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.....Comecemos
pelo início, que é o escuro da caixa. Antes de tudo é
preciso produzir o mais puro breu. O breu total. A escuridão absoluta,
enclausurada pelas paredes da caixa. Depois vem o furo da agulha. Um furinho
de nada, comunicando duas realidades distintas e complementares. Lá
fora, o Mundo, tal como ele pensa que é. Aqui dentro, um mundo de
mundos possíveis (e impossíveis).
.....Pelo buraquinho, o dentro espia o fora.
O Mundo lá fora parece não se dar conta, sempre envolvido
com seus muitos afazeres e atribulações, de que é observado.
No entanto, um olhar de voyer atento e apaixonado não se cansa de
espiar. Espiar o Mundo em sua distração cotidiana.
Através do furo da agulha o Mundo, transformado em luz, é
sugado pelo escuro da caixa. A passagem da paisagem para dentro da caixa
produz a sua metamorfose em imagem. Refeita em luminosidade etérea
e radiante, a paisagem se torna visagem.
.....Imagem-visagem de um mundo que recusa
explicações apressadas. Vultos que passam. Rastros. Gestos.
Cores que se misturam. O movimento dissolve os contornos, revelando um mundo
em perpétua transformação. Paisagem desfocada. Espectral.
Fantasmagórica.
Ao contrário do olhar de águia que congela o foco sobre a
presa, o olhar de pinhole recusa o fatalismo do instante. O instante se
dilata e respira, acompanhando a respiração do Mundo. Inspira
o Mundo pelo furo da caixa obscura e expira mundos, mundos outros, oxigenados
pela duração, pelo devir.
O olhar de pinhole é, acima de tudo, um olhar preguiçoso.
Curioso de ver, mas sem pressa de chegar. Um olhar que caminha vagaroso
dentro da paisagem (até o infinito e além!). Um olhar de ver-vendo.
Para ver mais e melhor, não para explicar. Não para aprisionar,
imobilizar, controlar, dissecar, estripar. Um olhar que flui sem incomodar
o tempo, sem interromper o fluxo da ação.
.....O olhar de pinhole é o olhar inaugural
da infância, vendo o Mundo sem saber, ainda, que nome dar às
coisas. Um olhar que espia sem ser visto, sem fazer alarido, sem perturbar
a cena. O Mundo lá fora segue seu caminho. Dentro do escuro da caixa,
isto é, diante das imagens de Dirceu Maués, estamos nós.
Feito crianças. Vendo mundos ressurgirem.
Imagens-visagens que nos confrontam com nossa própria perplexidade
diante das coisas do Mundo. Nenhuma certeza para consolar e, no entanto,
nenhuma angústia. Só calma e encantamento.
*O professor doutor Cristovão Fernandes Duarte é
Arquiteto e Urbanista, Superintendente Regional do IPHAN/MinC e professor
de Estética e História da Arte na Universidade da Amazônia
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