CAPÍTULO VIII
Jesus
define rapidamente a origem e desenvolvimento do espírito.
Sua
ascensão para Deus pelo progresso. Sexta-feira santa.
Jamais
Jesus pretendeu passar por Deus.
Definamos
hoje, irmãos meus, a graça inerente à natureza humana e ascendamos os escalões
que levam ao conhecimento da criação do homem.
Parto
de um princípio e digo que o livre arbítrio e o sentimento da responsabilidade
das ações são dados ao homem no estado natural e primitivo. Digo que a alma
humana os desenvolve à medida que sua luz intelectual se torna mais viva, e
acrescento que esta luz intelectual é própria do espírito.
O
espírito é uma criação de Deus, da qual a alma foi a promotora e a matéria
sua expressão.
O
espírito adquire cada vez maior lucidez para desenvolver seu princípio
espiritual e amortecer suas primitivas tendências, inteiramente animais.
O
espírito do homem novo não pode conceber as alegrias espirituais, porém mantém-se,
em suas relações materiais, alheio a toda demonstração de ferocidade, quando
traz de sua precedente habitação instintos brandos e em harmonia com o estado
social que abraça. O espírito do homem novo torna-se delinqüente quando
trazem de sua precedente habitação o desejo das demências atrozes e o gosto
pelas lutas furiosas.
O
homem novo deve seu fácil adiantamento ou seu embrutecimento prolongado à
intervenção dos espíritos de que está rodeado e o progresso do mundo
encontra-se entravado pelo baixo nível moral de todos. A terra deve a seu
Criador o justo tributo de seu próprio progresso e, entretanto, retarda sempre
este progresso como se lhe fosse dificultoso o descobrir a meta e a origem, como
se desconfiasse do porvir e quisesse ignorar o passado.
Todos
os homens se têm ocupado do destino do homem, mas todos lançaram um sombrio
olhar de desalento sobre a sua origem. Eu vou dar-vos algumas noções a
respeito de dita origem, ainda que estas noções sejam acolhidas com o
ceticismo próprio da época, cujo triste resultado moral eu deploro. A criação,
irmãos meus, não se encontra tão acima do alcance de vossa inteligência que
não se possa explicar - vo-la com um raciocínio humano.
Ofereço-me,
portanto a vós, como um filósofo da terra, como um espírito, cujas investigações
se viram coroadas pelo êxito e chamo para isso vossa atenção. Voltarei a
tomar depois meu nome e meu título; agora não sou senão um amigo vosso, que
vem comunicar-vos as impressões recebidas em regiões mais propícias para a
educação moral e intelectual dos homens. Apresento-me como um professor de
belezas desconhecidas e tomo a palavra com o desejo de iluminar-vos. Estudo há
muitos séculos, adoro o poder divino e alimento com sua luz a lanterna que eu
possuo.
Irmãos
meus, para que o quadro da criação seja compreensível para vós é necessário
admitir como ponto de partida: a alma, como faculdade sensitiva; o espírito,
como faculdade pensante; a matéria, como faculdade demonstrativa, no mundo em
que habitais.
A
alma, como dependência do princípio vital universal; o espírito, como criação
deste princípio vital; a matéria, como expressão da sensibilidade e da
inteligência.
Minhas
demonstrações a respeito do espírito constituirão o tema deste capítulo.
E’ necessário, por conseguinte, estabelecer uma base para a demonstração e
determinar as funções do espírito, completamente distintas das da alma.
A
alma é o principio do movimento e das sensações. A alma é o sopro divino que
se desliza e se reanima pela força da matéria, que se alimenta das forças da
natureza carnal e que se extingue com o seu enfraquecimento.
O
espírito é urna dependência da alma e da matéria,
Nas
raças de espíritos inferiores a memória está circunscrita a hábitos
naturais e a combinações pueris. Nas raças mais elevadas a memória
converte-se na fonte do progresso, dirigindo sua luz sobre as faltas cometidas
no passado. Nas regiões inteiramente espirituais a memória tira do passado
ensinamentos preciosos para compreender e fazer compreender o porvir. O espírito
converte-se em um iluminado com respeito aos desígnios de Deus e se eleva sem
descanso para as verdades eternas, cujas profundidades já mediram.
Nas
primeiras manifestações de sua personalidade, o espírito procede como as
crianças nos mundos carnais; caminha com temor e dirige olhares de surpresa
sobre tudo o que ainda não chega a conceber; harmoniza sons cujo significado
ninguém compreende senão os espíritos de sua categoria; foge da luz, que lhe
inspira temor, e acerca-se da chama, que o diverte; presta pouquíssima atenção
aos ensinamentos de sua vida e não o atraem senão os gozos presentes; nada
prepara e muito pouco recorda.
Durante
o completo exercício de suas forças, o espírito torna-se mau por cálculo, de
mau que era pelo ócio ou pelos desordenados desejos de seus instintos
materiais. No meio da luz de seus deveres, o espírito converte-se em delinqüente,
olvidando-os para satisfazer paixões cuja perniciosa influência ele conhece, e
a partir desta degradação moral o espírito cai na perturbação da morte para
despertar entre as angústias da dúvida e nas trevas do erro. Quando o espírito
humano cai no meio dos gozos bestiais, ainda que sem delinqüir, porém ingrato
para Deus, perde a pureza de sua alma. Engolfado em divagações enfermiças, o
espírito humano perde a miúdo, de vista, o verdadeiro objetivo da vida carnal
e sua ciência, tão estimada pelos homens, não lhe proporciona a paz do coração
e a saúde da alma. Que é a alma senão a parte sensível do ser, o direito de
sentir e de respirar, a capacidade de gozar e de sofrer?
O
espírito do animal que vos segue como primeiro depois de vós, homens novos, são
incapazes sem dúvida de arbitrar melhoras e fantasias de comodidades, porém
quem impedirá a sua alma de conhecer a dor, de chorar a separação, de
alegrar-se pela maternidade e de entregar-se às expansões do amor?
O
espírito desse homem novo, ó homens velhos, encontra-se certamente desprovido
das faculdades adquiridas por vós outros no exercício dos dons de Deus; porém
sua alma não tem nenhuma diferença da vossa, quando são iguais as forças
morais. Explico-me melhor: Se vosso espírito, no exercício dos dons de Deus,
quer dizer, no caminho dos gozos e dos conhecimentos adquiridos, deixou vossa
natureza humana cheia de vícios, porque se tenha inclinado ao mal o livre exercício
de vossas faculdades, a alma se ressente deste embrutecimento e permanece inerte
na sensação das alegrias que lhe são inerentes e como que deserdada pelo
distribuidor destas alegrias. O espírito concebe as boas ações e a alma
felicita-se por isto. O espírito descobre a verdadeira energia e a verdadeira
justiça, fortalecendo-se a alma pelo Impulso que elas lhe dão. O espírito
honra a lei dos mundos e afasta de sua natureza brutal o gosto pelas infrações
dessa lei e a alma empresta-lhe a sensibilidade de sua essência para harmonizar
os preceitos da lei com o sentimento do benefício e o horror à crueldade. Se o
espírito titubeia em seguir a luz da evolução, a alma sofre e chora. A alma
eleva a voz no silêncio, na solidão e esta voz chama-se consciência.
A
alma é a consciência do espírito, a alma é a elevada expressão da moral,
colocada no ser como semente do porvir.
A
alma nos animais destruidores parece asfixiada pela ferocidade do espírito, mas
logo que o espírito melhora, a alma toma a feição que lhe é própria, quer
dizer, que domina os instintos grosseiros, até onde lhe permite o
desenvolvimento da inteligência. Ela anuncia-se por meio da potência das emoções
ternas e pela manifestação de saciedade dos prazeres corrompidos.
A alma se assenhoreia da situação quando as faculdades do espírito (1)
perdem seu prestígio sobre a matéria, mas neste caso a marcha humana se
debilita e a derrota torna-se completa por causa da ruptura da trindade, a alma,
o cérebro (2) e o corpo. O espírito não oferece então mais que
demonstrações e a dilatação dos órgãos, dos que precisam por não tê-los
mais, os sons do pensamento se desviam como os sons de uma voz escutada por
ouvidos atacados de surdez.
O
pensamento é o labor do espírito, o espírito pensa sempre. O espírito
caminha para frente pelo engrandecimento de seu pensar. O espírito não perde
seu equilíbrio na loucura senão quando a fraqueza de seu instrumento torna
imperfeita ou nula suas manifestações. O espírito agita-se durante a febre
porque seu organismo se encontra enfermo. O espírito perde seu poder de
iniciativa na velhice pelo desgaste de seu meio de manifestação. O espírito
também durante a loucura ilumina com seus relâmpagos, porém depressa se cansa
da luta e esta luta determina o fim da vida corporal. O espírito não se revela
na infância porque o cérebro não tem o desenvolvimento conveniente, do mesmo
modo que na velhice o sentimento da animalidade domina a natureza humana; porém
à medida que se adquirem forças, o espírito (3) se evidencia através
do nevoeiro que o envolve, demonstrando seu caráter e suas aptidões. O espírito
não permaneceu inativo depois de sua última etapa em um mundo carnal, mas o
estado de torpor produzido por uma nova emigração tira-lhe a sensação de seu
poder, e aí, como em outra parte, a memória se enfraquece no sentido da
manutenção dos decretos de Deus. A memória da criança e a memória do homem
guardam do passado tão-somente as tendências e os gostos, dos quais a presente
existência oferece a prova inegável. A memória da criança manifesta-se em
suas inclinações, a memória do homem umas vezes ilumina com a luz do gênio
sua nova carreira e outras evidenciam faculdades pueris ou alumia sua rota com a
luz sinistra de delitos vergonhosos ou imundas orgias do espírito.
Se
em um momento dado aparecem resplendores da memória do espírito no cérebro
humano, o ser se encontra elevado em um êxtase de poesia no meio de visões de
longínquas harmonias; se são outros os reflexos dessa memória que
relampagueia no cérebro, o homem pode converter-se em um inovador.
_______________________________________________________((1)
(1) - Pensa dizer sem dúvida a razão, porquanto o desequilíbrio entre ela e o
sentimento traz o que em seguida diz: a paralisação do progresso humano por
falta de harmonia entre o coração e o cérebro, quer dizer, entre o sentimento
e a inteligência e o meio de sua realização no mundo, que é o corpo. —
Nota do Sr. Rebaudi.
(2)
- Pensa dizer sem dúvida a inteligência. — Nota do Sr. Rebaudi.
(3)
- Se bem observarmos, de tudo o que está dito se deduz que o princípio
volitivo, sensitivo e pensante tem sua base e seu ponto de partida na alma,
porém é o espírito quem no-lo manifesta. Isto ficaria esclarecido com a
doutrina outras vezes manifestada pelo Mestre, de que o espírito é a
personalidade, constituída pela alma e pelo perispírito. — Nota do Sr.
Rebaudi.
O
poder da memória leva consigo a luz que ilumina o caminho humano e a sensação
do ser no vasto horizonte dos descobrimentos é uma lembrança confusa dos
anteriores esforços de cada um. O homem sente-se impelido para o progresso pela
memória e nada fica perdido para ele apesar das interrupções momentâneas de
suas forças intelectuais. As privações da inteligência não levam consigo a
anulação de seus esforços e o repouso do espírito nada lhes tira de sua
penetração e de sua atividade futura.
O
sentimento das luzes intelectuais é conseqüência do adiantamento do espírito.
A tendência moral para as belezas da natureza demonstra a sensibilidade da alma
e esta sensibilidade encontra-se quase sempre associada ao progresso do
espírito.
A
luta dos instintos carnais com o princípio espiritual que anima o espírito
adiantado é o trabalho imposto a este espírito. O testemunho de sua vitória
assegura-lhe um aumento de faculdades morais e intelectuais para sua nova
peregrinação.
O
fracasso repentino do princípio espiritual na luta submerge o espírito no
estupor, no repouso humilhante, no enfraquecimento das aspirações divinas, no
remorso e no abatimento da alma.
Não
quero acompanhar em sua expiação aos espíritos que hajam desmerecido de si
mesmos, porque o argumento de minha exposição é alheio à descrição dos
tormentos inerentes a toda culpa, correspondendo-me tão-somente tratar das graças
derramadas sobre o espírito do homem, que tenha permanecido firme no meio da
luz alcançada, em suas anteriores existências.
Tomo
o encargo de provar o elevado ensinamento da chamada, com propriedade, graça,
da graça outorgada à natureza humana de conhecer sua origem e seu destino,
mediante a aprendizagem de seus deveres e em virtude das manifestações da
verdade.
Na
natureza humana, já disse, existem seres novos e seres renovados, espíritos saídos
recentemente do embrutecimento material, sem outro reflexo de luz que os guie a
não ser o instinto da alma, que, dominando o espírito, se encontra por sua vez
dominada pela matéria, espíritos que passaram por esperanças de vida, por
sofrimentos de degradações, por desânimos, por alegrias, por lampejos, por
quedas, por êxtases de felicidade, por tristezas, por glórias, por martírios.
Espíritos cujos sofrimentos foram filhos de seus excessos e aos que o horror da
morte os arrojou no meio do terror e do arrependimento. Espíritos que estão
chamados a sustentar as seus irmãos e a ascender os degraus do poder
espiritual. Espíritos fortes pelo desenvolvimento de sua inteligência. Espíritos
dispostos ao bem pelo desenvolvimento de suas faculdades, preparados para a
felicidade por seus sentimentos de justiça e dominados pelos desejos das
investigações.
Fundamento
minha definição sobre a dependência das forças intelectuais da natureza
espiritual e digo que o grau da inteligência é proporcional à extensão dos
conhecimentos adquiridos pelo espírito, nos desenvolvimentos alcançados nas
sucessivas existências temporais e de alianças produtivas, no caminho
ascendente das faculdades. da alma e na atividade do elemento divino. A ciência
humana chegou a demonstrar a influência efetiva das funções do cérebro sobre
as manifestações intelectuais, porém este fato, material para os olhos dos
humanos, guarda dependência com o organismo (4) espiritual,
porquanto o cérebro não é mais que o espelho do espírito e o espírito vêem-se
colocado em um meio que lhe é favorável para cumprir os decretos de Deus e
preencher os fins de sua criação.
Todos
os espíritos devem descobrir o poder de Deus e a dependência de sua própria
natureza. Todos os espíritos devem estudar a origem e o objeto da existência,
porém devem ao mesmo tempo dominar o instinto natural da matéria para
converter esta descoberta e este domínio no pedestal de sua grandeza
espiritual. Todos os espíritos humanos, ainda que tenham de permanecer séculos
na ignorância, não sairão desta ignorância senão quando suas tendências
carnais (5) hajam sido finalmente anuladas, mediante esforços de paciência e
prova de pureza em presença da elevada esperança dos bens faustosos da
espiritualidade.
_______________________________________________________
(4)
Os espiritistas crêem que os espíritos, mediante o perispírito, têm uma
forma real que os individualiza e lhes serve para suas relações. Os modernos
espiritualistas levam além sua crença, acreditam que o espírito é dotado de
um verdadeiro organismo apropriado ao meio em que deve atuar. — Nota do Sr.
Rebaudi.
Allan
Kardec, na introdução ao estudo da Doutrina Espírita, diz o seguinte: “O laço,
ou perispírito, que prende ao corpo o Espírito, é um espécie de envoltório
semi-material. A morte é a destruição do invólucro mais grosseiro. O Espírito
conserva O segundo, que lhe constitui um corpo etéreo, invisível para nós no
estado normal, mas que pode tornar-se acidentalmente visível e mesmo tangível,
como sucede ao fenômeno das aparições”. (Livro dos Espíritos)
(5)
Estas tendências, sempre que não sejam viciosas, são inerentes à natureza
animal do homem e asseguram a persistência da espécie, posto que seja, todavia
um instinto, apenas depurado, o que preside à formação da família pela atração
sexual inconsciente. Se a teoria do amor livre é uma teoria, mais que imoral,
bestial, a constituição da família é mais uma necessidade social que unta
virtude. Assim também é só o nosso atraso o que nos faz considerar o amor
materno como o mais sublime dos sentimentos, conquanto seja tão somente filho
da relação carnal que medeia entre os pais e os filhos. Esse amor seria
verdadeiramente sublime se a mulher mãe o manifestasse para crianças que não
fossem seus filhos, como às vezes acontece. Quanto às tendências carnais, são
inerentes ao grau de evolução em que nos encontramos. Um grau superior talvez
dê o resultado dele não precisar mais da reencarnação, porquanto o perispírito
precisaria da materialidade suficiente para se poder relacionar com o plano físico.
— Nota do Sr. Rebaudi.
______________________________________________________
124
Irmãos
meus, no mundo em que habitais as influências do círculo de nossas alianças e
a cegueira do espírito não permitem ao pensamento elevar-se até os deliciosos
gozos da espiritualidade. Ele não é capaz de desprender-se dos objetos
materiais e poucas vezes lhe é dado meditar sobre a potência de Deus,
sentindo-se em seguida desviado pelas aparentes contradições recolhidas no
mesmo seio da natureza terrestre; mas a força da graça está aí, a luz de
Deus fende as trevas, a vontade do espírito despedaça o jugo que o aprisiona.
Então, o espírito humano, pobre ainda, porém resolvido a conquistar seu
engrandecimento, rasga o véu que lhe esconde a adorável imagem de Deus.
Oh
divina natureza da alma! Atira teus laços e tuas doçuras sobre o caminho do
homem, no meio das tribulações materiais, e concede os dons da ciência aos
que te reconhecem como elemento de vida e de felicidade! Seja a alegria dos
crentes e provoca entre eles as idéias de reformas, apura seus gostos, amplia
seus pensamentos e procura-lhes honras de alta moralidade! Faze baixar entre as
sombras das paixões a tranqüila claridade, acalma a febre das paixões, destrói
as causas do delito, aplicando a todos os males o bálsamo da palavra celeste!
Converte-te em consolo dos justos, mas dá também aviso aos pecadores e faze a
luz na noite de seus espíritos! Bela e santa poesia da alma! Domina as humilhações
da matéria carnal e converte-te na fonte dos melhoramentos do espírito humano!
Irmãos meus, a dependência do espírito humano, da natureza espiritual da alma
é a base do pensamento eterno de Deus para converter as criaturas no objeto de
seu amor. O princípio da religião universal descansa sobre esta base, que vos
demonstra o homem em seu porvir, livre do jugo dos vícios da natureza carnal e
resplandecente dos atributos da alma, cuja natureza é divina.
Afasto
de meu pensamento a lembrança do embrutecimento do homem e apresento ao seus
olhos o desenvolvimento futuro de sua natureza espiritual, colocando como princípio
o indicado resultado dos esforços do ser e da multiplicidade de conhecimentos
adquiridos. Mas devo deduzir de tudo o que disse que os esforços do trabalho e
a multiplicidade das luzes determinam o adiantamento do espírito e descrevem o
círculo de suas atribuições no eterno pensamento divino. Aparto de minha
natureza o quadro dos humilhantes erros do espírito humano, porém aspiro à
sua regeneração e esta aspiração chegará a ser uma realidade. Desvio a
vista dos hábitos monstruosos, dos negócios desonrosos, das prepotências, dos
delitos, dos horrores, das corrupções e vejo no fundo do céu de minha alma,
desenvolvimentos, mudanças, elevações, honras e forças para conquistar o
poder espiritual.
Retardados
para com sua natureza espiritual, os homens convertem-se em fratricidas e ímpios;
voltados à felicidade que proporciona a memória da alma, compreenderão o
destino de seus espíritos e a justiça da carga que constitui as provas da vida
corporal. Saberão harmonizar as potências do impulso carnal, com a solidez dos
preceitos da ordem superior, e colherão o doce fruto da oração, quando esta
oração seja dirigida ao Criador do Universo, cujas obras serão respeitadas e
observadas suas leis.
Todos
colaborarão nos propósitos divinos quando se entreguem ao trabalho
reconhecendo-o como a causa do aumento da força e da inteligência, que nos
aproximam a Deus. Os homens encontram-se afastados de Deus. Os espíritos da
terra são inferiores como famílias e como individualidades. A elevada expressão
da inteligência divina encontra-os frios e céticos, o desenvolvimento de seu
órgão auditivo não está em relação com as harmonias da graça, de cujos
dons estão rodeada, e a pureza do elemento espiritual fá-los parecerem larvas
que se arrastam por cima das carnes putrefatas de um cadáver. Mas, já o
dissemos, a graça da força está aí... a luz de Deus penetra através das
trevas, a vontade do espírito despedaça o jugo que o aprisiona, e portanto o
espírito humano, pobre ainda, porém resolvido a engrandecer-se, rasga o véu
que lhe esconde a adorável imagem de Deus. O fim dos espíritos é progredir e
pouco lhes importa a natureza dos obstáculos que os rodeiam. Que pode
importar-lhes as ambições mesquinhas de sua passagem momentânea na vida
material? A desproporção dos avanços intelectuais com relação à idéia da
verdadeira justiça e das elevadas graças, que por todas as partes os rodeiam,
há de desaparecer por efeito da vontade e há de evidenciar-se a natureza
espiritual quando se apagar a materialidade sob o império de maiores progressos
e de alianças mais nobres em manifestações da alma.
Os
espíritos da terra encontram-se afastados de Deus por causa da inferioridade de
sua natureza que os submete as leis monstruosas de impiedade e a costumes de bárbaros
gozos. Porém espíritos de mais elevada natureza vêm emancipar o pensamento e
ampliar o critério dos espíritos da terra e com freqüência lhe são
concedidas forças de luzes especiais que lhes permitem, mediante auxílios de
natureza intermediária, poder sustentar-se no meio desses espíritos atrasados,
no meio do ambiente escuro e do sofrimento da humanidade.
Pobres
espíritos terrestres! Humilhai-vos perante a ciência dos delegados de Deus,
para abreviar o caminho para vossa espiritualidade. Permanecei na expectativa
dos bens futuros, caminhando de uma maneira altiva e consciente em meio das paixões
e dos males da humanidade, para reprimir as tendências perniciosas de vossa
natureza e para aliviar aos mais miseráveis entre vós. Aprendei a conhecer a
finalidade de vossa existência e prossegui o trabalho de vossa regeneração,
apesar da pressão que o espírito deve suportar por efeito da luta e da
indiferença dos homens entregues aos gozos e ao orgulho. Buscai auxílio e
consolos na fonte da Divindade e aliviai o fardo das dores próprias da natureza
corporal com o emprego das forças da natureza espiritual.
Sim,
irmãos meus, é realmente Jesus quem vos fala, mas a alegria intelectual
derivada das manifestações de seu espírito não pode ser concedida senão aos
que tenham começado a tarefa de sua purificação, o trabalho de sua
desmaterialização, aos que tenham entrado já pelo caminho das reformas de sua
própria natureza animal e pelo das lutas contra si mesmo, contra todas as paixões
desorganizadoras da alma, contra todos os vícios que fazem o espírito baixar
ao nível dos brutos, contra a ambição dos bens terrestres, contra a faculdade
pensante que fomenta tão-somente culpáveis ficções, más doutrinas, delírios
de imaginação dignos de lástima, falsos estudos filosóficos, tristes soluções,
desprezíveis negações da existência de Deus.
Descobri
vossos destinos, irmãos meus, na manifestação espiritual. Praticai excursões
ao centro da luz e libertai vossas almas dos laços que as oprimem. Permanecei
defensores do livre pensamento, ó vós que desejais e emancipação do espírito
porém fazei participar da discussão o grande nome de Deus e inclinai-vos
perante os testemunhos de seu poder e de seu amor. Acumulai tesouros de ciência,
porém lembrai-vos que sem a devida participação do espírito não existem
verdadeiros triunfos para o homem e abandonai o tolo orgulho e o insolente
desprezo das naturezas inferiores pelo que sabem e pelo que não sabem, por não
conseguirem percebê-lo.
Influi
em favor da educação geral das massas e empregai vossas faculdades para o bem
geral. Arrebanhai crentes para a religião universal, fazendo-vos seus apóstolos.
Ela quer a fraternidade entre os homens e a devoção para com Deus. Buscai o
elemento divino em sua pureza e a paz no mundo, relacionai o amor da família
com o amor entre todos os espíritos, aproximai-vos à habitação humilde, do
mesmo modo que à faustosa morada, e explicai o porquê do rigor das provas a
par da abundância dos dons; o porquê da grandeza das idéias a par da desnudez
do espírito, do caminho das honras a par do estacionamento das faculdades, da
posse de grandes inteligências a par do desenvolvimento puramente vegetativo do
homem em suas fases de crescimento e de pausa. Humilhai a natureza carnal no que
ela tem de bestial. Destruí a vergonha no matrimônio substituindo-a pela
sinceridade e a delicadeza do amor.
Fugi
da glória adornada de sangue, das alegrias compradas com o preço desonra, dos
vapores da embriaguez e das tentações da carne.
Fazei
que desçam sobre vós as forças da pátria celeste, pedindo-as com o fervor de
uma alma cheia de esperança e orai como oram os anjos, sem vestígios de
fraqueza e com a abnegação das grandes almas.
Empreguai
no cumprimento das leis humanas a força demonstrativa do espírito, que luta
contra a sensibilidade da alma, porém deixai que a alma fale para amenizar a
sorte do condenado. Ide à casa do pobre para dar provas de fraternidade.
Castigai o assassinato, porém jamais mateis o assassino: o direito de morte só
a Deus pertence.
Fazei
repousar a lei humana sobre a lei divina e levantai o culpado depois da expiação
para induzi-lo a seguir o caminho da reabilitação e da liberdade.
Despojai
o homem velho de todas as suas velharias, rejuvenescendo-o em todo sentido, e
escrevei sobre o seu rejuvenescimento esta máxima religiosa, humanitária e
fundamental: Deus para todos e cada homem para seus irmãos.
Dizei
a todos os espíritos que a graça adquire-se pelo bom emprego de todas as
faculdades e ponde em execução, para a regeneração social, a penosa, porém
gloriosa atividade dos nobres filhos de Deus, dos inteligentes e dos fortes
mandados em auxílio dos ignorantes e dos fracos.
Então,
irmãos meus, Jesus não vos parecerá mais tão distante de vós e as manifestações
de seu espírito enraizarão as convicções nos vossos, assim como a doce
piedade de sua alma atrairá os entusiasmos de vossos corações.
Despeço-me
de vós, irmãos meus, até ver-nos no nono capítulo desta história.
Sexta
Feira Santa — 19 de abril de 1878
Honremos
a memória de minha morte corporal e afirmemos novamente que Deus é de tal
sorte superior à humanidade, que não poderá misturar-se materialmente com ela.
Insisto
sem cessar sobre esta falsa direção impressa às cousas pelo espírito humano,
porque transtornou o bom sentido de homens levados para o sentimento religioso e
porque deu em resultado ser uma fonte inesgotável de impiedade e de delitos.
Jamais
Jesus pretendeu passar por Deus e os milagres que se lhe atribuem são uma pura
invenção.
“Eu
sou o filho de Deus, dizia ele, mas todos os homens devem preparar a elevação
de seu espírito até atingir a honra espiritual que é atualmente uma glória
para mim”.
“Sou
o filho de Deus, mas mereci este titulo com minhas obras e a família humana
conta com trabalhadores, que assim como eu empregar, o esforços para alcançar
uma pátria mais formosa”.
“Meu
lugar não é aqui, mas vim até vós para trazer-vos a luz e a boa nova”.
“Voltarei
ainda, porque muitos que não podem compreender-me agora me compreenderão mais
tarde, pois minha missão divina não tem termo, porque representa o amor de
Deus para com todos os homens”.
“Sou
filho de Deus, mas, acatando vós outros minha superioridade, não rompeis os laços
de irmandade que nos ligam”.
“Todos
os homens são irmãos; os mais fortes têm que prestar seu apoio aos mais
fracos; os instruídos têm a obrigação de ensinar a moral e a lei divina; os
ricos têm o dever de fazer participar aos pobres de suas riquezas”.
“Muito
entre vós verás o reino de Deus, porque o homem torna a nascer para cumprir
seu destino. Todo o que tenha vivido tornará a viver, pois a morte só tem domínio
sobre a carne”.
A
doutrina de Jesus demonstrava o caráter imutável de Deus e a perfectibilidade
dos seres mediante suas transformações, através da matéria e de suas estadas
nas moradas espirituais adaptadas aos seus sucessivos estados de desenvolvimento
moral.
O
caráter Imutável de Deus determina a Inviolabilidade de suas leis.
A
perfectibilidade do espírito criado é uma prova do amor e da inteligência do
espírito criador.
A
fraternidade deduz-se da doutrina de Jesus.
Compreende
não só a aliança dos espíritos de um mundo, se não também a aliança dos
espíritos de todos os mundos.
A
morte corporal não enfraqueceu em nada o amor de Jesus para com a humanidade
terrestre, e responde aos infelizes que o imploram, explicando-lhes os erros
religiosos e a causa de seus sofrimentos.
Deus,
cheio de misericórdia para o pecador, permitiu que eu aqui me manifestasse
ostensivamente e a graça renovada constitui uma promessa de novas graças.
_______________________________________________________
NOTA
(do original) — A manifestação da Sexta-feira Santa de 1878 foi transcrita
para aqui porque afirma a não divindade de Jesus, de acordo com o igualmente
estabelecido na narração inteira de sua vida; constitui isto mais um laço de
continuidade do que uma sanção. Mais tarde se entenderá.
_______________________________________________________
Final
do VIII Capítulo (19/07/2005)
Baixar Capítulo - VIII (Download)
Topo