me que poderia ser interessante, pelo menos uma vez, fazer um sujeito de terno azul que fosse um quase bruxo. Alguém que tivesse um conhecimento das ruas, da classe operária, e de uma natureza diferente da que se convencionou nos quadrinhos místicos. Constantine começou a se originar a partir disso.

Há uma caso interessante que eu deveria contar e aconteceu comigo um dia desses. Eu estava em Westminster, Londres - isto foi depois de introduzir-mos o personagem - e eu estava sentado dentro de uma lanchonete. De repente, dos degraus, veio John Constantine. Ele estava usando um terno, de corte impecável - ele olhou - não, ele nem mesmo olhou exatamente como o Sting. Ele olhou exatamente como John Constantine. Ele me olhou, fitou-me diretamente nos olhos, sorriu, balançou a cabeça quase que conspiratoriamente, e então simplesmente andou para um canto do outro lado do bar. Eu estava lá sentado e pensando: eu deveria ir para aquele canto e vê se ele realmente estava lá, ou deveria apenas comer meu sanduíche e depois sair? Optei pela última alternativa; pensei que era o mais seguro. Não estou fazendo nenhuma reivindicação ou qualquer coisa assim. Apenas estou dizendo que isto aconteceu. Uma pequena e estranha história.


Wizard: Você foi inicialmente conhecido por escrever super-heróis sombrios; a mini-série de Violador para Todd McFarlane o leva de volta à isso?

Moore: Violador é violento, mas também é engraçado. Basicamente, a minha percepção atual dos super-heróis é que, durante algum tempo, tive uma completa aversão à super-heróis. Eu tinha dito que eles eram completamente inúteis, que eram simplesmente fantasias de poder, e eu não estava interessado em fazê-los, e eu não pude mais levar a sério a idéia de heróis. Ainda sinto muito dessas coisas, mas também vim a perceber que a razão pela qual comecei a ler quadrinhos foi por causa dos super-heróis. Esses super-heróis, apesar de tudo, eram divertidos. É como meus super-heróis favoritos - Homem-borracha, Fighting American, Capitão Marvel - você pode ver que os criadores desses quadrinhos tinham satisfação de estarem no meio dos quadrinhos.

A idéia de 1963 se cristalizou fora da Image. Senti que poderia usar este simples e sedutor mundo de super-heróis que queria criar para atacar alguns interessantes contrastes com os personagens da Image que representam os atuais quadrinhos de super-herói. Os personagens de 1963 são os requintados personagens de 1960 que poderiam ter vindos da Marvel. Senti que poderia ser instrutivo e interessante reunir os dois. Isso foi basicamente a idéia para a série, tanto quanto a idéia de fazer um conjunto muito simples, sedutor e divertido de super-heróis. No anual de 1963, nós reuniríamos os dois mundos. Nós teriamos aquela arte simplista em nossos personagens, e que inacreditavelmente a alta tecnologia de Jim Lee está traduzindo para os personagens da Image, e parecerá muito estranho. Como o modo que os personagens de 1963 se comportam. As mulheres de 1963 são próximas as mulheres de 1993. Só isso é um estudo de contrastes com o qual;, penso eu, posso preencher umas duas páginas.

Também, temos a atitude de violência. Em 1963, nem mesmo os vilões matavam. Eles certamente não quebraram as colunas cervicais das pessoas e aleijavam como o Shadowhawk de Jim Valentino faz regularmente. As coisas mudaram. Um personagem como Shadowhawk teria sido o pior vilão de todos na série 1963 sobre a qual nós estamos falando - personagem como Spawn - todo estes personagens. A atitude de violência é muito diferente. Vai ser um interessante estudo de contrastes. Eu acho que ainda há coisas com as quais eu possa me divertir com relação aos super-heróis. Isso não significa que o principal impulso de meu trabalho não está sempre na direção de materiais sérios, dos quais tenho mais entusiasmo. Meu trabalho mais importante no momento ainda Lost Girls e Do Inferno e - por favor, Deus, se nós ainda conseguirmos colocalos de volta nos trilhos - Big Numbers. Mas 1963 foi uma grande diversão. Nós ainda estamos considerando futuras possibilidades depois do anual de 1963, porque alguns destes personagens tivemos tanto prazer em criar, que parece uma vergonha jogá-los fora. Ainda não nos comprometemos com nós mesmos, mas poderia haver vida em 1963 depois do anual.

Wizard: O que aconteceu a Big Numbers?

Moore: Foi um catálogo de infortúnios do começo ao fim. Escrevi aproximadamente 200 páginas. Cinco episódios. Bill Sienkiewicz, depois de completar três episódios, sentiu-se vencido e ficou impossibilitado de continuar. É o trabalho mais exigente que já fiz, e imagino que deve ser muito exigente para qualquer outro artista. No caso de Bill, foi demais, e ele sentia que não seria bom, para ele ou para a série, continuar nela. Nós concordamos com isso, e assim Bill deu lugar, naquele ponto, para Al Columbia, que assumiu a função. Eu acredito que Al terminou uma edição, mas não estou certo do que aconteceu com ela. Al desistiu da série depois daquela edição. Eu pareço estar deixando estes artistas como ruínas fumegantes pelo fogo do entusiasmo. Este foi o trabalho de HQ mais avançado que já fiz em termos de storytelling. Estou comprometido com ele - nunca deixei um projeto inacabado, embora não possa desenhar por conta própria. Se pensasse que pudesse, eu iria em frente com ele. O que há neste livro que faz homens fortes chorarem e os policiais recolherem seus distintivos? Eu não sei. Estou determinado em terminá-lo, supondo que possamos encontrar um artista. No momento, acho que o projeto está em banho-maria, até termos certeza de que Lost Girls e Do Inferno continuem sendo publicadas até o final na Taboo (editora de Stephen Bissete). Eles serão publicadas como revistas trimestrais, sem serem descontinuadas. Queremos ter certeza que isso ocorra suavemente, e então discutirei comigo mesmo sobre o que diabos vamos fazer com Big Numbers.


Wizard: Que outros projetos importantes você tem em mente, enquanto Big Numbers fica em banho-maria?

Moore: Do Inferno é o projeto mais importante. Isso está assando no forno. A edição #8 é a única que acabei de terminar. Acho que temos quatro ou cinco capítulos para fazer, assim ele está começndo a ficar perto do final. O primeiro livro de Lost Girls está completo; Há outros dois livros para fazer. O romance no qual estou trabalhando é algo que estou muito interessado em fazer. Não é totalmente uma fantasia, mas há certos elementos fantásticos nele. É um romance histórico encenado em Northampton. Terá 12 capítulos, o primeiro deles é narrado em primeira pessoa por um personagem que vive numa Northampton paleolítica, quando a cidade tinha duas a três cabanas de barro e uma ponte. O segundo é narrado em primeira pessoa por um personagem totalmente desligado do primeiro que vive em Northampton durante a idade do bronze, em uma comunidade que começou a crescer, se desenvolvendo através das eras. Lentamente, nos movemos através dos séculos, até o décimo primeiro capítulo, que é narrado por mim na Northampton do presente. Basicamente, você verá uma comunidade crescer de um par de cabanas de barro à uma bagunça urbana espalhada no meio da província que o lugar é atualmente. O título do livro é Voz do Fogo. Vai passar muito tempo até que saia. Acho que cada um que acompanha meu trabalho recente sabe que me movo com uma lentidão glacial , mas eu sempre entrego o trabalho no final.


William A. Christensen
e Mark Seifert são colaboradores regulares da Wizard

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