No mesmo espaço da floresta o pavão e a coruja contemplavam os
mistérios da natureza.
Em dado momento, o pavão tomou conhecimento da coruja - que já havia
percebido sua presença - e ambos puseram-se a conversar.
O pavão, consciente de si e de seus magníficos dotes, exibia-se
orgulhoso e polêmico, com frases de grande efeito.
Transformava tudo em debate e se colocava como verdadeiro mestre de
todos os temas.
Com isso, muitos animais se aproximavam para se edificarem com suas
palavras ou se identificarem com o seu desempenho.
A coruja, por seu turno, prestava genuína atenção a cada coisa dita
ou exibida.
Com serenidade interior e sem inveja, distinguia o certo e o verdadeiro
de cada coisa, sem desprezar e nem venerar seu interlocutor.
Os esforços da coruja se centravam na busca da verdade e na construção
do caminho que leva à plenitude.
Seu longo hábito de meditação e de recolhimento lhe permitiam silenciar
à maior parte do tempo, esperando que o fluxo sucessivo de argumentos
superficiais do pavão trouxessem à luz suas próprias contradições.
Não era necessário destruir seu oponente.
A coruja não precisava vencer e nem brilhar.
Um sábio, que por ali passava, refletiu sobre o que presenciava.
E constatou, também em silêncio, que o ser verdadeiramente seguro e
conseqüente interage com todos os entes sem buscar a própria glória.
Aprende a edificar seu interior e a orientar sua existência no
despojamento da verdade.
Ajuda sem impor. Convive sem iludir.
E se torna livre daquela forma de reconhecimento superficial que
escraviza ao aplauso alheio.
Uma caravana de circo também passava pelo local.
Seu gerente, que buscava novas atrações para seu espetáculo ao ver a
cena, tornou-se empolgado.
Espantou a coruja e aprisionou o pavão.
Este, atualmente, exibe-se em todos os lugares por onde o circo passa,
recebendo aplausos em seu cativeiro.
A coruja voa livre pela floresta.
José Tarcísio Amorim
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