N/D
- Pré-diagnóstico da Situação da Horticultura em Puerto Suarez, Bolívia
Alexandre
Dinnys Roese e
Vanderlei
Donisete Acassio dos Reis
Devido à localização na fronteira com
a Bolívia, e também à grande carência de assistência técnica na área
da produção rural no país vizinho, é freqüente a procura por esse
tipo de informações na Embrapa Pantanal, por parte principalmente dos
produtores rurais bolivianos que trabalham ou residem próximos à divisa
com o Brasil, na cidade de Corumbá, MS. Imbuída de um espírito de
solidariedade, e preocupada com a conservação ambiental no bioma
Pantanal, os técnicos e pesquisadores da Embrapa Pantanal atendem, sempre
que possível, a essa demanda. Exemplo disso é o caso da horticultura,
relatado a seguir. No caso específico da horticultura, além dos aspectos
mencionados acima, destaca-se o fato de que quase toda a produção hortícola
do município de Puerto Suarez, na Bolívia, é comercializada e consumida
no Brasil, nas cidades de Corumbá e Ladário, e em virtude disso existe a
preocupação da Embrapa Pantanal quanto à segurança alimentar da população
local.
A atividade hortícola teve início há
pouco mais de uma década em Puerto Suarez, sendo a produtora mais antiga
a Sra. Mary Moron, que iniciou suas atividades há 14 anos, e atualmente
é a presidente da Associação de Horticultores desse município. Segundo
essa entidade, há aproximadamente 50 horticultores na região peri-urbana
do município, dos quais 23 estão associados.
Há também cerca de 50 horticultores na
região rural, porém não filiados à associação. Segundo Hebert
Sanchez Chavez, Secretário da Câmara Municipal de Vereadores, o município
conta com aproximadamente 11.000 habitantes. Visitou-se 9 áreas de produção
de hortaliças no município, sendo 7 na região peri-urbana e duas na
região rural. A mão-de-obra predominante é a familiar, sendo a
horticultura a única ocupação econômica para a maioria destas pessoas,
e observa-se, em alguns casos, a utilização de mão de obra infantil. A
atividade é praticada em pequenas áreas, de aproximadamente um a dois
hectares, freqüentemente com permissão de uso da terra no sistema de
parceria (“meeiros”) ou arrendadas (a única exceção é a Sra. Mary
Moron que é proprietária da área onde explora a atividade), com metade
da produção ou do valor desta destinada ao proprietário da terra.
Observa-se, na região, duas épocas de
produção bem definidas, sendo a primeira de março a agosto, coincidindo
com o período de menor precipitação pluvial e temperaturas mais baixas
(conhecido como “época da seca”), e a segunda de setembro a
fevereiro, quando a temperatura e a precipitação são mais elevadas
(conhecido como “época das águas”). A produção de hortaliças é
mais intensa no período seco, quando produz-se, predominantemente,
alface, tomate, couve, couve-flor, pimentão, acelga, espinafre, repolho,
beterraba, acelga e cenoura. Já no período chuvoso a produção
predominante é de alface, couve, cebola, alho e agrião. É pequena a
utilização de cultivo protegido, tendo-se observado apenas a utilização
de sombrite ou folhas de palmeiras, principalmente o acurí, para
proporcionar sombreamento artificial. A produção hortícola tem
finalidade comercial, não tendo sido observado produção exclusiva para
o consumo de subsistência, nem mesmo em lotes urbanos ou nos quintais das
residências.
A maioria dos insumos, como sementes, uréia
e ferramentas, são adquiridos na cidade de Corumbá, MS, exceto o esterco
bovino, principal fertilizante empregado, que é adquirido gratuitamente
em fazendas de criação de gado de corte nos arredores do município, e
os inseticidas e fungicidas, que são adquiridos na cidade de Puerto
Suarez. A produção das mudas é realizada independentemente em cada
propriedade, não existindo produção especializada de mudas, sendo essa
atividade realizada próxima dos cultivos e sem qualquer medida de exclusão
de pragas e doenças. Alguns horticultores estão iniciando o uso de húmus
de Minhocas Vermelhas da Califórnia (Eisenia feotida), tendo obtido as
matrizes na Universidade El Vallecito, na cidade de Santa Cruz de la
Sierra, distante aproximadamente 600 km de Puerto Suarez.
Apesar da presidente da Associação de
Horticultores incentivar o cultivo “orgânico”, caracterizado pela não
utilização de agroquímicos, é freqüente a utilização desses
produtos, destacando-se os fungicidas Oxicloreto de Cobre, Mancozeb,
Metalaxyl + Mancozeb, e os inseticidas Malathion, Methamidophos e
Parathion Methyl.
Conforme o relato dos horticultores, é
comum o uso inadequado desses produtos, como aplicação de fungicidas
protetores após a infecção da doença, aplicação de Malathion sobre o
agrião cultivado em curso d’água, inobservância do período de carência,
não utilização de equipamentos de proteção individual (EPI),
armazenagem inadequada de defensivos e pulverizadores e descarte
inadequado de embalagens vazias.
A água para irrigação é obtida
diretamente de cursos d’água, quando da existência destes na
propriedade, ou de poços escavados para essa finalidade. Observou-se três
formas de irrigação: 1) com regador: neste caso a água é bombeada para
reservatórios, onde são abastecidos os regadores; 2) com mangueiras:
neste caso a água é bombeada diretamente para os canteiros; e 3) através
de sulcos de infiltração: neste caso a água é bombeada para as
extremidades dos sulcos, fornecendo-se água até que esta atinja a
extremidade oposta.
Em nenhum desses 3 sistemas há algum tipo
avaliação do momento adequado de se realizar a irrigação, sendo esta
realizada em períodos pré-determinados (turnos de irrigação). O
bombeamento da água é feito por motores a
gasolina, devido
principalmente à dificuldade de acesso à energia elétrica. Em muitas
propriedades relatou-se restrição na quantidade disponível de água no
final do período seco, dificultando a exploração da horticultura nesse
período.
Não há assistência técnica qualificada
para os horticultores de Puerto Suarez, de modo que muitas atividades,
como a escolha de cultivares para plantio, a adubação, a aplicação de
defensivos químicos e o descarte de embalagens são realizadas sem critérios
técnicos, além de várias práticas de manejo que, por não serem
realizadas corretamente, comprometem a eficiência da produção. Por
outro lado, observa-se, devido à experiência acumulada pelos
horticultores, conhecimentos importantes sobre épocas próprias para o
cultivo, manejo da irrigação, controle de plantas daninhas, dentre
outros. Deve-se destacar também o grande interesse dos produtores em
adquirir conhecimentos e técnicas que possibilitem a solução das
dificuldades acima relatadas.
Destaca-se, na cultura do tomate a alta
incidência da virose conhecida como “Vira Cabeça”, causada pelo vírus
TSWV (Tomato Spotted Wilt Virus), cuja ocorrência tem sido observada há
aproximadamente três anos. E a principal planta daninha observada nas áreas
de produção, e que exige controle quase que diário, é a tiririca (Cyperus
rotundus).
Uma pequena parcela da produção hortícola
é comercializada em Puerto Suarez, sendo a maioria da produção
comercializada no Brasil, na cidade de Corumbá, MS, onde a comercialização
é informal, normalmente realizada nas feiras livres que ocorrem
semanalmente em vários locais dessa cidade. Alguns horticultores entregam
sua produção para intermediários revenderem, diminuindo assim seu
rendimento na atividade.
Observa-se que a atividade hortícola no
município de Puerto Suarez é realizada de forma empírica, e que muitas
práticas agronômicas simples (controle cultural de pragas e doenças,
produção protegida de mudas, uso adequado dos agroquímicos, etc.) podem
ser implementadas para aumentar sua eficiência.
* Alexandre Dinnys Roese é
Engenheiro
Agrônomo, M.Sc. Fitopatologista, Técnico
de Nível Superior, da Embrapa
Pantanal, na área de Desenvolvimento Institucional (adroese@cpap.embrapa.br)
e Vanderlei Doniseti Acassio dos Reis (reis@cpap.embrapa.br),
é Engenheiro Agronômo e pesquisador da Embrapa Pantanal, na área de
apicultura.
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