REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E O RENASCIMENTO DA RESISTÊNCIA DOS TRABALHADORES NOS ANOS 90(1)
Maria Carmela Buonfiglio(2)
"Quem vai à luta? Viva! Nossa união? Viva!"
"Quem são vocês? O povo unido outra vez!"
"Quem são vocês? O povo unido outra vez!"
(refrão em manifestação, em J. Pessoa, 11/09/96, em repúdio à violência policial contra os trabalhadores sem terra, da fazenda Gomes, na madrugada de 7/8 de setembro/96.)
Talvez o resultado mais visível desses anos de atuação da atual reestruturação produtiva seja o golpe dado ao movimento sindical, em todo o mundo. A adoção de políticas neoliberais e a aceitação das novas regras do jogo, resultou na solidão e abandonado dos trabalhadores, e na perda de rumos do movimento sindical. Este foi o resultado da aceitação do canto de sereias da política de negociação: um sindicalismo que perdeu sua essência, seu significado de proteção e defesa dos trabalhadores, mero figurante do falso jogo democrático. Desmoralizados, não só pelas perdas sofridas, inerentes a qualquer luta, mas sim pelo caminho adotado que mais que a negociação, significou cooptação, e que fez de muitos deles apenas "parceiros" para referendar as perdas dos trabalhadores. [fim da página 19]
Entretanto, os últimos anos parecem indicar mudança nessa trajetória suicida. Um tanto tardia, é verdade, talvez demasiadamente. Particularmente em '96, o movimento sindical, em vários países, vem despertando do seu letárgico sono, impulsionado pela queda da máscara do discurso da participação nas empresas, e por formas de resistências e lutas, geralmente à margem da política das grandes centrais, que envolvem dissidências e outros atores sociais. Um despertar doloroso, porque nesse meio tempo, de um lado, a obra da reestruturação neoliberalizante avançou e são muitos os estragos provocados (destruição de milhões de empregos, milhões de subempregados, redução da participação dos salários na renda gerada em média de um terço, precarização do emprego) e, por outro, coloca a necessidade de se reconstruir o próprio sindicato, retomando seu papel de defesa dos trabalhadores, o caminho do sindicato classista (Malabarba, 1995) para reconquistar a confiança dessa classe abandonada e sem esperanças.
Ainda, nesses anos, essa massa de deserdados, encontrou no renascimento dos movimentos populares, principalmente ligados aos camponeses, aos trabalhadores rurais, excluídos mais fortemente das benesses da modernidade capitalista, o lume ausente no movimento sindical urbano. E foram eles, por sua firmeza, a apontar um caminho e de novo dar um horizonte, uma esperança através da única alternativa possível: a velha resistência.
Contrariando os muitos adeptos do pensamento único, do fim da História e da pressa em ceder aos poderosos, assegurando seu quinhão, em vários países, o noticiário é cheio daquilo que decretaram morto e ultrapassado: manifestações em massa, greves gerais, ocupação de fábrica, protestos. Nos EUA, o IWW renasceu! Sindicalistas que antes eram bem comportados "negociadores", agora ameaçam com resistências e ações conjuntas, às vezes internacionais. As ocupações dos Sem-Terra , além do Brasil aparecem também no Paraguai, na Bolívia, na Colômbia. Os zapatistas organizaram um congresso internacional contra o neoliberalismo no meio da selva, reunindo três mil participantes de todo o mundo. O presidente do Uruguai organizou um Seminário Internacional contra o neoliberalismo. A CIOSL, central mundial criada exatamente para combater os comunistas e esquerdistas no movimento sindical, em seu último congresso de junho 96, declarou que é hora de combater o neoliberalismo e seus efeitos nefastos. [fim da página 20]
O que dizer dessa realidade tão negada, que o noticiário frequentemente oculta, esquece, nega? Não estaríamos vivendo um novo "outono quente"?
Registramos, pois, algumas das resistências que hoje vem ocorrendo para quem sabe, no futuro, não se atribua à generosidade dos economistas do FMI ou do Consenso de Washington o fim dos estragos desse modelo perverso, como hoje ocorre com relação ao fordismo. (3)
A segunda metade de 1996 já (no momento em que escrevemos) aponta para a retomada de um novo "outono quente", outono que na verdade se iniciou no final do verão europeu. Várias manifestações e greves gerais ocorreram em vários países e outras estão previstas. Em sua maioria, foram convocadas pelas grandes centrais, até pouco antes, conciliadoras, mostrando uma mudança de rumo. Vamos aqui retomar algumas delas, por países.
ALEMANHA:
2/10/96: cem mil metalúrgicos em manifestações de protesto, em toda a Alemanha, contra redução do auxílio-doença, e ameaças de revisão do contrato de férias e do 13o.salário. Apesar de negociações e ameaças de greve - e da própria quebra do dito "modelo alemão - (já bastante trincado), várias empresas, capitaneadas pela Daimler-Benz, maior empregadora (1.300.000 empregados), e seguida pela Hoescht, Schering, Deutsche Bank, Commerzbank, Siemmens, Philips, Mannesmann, entre outras, decidiram reduzir o auxílio-doença a 80% do salário (seu pagamento integral foi conquistado após violentos distúrbios, em ´56). Já no sábado (28/09) interrromperam os turnos extraordinários 20.000 operários da Mercedes, das plantas de Bremen, Sindelfingen e Untertuerkheim. Algumas empresas -Volks, BMV e Porsche não seguiram a Daimler-Benz. Após a greve, Siemens, primeira a segui-la [fim da página 21] e a Basf, voltaram atrás. O IG-Metall (três milhões de sindicalizados) prometeu agir judicialmente e lutar duramente para impedir essa volta ao passado. ( Il Manifesto, 1 e 12/X/96; Gazeta Mercantil 2 e 3/X/96; Clarín, 14/10/96)
23/outubro: esgotado o prazo dado às empresas, sem recuassem na questão do corte no auxílio-doença, nova manifestação dos metalúrgicos alemães, nas ruas das principais cidades industriais do país, que dessa vez contou com mais de 400.000 grevistas. Uma manifestação muito mais forte que a anterior, pois à raiva pelo contrato rompido, juntava-se a ameaça sobre uma conquista obtida na mais dura luta dos trabalhadores alemães, iniciada em 27 de outubro de 1956 e que durou dezesseis semanas. E sem sinais de acordo, pois empresas como a Daimler-Benz, aceitavam manter o pagamento integral do auxílio-doença até o final do contrato (próximo inverno) para então, implementarem os cortes com a nova negociação. (Il Manifesto, 24 e 25/10/96)
ITÁLIA:
30/08/96 (ainda final do verão): greve e manifestação de 150.000 trabalhadoras temporárias, de todas as faixas etárias, das numerosas pequenas empresas da região da Campânia, da indústria de tomates, em Scafati. Lutavam contra a precariedade, as longas jornadas sem remuneração de horas-extras, os baixos salários, os contratos temporários sem indenização e ainda sem direito à aposentadoria, devido a mudança na legislação trabalhista. As três grandes centrais convocaram a greve, a partir de uma plataforma de reivindicações relativas à requalificação do setor, garantia de trabalho e desenvolvimento, apostando numa negociação que facilitasse aos empresários incentivos fiscais já previstos na lei dos distritos industriais. E, em último lugar, a questão das trabalhadoras temporárias. Esperavam que da greve participassem operários das grandes indústrias. E, no entanto, a maioria dos grevistas era composta dessas trabalhadoras sem contrato fixo, e outros tantos que, apesar de contratos por tempo indeterminado, estavam ameaçados pela reestruturação. Ou seja, participaram os mais afetados pelas novas relações da modernidade capitalista. E pediam dignidade, respeito - "Luta dura, sem medo" - por estarem no limite, por nada terem a perder (ou muito pouco) reivindicando coisas que se pensava enterradas no passado e que revelam a verdadeira face da modernidade - ou pós-modernidade - capitalista. Deve-se lembrar que a situação na região deve-se aos últimos anos de políticas neoliberalizantes. Políticos da [fim da página 22] região deram seu apoio - ou mostraram-se sensíveis às denúncias e reclamos (inclusive o Ministro da Agricultura, que é de Salerno). Os sindicatos receberam a lição de que é preciso estar mais atentos à situação dos trabalhadores e que devem recuperar sua confiança. (Il Manifesto, 4/08/96)
27/09/96: greve nacional dos metalúrgicos contra a quebra do contrato de 23 de julho último (a empresa se recusava a pagar o reajuste acordado entre a CGIL, Cisl e UIL e a Cofindustria e a Federmeccanica - L$ 76.000,00 - pouco mais de US$ 50,00). Vale lembrar que o acordo firmado em julho, refletia ainda a linha do sindicalismo de negociação e mesmo assim foi quebrado.
A CGIL, em seu último congresso, em julho 96, reafirmou a linha do sindicalismo de negociação, o que levou o PRD a declarações que apontavam para um caminho em que o partido ocupasse a vanguarda política que a central teimava em não assumir, colocando um fim na separação entre partido e sindicato. (Il Manifesto, 22/7/96)
Tratava-se então de um contrato já muito favorável à empresa, que mesmo assim resolveu rompê-lo. O modelo da negociação, das "parcerias", parece esgotado pelo menos em sua face ideológica. No dia anterior à greve, o presidente da Federmeccanica, sindicato patronal, lançou aos 1.700.000 metalúrgicos do país: "Façam greve, tanto vocês nada contam". Esse é o novo discurso do capital em tempos de flexibilizações .Parece que os tempos do discurso vazio da qualidade e da participação chegaram ao fim, apesar dos elevados lucros registrados em 94, '95 e em '96. A Fiat, por sua vez na fábrica de Melfi, ameaçou os trabalhadores, principalmente aqueles com "contrato de formação" que a adesão à greve implicaria na não renovação dos contratos de trabalho.
Ainda, como agravante, havia a questão da previdência, e que provocara uma quase ruptura com Prodi, embora, no dia anterior à greve, o governo voltasse atrás, devido a pressões de Bertinotti, do PRC. Em jogo, uma redução salarial nos chamados aposentados-baby (com 15 a 20 anos de serviço), geralmente do serviço público. O corte era até pequeno (L$ 7.000,00 ou US$ 5,00), entretanto perigoso, porque implicava em mexer em direitos adquiridos. A CISL, forte nos sindicatos do serviço público, posicionou-se contra. Também deixado de lado o "ticket diária hospitalar" (também de pequeno valor- L$ 20.000,00) a ser aplicado para as altas rendas, uma vez que também feria o princípio de direito universal à saúde. E, depois de se aprovar uma limitação como essa, simpática para muitos, estaria aberta a porta para passar outras, com implicações bem maiores. [fim da página 23]
É nesse clima que a greve, convocada pelas três grandes centrais - CGIL, CISL e UIL - e, apesar de seu tímido e fraco apoio - constituiu-se na grande manifestação desde a derrota do movimento operário italiano em 78, quando 300.000 metalúrgicos tomaram as ruas das principais cidades italianas (em '90 houve uma retomada, mas muito menor que esta; em 94 também fizeram greve em defesa da previdência). Uma manifestação de muitos jovens entusiasmados, uma nova geração operária, que apesar dos mitos do pós-fordismo, vive hoje no cotidiano da fábrica a mesma realidade dos que viveram o outro "outono quente". E estão sós, porque o sindicato de agora os abandonou desde muito.
Em Turim, foram 50.000 manifestantes que usavam o adesivo "eu amo os macacões azuis", slogan criado pela FIOM, FIM e UILM. A greve que recebeu adesão de estudantes e aposentados, não era apenas pelo contrato de trabalho , mas pela defesa dos contratos de trabalho e contra a insegurança com relação ao emprego.
Em Pádua, cidade do Vêneto, de industrialização difusa e sem tradição de mobilizações, a manifestação contou com um número entre 20 e 30 mil pessoas; todos jovens operários; (estudantes, ausentes). Operários de pequenas empresas, politicamente próximos aos separatistas da Liga; mulheres, da grande indústria, que sobre a flexibilidade do trabalho que experimentam, diziam "trabalhamos menos, mas em piores condições".
Em Milão, na Lombardia, grandes fábricas de antanho, como a Alfa Romeo, desapareceram; restou uma miríade de pequenas e médias empresas. Os metalúrgicos ainda existem, embora já não desfilassem de macacão. Com relação aos efeitos do pós-fordismo, dizem que desarticulou e reconfigurou a classe operária, mas que isso se sabia há pelo menos seis anos atrás, na última greve da categoria. Mas que era obrigação naquela ocasião, o confronto, que não houve. Nessa greve, com 50.000 manifestantes, operários jovens, novos atores.
Em Bolonha (Emília Romana), também manifestação com 50.000 participantes e todos jovens empregados em pequenas empresas, em sua primeira greve. As representações sindicais unitárias (RSU) de outras categorias - têxteis, ceramistas, construção civil, além de aposentados - participaram, principalmente porque os problemas enfrentados, e que vão além do respeito ao contrato de trabalho, são comuns. Nas faixas dos manifestantes, agradecimentos a Bertinotti por salvar as aposentadorias; nos discursos, as declarações foram no sentido [fim da página 24] de "não aceitar mais nenhum falso compromisso em nome do desenvolvimento e da competitividade".
A greve chegou pela primeira vez ao sul: em Potenza (Basilicata), pequena cidade do sul, operários da FIAT Melfi se uniram a outras categorias que organizaram a "greve do despertar", slogan adotado para a plataforma de lutas na região. A manifestação reuniu 7.000 pessoas entre metalúrgicos, outras categorias, desempregados e aposentados, mostrando que é possível superar as barreiras entre essas distintas situações que fragmentaram a classe operária, principalmente a dicotonomia empregados- desempregados. Mas a greve teve um significado ainda maior por se tratar de Melfi, a mais toyotizada empresa do grupo FIAT, aquela onde a palavra "greve" nunca deveria entrar, o símbolo da "paz social". A Fiat ameaçou com demissão aos que participassem da greve. (Um operário Fiat participou encapuçado, representando os que dela, por medo, não puderam participar.) (A participação em Melfi ficou entre 60% - segundo o sindicato- e 30% - segundo a empresa, enquanto que em Mirafiori, Turim alcançou índices, entre 80 a 95%.) Em Melfi, portanto, os métodos da modernidade (ou pós) da Fiat em tempos de reestruturação produtiva, de qualidade total, foram desvelados: retorno aos anos 50, como denunciaram os sindicalistas.
Em Nápoles, os 20.000 metalúrgicos grevistas manifestantes evocaram os fantasmas das tantas indústrias fechadas, outra região de desindustrialização e de desastre econômico. Cansados de tanto "pacto pelo trabalho" que, aos patrões, assegurou a "flexibilidade" com suas maravilhas, como salário reduzido e aos trabalhadores, nada, sequer o emprego. O clima era pesado, pois além do desemprego, os problemas apareciam em várias frentes: na ex-Alfalancia o trabalho reduzira-se a apenas duas semana por mês; no dia anterior à greve, a FIAT despedira um operário dos COBAS, da oficina 99, por um motivo tolo; outra ex-empresa estatal, agora privatizada, ameaçava fechar as portas, além de estarem há seis meses sem receber os salários; uma fábrica coreana acabara de demitir duzentos empregados ("A fábrica do sorriso morre, resta o pranto dos 200 demitidos").
5/10/96: Manifestação em Nápoles do "terceiro setor em nome da solidariedadeque reuniu um número entre 20 e 30.000 participantes, jovens e velhos; representantes das centrais, sindicatos e ONGs. (Il Manifesto, 6/10/96)
6 a 12/10/96: "marcha pelo trabalho", da região da Basilicata e que se estendeu por sete dias com uma programação de debates e encontros [fim da página 25] com trabalhadores, tendo como objetivo principal o protesto contra o desemprego na região, a redução da jornada de trabalho, sem redução de salários ou perdas contratuais. (Il Manifesto, 6/10/96)
12/10/96: manifestação nacional, em Roma, como programação dos participantes na Conferência Internacional contra o neoliberalismo e pela Humanidade, realizada em Chiapas.
18/10/96: greve nacional dos trabalhadores da Olivetti, com passeata em Roma, que reuniu cinco mil participantes, vindos de Ivrea e de Nápoles, em protesto contra a "liquidação" do setor de informática da empresa. Além da defesa do emprego, trata-se de uma questão de modelo de desenvolvimento. E, por mais surpreendente que possa parecer, esse setor e esses trabalhadores que eram considerados os "trabalhadores do futuro, do século XXI", hoje são descartados como "obsoletos". A questão gira em torno do problema das telecomunicações e mais precisamente da telefonia móvel. O celular, mania dos italianos, movimenta um mercado fabuloso (como em todo o mundo); a Olivetti nos últimos anos vem se interessando por esse mercado, tendo deixado a informática sem investimentos, portanto sem pesquisa e desenvolvimento. E agora quer se desfazer da produção do PC, embora mantenha por enquanto a produção dos grandes sistemas. "Telefonia é o negócio do futuro, microcomputadores e informática é coisa de Terceiro Mundo!" - a lógica do capital parece beirar a insensatez. Os trabalhadores pedem a intervenção do governo, medidas que garantissem o futuro da informática e de seus postos. Mas, neste setor, declarado agora pouco atrativo, vendido desmembradamente e a qualquer preço, sem garantia para os trabalhadores, as demissões virão e a região que se desenvolveu à luz de Tecnocity apagar-se-á juntamente a seu ocaso. (Il Manifesto, 18 e 19/10/96)
17/ 10/96: manifestações, passeatas e assembléias em várias cidades - Milão, Florença, Roma, Veneza, Cagliari, Turim, Bolonha e outras - de estudantes secundaristas e universitários, convocada pela Coordenação Nacional das Listas Universitárias de Esquerda, abrindo o "outono quente dos estudantes". Protestaram contra ameaça de reforma universitária que introduz o "número fechado", limitando o acesso ao ensino superior, além de taxas. (Il Manifesto, 12 e 18/10/96)
25/10/96: manifestação nacional dos estudantes em Roma, além de uma jornada de mobilizações em sessenta cidades (Milão, Turim, Nápoles, Gênova, Perúgia, Taranto, região da Toscânia, de Reggio Calábria, Reggio Emilia, etc) colocaram 200.000 estudantes nas ruas. Além da Coordenação, a UDS e a UDU (democráticas) também convocaram a [fim da página 26] manifestação contra a reforma do ensino e por maior democracia. Com os estudantes, voltaram também os velhos slogans e as velhas canções de protesto ("Bandiera Rossa", "Bella Ciao") em meio a algum rap. (Il Manifesto, 26/10/96).
26/10/96: manifestação nacional convocada pela oposição sindical - COBAS, CUB, RdB, COMU - contra a reforma financeira/plano econômico do governo (previdência incluída) . Antes disso, invadiram no dia 18/10 a RAI para protestar contra a falta de espaço em seu noticiário, garantida por lei, a sua manifestação. Reivindicam o retorno da "scala mobile" (reajustes salariais de acordo com a inflação), semana laboral de 32 horas sem cortes salariais, pleno emprego, direito à habitação, saúde, educação, aposentadoria e democracia no local de trabalho. Acusam as três grandes centrais de conluio com o governo Prodi, na questão da reforma orçamentária. (Il Manifesto, 19- 24 e 26/10/96)
15/10/96: anunciada manifestação nacional em Roma dos metalúrgicos, a maior categoria dos trabalhadores industriais italianos, de novo à frente do movimento. Outras categorias que adeririam à greve, adiaram o encontro. A incapacidade do movimento sindical de ver que o problema da quebra de contrato dos metalúrgicos interessa a todos e não só a essa categoria, porque assinala os limites da "via da negociação". Entretanto, muitos ainda estão presos a esse tipo de sindicalismo e se não tiveram ainda quebra de contrato é porque inclusive só negociam o que a patronal quer. E nesse meio ainda, a disputa entre as três grandes centrais com a CISL, porque forte entre funcionários públicos, querendo uma manifestação contra a reforma do governo e a CGIL, querendo limitá-la a um confronto com a Cofindustria. (Il Manifesto, 18/10/96)
outubro/96: Julgamento de processo que incrimina dirigentes da Fiat por doença ocupacional:
O modelo de saúde ocupacional italiano desenvolvido nos anos 70 foi um marco, referência para muitos -até hoje - fora da Itália. Entretanto, a nova administração da qualidade, com o modelo japonês, com as "ilhas" de montagem deixou longe no tempo as conquistas que protegiam os trabalhadores da intensidade do ritmo da produção, inclusive com a acusação desse modelo que seria responsável pela perda de competitividade da indústria italiana. E, no caso da Fiat Mirafiori, no período 85 até '93, as trabalhadoras da montagem de câmbios, depois substituídas por homens, e depois também eles, adoeciam de tendinites e outras doenças do grupo LER. A empresa refutava aos sindicalistas que isso se devia a prática de tênis ou manuseio de ferro de passar! O [fim da página 27] processo iniciado em 93, finalmente levou ao tribunal, em outubro '96, nove dirigentes da Fiat responsabilizados pelas lesões a vinte e nove trabalhadores. Os peritos concluiram que as doenças se deviam ao excessivo ritmo imposto na nova organização do trabalho, muito superior ao da linha de montagem. Antes, tinham ao longo da jornada quarenta minutos de pausa; nas ilhas, a pausa foi reduzida a vinte - teoricamente. De fato, como deveriam montar sessenta e seis câmbios e cada um levava sete minutos, e alguns mais sofisticados, até mais, só conseguiam realizá-los eliminando as pausas, inclusive parte do intervalo de almoço. Os técnicos recomendaram que se limite a trinta e dois a trinta e oito câmbios/dia a produção de cada trabalhador. (Il Manifesto, 18/10/96)
FRANÇA:
30/09/96: greve nacional dos professores em protesto contra ameaça de eliminação de 5 mil postos de trabalho.
17/10/96: com o slogan "uma sociedade que põe o lucro antes do homem, é uma sociedade à beira da morte", ocorreu a greve geral dos funcionários públicos de todos os setores, em defesa do "emprego, do serviço público e do poder de aquisição", com grandes manifestações em Paris, Marselha, Lion, Estrasburgo, Toulouse, Rennes, Nantes, Bordeaux e outras. Esta greve foi convocada por sete federações sindicais, incluindo a reformista CFDT, muito próxima ao governo, que recebeu vaias. É de se lembrar que a grande greve de novembro-dezembro 95 começou de fato a partir de uma manifestação dos funcionários em outubro. Agora, o plano de Juppé ameaça cortar 6 a 7 mil empregos públicos cinco mil na Educação), além de redução ou extinção do programa de renda mínima. Além disso, continuam as ameaças de privatizações, estando prevista, para '97, a TELECOM. Os grevistas continuam contando, como em '95, com a aprovação da população, ferida pelo alto índice de desemprego, aumento do trabalho temporário (75% dos empregos criados em 95), piores condições na prestação do serviço público, seja educação, saúde, transportes, comunicações. Como lembraram, "Privatização é bom para os ávidos, não para os usuários". Foi marcada nova paralisação em 10 de novembro próximo; prevê-se ainda diante da insatisfação popular uma repetição das jornadas de 95, com maior força. (Il Manifesto, 18/10/96; Folha de S. Paulo, 18/10/96 1-12 e 20/10/06 1-19) [fim da página 28]
ESPANHA:
30/09/96: protesto dos 2 milhões de funcionários públicos pelo congelamento salarial imposto pelo governo, na forma de "greve de consumo"( restringir compras estritamente ao essencial).
15/ 10/96 : greve com grande marcha em Madri de funcionários públicos, convocada por oito centrais sindicais. (Clarín, 28/09/96)
ARGENTINA:
26 de julho: manifestação de 15.000 pessoas, em Buenos Aires, contra o plano neoliberal de Menem e por mudanças na política governamental, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Argentinos (MTA), sindicalismo de oposição, que pedia a queda de Cavallo. Ele saiu, mas o plano - e o presidente- continuam. O MTA prometeu continuar com as lutas até a mudança de política econômica. (Clarín, 27/7/96)
08/ agosto/96: greve geral em protesto contra a política econômica.
12/agosto /96 : manifestação popular com o "apagón" contra a política neoliberal de Menem, com ampla participação da população.
19/ setembro/96: ocupação da fábrica da Fiat em Córdoba, também em protesto contra a flexibilização imposta através de subterfúgios. Os 1.700 trabalhadores eram empregados da CORMEC e filiados à UOM. A venda da planta à Fiat , num acordo obscuro, implicava também que deixariam o sindicato metalúrgico e passariam ao SMATA, sindicato dos mecânicos, cujo convênio era mais " flexível"( redução salarial de 50%, redução à metade do número de cargos e "condições de trabalho flexíveis"). Embora esse contrato irregular incomodasse aos sindicalistas, os trabalhadores aceitaram a situação - sempre a questão da manutenção do emprego. Foi-lhes informado que o novo contrato implicaria uma redução salarial de 12%; porém, descobriram depois que de fato era de 50%. O que levou à ocupação. (Clarín, 20 e 23/09/96).
26 e 27/09/96: CGT e MTA realizaram greve geral conjunta de trinta e seis horas, contra a flexibilização do governo Menem; a greve teve adesão plena, chegando até a províncias menos desenvolvidas , como La Rioja de Menem. Em Buenos Aires, a manifestação reuniu 100.000 pessoas. Essa greve marcou o rompimento da CGT com o governo, porque o fato imediato era a reforma trabalhista, com propostas acintosas, como eliminação de repouso semanal. O porta-voz da central declarou que "Direitos não se negociam"( Folha de S. Paulo, 28/9/96). A greve conjunta, foi decidida após conflitos entre militantes de ambas as centrais, que culminaram com a renúncia de Gerardo Martinez, [fim da página 29] secretário-geral da CGT e um dos principais responsáveis pela postura da Central, nos últimos anos "parceira" do governo na ação neoliberalizante. Sua substituição, sinal de uma mudança, uma ruptura com o perverso passado recente da central, facilitou a ação conjunta das centrais. (F.S. Paulo, 6/9/96; 2-4). (O novo secretário-geral da CGT é Rodolfo Daer, antes presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Alimentação, ironizado por Menem por ter, durante sua gestão naquele sindicato, assinado acordo de flexibilização trabalhista.) Prometem novos protestos, da mesma forma que o governo ameaça em não ceder. Os presidentes das três grandes centrais brasileiras - Vicentinho, da CUT, Medeiros, da Força Sindical e Enir S. da Silva, da CGT participaram da manifestação em Buenos Aires, em solidariedade com os argentinos. Em artigo publicado em conjunto pelos três líderes sindicais (F.S. Paulo, 29/9/96), informavam de que preparam ações conjuntas com os colegas do Mercosul contra o "desemprego, a precarização dos direitos trabalhistas e das condições de trabalho". Vale lembrar ainda que, em 7/10/96, Menem assinou decreto que implica num golpe aos sindicatos argentinos e deve aprofundar a distância entre seu governo e a CGT. Por esse decreto, os serviços de saúde e assistência social ("obras sociales") até agora controlados pelos sindicatos e que lhes permite o controle de recursos no montante de US$ 2,5 milhões anuais, deverão passar, em '97, para a iniciativa privada. ( Folha de S. Paulo, 9/X/96)
CHILE:
15 a 27/10/96: greve de funcionários públicos municipais, em todo o país, por reajuste salarial de US$ 120 para todos; registraram-se atos de violência. A greve continuava e até essa data não havia perspectiva de solução do conflito. (Clarín, 27/10/96)
23/10/96: manifestação dos funcionários públicos contra a política do governo e o congelamento dos salários; fortemente reprimida, deixou um saldo de vinte feridos. Anunciaram greve nacional até o final do ano. (Folha de S. Paulo, 24/10/96)
PARAGUAI:
7/08/96: O país também assistiu à retomada das greves gerais: de maio de 1994 até agosto último, a quarta greve geral, convocada pelas três centrais sindicais e pelas organizações camponesas - CUT (esquerda), CNT (cristã) e a CPT (oficialista) e a Federação Nacional Camponesa [fim da página 30] (FNC, esquerda) - reuniu operários e camponeses contra o plano de ajuste neoliberal de Wasmosy, contra a privatização da represa hidrelétrica binacional Yecyretá e pela legalização das ocupações de terra, por aumentos salariais de 30% e pelo cumprimento das leis trabalhistas. Pediam a renúncia ao "plano neoliberal selvagem". Mas, além dos pontos específicos, os protestos visavam rechaçar a política de ajuste do governo, que levou ao crescimento da miséria e do desemprego. Dentro do extenso plano de lutas sindicais, mais uma greve geral, de 72 horas, em novembro próximo. As três greves gerais anteriores, tiveram enfrentamentos violentos, e já contabilizavam um saldo de cinco mortos; a greve de agosto, fortemente reprimida, deixou mais de vinte feridos. (Clarín, 8/8/96)
MÉXICO:
2/09/96: manifestação de trabalhadores da previdência, com 5.000 participantes, no centro da capital, contra sua reforma. Imagens pungentes (noticiário televisivo - jornal noturno do SBT; a imprensa nacional não o noticiou) em que vertiam o próprio sangue dos braços, em protesto ao governo que os vampiriza.
2/10/96: manifestação com mais de cem mil pessoas, comemorando o aniversário do massacre de 1968, no centro da capital; pediam o livre trânsito aos zapatistas para participar na reunião de 8 a 12 de outubro no D.F., proibida pelo governo de Zedillo.(Il Manifesto, 5/10/96).
Se não incluímos os EUA na retomada do "outono quente" de 96, isso não significa que tenham ficado alheios aos ventos de mudanças. E com antecipação, pois ela se deu em outubro de '95, trazendo uma transformação sem precedentes na poderosa AFL-CIO. E a novidade do congresso da central nas eleições convocadas pelos rebeldes foi que se tratou de eleições de fato, concorridas, uma disputa verdadeira e não o ritual da farsa democrática com cartas marcadas, que culminaram com a derrota do candidato apoiado pelo ex-presidente todo poderoso que a dirigia desde 1979 até ser obrigado a pedir demissão, em agosto '95. Em sua gestão, em termos de política externa, teve como preocupação maior estabelecer um sindicalismo moderado e centrista, no mundo, tendo como objetivo fundamental o combate ao comunismo. E isso, mesmo quando esse combate passava por ações como a de organismos [fim da página 31] representantes de seu IADESIL - Instituto Americano para o desenvolvimento do Sindicalismo Livre, como o ICT, no Brasil -Instituto Cultural do Trabalho - que teve participação na preparação do golpe de 64 e, nos anos '80 apoiou a CGT de Magri, contra a CUT. A nova diretoria, que tem na presidência John Sweeney, do Sindicato dos Empregados no Serviço Público - SEIU (1,1 milhão de afiliados), sindicato agressivo e forte mesmo nos anos '80; na vice, Linda Chávez-Lopes, primeira hispânica (e segunda mulher) na direção da Central, também do SEIU; e, como secretário-tesoureiro, o líder do Sindicato dos Mineiros, também agressivo. Ou seja, não se trata de apenas uma troca de diretoria, mas uma mudança na direção, nos rumos da AFL-CIO. Em termos de política externa, declaram como único objetivo "a estruturação de uma solidariedade sindical mundial, necessária para enfrentar a espoliação dos trabalhadores pelas multinacionais" (Moberg, 1996: 44). Essa questão toca diretamente o NAFTA e implica numa ação que eleve o nível de vida dos trabalhadores no México, por exemplo. E também em ações, como aquela desenvolvida no outono de 95, como o ataque à rede de lojas GAP, especializada em vestuário, porque usava trabalhadoras subcontratadas e explorava jovens em El Salvador. Enfim, a luta pela "cláusula social", ou pela "globalização do sindicalismo", resposta imprescindível à globalização econômica. (Frente à publicidade negativa, a empresa cedeu, exigindo de seus fornecedores respeito à legislação trabalhista e readmitiu aqueles que demitira).
No plano interno, representa o fim da política de conciliações e negociações, o retorno à defesa dos trabalhadores, reorganização sindical, desenvolvendo campanhas em todos os sindicatos para novas filiações (30% do orçamento destinado a isso, o mesmo índice que o SEIU vem dedicando desde os anos '80) e novas estratégias de mobilização. Como exemplo dessas mudanças, ainda no outono de 95, a ação do Sindicato do Vestuário contra as chamadas "oficinas de suor" - fabriquetas de baixo salário, péssimas condições de trabalho, trabalhadoras sem registro (aqui nós as chamamos de "pronta entrega", ah! a ilusão das palavras e da sedução da "modernidade"). As grandes redes de loja foram obrigadas, sempre pela publicidade negativa, a exigir de seus fornecedores no país. padrões mínimos, em termos de direitos trabalhistas.
Na campanha pelas eleições presidenciais de 1996, aplicaram US$ 35 milhões para a reeleição do democrata Clinton, com os qual têm certas pendências, para manter afastados do poder os conservadores. Também realizaram em 96 um "verão sindical", com forte campanha pela sindicalização (Gazeta Mercantil, 9/X/96 -A-3). [fim da página 32]
Vale lembrar ainda que "La Marcha", passeata realizada em 12/10/96, em Washington, a primeira dos hispânicos que, a exemplo dos negros, começam a se organizar; reuniu milhares de manifestantes e contou com o apoio da AFL-CIO renovada. Mais um exemplo da concretização da linha de apoio aos movimentos sociais das chamadas "minorias". (A comunidade que, nos EUA já representa quase 10% da população, pediu a continuidade dos programas de ação afirmativa, anistia para os ilegais e fim da política contra a imigração.) (Folha de S. Paulo, 11/X/96; Clarín 13/X/96).
Quando em dezembro de '95, as ruas de várias cidades francesas foram tomadas por milhares de manifestantes em greve, em protesto contra ameaças de cortes na previdência que atingiam fundamentalmente o funcionalismo, muitos quiseram minimizar o impacto do fato. Afinal de contas, decretou-se o fim dos movimentos sociais, o fim do sindicalismo de combate, junto com o fim da história e a vitória do pensamento único. Um protesto forte, mas - gostariam - isolado, apesar de quase um quarto da população ativa francesa ser constituída por funcionários públicos.
Foram os mais fortes protestos em dez anos que, além da adesão do funcionalismo e dos estudantes, contou com a participação de alguns sindicatos do setor privado e também com o apoio e simpatia da população. As jornadas de luta, iniciadas na greve de 10 de outubro, culminaram com a terceira manifestação nacional contra as reformas de Juppé, em dezembro, convocadas conjuntamente pela CGT, de há muito imobilizada, e pela Força Operária, mais radical, rivais há quarenta e oito anos.
Com um movimento sindical enfraquecido, partidos políticos alternativos, idem, para muitos, tratava-se apenas um espasmo de agonizante. Espasmos ou não, conseguiram sacudir o movimento sindical, quase ausente, além de bloquear até o momento as más intenções de Juppé, embora não a direção geral do governo (anunciaram recentemente a privatização do TELECOM para o início de 1997). Além do mais, essas manifestações vem se sucedendo em vários países. E, na própria França, como vimos, repetiram-se neste ano. (Folha de S. Paulo, 1, 2,3,7/12/95 e 14/01/96; Le Monde Diplomatique - dezembro/95) [fim da página 33]
Se ´96 aponta para um novo hiato na história do sindicalismo, com a retomada das resistências e o surgimento de um "segundo outono quente", em termos heurísticos vale lembrar a questão da emergência dos fenômenos (Bunge, 1980). De qualquer forma, seria pelo menos falso e imperdoável deixar de registrar que mesmo nos piores momentos, quando grandes e importantes centrais e sindicatos cediam à voragem do capitalismo neoliberal, buscando ser seus parceiros, houve resistências de alguns. E, novamente, devido a nossas limitações, resgataremos apenas alguns desses casos, limitando-nos a alguns países (Argentina, Brasil, EUA, Itália e México). Por outro lado, também vale a pena retrocedermos ao início desses processos, lembrando como se golpeou duramente a resistência dos trabalhadores, para impor a estupidez neoliberal. No Chile, um golpe militar; na Inglaterra thatcheriana, entre outras, a greve dos mineiros, entre 84-85 e que durou cinquenta semanas. Sem dúvida, uma resistência - inútil, é certo - contra a reestruturação produtiva, mas corajosa. (4)
Por sua vez, na Itália, a derrocada que marcou também a inflexão nas centrais italianas, inclusive da própria CGIL, liga-se à derrota dos metalúrgicos italianos da Fiat, na greve de 1978. Depois disso, amargaram doze anos sem voltar às ruas e, mesmo quando o fizeram (em 1990), estava muito longe das grandes manifestações de outrora.
E até a CGIL aderiu ao malfadado modelo do "sindicalismo de negociação". E essa história se repetiu em vários países, Brasil, México, Argentina, Paraguai....
Restou algo em meio às trevas, enquanto se fingiu que se vivia no melhor dos mundos possíveis? Felizmente, a realidade é mais complexa. [fim da página 34]
ARGENTINA:
Na Argentina, a experiência suicida neoliberalizante levou à desindustrialização, ao desemprego espantoso, como estamos cansados de saber; no plano sindical e dos direitos trabalhistas, antes da batalha que quebraria/ou quebrará os direitos constitucionais dos trabalhadores, ou o próprio direito trabalhista, as "flexibilizações" avançaram e contaram com o apoio, muitas vezes, dos próprios sindicatos (Paulón, 95). Um trabalhador argentino, da Zona Industrial de Villa Constitución, província de Santa Fé) disse-nos, em novembro de '95, que eram agora os próprios sindicalistas a assumirem o papel de algozes dos trabalhadores, dirigindo o processo de "terceirização" e colocando-se como os "novos pequenos patrões". Nesse período de concessões tão fortes, realizadas pelas grandes centrais, registra-se também o trabalho do sindicalismo de oposição, como a oposição sindical dos metalúrgicos San Nicolás (província de Buenos Aires) que, como os COBAS italianos, colocaram em prática a reconstrução do sindicalismo com o retorno às bases, um sindicalismo identificado com os trabalhadores e que se coloca em sua defesa. (Paulón, 95)
BRASIL:
No Brasil, a sedução ou o imobilismo dos sindicalistas pelo modelo neoliberal vem se dando principalmente a partir do governo Collor, que inclusive financiou a criação da Força Sindical, desestruturando a CUT com um sindicalismo que "dizia sim", colaborador e nada crítico (Comin, 1994). No atual governo FHC, de clara opção neoliberal e investida contra os trabalhadores e seus direitos, temos poucos exemplos de tentativas de resistências, ainda que fracassadas, e dificultadas inclusive pela linha de sindicalismo adotada pela própria CUT em sua última gestão e que a aproximou também do "sindicalismo de negociação".
A mais importante delas foi a greve dos petroleiros, em maio de 95. Uma greve em defesa do monopólio do petróleo, ameaçado pelo atual governo e, principalmente, pelo cumprimento do acordo de trabalho, firmado em novembro de '94, entre a Petrobrás e a Federação Unitária dos Petroleiros - FUP - (vinte e uma entidades sindicais, em catorze estados). Assistimos então à novela rocambolesca da justiça do trabalho, que, numa situação onde não havia possibilidade objetiva de recusar o recurso dos petroleiros, deu ganho de causa à empresa. Por [fim da página 35] outro lado, o lock-out do gás de cozinha, escondido pela distribuidora para facilitar a propaganda - intensa - nos meios de comunicação que vociferavam "contra o corporativismo" dos petroleiros. Como diria Colletti, apenas a subreptícia inversão da realidade ou a velha e perniciosa hipóstase. E, como se isso já não bastasse, a CUT, central à qual a FUP é filiada, foi imperdoavelmente omissa. Abandonados, os petroleiros resistiram durante trinta dias o duro braço de ferro com o governo que, assessorado pela ex-dama de aço, já desprestigiada em seu país, mas que veio ao Brasil a preço de ouro, queria "quebrar a espinha dorsal do movimento sindical brasileiro". Como sempre, os petroleiros foram castigados com demissões (inclusive Spis, presidente da FUP), desconto dos dias parados e não cumprimento do contrato. (O absurdo era tamanho que, ao mesmo tempo, foi-lhes pago um benefício qualquer que, de certa forma, compensava o desconto). De novo, a solidão dos trabalhadores em tempos de neoliberalismo. Ao mesmo tempo em que registramos aqui essa resistência, devemos alertar para o que se seguiu. A Petrobrás continua ameaçada pela privatização; a automação dos processos só fez aumentar, preparando para um desfecho em breve; muitos foram levados, como em toda esfera do serviço público, a se aposentar; a terceirização avançou enormemente (em alguns setores de algumas refinarias, podem se contabilizar 1 petroleiro para 3 "terceirizados"). Quando em 26 de setembro 96, os bancários entravam em greve (data da mobilização na Argentina) inicialmente pensavam fazê-lo com os metalúrgicos e os petroleiros, unificando a campanha pelas datas-base, só os bancários o fizeram. Os metalúrgicos desistiram; os petroleiros optaram por uma paralisação no início dos turnos. Só. (Folha de S. Paulo, vários números de maio 95 e setembro 96)
O Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, firmou uma série de contratos com a Volks (células, março/94; terceirização, abril/94; trabalho em grupo, março/ 95; participação nos resultados, junho/95). Acreditavam-se os construtores do "modelo alemão", do novo padrão de produção e de sindicalismo. Porém, em setembro/95 foram surpreendidos com o anúncio de 1.200 demissões e rompimento dos contratos. Durou pouco o modelo no Brasil. Em fevereiro/96, um novo contrato de flexibilização da jornada e redução a 40 horas, "criou" 470 empregos.
Outro caso - infeliz - que resgataremos é o da grande mobilização que não houve, e que se preparava para o final de janeiro de '96. No Brasil, o exemplo francês, num momento de perseguição inusitada pela duração, constância e força ao funcionalismo público, em particular e ameaça para todos, golpeando duramente os desprotegidos do setor [fim da página 36] informal e todos os ameaçados pela reestruturação e "flexibilizações" que significam apenas perda de direitos, incluindo reformas inconstitucionais, impulsionava um evento semelhante e inflamado em janeiro último. O "acordo" do presidente da CUT com o senhor presidente, depois desfeito, cortou qualquer possibilidade de protesto, que prometia a mesma força do protesto francês. Valia ainda o sindicalismo de negociação e a preocupação em se colocar como a interlocutora do governo, mesmo ao preço do desgaste entre seus representados.
Depois, em junho, com outras centrais, houve a greve geral contra o desemprego, mas sem a força e o impacto que a anterior prometia.
No Brasil, então, não se pode falar de outono ou qualquer outra estação quente, apesar do calor tropical, ainda que haja alguma mobilização, preparando iniciativas conjuntas com centrais do Mercosul, com manifestações marcadas os três países, e centralizadas em Fortaleza, no final de novembro. Ou, também nessa direção, a participação de sindicalistas brasileiros na greve da Argentina e, posteriormente, o Seminário realizado em S. Paulo, em 10-11 de outubro. Apesar da importância dessas iniciativas, o contraste com a inação frente a medidas do governo, como o pacote de 10 de outubro último contra o funcionalismo público, salvo alguma reação em Brasília, deixa a sensação de um longo inverno.
Entretanto, ainda que com receio de cairmos em algum otimismo perigoso, assinalaremos uma mudança na CUT que, esperemos, se reflita cada vez mais em sua atuação. Trata-se de uma guinada entre as teses sobre reestruturação produtiva preparadas para o 7o e o 8o Congresso da central (agosto 1995 e agosto 1996, respectivamente). A tese do 7o. Congresso era um exemplo acabado do "sindicalismo de negociação" e, no afã de salvar a indústria nacional, esqueciam os trabalhadores (Buonfiglio, 1995). As teses do 8º vão numa linha radicalmente oposta, particularmente o texto 3 (Almeida; Travassos e Gouveia, 1996). A prevalecer essa posição, teríamos um forte instrumento de luta e de defesa dos trabalhadores. Mas, na ausência de fatos, é cedo para avaliar essa possibilidade.
Ainda vale lembrar que apesar do sindicalismo de negociação, dos contratos com a Volks, que se não eram desvantajosos num primeiro momento, representavam uma negociação no terreno da empresa, a CUT não endossou a flexibilização dos contratos de trabalho, como a [fim da página 37] Força Sindical. E, por outro lado, há ações que apontam para a resistência, para respostas. Assim, podemos lembrar:
a) campanha pela 30 horas dos químicos filiados à CUT; o protesto de mulheres dos químicos de turno da UNIPAR, em greve desde 19 de agosto, com panelaço das 8 às 11:30 na manhã de 5/9/96, contra decisão da empresa em não negociar (Folha de S. Paulo, 6/9/96, p. 2-8).
b) o 7 de setembro, dia da independência, comemorado com "o grito dos excluídos", convocado pela Igreja, pelo MST e pela da CUT, tendo manifestações em vinte e cinco cidades; em algumas, participação dos indígenas, dos sem teto. (Folha de S. Paulo, 7 e 8/9/96)
c) 10 e 11/ outubro: em S. Paulo, reunião das centrais sindicais do Cone Sul, organizado pela CCSCS (Coordenadora de Centrais Sindicais do Cone Sul), presidida atualmente pela CUT brasileira e da qual participam Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai. Na pauta, a discussão de medidas contra o desemprego e ações conjuntas na região, iniciando o processo de "globalização" do sindicalismo para enfrentar a globalização econômica. A idéia dessa reunião surgiu durante a manifestação em Buenos Aires, que contou com a solidariedade dos demais sindicatos da América do sul. Participaram as seguintes centrais: CGT, da Argentina; CUT, CGT e Força Sindical, do Brasil, CUT, do Chile; CUT, do Paraguai; PIT/CNT (Plenário Intersindical de Trabalhadores/Confederação Nacional de Trabalhadores, do Uruguai. Na pauta, a unificação do salário-mínimo na região (Argentina, US$200; Brasil US$ 112,00; Uruguai US$120,00; Paraguai US$300,00), o nivelamento das condições de trabalho, combate ao desemprego, proteção à produção nacional; a discussão da cláusula social que prevê a vinculação de acordos comerciais ao respeito da legislação trabalhista). A proposta da CUT brasileira incluía ainda menor tributação para a pequena e média empresa, reciclagem profissional e jornada de 40 horas semanais (proposta algo retórica, porque de um lado, a maioria formalmente é de 40 horas, embora por outro lado, tem sido constatado aumento nas jornadas - em todo o mundo, Brasil inclusive; enfim, de um lado ótimo porque alerta ao problema e necessidade de defendê-la e, de outro, tímida porque é preciso muito mais). Do encontro, resultará a primeira manifestação conjunta nesses países e centralizada em Fortaleza. (Folha de São Paulo, 5/X/96 -1-4 e 10/10/96 2-8; Gazeta Mercantil, 9/X/96 -A-6)
d) a greve dos bancários, deflagrada em 26/9/96, por reajuste salarial na data-base e com nove dias de duração; ficou restrita a alguns centros urbanos (S. Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte e mais algumas [fim da página 38] capitais), a algumas instituições (Unibanco, Real e Mercantil de S. Paulo) e, sempre, apenas a algumas agências. Caracterizou-se pela baixa adesão da categoria, atemorizada e castigada por um desemprego massivo (desde o início da década, 35% dos postos eliminados). Uma greve, no dizer do presidente do Sindicato dos Bancários de S. Paulo, Ricardo Berzoini, "ousada, levada mais pela direção" e, tanto que utilizaram piqueteiros de outras categorias. O acordo firmado, assim mesmo, trouxe algum ganho: reajuste de 10,6%, muito inferior ao pretendido, mas superior ao proposto pela FENABAN. (Folha de S. Paulo, 8/10/96; 2-11) (5). É de se notar ainda que alguns sindicatos dos bancários, entre eles o de S. Paulo, tem tido uma postura de não adesão à reestruturação, tem-se preocupado pelo menos desde o início dos anos '80 com as novas tecnologias e se não tem podido barrá-las, não é por terem optado pela política de "negociação". Ao contrário, tem até, em alguns momentos, logrado algum êxito na defesa dos bancários, como no caso dos contratos de interpolação de mão de obra (Blanco,1994). Apesar disso, o sindicato não tem força de barrar a avalanche que os aplasta com a automação bancária. E agora, menos ainda com os programas de enxugamento ou reengenharia, com seus "programas de demissão voluntária". Isso porque, a questão extrapola os limites do espaço produtivo e pede uma solução que passa pela interferência de toda a sociedade. Ou logramos o controle social da tecnologia, isto é, realizar os avanços sociais compatíveis com os avanços tecnológicos, ou estaremos definitivamente perdidos.
e) Ainda se deve assinalar o caminho alternativo de sindicatos que, por desconhecimento e incapacidade nossa, deixamos de registrar, mas que serão lembrados pela referência ao SINTRICOM, Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Construção Civil, de João Pessoa, que desde os anos '80, quando a oposição sindical "Zé Pião" foi eleita, vem construindo, através do contínuo e constante trabalho de base - muito antes da discussão atual sobre a necessidade do retorno a elas - e num setor caracterizado pela dispersão espacial e pela rotatividade dos [fim da página 39] contratos por tempo determinado, um sindicalismo vivo e respeitado, porque junto do trabalhador. Ainda na construção civil, lembrar a declaração do sindicato de S. Paulo, contra a legalização dos contratos de trabalho flexíveis, propostos pela sindicato dos Metalúrgicos de S. Paulo ou de Belo Horizonte, ambos ligados à Força Sindical, por conhecerem bem seus efeitos perniciosos. E, ainda, o trabalho da direção do SINTESPB, não só por sua influência nacional, através de sua liderança na FASUBRA, mas também por ter implementado ações, no último ano, que visam seu fortalecimento e credibilidade na categoria e junto à sociedade (como o curso pré-vestibular, aberto inclusive à população).
E.U.A. :
Nos EUA, a derrocada do movimento sindical se deu nos anos '83-'84 (governo Reagan) quando, frente à crise e à competitividade com o Japão, empresas desenvolveram a estratégia do fechamento e transferência - ou ameaças de - para outras áreas - no México ou no próprio país - conseguindo baratear enormemente o valor dos salários e contratos desfavoráveis para os trabalhadores, porque implicavam na perda de conquistas anteriores (dias de férias, prêmios). Desde então, e principalmente com a reeengenharia, a toyotização e o avanço contínuo da automação, o sindicalismo norte-americano entrou em declínio e perda do poder de luta, mesmo em sindicatos antes forte, como o UAW. ntretanto, mesmo quando no geral podemos concordar com Elder (1994), ao afirmar (no caso dos telefônicos) que "a reação foi fraca e tardia", alguns fatos merecem ser destacados. São eles:
a) O retorno do I.W.W.:
Entre o final do século passado e o início deste, a força do anarco-sindicalismo era bem representada em organizações como os "Cavaleiros do Trabalho" ("The Knights of the Work) -de origem inglesa e com forte enraizamento no Canadá e nos Estados Unidos - e o IWW - Industrial Workers of the World, cujos associados eram conhecidos por "wobblies". O I.W.W. foi esmagado pelo seu pacifismo, acusado de pró-alemães, ainda no final da Primeira Guerra Mundial. Sem dúvida, entre os vários fatores da destruição do anarco-sindicalismo estava a ascensão dos comunistas, aparentemente mais eficazes. Hoje sabemos o preço da eficiência! Mas a questão é que ao olharmos o quadro do devastado movimento sindical, nas luzes de esperança vemos o renascer não só [fim da página 40] das velhas formas de luta, mas também das velhas organizações. E entre elas, a volta do IWW, recriado em janeiro de 1995. (Home-page IWW)
O IWW do passado, com marcante presença entre lenhadores, mineiros e trabalhadores de agroindústrias (setores econômicos críticos na Primeira Guerra Mundial) conseguiu aglutinar também os inumeráveis desempregados de então, que se valiam da tecnologia de ponta da época, as ferrovias, e cruzavam o país, agitando-o com mobilizações massivas. Propõe-se agora a aglutinar assalariados de todos os setores, desempregados, aposentados, empregadas domésticas, prisioneiros.
b) Sindicalistas criam o "Labor Party":
Em Cleveland, Ohio, em convenção realizada entre 6 a 9 de junho 95, da qual participaram 1.400 delegados de quarenta e quatro estados, representando mais de dois milhões de sindicalizados, foi criado o Partido Trabalhista "para lutar por justiça econômica". Maiores responsáveis por sua criação são os sindicatos Oil, Chemical and Atomic Workers (OCAW) e United Electrical workers (EU). A convenção contou com a presença de nove sindicatos internacionais (ou seja, com atuação nos EUA e no Canadá), 117 locais (subseções), além de políticos da Califórnia e do Texas, do candidato presidencial do Partido Verde, de organizações de trabalhadores - como o Black Workers for Justice (BWfJ) e outras organizações de esquerda. Apesar da ausência de apoio tanto do UAW, o maior sindicato, envolvido na campanha pela reeleição de Clinton, como do SEIU, o agressivo sindicato dos funcionários públicos, contou com a presença de muitos membros do SEIU e algumas representações locais do UAW; foi pequena a participação dos Teamsters, sindicato dos transportadores, envolvidos em eleições internas (de novo a disputa com o candidato de Jimmy Hoffa Jr). Porque ainda se estruturam e precisam crescer, não apresentaram candidato para essas eleições presidenciais. Querem se tornar a voz e a opção para os trabalhadores da América, lutando por trabalho para todos, com salário digno. Pedem mínimo de US$ 10,00 por hora, com reajuste automático da inflação, semana laboral de 32 horas, programa de saúde universal, proteção e ações afirmativas para minorias e trabalhadores imigrantes. (La Botz, 1995) Apesar de nossa descrença ou cansaço de reformas dentro das velhas regras já estabelecidas (vide o PT, no Brasil, os trabalhistas, na Inglaterra ou até mesmo o PRC, na Itália) deve-se, pelo menos, acompanhar o desenvolvimento da proposta norte-americana. [fim da página 41]
c) A guerra dos trabalhadores de jornais de Detroit:
Verdadeira guerra, com greve iniciada em 13/07/95 e que durou oitenta e cinco dias, contra o anúncio da empresa em não cumprir até o fim o contrato vigente, implementando mudanças reestruturativas que implicavam na substituição do pagamento por mérito por aumentos salariais contratuais (levariam a favoritismo), subcontratação ilimitada de pessoal de manutenção de salários mais baixos; forçar membros sindicatos a pagar prêmios de seguridade e saúde, eliminação de mais da metade dos 3.000 cargos, que seriam convertidos em empregos para não sindicalizados; substituição de oitenta cargos por empregados de tempo parcial, com metade do salário e sem benefícios; eliminação das regras trabalhistas para impressores e gravadores, sem pagamento de benefícios para compensar cortes dos operadores de prensa. Esse conflito levou à união de seis sindicatos (jornalistas, tipógrafos, artistas gráficos, entregadores, motoristas de caminhão e repartidores) e, também o apoio da comunidade (a "Labor Community Religious Coaligation in Support of Striking Newspaper Workers, a "Readers United" e a WILD - Women Involved in Labor Disputes"). Até o entorpecido líder do UAW sinalizou a seções locais para ajudar nos piquetes semanais. Assim mesmo, em 1o. de outubro deu-se uma ofensiva paramilitar contra os trabalhadores. E, assim, mas só assim, a empresa implantou seu terrorífico plano. (Against the Current 63)
d) Resistência de automotrizes de seções locais do UAW e do canadense CAW à "produção enxuta":
O toyotismo ou "lean-production", que para deixarmos os eufemismos de lado merece o nome sugerido pelo Labor Notes- "administração por estresse" - teve na indústria automotriz, talvez o melhor exemplo de sua aplicação. Trabalhadores norte-americanos ( e também canadenses) de montadoras como a NUMMI, a MAZDA e a CAMI, a ela submetidos, desenvolveram um conjunto de pequenas resistências que não só aliviaram o cotidiano desses trabalhadores, como também mostraram que o sistema não é invencível. Embora cada uma dessas experiências tenha suas particularidades, elas passam pela reconstituição do sindicato de base com eleições de coordenadores sindicais que trabalham em tempo integral na linha (ou "célula"), negociando convênios favoráveis, ressaltando a diferença de interesses entre a empresa e os trabalhadores, defendendo tempos de produção razoáveis, usando a legislação para defender condições de trabalho, [fim da página 42] reduzindo o trabalho temporário, mantendo a independência sindical. Associaram os trabalhadores de quatro fornecedoras, impedindo a subcontratação na Mazda e elevando os salários desses trabalhadores que contaram com o apoio do pessoal da empresa. Estes, em seus cartazes proclamavam: "Não tenha medo. Somos um sindicato com mais de 3.000 membros. Venha unir-se a nós". Enfim, mostraram que a única arma é o sindicato forte e corajoso. (Slaugther, 1994).
ITÁLIA:
Se nos anos 70, ou mais precisamente desde o "outono quente" de '68, o sindicalismo italiano representou a vanguarda, servindo de modelo e inspiração para outros em suas lutas e conquistas na organização do trabalho e na saúde, nos anos '80, a via do acordo, da participação, primeiramente lançada pela CISL, mas depois também seguida pelas demais, incluindo-se aí a CGIL, levou à descaracterização do sindicalismo, à solidão e abandono dos trabalhadores e, posteriormente, também a reações (Codas, 1996). Hoje, embora de um lado se coloque a necessidade de unificação das lutas, de união das forças, as resistências da burocracia das três maiores centrais, particularmente a CGIL, poderiam levar ao nascimento de outra central ou mesmo de que, ao invés da necessária separação partido-sindicato, este espaço em aberto que a CGIL teima em não ocupar, porque continua encantada com sua linha de "concertação", reafirmada no último congresso e que a torna sócia da reestruturação produtiva, poderá ser ocupado pelo partido, no caso o PRC (Il Manifesto, 22/7/96).
Os excessos levados pela linha da concertação, podem ser exemplificados com:
a)Acordo de Melfi, de 1990 no qual as Centrais assinaram o acordo sobre a futura fábrica Fiat, instalada em 1993, totalmente toyotista, com redução de custos de 25% (menor custo do trabalho em 15%, porque sul do país; 3 turnos de 8 horas: intensificação do trabalho e da jornada; trabalho noturno para mulheres, apesar de legalmente proibido, exclusão dos trabalhadores de Melfi de qualquer benefício obtido por acordo nacional.
b)Prêmios sindicais para sugestões em produtividade: não contentes com a iniciativa patronal, primeiro a CISL depois a CGIL, inicialmente na fábrica de Rivalta também decidem instituir prêmios. Como diz Gigi Malabarba uma proposta para participar "no interior do curso do 'rio' da estratégia da empresa, com a própria estrutura dos sindicatos, para manter uma [fim da página 43] relação com os operários no mesmo curso em que foram colocados pela empresa". (Codas, 1996:7)
c)A CGIL reafirmou, no Congresso de julho/96, sua opção pela "via da negociação". (Il manifesto, 22/7/96)
d) Em setembro, as três grandes centrais acertaram com o governo o "pacto do trabalho", que em nome da retórica e falsa salvação de empregos, introduz a flexibilização dos contratos de trabalho, ou seja legalizou a precariedade (contratos de aprendizagem, trabalho temporário sem direito a aposentadoria).
Essas questões exemplificam o beco sem saídas que o enfraquecimento sindical frente à reestruturação produtiva tem deixado os trabalhadores. E ela é necessária ao sistema toyotista a, mais vulnerável a greves, porque facilmente se interrompe a produção (exemplo: greve Alfa Romeo Arese: luta do pessoal de limpeza, pequeno grupo terceirizado - uns 50 trabalhadores - que impede a entrada de caminhões e, com isso, fábrica inteira paralisada por dois dias. (Codas, op. cit) Por outro lado, foram as centrais a abandonar os trabalhadores, ao aceitar a via da negociação e, mesmo com o renascimento da oposição sindical - os Cobas - prefere manter a linha desses anos de declínio.
A oposição sindical hoje, embora se apresente em várias siglas, tem seu melhor representante nos COBAS (Comitês de Base); que hoje se referem a um movimento nascido na indústria e que guardou o nome de um forte movimento de oposição de ´86-´87.
Os primeiros COBAS surgiram como movimento de massa dos professores, fora da estrutura das centrais, embora a maioria viesse da CGIL. Nasceu como movimento, nunca se tornou sindicato e lutou por reajustes salariais e em defesa da escola pública; contavam com a antipatia das centrais, que os acusava de "corporativistas". Diluiram-se depois de ter deixado uma lição de mobilização, lutas e de democracia nos feios anos 80.
Nos anos 90, os COBAS renasceram, como experiência de mobilização e de democratização no espaço fabril. A primeira experiência se deu na Alfa Romeo - Arese, atualmente também do Grupo Fiat e ligada à questão dos "Conselhos de Fábrica", experiência do passado autonomista e pré-taylorista dos trabalhadores, que as lutas de ´68 resgataram. Assim, de '69 até '84, os conselhos de fábrica eram eleitos democraticamente, com a participação de todos, sindicalizados ou não. Contrariando essa tradição, as centrais passaram a nomeá-los. [fim da página 44] Recorrendo a uma lei de '69, que permitia a votação da comissão interna, o movimento conseguiu que voltassem a ser eleitos. As centrais manipularam, determinando que um terço das vagas fosse a elas reservado, sem votação e, ainda, organizaram cédula onde constava os nomes de seus candidatos e só uma linha em branco para qualquer outro nome. Os delegados COBAS venceram as eleições apenas com essa linha. (Malabarba, 1995).
As centrais fizeram acordo nacional com a patronal, criando a RSU (Representação Sindical Unitária) garantindo sua hegemonia. Em '92, assinaram o acordo que selou o fim da escala móvel, que reajustava automaticamente os salários, gerando greve, em outubro e novembro, contra esse acordo. Renasceram então os conselhos de fábrica. O movimento cresceu e se expandiu para outras fábricas, com eleições generalizadas, mas sempre com o controle sobre a RSU. Em 92 (nov.), os COBAS se organizam como sindicato intercategorial: o SLAI-Cobas (Sindicato Intercategorial dos Trabalhadores Auto-organizados), inicialmente no ramo metalúrgico, depois em toda a indústria e ainda em setores de trabalhadores do Estado (também abandonados pelas centrais frente a ameaças de privatizações). Outros sindicatos de oposição surgiram, como o COMU (Comitê de Maquinistas Unidos) dos ferroviários.
O Slai-Cobas não quer derrubar as centrais, quer reconstruir o sindicato classista abandonado por elas; querem a unidade sindical, calcada na democracia verdadeira e não em sua encenação, a democracia-espetáculo feita com cartas marcadas e mera e bufa atuação. (Codas, 1996: 11) Questionaram a reserva de 1/3 vagas no RSU pelas centrais e conseguiram que se realizasse um plebiscito (para isso obtiveram um milhão de assinaturas), que por implicar na modificação de lei, foi votado por toda a população e, apesar das manobras e da propaganda que os acusava de anarquistas, venceram.
MÉXICO:
A "flexibilização" neoliberal no México se deu no governo de Salinas de Gortari que, para impô-la, emprendeu forte ataque aos sindicatos, com prisões, ocupações e eliminações. Prendeu o líder dos petroleiros, ocupou mina em Sonora, cooptou líderes sindicais, preparou e reescreveu o contrato para a flexibilização na Volks, congelou salários. Sua modernização, que passava pela privatização e pelo fechamento de fábricas, eliminou 400.000 empregos. [fim da página 45]
No caso da Volks (Puebla), para quebrar o sindicato combativo nesta fábrica que já nos anos '80 funcionava dentro da moderna administração toyotista, com subcontratação e "polivalência", cooptou-se o secretário geral do sindicato. Num encontro secreto com a empresa, Gaspar Bueno assinou contrato que garantia a flexibilização total e 5% de aumento por produtividade. Quando os trabalhadores souberam, houve greve e intervenção policial. A oposição sindical, com Jesús Valencia, desafiou Bueno e em assembléia votaram em favor de sua deposição. A Volks não aceitou e queria o cumprimento do novo contrato. Houve manifestação de cinco mil trabalhadores no D.F., toda a via judicial que, naturalmente deu ganho de causa à empresa. A greve foi declarada ilegal e todos os 14.289 trabalhadores demitidos e impedidos, por algum tempo, de nela voltar a trabalhar. O cooptado Gaspar Bueno ficou como secretário geral e o contrato, referendado também pelo secretário do Trabalho, foi imposto, garantindo toda a flexibilização patronal: número ilimitado de trabalhadores temporários, polivalência, isto é, trabalhadores totalmente responsáveis pela qualidade, pelo controle de materiais, pela limpeza; ainda, salário determinado pelo chefe e não por tempo de serviço e treinamento fora do horário de trabalho. Ao final, concordou em readmitir trabalhadores (afinal, precisava deles) mas recusou dois mil deles, identificados com a oposição sindical. Enfim, em setembro de '92, o governo e a Volks quebraram o movimento sindical dos metalúrgicos mexicanos.
No capítulo das privatizações, Salinas em '89 privatizou a Telmex, Telecomunicações de México, mas antes disso, acabou com o combativo sindicato de seus trabalhadores, o STRM, através da cooptação e iniciando o "neosindicalismo". O cooptado Hernández Juárez assinou em abril '89, com a Telmex o "Acordo de Cooperação", pelo qual já não se opunham a sua privatização, ao tempo que a empresa prometia que não haveria demissões. Mas havia mais: o acordo permitia a redução dos cargos , transferências e alocações de trabalho e a substituição de cinquenta e sete níveis salariais por uma única escala de pagamentos. E ainda, redução de pessoal por aposentadorias antecipadas, sem reposição e fim dos trabalhadores temporários. Ou seja, garantiu a flexibilidade total e abriu as portas às demissões ("voluntárias" ou não). Na privatização entraram a South Western Bell, a France Cable and Radio, um grupo mexicano e o STRM ficou com 4,4% das ações.
As mudanças no sindicalismo atingiram também as centrais. A CTM de Fidel Velázques, controlada pelo PRI, foi considerada um dinossauro, porque impregnada de populismo, de velhas relações. Para [fim da página 46] os novos tempos, Salinas ajudou a criar uma nova central, a FESEBES, tendo à frente o cooptado Hernández Juarez, que se juntou ao Eletrical Workers Union (sindicato dos pilotos) e outros três pequenos sindicatos. E foi Juarez quem depois "ajudou" na implantação da flexibilização na Volks.
Depois da privatização de Telmex, as transferências arbitrárias de trabalhadores para diferentes cidades e as reduções salariais se sucederam, ao mesmo tempo em que se elevou a produtividade, as tarifas telefônicas e os lucros. Parecia o melhor dos mundos possíveis para o capital, até a rebelião de Chiapas, em janeiro '94.(La Botz, 1994)
O descontentamento da população, o fortalecimento dos movimentos guerrilheiros e a retomada dos movimentos sociais, provocados por essa década de política neoliberal, trazem de volta os "dinossauros" ou velhos caciques do PRI, preocupados com o comprometimento de seu largo domínio. Propõem uma pausa, uma volta ao velho populismo, adiando ou esquecendo inclusive a privatização de PEMEX. (Gazeta Mercantil, 18, 19 e 20/10/06)
1. Introdução.
2. Um novo "outono quente" ?
2.1 Um breve olhar sobre alguns fatos: a aurora de um novo "outono quente".
2.2. Outono anterior, outra mudança: novos rumos no sindicalismo norte americano.
2.3 Outro despertar: outono/inverno 95, manifestações contra a reforma da oprevidência na França.
3. Resistências e fracassos em meio à derrocada:
4. Quando sopra o vento do sul: o renascimento dos movimentos sociais.
E, sem querer cair em qualquer tipo de terceiromundismo, podemos afirmar que a periferia está bem viva; e mais: ela agora está em toda parte.
Nesses tempos de escuridão, uma luz se acendeu e se fez fonte de esperança para milhões de pessoas, direta ou indiretamente envolvidas. E se deu fora das cidades, fora dos sindicatos, e foi a primeira e a mais firme expressão de resistência, de construção de alternativas. Evidentemente, referimo-nos aos dois mais significativos movimentos da atualidade nascidos no Brasil e no México: o MST e o EZLN. Movimentos de massa, que além de sinalizarem alternativas à lógica de poder vigente, ao poder do pensamento único, lograram uma estrutura altamente democrática e em todo diferente daquelas que hoje constituem as piores amarras do sindicalismo. Resistência. Construção. Rapidez. Firmeza. Objetividade. Democracia. Marcas de sua atuação, que por serem tão fortes e diferenciadas geram tamanha oposição na imprensa e da mídia que, subserviente, procura desacreditar essa força que desafia sem se render às manobras do poder central. Como afirma o sub-comandante Marcos, seu radicalismo reside não em armas e sim na [fim da página 47] "nova prática política: a construção de uma prática política que não busca a toma do poder, mas sim a organização da sociedade". (Il Manifesto, 4/9/96)
Diferenças entre ambos, são muitas, a começar do âmbito da atuação - O MST, nacional; o EZLN, restrito à região de Chiapas, sul do país, diferença imposta por características geo-econômicas e sociais - e também pelas referências históricas: no México, a força da tradição de um país rebelde, do líder máximo; no Brasil, um certo vazio. Ainda, no Brasil, frequentes assassinatos e massacres, como o de Corumbiara ou de Eldorado dos Carajás (abril/96); no México, o apoio da população tem até agora impedido o massacre do EZLN. (6)
A coincidência entre os dois movimentos se mostra na firmeza dos objetivos, na ausência de ânsia pelo poder: quer-se uma alternativa social para os milhões de excluídos e massacrados pelo sistema, uma solução democrática e oposta à lógica do capital. O avanço dessas lutas não sinalizam apenas os limites daquilo que se apresentou como única via possível, não mostram apenas um caminho de resgate da dignidade humana para os trabalhadores do campo, porque com isso, assinalam possibilidades para todos os demais. Contrastando com o oportunismo autofágico da maior parte do sindicalismo, nesses tempos de recuo, perdas e traições, mostram que só quando se reconhece quem é e de que lado se está, abrem-se as possibilidades. (7)[fim da página 48]
Ainda sem um caráter definitivo - os fatos ainda estão acontecendo - pode-se afirmar a volta da resistência através da oposição popular, dos condenados à exclusão social e dos trabalhadores ao modelo que veio se impondo. O "outono quente" de 96, que já é forte em vários países, deixará marcas. O exemplo mais politicamente avançado dos movimentos sociais aponta para a reconstrução da solidariedade. Teremos força e sabedoria para avançar nessa direção?
A retomada das lutas, no caso do sindicalismo urbano, é ainda eminentemente defensiva, apesar dos movimentos de oposição sindical. Uma resposta forçada à quebra de compromissos assumidos pelas empresas dentro das regras estabelecidas das flexibilizações. Mas, diante de um sindicalismo acostumado a dizer sim, sentiram-se à vontade para retirar a máscara do discurso da parceria, da qualidade. A resposta vem se dando não pela força das grandes centrais e sim pelo cansaço por acordos negativos, festejados como vantagens. Terão elas condições de mudarem tanto e passar a liderar a reação, dando um novo rumo ao sindicalismo? Com exceção dos EUA, onde a mudança de rota passou primeiro pela substituição não só de dirigentes, mas do que representavam, no caso das grandes centrais, responsáveis pela direção geral do movimento, é difícil prever a profundidade dessas mudanças. Foram empurradas ao protesto ou pela atitude das empresas - foram elas a romper o contrato e abrir o confronto - ou pelos trabalhadores, até por aqueles que não são prioritários para elas. Na italiana CGIL, que em julho reafirmou sua linha de negociação, não houve mudança mais substancial de seus dirigentes, nem maior espaço à oposição. E o mesmo vale para a CISL ou a UIL. E também para o IG-Mettal na Alemanha. E ainda para a CGT argentina, embora tenha havido a mudança forçada de seu secretário geral. (O novo, Rodolfo Daer, solução para uma ação conjunta com o MTA, foi desqualificado por Menen, que lembrou ter sido ele a assinar o contrato de flexibilização do Sindicato dos Trabalhadores em Alimentação). E o mesmo para o secretário geral da CIOSL, Bill Jordan (antes, assinou o contrato de flexibilização dos metalúrgicos ingleses). Podem os trabalhadores brasileiros confiar em suas lideranças da CGT ou da Força Sindical? E mesmo a CUT, com pecados bem menores, saberá voltar a seu caminho original nesta conjuntura, enterrando seu passado recente de negociação? Ou ainda, conseguirá se colocar como Central Única de todos os trabalhadores e deixar o viés que a tem dominado até hoje, e que a leva a avaliar os [fim da página 49] problemas exclusivamente segundo a ótica dos metalúrgicos de S. Bernardo? Conseguirá democratizar suas instâncias de poder, fundamental para um sindicato ou central dos e para os trabalhadores?
Deve-se notar também que metalúrgicos constituem ainda uma categoria muito significativa - numericamente expressiva - apesar da automação. Entretanto, o modelo de administração por estresse ou "lean production" minou seu orgulho de outrora. Significativo o "botton" adotado em Turim - "eu amo os macacões azuis", enquanto na manifestação em Milão já não usassem esses mesmos macacões. Não há mais orgulho em ser metalúrgico (aliás a destruição do orgulho profissional, passo para a destruição moral e depois até total, vem atingindo várias categorias - bancários, professores - estes, particularmente no Brasil - funcionários públicos e até profissionais da indústria de informática - Itália). Mas se a importância numérica parece inquestionável, continuam a ser a vanguarda ? Na Alemanha, na Itália foram à frente dos movimentos, mas numa reação a quebras contratuais e, de contratos dentro da linha de concessões, de negociações. Daí o repúdio. Será este o suficiente para romper com a política das grandes centrais? Ou colocá-los - agora que o modelo despe a cara do "todos ganham", "somos parceiros" - no difícil caminho inverso? Por outro lado, é de se notar que categorias de trabalhadores submetidos a trabalho precário, mesmo na ausência de tradição de lutas, tem se mobilizado, porque quase nada têm a perder. E também os funcionários públicos, categoria que levou a maior parte das mobilizações nos anos '80, agora se destacam tanto pelos acontecimentos na França, como na condução da AFL-CIO e de sua nova política.
A mudança geracional se completou e hoje temos novos atores, muitos em sua primeira greve. Entraram nas fábricas já sob o signo das novas gestões ditas modernas e padecem tanto ou mais que os de antigamente. Assistiremos à gestação de um novo caminho crítico?
E disso tudo se pode esperar que se esse caminho se fizer sob a luz emanada dos novos movimentos sociais, da estrada que busca a construção de uma nova sociedade e não da busca pelo poder, ou simplesmente, garantir a permanência de estruturas estabelecidas, há esperança, há um futuro para a humanidade.
Quanto ao pensamento único, ao neoliberalismo, vemos que seu domínio está cada vez mais trincado, porque esqueceu duas grandes verdades. A primeira, como nos lembra Rifkin (1996) de que "Não existe mercado sem sociedade organizada... A sociedade antecede o mercado." A segunda, na afirmação de Paulo Freire, nos lembra que "para a história [fim da página 50] morrer é preciso que morramos primeiro, homens e mulheres." (Folha de S. Paulo, 13/10/96)
E, para finalizarmos, numa homenagem aos que ousam sonhar, recorrendo ainda a citações, lembramos que "bondade é ter coragem" (Renato Russo) e como Chico César, dedicamos este trabalho AOS VIVOS.
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2) Professora do Departamento de Ciências Sociais/Programa de Pós-Graduação em Sociologia/UFPb.
3) É frequente encontrar, mesmo entre os melhores autores, referências ao fordismo que, esquecendo-se das lutas dos trabalhadores, atribuem a Mr. Ford a conquista dos altos salários norte-americanos e até mesmo da redução da jornada de trabalho (exemplo, o belíssimo livro de David Harvey, A Condição Pós-Moderna, Loyola, São Paulo, 1993).
4) Em dezembro de 84, num Seminário Internacional sobre Globalização/ Novas Tecnologias, no México, num GT, discutíamos a questão. O representante da FIOM/CGIL e também deputado do Parlamento Europeu, Alberto Tridenti, criticava o modelo imposto, embora apontasse também para o fato de que certas resistências operárias também fossem conservadoras, como no caso dos mineiros ingleses que se aferravam a seus empregos, os quais eram verdadeiros infernos em termos de condições de trabalho. Do outro lado, um representante da CISL italiana, em plena euforia pela adesão a ela. Bem, mas além da séria questão de que trocamos a saúde e, portanto a vida, sem falar nos sonhos, nas possibilidades, pelo emprego - ou pela sobrevivência básica, mas mutilada - o resultado da modernização thatcheriana praticamente aniquilou os empregos e os próprios mineiros.(Beynon, 1995)
5) Reportagem na revista VEJA, de 9/outubro/96, tentava ridicularizá-la e desmerecê-la, muito pela questão dos piqueteiros - contratados - segundo ela e, além disso, lembrando que "as greves atuais na Europa seriam apenas em defesa de antigas conquistas". Reajustes salariais, em período de desemprego em massa, quando "todos devem fazer sacrifícios" são extemporâneos. Curioso que a revista não tenha noticiado essas greves antes e nem nesse número lhes tenha dedicado um espaço à altura. E mais: se a informação é correta, no caso dos metalúrgicos alemães, é falsa com relação à greve dos metalúrgicos da Itália. Nela estava em jogo a questão salarial, o contrato de trabalho. E no caso dos funcionários públicos espanhóis também.
6) Este apoio é organizado pela Frente Zapatista, organização nacional; a solidariedade popular que tem impedido o massacre dos zapatistas até o momento, vem do descontentamento com a situação do país e com a confiança na lição moral dada por eles, num país envolvido em escândalos e corrupções. Manifestações de apoio aos zapatistas reuniram mais de cem mil pessoas no DF. Outros movimentos sociais tem surgido, entre eles a guerrilha do ERP, um dos mais violentos e "El Barzón", o mais pacífico. Este último, essencialmente de classe média e preocupado em reduzir o endividamento das pequenas empresas, promove agitações pacíficas, como os elefantes desfilando pelo centro do DF e que culminou com um caminhão de tomates podres despejados frente à Associação Mexicana de Bancos.
7) O EZLN realizou a 1a. Conferência Internacional Contra o Neoliberalismo na última semana de julho/96, em La Realidad, Chiapas, reunindo representantes de vários países, partidos, ONGs, interessados, num total de mais de três mil pessoas de vários continentes (a maioria, da Europa). Nessa reunião, foi escolhido o dia 20 de novembro, data do início da revolução mexicana de 1910, como data da luta intercontinental contra o neoliberalismo. Ainda, de 8 a 12/ outubro, realizou-se o Congresso Nacional Indígena, na cidade do México, com a presença de milhares de delegados das 56 etnias indígenas. Representando o EZLN, a comandante Ramona, solução encontrada pelos zapatistas na disputa com Zedillo sobre a participação de seus líderes.