
Plotino
por
Carlos Antonio Fragoso Guimarães

Música: Noturno Op. 9, nº 1, de Chopin
Plotino e o Neoplatonismo
"A aspiração do homem não deveria limitar-se a não não ser culpado,
mas a ser Deus."
Plotino
Durante o período helenístico pós-Alexandre e, posteriormente, no período
Imperial Romano, desenvolveram-se várias escolas de filosofia. Entre elas se
destacam a dos cínicos, a dos estóicos e a dos epicuristas. Embora sejam escolas
com características bem próprias, todas elas tinham por ponto de partida os
ensinamentos de Sócrates e/ou dos
pré-socráticos Demócrito e Heráclito. Mas, sem dúvida alguma, a mais importante,
bela e orignal das escolas do final da Antiguidade foi inspirada pelo gênio de
Platão. Por isso
ela é chamada de neoplatonismo, se bem que ela seja, de fato, um
aperfeiçoamento extraordinário do pensamento filosófico grego, com matizes bem
mais originais e estruturadas do que tinha o pensamento platônico. De fato, a
escola neoplatônica nos parece extremamente atual, hoje em dia, devido às
grandes similiridade entre a visão e concepção de mundo que emergem de seus
pressupostos filosóficos básicos e a atual visão de mundo que surge da Física moderna, da
Teoria Geral dos Sistemas e da Psicologia
Transpessoal. A figura mais importante do movimento neoplatônico foi
Plotino.
Plotino nasceu em 205 da era cristã, em Licópolis,
permanecendo quase toda a juventude em Alexandria até 243 d.C., quando deixou a
cidade para seguir o imperador Jordano em sua expedição oriental. Morto Jordano
no meio de sua expedição, Plotino deicide ir à Roma, onde chegou em 244 d.C.,
fundando uma escola, espelhando-se no exemplo de seu mestre e real modelador do
movimento neoplatônico: Amônio Sacas.
Pelos escritos de um
discípulo famoso de Plotino, Porfírio, sabemos que Amônio foi um jovem
brilhante, educado no seio de uma família cristã. Mas depois que passou a se
dedicar à filosofia, Amônio, por inclinação e vontade próprias, se voltou
novamente ao paganismo (talvez por achar mais liberdade por buscar um caminho
próprio de entendimento). Segundo Porfírio, ele tinha um alto conhecimento da
filosofia de sua época, e, tal como mais tarde faria Plotino, aprofundou-se de
tal modo na vivência da filosofia ao ponto de "ter uma experiência direta
seja da filosofia praticada pelos persas, seja daquela preponderante entre os
hindus" (Porfírio, Vida de Plotino). Outras referências a Amônio são
encontradas em obras de Teodoreto, que era um bispo cristão, Hiérocles de
Alexandria e em Nemésio, bispo de Emesa.
Amônio preferiu não se dar a
público, rejeitando pertencer ao círculo de celebridades consagradas de seu
tempo, talvez por sentir uma certa instabilidade emocional no ar entre as
escolas cristãs e pagãs, e, por isso viveu de forma modesta e esquiva,
afastando-se do burburinho do mundo e cultivando a filosofia não apenas como um
exercício de inteligência, mas também de vida e de aperfeiçoamento espiritual,
buscando uma percepção direta, de cunho místico (no sentido transpessoal do
termo), da realidade, ou da essência, da existência, juntamente com alguns
discípulos mais indentificados com a sua mensagem.
Tal como Sócrates e Jesus, Amônio nada
deixou escrito, mas sua doutrina foi levada adiante e aperfeiçoada pelo gênio de
Plotino, tal como, antes, a mensagem de Sócrates foi perpetuada pelo testemunhos
de Platão e Xenofonte. Amônio é apresentado como um filósofo que, elevando-se
acima das disputas e das plêmicas das outras escolas filosóficas, soube
conciliar Platão e Aristóteles e a transmitir a seus discípulos, sobretudo a
Plotino, uma filosofia livre do espírituo de polêmica, muitas vezes resultante
da mera vaidade pela disputa intelectual. Conta-se que Plotino, chegando a
Alexandria, teria ouvido a todas as celebridadas da época, cristãs e pagãs, mas
continuava insatisfeito. Levado por um amigo a Amônio, depois de te-lo ouvido
falar apenas uma vez, teria dito: "Este é o homem que eu buscava!", e tornou-se
seu discípulo por onze anos. Não é à-toa que nos vêm à mente que a relação entre
Amônio e Plotino tenha alguma semelhança com a que existiu entre a de Sócrates e
Platão. Outros discípulos famosos de Amônio foram Orígenes, o Pagão, Longino,
Erênio e Orígines, o Cristão.
Após fundar sua escola, em Roma, Plotino
passou de 244 d. C. a 253 d. C. apenas ministrando lições, sem nada escrever,
por respeito a um pacto que fizera com Erênio e Orígines, o Pagão, no sentido de
não divulgar a doutrina de Amônio. Mas logo seus colegas romperam o trato,
permitindo a Plotino escrever tratados, nos quais fixava suas lições. Todos os
seus escritos foram ordenados mais tarde por seu discípulo Porfírio, que os
dividiu em seis grupos de nove tratados, de onde veio o título Enéadas
(leia a tradução inglesa na internet: The Six Enneads by
Plotinus - infelizmente, estes textos magníficos não foram traduzidos ainda
para o português), pois, em grego, nove se escreve ennea. Estes escritos
chegaram integralmente até nós, por sorte, e eles são, juntamente com os
diálogos platônicos e os escritos esotéricos de Aristóteles, uma das mais
elevadas e sublimes mensagens filosóficas da Antiguidade. Através deles, podemos
perceber o grau de profundida espiritual do pensamento de Plotino, intensamente
carregado de imagens poéticas, onde vemos lindamente explicadas fenômenos tais
como a saída da alma do corpo (projeção), a análise do Uno (holos), como e
porque existem um mundo físico e um outro espiritual, etc.
Plotino
possuia um carisma especial, e gozou de enorme prestígio em sua época. E seu
fascínio era tal que chegou a exercer uma profunda influência sobre a própria
teologia cristã, como sabemos pelos testemunhos de Eusébio, do bispo Teodoreto,
etc. Suas lições eram assistidas até mesmo pelo imperador Galiano e sua esposa
Solonina, e foi tal o impacto que Plotino exerceu sobre eles que o imperador
chegou a examinar um projeto de fundar uma cidade de filósofos que deveria se
chamar Platonópolis. O projeto não foi adiante devido às tramas dos
cortesãos.
Plotino morreu aos sessenta e cinco anos, em 270 d. C. Suas
últimas palavras ao médico Eustóquio foram: "Procurai sempre conjugar o
divino que há em vós com o divino que há no universo".
Segundo Reale
& Antiseri, a escola de Plotino não se assemelhava a nenhuma das escolas
filosóficas anteriores: Platão havia fundado a Academia para a formação de
homens que pudessem renovar o Estado; Aristóteles havia fundado o Liceu para
organizar e sistematizar a busca do saber; Epicuro havia fundado seu movimento
visando dar aos homens a paz e a tranquilidade da alma. Já a escola de Plotino
visava ensinar aos homens um modo de entrarem em contato direto com uma
realidade mais abrangente, e reunir-se com o divino, de uma forma que hoje
chamaríamos de uma experiência direta de cunho transpessoal.
Ele dizia que o mero conhecimento intelectual pouco será diante da certeza, da
experiência direta das realidades supra-sensíveis. Estas possuiam uma riqueza e
uma força transformadora da percepção humana que dificilmente poderiam ser posta
em palavras. Aliás, isto é também o que dizem todos os grandes e verdadeiros
místicos, santos e pensadores da humanidade, como Mestre Eckhart,
São Juan de La Cruz, etc. O fato é que, tal como ocorre em algumas formas de
psicoterapia, notadamente a psicologia junguiana e as abordagens existenciais,
há fatores significativos em nosso desenvolvimento psíquico que se colocam como
indefiníveis, mas altamente significativas a nível intuitivo, já que termos
abstratos não são suficentes para descreve-los. Enquanto para a mioria das
pessoas, em nossos dias, a única abordagem compreensível da realidade baseia-se
na definição de tudo através de conceituações literais, lineares, racionais e
impessoais, algumas outras redescobrem que o universo intuitivo pode ser tão ou
mais abrangente quanto este causal universo racional. Entre estas pessoas
podemos citar Albert Einstein e Carl Gustav Jung.
Aliás, Jung julgava ser a intuição e o sentimento faculdades indispensáveis para
uma vivência adequada da psique, pois é apenas através de todos os seus
elementos (pensamento, sentimento, sensação e intuição) que podemos tentar
entendê-la. As dificuldades que a pessoa moderna encontra ao tentar compreender
a verdadeira abordagem "mística" (não o fácil e simplório misticismo que
vemos sendo vendido a torto e a direito em cada esquina e nas bancas de
revistas, mas o real misticismo que vem de dentro da alma) baseia-se no fato de
que, como reação à tendência altamente introvertida, supersticiosa e ao
obscurantismo da Igreja medieval, o desenvolvimento científico ocidental recente
enfatizou excessivamente o pensamento objetivo abstrato, linear e racional. Este
desenvolvimento preocupou-se exclusivamente com a utilização prática de objetos
externos e necessidades externas e, em nossos dias, culminou no extremo
racionalismo lógico e impessoal de nossa sociedade. Assim, a capacidade de
sentir e a de intuir não recebem valor ou não são levadas em consideração; os
sentimentos são até mesmo considerados como algo dispensável, e as intuições são
vistas com desconfiança. Esta é uma abordagem que já vem demonstrando ser falha
há muito tempo, já que não é capaz, entre outras coisas, de compreender a
motivação básica do comportamento moral do ser humano, por exemplo, que se
baseia em alicerces emocionais. Estas áreas até podem ser racionlaizadas, mas a
razão em si dificilemente as atinge, pois se assim fosse os cientistas já teriam
solucionados problemas como a violência, o suicídio, a apatia, a depressão (que
hoje já virou epidemia) e outros males da alma. Os apelos racionais são pouco
eficientes quando comparados aos emocionais. Nossa cultura é voltada para a
lógica, mas, ao lidar com problemas mais profundos, esta mesma lógica é incapaz
de nos oferecer respostas adequadas à compreensão da vida e de seus mistérios.
Por que, então, negarmos como fantasias ou irrealidades os fenômenos místicos?
Talvez o estado de vigília - considerado o estado pradão normal - seja apenas um
de vários níveis de consciência possível ao psiquismo humano. Para maiores
detalhes, veja a
Psicologia Transpessoal.
A Mensagem de Plotino
Plotino, segundo Jostein Gaarder, via o mundo fenomênico e humano como algo
que está entre dois polos: Numa extremidade está o divino, de onde tudo vem e
para onde tudo vai, ao qual ele chamava de Uno. Plotino abraçava uma
concepção holística do
universo (é pena que a palvra holismo esteja, hoje em dia, misturada com
uma falácia de lixo pseudo-místico, que lhe tiram o signficado real). Às vezes
Plotino chamava o Uno de Deus. Na outra extremidade estaria aquilo que
Plotino chamava de reino das sombras, onde apenas uma fração ínfima da luz
divina chegava. Mas Plotino usava estas metáforas apenas como uma figuração
didática. Ele dizia, por exemplo, que estas trevas não tinham uma existência
concreta. Elas eram apenas a ausência momentânea da Luz Divina, como mais tarde
Mestre Eckhart
diria que a matéria era a condensação de algo espiritual. Assim, sendo este
extremo apenas ausência de luz, as trevas não são. Elas apenas
estão na escuridão. A única existência real é a existência da odem
implícita que causa o mundo fenomênico mutável. Assim, só Deus é o real. Mas,
assim como uma fonte de luz pouco a pouco se perde na escuridão, também podemos
imaginar um lugar onde os raios divinos chegam muito fracos, o que Plotino
identificava com a matéria. Mas até mesmo a matéria possui um pouco da luz
divina. Sabemos hoje em dia, pela Física, que a matéria nada mais é que uma
condensação de algo mais sutil: a nergia.
Eis um belo resumo das
analogias poéticas da obra de Plotino (e, por ligação, de Amônio Sacas) dada por
Jostein Gaarder:
"Imagine uma enorme fogueira creptando no meio da noite. Do
meio do fogo saltam centelhas em todas as direções. Numa amplo círculo ao redor
do fogo a noite é iluminada, e a alguns quilômetros de distância ainda é
possível ver o leve brilho desta fogueira. À medida que nos afastamos, a
fogueira vai se transformando num minúsculo ponto de luz, como uma lanterna
fraca na noite. E se nos afastarmos mais ainda, chegaremos a um ponto em que a
luz do fogo não mais consegue nos alcançar. Em algum lugar os raios lumiosos se
perdem na noite e se estiver muito escuro não vamos enxergar nada. Nesse
momento, contornos e sombras deixam de existir".
"Agora imagine a realidade
como sendo esta enorme fogueira. O que arde é Deus - e as trevas que estão lá
fora são a matéria fria, onde a luz está fraca, da qual são feitos homens e
animais. Junto a Deus estão as idéias eternas, as causas de todas as criaturas.
Sobretudo, a alma humana é uma 'centelha do fogo'. Mas por toda a parte na
natureza aparece uma pouco desta luz divina. Podemos vê-la em todos os seres
vivos; sim até mesmo uma rosa ou uma campânula possuem um brilho divino. No
ponto mais distante do Deus vivo está a matéria inanimada".
"Digo que
tudo o que vemos tem um pouco do mistério divino. Podemos ver o brilho desta
alguma coisa num girassol ou numa papoula. Percebemos um pouco mais deste
insondável mistério numa borboleta que pousou num galho, ou num peixinho dourado
que nada no aquário. Mas o ponto mais próximo em que nos encontramos de Deus é
dentro de nossa própria alma. Só lá é que podemos nos re-unir com o grande
mistério da vida. De fato, em alguns raros momentos" - como falam Jung e Maslow - "podemos
sentir que somos, nós mesmos, este mistério divino". O psicólogo americano
Abraham Maslow fez exaustivos estudos provando a existência destas
experiências culminantes, frequentemente impossíveis de serem expressas
em palavras sem que se percam grande parte de sua força extraordinariamente bela
e luminosa, e o onde a sensação de íntimo encontro com algo transcendete
é o leitmotiv dominante.
As imagens que Plotino usa, e que Jostein
Gaarder acabou de resumir, nos remetem ao mito da caverna de Platão. Mas enquanto
Platão é dualista, distinguido de forma estanque a oposição entre o espírito e a
matéria, Plotino nos aponta para a realidade de que o isto está também
ligado ao aquilo (como também falava Buda), que o universo é uma imensa
rede de relações onde tudo tem sua razão de ser no conjunto, no
holos. Tudo está ligado a tudo, e tudo é Um, pois tudo concorre
para o andamento da obra de Deus. Até mesmo as sombras têm uma tênue parte desta
"Unidade" ((holismo)).
Em
alguns momentos de sua vida, Plotino experimentou a vívida sensação de unir,
fundir sua alma com Deus. Em nosso século, Abraham Maslow fez uma enorme
pesquisa para provar que as pessoas mais saudáveis e carismáticas
experimentaram, pelo menos uma vez na vida, uma espécie de experiência de pico
(as Peak Experiences de Maslow) onde parece que as divisões convencionais
do intelecto humano parecem perder todo o sentido, e a pessoa sente-se plena de
uma paz e de um contato mais íntimo com algo transcendetal. Chamamos a este tipo
de experiência de experiência mística. Plotino, porém, como sabemos, não
foi único a viver essa experiência. Como nos fala Jostein Gaarder, pessoas de
todas as culturas, em todos os tempos, têm relatado experiências semelhantes.
Hoje o estudo dessas experiências é feito pela Psicologia
Transpessoal. E um ponto básico destes relatos é o de que, embora
ocorram variantes na descrição desses fenômenos - devido ao pano de fundo
cultural e às crenças do sujeito -, esses relatos têm muitos e supreendentes
pontos em comum.
Misticismo
Em praticamente todos os relatos
sobre os chamados êxtases místicos, desde Plotino (e mesmo antes dele)
até os dias de hoje com os pacientes/clientes da psicoterapia transpessoal, o
que vemos é uma espécie de união íntima com algo que transcende nossos conceitos
de realidade, que é difícil de por em palavras. Na nossa cultura cristã - embora
o próprio Cristo tenha relatado muitas vezes que ele se sentia um com o Pai, de
dizer que "vós sois deuses" e de que "O Reino está em vós" - o
padres, pastores e teólogos vários nos inculcam que Deus fez o mundo sem que se
envolvesse com o mundo, ou seja, que há um abismo entre Deus e sua criação. Deus
teria feito as coisas e estaria apenas observando o andamento do drama
universal, às vezes interferindo momentâneamente em algo, nos chamados milagres.
Mas no oriente, especialmente no budismo e no taoísmo, e no ocidente, nas
religiões originais dos celtas e gauleses (druidas), bem como em alguns de
nossos índios da América do Norte e do Sul, em em todos os místicos de
qualquer religião, o que se vivencia é uma sensação de união, onde este abismo é
desconhecido (veja-se os relatos de Teresa D'Ávila e Juan de la Cruz). O que ele
- ou ela - conhece é uma elevação a Deuss (Gaarder, 1995; Grof, 1988; LeShan,
1994).
Carl
Gustav Jung e Joseph Campbell, bem
como Plotino, nos dizem que aquilo que chamamos comumente de "eu" não é nosso eu
verdadeiro, é apenas uma máscara, o ego. Em momentos de profundo amor e/ou
emoção ou paz podemos sentir rapidamente uma espécie de contato com um eu mais
profundo, que Jung chamava de self, e que alguns místicos chamam de
Cristo interior. Alguns vão ainda mais além, e se sentem unidos ao próprio Deus,
ou a uma "consciência cósmica" - termo muito utilizado na Psicologia
Transpessoal. O místico cristão Angelus Silesius (1624-1677) assim se
expressou sobre esta experiência: "A pequena gota (o indivíduo) se transforma em
mar quando chega até ele; e assim a alma se transforma em Deus quando é nele
acolhida" (Gaarder, 1995, p. 154).
Ora, o ego pode se revoltar contra a
possibilidade de perder o controle e a pessoa se "perder a si mesma" nesta fusão
íntima com a consciência cósmica, mas, como muito bem disse Jostein Gaarder,
esta pseudo-perda (na verdade o ego não é eliminado, continua a existir) é algo
muito insignificante diante daquilo que se ganha (veja-se a parábola de Jesus
sobre o semeador que encontra uma pérola no campo, e vende tudo o que tem para
comprar aquele campo). O místico perebe que seu ego é apenas uma parte ínfima de
si mesmo. Compreende que o "eu" real é algo infinitamente maior. Compreende que
faz parte do universo inteiro, que é Deus. É por isso que os hindus dizem que o
Eu é o maior amigo do ego, mas o ego é o pior inimigo do Eu. Ora, como nos diz
Jostein Gaarder, se tememos nos perder enquanto indivíduos num mundo que para
nós é a realidade (o mundo comum), talvez sirva de consolo e estímulo saber que
um dia de qualquer forma termos de perder este "eu cotidiano" de uma forma ou de
outra. Por que não tentar experimentar o verdadeiro Eu conseguindo-se se
libertar do jugo de um eu egóico? "Aquele que quiser conservar sua vida,
perde-la-á, e aquele que quiser perder sua vida, por amor à verdade, a ganhará",
já dizia o Cristo.
Jostein Gaarder aponta com muita propriedade que
encontramos vertentes místicas em todas as grandes religiões do mundo. "E tudo o
que os místicos escrevem sobre suas experiências apresenta visíveis semelhanças,
a despeito de todas as diferenças culturais. Somente quando o místico tenta uma
interpretação religiosa ou filosófica para a sua experiência é que se evidencia
o pano de fundo cultural". (Jostein Gaarder, O Mundo de Sofia, 1995, p.
155).
Pelos trabalhos em Psicologia, especialmente na Psicologia
Junguiana, na Gestalt Terapia e nas terapias humanistas, e principalmente nas
Psicoterapias de orientação Transpessoal, sabemos que pessoas que não pertencem
a nenhuma religião têm passado e relatados experiências místicas. Elas
experiementam espontâneamente algo que chamam, entre outras coisas, de
"consciência cósmica" ou, como Freud chamava, de "experiências oceânicas": neste
momento, tempo e espaço e outras limitações físicas não passam de figurações
fantasiosas da percepção humana. A única coisa que existe é a sensação de
completude e consciência de se estar imerso e lúcido de uma realidade maior e
mais bela.
Bibliografia Sugerida
Campbell, Joseph, O Poder do Mito, Palas Athenas São Paulo,
1990
Porfírio. Vida de Plotino/Eneadas I-II, Editora Gredos, Madrid,
1996.
Grof, Stanislav. Além do Cérebro - Nascimento, Morte e
Transcendência em Psicoterapia, McGraw-Hill, São Paulo, 1988
Reale,
Giovanni & Antiseri, Dario. História da Filosofia Vol. I, Ed. Paulus,
São Paulo, 1990
Gaarder, Jostein. O Mundo de Sofia, Companhia das
Letras, São Paulo, 1995
LeSham, Lawrence. O Médium, o místico e o
físico, Summus Editorial, São Paulo, 1993
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