"O caminho, para existir como caminho,
não
pode permanecer como absoluto."
Lao-Tsé
Prólogo
A estrada seguia em linha reta à sua frente, quase não havia curvas. A
paisagem passava rapidamente pelos vidros laterais e o ruído monótono do motor
era a única coisa que escutava. Não sabia para onde se dirigia, tinha apenas
certeza de que não queria ficar aonde estava. Tinha necessidade de estar sempre
partindo. Fugindo talvez fosse a palavra mais certa. Fugia de um fantasma que o
perseguia há anos e que desejava esquecer. Mas ele não o abandonava...
O sol se aproximava do horizonte, e logo escureceria. Se não chegasse a
alguma cidade, teria que passar a noite no carro. Gostava de dormir assim,
contemplando as estrelas. Concentrou-se nesse pensamento para tentar afugentar o
sono. A monotonia da paisagem e do ruído do motor começou a tomar conta dele.
Tinha que resistir. Pouco a pouco as lembranças foram aparecendo em sua mente.
Não queria lembrar de novo. Por que não o deixavam em paz? Por que insistiam
em persegui-lo?
Tentou afastar os pensamentos de sua mente, mas eles insistiam em ficar.
A noite já havia caído por completo e, no horizonte, podia-se ver uma pequena
estrela esverdeada e pálida. Não a notou. Tentava lutar com suas lembranças,
mas sabia que era em vão. Elas acabariam vencendo-o novamente. Não tinha forças
para resistir.
Parou o carro à beira da estrada. Sentou-se sobre o capô e pôs-se a observar as estrelas. Gostava de conversar com elas. Chamava-as de suas amigas. Uma idéia passou rapidamente pela sua cabeça. Não custava tentar, talvez assim elas o deixassem em paz. Tomou o pequeno caderno que sempre carregava consigo e, à luz pálida que vinha do interior do carro, pôs-se a escrever...