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Política & Trabalho 16 - Setembro / 2000 - pp. 41-54
A SITUAÇÃO DA CRIANÇA TRABALHADORA
NO MERCADO INFORMAL EM JOÃO PESSOA (1)
Maria de Fátima Pereira Alberto (2)
Introdução
O objetivo deste artigo é o de apresentar, de modo introdutório, o trabalho dos meninos em condição de rua(3) que vivem em João Pessoa e os impactos desse trabalho para o desenvolvimento psicossocial dos mesmos. Utilizaremos como elementos para justificar a concepção que ora defendemos, dados extraídos de nossa experiência como pesquisadora dessa realidade e do projeto de pesquisa que estamos desenvolvendo atualmente no doutorado.
O texto está organizado em cinco partes: 1º) O Conceito de Trabalho Precoce; 2º) O caso do Trabalhador em Condição de Rua; 3º) As causas do Trabalho Precoce; 4º) O perfil do Trabalho e do Trabalhador Precoce em João Pessoa e 5º) Os impactos do Trabalho Precoce no Setor Informal sobre o desenvolvimento psicossocial dos Meninos em Condição de Rua(4).
Deixemos claro, desde já, que o nosso universo de pesquisa tem-se detido em uma forma de infância das crianças das classes populares(5), filhas de trabalhadores, desempregados e subempregados, cujas condições de vida lhes imprime a necessidade premente de trabalharem, sendo elas muitas vezes a única fonte de renda para a família. Percebemos, assim, que a infância é uma questão social. A infância que conhecemos, etapa do desenvolvimento humano dedicado às brincadeiras e ao estudo, objeto de cuidados, carinho e afeto, na qual deve ser preparada para a vida adulta, não é reconhecida como um direito de todos os brasileiros e brasileiras em processo de desenvolvimento. Pelo contrário, há uma outra infância, há outros sujeitos a quem estas condições são negadas. Que infância é esta, a que impingimos a responsabilidade do trabalho precoce? Por que assim procedemos? Quais as causas responsáveis pelo trabalho precoce? Quais as conseqüências do trabalho precoce?
Uma definição conceitual para Trabalho Infantil
A categoria criança e a categoria adolescente são definidas conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Criança é a pessoa que tem até doze anos de idade. Adolescente aquela que está entre os doze e os dezoito anos de idade.
Esclarecemos que, ao referir-nos a trabalho infantil ou trabalho precoce, estamos considerando as atividades de trabalho desempenhadas por crianças [fim da página 41] ou por adolescentes até os 14 anos de idade - a mínima limite para ingressar no trabalho e a máxima obrigatória para a escolaridade conforme determinam a Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho, a Constituição Federal do Brasil (Art. 227, parágrafo 3o, inciso I) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Art. 60). A Convenção 138, citada como a Convenção da Idade Mínima, foi adotada como instrumento geral, que substituiu os instrumentos anteriores, com o objetivo de erradicar o trabalho infantil. Foi ratificada em 1973, por vários países, inclusive o Brasil.
A discussão da categoria trabalho prescinde, na Sociologia do Trabalho, de definições já situadas histórica e teoricamente. A categoria trabalho infantil ou trabalho precoce não se encontra ainda definida conceitualmente ou construída sociologicamente, de maneira uniforme. Mas é difícil para os estudiosos da temática chegarem a um consenso sobre isso. A dificuldade reside nas nuanças que envolvem a questão e as implicações que acompanham a problemática:
1º) Há uma distinção condicionada por valores sociais entre o que é trabalho para o adulto e para as crianças - as atividades realizadas por crianças não são consideradas trabalho, mas ajuda a adultos, complemento das empreitadas familiares.
2º) Os trabalhos desempenhados por crianças nem sempre se configuram como atividades produtivas, realizadas sob condições organizadas de produção, como exemplo: o trabalho de rua e na rua e o trabalho doméstico.
3º) O trabalho infantil ou trabalho precoce é ilegítimo. A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) proibiam qualquer trabalho para menores de quatorze anos, salvo na condição de aprendiz. A Emenda Constitucional nº 20, de dezembro de 1998, fez a seguinte modificação: proíbe qualquer trabalho para os menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos quatorze anos. Entretanto, na prática, a criança está inserida precocemente em várias atividades de trabalho, inclusive com idade inferior a quatorze anos e não é como aprendiz.
Dadas estas nuanças que permeiam a questão necessitamos definir conceitualmente, esta categoria para que possamos discutir teoricamente e ter a certeza de nos reportarmos à mesma questão. O texto da Lei, expressa na Constituição e no ECA, usa a categoria menor. Tal conceito traz implícitas algumas implicações, dentre as quais, chamamos a atenção para a conotação que o termo assumiu historicamente. Segundo Londoño (1991) “(...) na passagem do século, menor (grifo do citado autor) deixou de ser uma palavra associada à idade, quando se queria definir a responsabilidade de um indivíduo perante a Lei, para designar principalmente as crianças pobres abandonadas ou que incorriam em delitos”. Embora o próprio ECA tenha tentado modificar esta conotação (menor), ao se denominar Estatuto da Criança e do Adolescente e, portanto, ao abranger os direitos da criança e do adolescente independente da condição social deles, o termo menor evoca este ranço pejorativo, excludente. Precisamos, portanto, definir uma das duas categorias: ou trabalho infantil ou trabalho precoce. Se optamos pela primeira, estaremos referindo-nos apenas ao trabalho feito por crianças (a priori infantil significa criança) até doze anos de idade (o que aliás é a definição jurídica). Se optamos pela segunda, estaremos aludindo aos indivíduos até os dezesseis [fim da página 42] anos de idade. Neste caso, a precocidade residirá na inserção, antes da maioridade no mundo de trabalho. Pois usar o termo trabalho infantil é referir-se indiscriminadamente, aos indivíduos até dezesseis anos de idade. Desta forma, incorrer-se-ia em equívoco. Os motivos que conduzem à inserção de crianças no trabalho, até doze anos, não são os mesmos que conduzem à de adolescentes, assim como as conseqüências para ambas as faixas etárias também são diferentes. Por isso defendo a seguinte idéia: esta não é apenas uma questão jurídica de legitimidade, ela precisa ser definida sociologicamente.
Há, na sociedade brasileira, uma mentalidade que defende o trabalho infantil como formador e prevenção da marginalidade. Acredita-se que, se a criança começar a trabalhar cedo, a ocupação do seu tempo impedi-la á de se envolver com atividades infratoras. Esta caracterização permite traçar um panorama que delineia as várias visões que se têm sobre a inserção da criança no mundo do trabalho - trabalho explorador, trabalho formador-profissionalizante, trabalho complementar à renda familiar e a concepção de que criança não deve trabalhar.
Estas várias visões acabam por escamotear a gravidade do trabalho precoce para crianças, a ponto de, nas cidades ele ser dissimulado, invisível, levando isso a crer que seja menos grave do que no campo, ou até que inexista. A literatura pertinente permite compreender que há, no interior da problemática, uma discussão que aponta dois aspectos fundamentais: o caráter discriminatório do trabalho infantil e o uso deste como instrumento disciplinador. Discriminatório, porque as crianças trabalhadoras pertencem à classe baixa. São crianças pobres, filhas de trabalhadores, desempregados, proletários e lupemproletários, os quais compõem os excluídos sociais. São crianças que se tornam trabalhadoras precoces porque os pais não conseguem garantir a sobrevivência da família. É um instrumento disciplinador porque é pensado como uma alternativa para crianças pobres, forma de prevenir a marginalização e adestrá-los para o mundo do trabalho.
O trabalho infantil não pode ser conceituado seguindo os padrões clássicos da Sociologia do Trabalho que tomava como trabalho as atividades de transformação(6), uma vez que as relações do trabalhador infantil com o seu objeto segue outros parâmetros. Por trabalho usaremos a categoria de Costa (1991), ou seja, o exercício da atividade socialmente útil e/ou esquemas de profissionalização divergentes: tráfico e prostituição. O que o trabalhador precoce faz são atividades variadas, a cuja ação objetiva está inerente o objetivo de obter pagamento, que pode ser em espécie ou em gênero.
Para efeito do nosso trabalho, a categoria atividade de trabalho se presta melhor, pelo caráter de abrangência que a junção entre as duas palavras comporta e pelo fato de o trabalho infantil caracterizar-se por essa abrangência.
O conceito de atividade é também usado por autores de orientação marxista, como sinônimo de trabalho. Segundo Martins (1992: 24), nos Manuscritos, Marx faz uma distinção entre atividade e trabalho:
“Atividade é uma categoria bem mais inclusiva que a de trabalho, ela recobre um campo semântico mais extenso. Forma ampla de [fim da página 43] intercâmbio em que o sujeito interage com um objeto, a atividade se processa nas mais variadas manifestações da existência humana.”
Quanto ao trabalho, “(...) ele é o particular modo de atividade que se exerce sob a pressão de satisfazer as necessidades, relaciona-se sobretudo à luta cotidiana da espécie para assegurar a sobrevivência” (Martins, 1992: 24). É desse modo que se caracteriza o trabalho dos meninos e meninas em condição de rua, trabalhadores nas atividades informais, como uma coação exercida pelos mais variados agentes sociais, que tem, as mais das vezes, na família seus legítimos representantes. Uma coação que visa , essencialmente garantir a sobrevivência dessas crianças e adolescentes e de suas famílias.
Usamos neste artigo a concepção de economia informal de Lautier (1997), ou seja uma economia multiforme. Entretanto, pelo seu caráter multiforme, usaremos como categoria a denominação atividades informais de trabalho, porque ela caracteriza, de forma mais precisa, as atividades de trabalho desenvolvidas pelos meninos e pelas meninas nas ruas. A opção pelo referido autor se deve ao fato de que sua concepção engloba aspectos que se assemelham com o nosso objeto, com características multiformes: a) diversas atividades de trabalho informal, inclusive ilícitas; b) relações de trabalho informais sem registros, contratos ou por conta própria; c) ausência do Estado no cumprimento do seu papel. Vale assinalar que por ilícito estamos considerando tanto o que fere a lei, uma vedação constitucional (trabalho precoce é proibido), quanto o que fere a moral da criança e do adolescente (prostituição).
Estes fatores, aliados a outros não mencionados aqui, fazem com que nem sempre as atividades de trabalho desenvolvidas por crianças, com o objetivo de obter pagamento, sejam vistas como trabalho infantil, Daí por que carecemos de uma definição. E para esta tarefa desejamos contribuir, situando como trabalho as atividades desenvolvidas pelos meninos em condição de rua.
O caso do trabalhador infantil em condição de rua
No caso do menino e da menina em condição de rua, a realidade social é ainda mais complexa, porque envolve um conjunto de fatores que perpassam os conceitos de trabalho e de meninos de rua. Toda essa complexidade ainda é transversalizada pela divisão sexual do trabalho. Essas crianças e adolescentes sofrem discriminação e são marginalizados por estar na rua . O trabalho para esta categoria social confunde-se com a sua condição de rua. Isto os afeta de tal modo que, para a sociedade de um modo geral (inclusive estudiosos do fenômeno, mídia e população), eles e elas são vistos como marginais ou em processo de marginalização, e não como trabalhadores precoces. A literatura sobre meninos trabalhadores em condição de rua apenas vê como trabalhador o menino na rua(7) e não aquele que se convencionou chamar de rua.
Segundo Minayo (1993), meninos de rua são crianças e adolescentes de ambos os sexos que passam a maior parte do seu dia-a-dia nas ruas, retirando por meio do trabalho informal e ou de atos ilícitos, o seu sustento e/ou de sua família. Utilizamos a definição conceitual de meninos de rua, de Minayo, e modificamos para meninos em condição de rua. Optamos pela modificação, a [fim da página 44] partir de uma pesquisa que realizamos em João Pessoa/PB(8) acerca da Representação social dos meninos de rua sobre a família:
A partir dos discursos dos meninos, quando compreendemos que, embora os elementos conceituais de Minayo estivessem presentes, a permanência na rua tinha uma variabilidade ou, mais especificamente, a representação que o menino faz de si baseia-se ou está ligado ao que faz nas ruas, o que relativiza à sua condição de sujeito em processo de desenvolvimento, em relação ao período de transição da infância. Portanto, ele não é de rua, ele está, naquele momento de sua vida, em condição de rua.
Nos discursos dos meninos, a categoria menino de rua violenta a sua condição de ser criança, pois, ao pretender-se definir, operacionalmente, os sujeitos envolvidos em tal situação, ela estigmatiza-os e cria uma representação que os define pejorativamente, dentro do grupo de pares, na interação com os educadores e na relação da sociedade para com eles.
Portanto, definimos meninos em condição de rua como: crianças e adolescentes de ambos os sexos que passam a maior parte dos dias nas ruas, desacompanhados, retirando mediante o trabalho informal e/ou atos ilícitos, o seu sustento e ou de suas famílias. Portanto, têm famílias, mas não vivem com elas cotidianamente; varia a qualidade e a quantidade do contato.
Entendemos que o menino em condição de rua é um trabalhador do setor informal. É um trabalhador precoce, cujas atividades desenvolvidas não se definem pelas clássicas categorias do trabalho. Conseqüentemente, é um trabalhador precoce, cujas condições de trabalho se confundem com as condições de vida.
As causas do trabalho precoce
As causas do trabalho precoce envolvem um conjunto de fatores que, em separado ou em conjunto, apresentam-se - em cada país, ou em cada região dentro de um mesmo país - mais significativos do que em outros. Esses fatores podem ser denominados de macro-estruturais ou micro-estruturais.
A presença das crianças e adolescentes nas ruas, trabalhando, está diretamente ligada à família. O desemprego dos pais e/ou a falta de condição para eles suprirem as necessidades da família, principalmente a de alimentação, fazem com que a própria família às vezes se veja impelida a mandar os filhos para as ruas, a fim de estes obterem por meio do trabalho ou da mendicância, formas de garantir ou ajudar na sobrevivência da família.
Dois fatores contribuem para compreender que a problemática desta criança trabalhadora inicia-se na família, que, consciente ou inconscientemente, empurra a criança e o adolescente para trabalhar. Como estes sujeitos não têm formação profissional e o seleto mercado de trabalho oferece-lhes como única opção o trabalho informal, na rua, eles acabam aceitando. Os fatores responsáveis pela ida dos meninos para trabalhar nas ruas são:
1º Fatores macro-estruturais - São aqueles fatores sociais, políticos e econômicos que reproduzem a pobreza e forjam a necessidade, que sentem [fim da página 45] certas famílias, de enviar seus filhos ao mercado de trabalho, por exemplo:
O acirramento das forças produtivas que gera a concentração de renda, a transformação e precarização das relações e condições de trabalho;
O uso não-planejado da tecnologia, como a mecanização da lavoura, que dispensa e expulsa o trabalhador do campo, sem a elaboração de programas de absorção da mão-de-obra;
As políticas econômicas recessivas, que geram o desemprego e o arrocho salarial, dificultando às famílias a garantia da sobrevivência de todos os membros;
Os fatores climáticos , em especial no Nordeste a seca, as pestes agrícolas, como o bicudo na lavoura do algodão, a substituição da produção de subsistência por produção para exportação e a ausência de políticas agrícolas, Tudo é responsável pela migração das famílias do campo para as cidades.
2º Fatores microestruturais - são os fatores subjetivos que se originam na própria família, destacando-se dois aspectos: a) a tradição do grupo social, geralmente, de origem camponesa ou operária, que concebe o trabalho infantil como um elemento formador do indivíduo social; b) aquela família que não consegue mais (como consequência dos fatores macroestrurais) atender às necessidades materiais e subjetivas dos seus filhos, o que, por sua vez, acaba gerando conflitos. No caso dos conflitos são causa da ida para as ruas, mas eles também estão ligados ao trabalho, à medida que leva o menino a fugir. E uma vez nas ruas, ele começa a trabalhar, exercendo qualquer atividade para obter dinheiro e garantir a sua própria sobrevivência.
A origem do trabalho infantil para os meninos em condição de rua se dá em condições de extrema pobreza; tendo sido considerado um mecanismo intergeracional de pobreza, uma vez que impede o acesso dessas crianças à educação, profissionalização, mecanismos facilitadores de ascensão profissional e, consequentemente, salários e melhores condições de vida.
No caso dessa categoria de trabalhadores precoces há ainda que se destacar: a ausência do Estado no exercício de seu papel como responsável pelas políticas públicas de atendimento a criança e ao adolescente.
O perfil do trabalho e do trabalhador precoce
Segundo Pillotti & Rizzini (s.d.) existem hoje, na América Latina, 195 milhões de crianças e adolescentes com menos de dezoito anos de idade, o que representa 45% da população total, nesta faixa etária. No Brasil, existe cerca de três milhões e meio de trabalhadores infantis, com menos de quatorze anos de idade, tempo mínimo determinado pelas convenções da OIT, para ingresso no mercado de trabalho. Apesar de o Brasil ter participado de todas as convenções, ocupa o primeiro lugar no ranking mundial, em relação à taxa percentual de crianças economicamente ativas. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1990, 56% das crianças, nessa faixa etária, trabalhavam no setor rural e 69%, no setor urbano.
Segundo dados do Relatório da Delegacia Regional do Trabalho no Estado da Paraíba, em Diagnóstico do Trabalho Infanto-Juvenil no Estado da Paraíba, estes trabalhadores mirins dos setores formal e informal são parte dos 45,1% da [fim da página 46] população paraibana que se situam na faixa de zero a dezessete anos, dos quais um terço com idade entre os onze e os quatorze anos eram analfabetos, em 1991. Na sua grande maioria, vivem em domicílios inadequados às condições de abastecimento de água e saneamento, expondo-se a riscos biológicos, que significam doenças infecciosas expoliadoras e cujas famílias tinham renda de no máximo dois salários mínimos. De acordo com o referido relatório, “o trabalho propriamente infantil - até os 13 anos de idade praticamente só existe no setor informal, onde as crianças vendem algumas mercadorias” (Ministério do Trabalho, 1996: 55).
Segundo dados da PNAD, em 1996 a Paraíba tinha uma população de 3 379 313 de habitantes, com 10,9% na faixa de cinco aos nove anos de idade; e 11,8% na faixa etária de dez aos quatorze. Do total desta última faixa dez aos quatorze anos 3,4% trabalham, sendo 73% em atividades agrícolas e 26,51% em atividades não agrícolas.
Em João Pessoa, o trabalho precoce no setor informal se dá nos seguintes ramos de atividades: oficinas mecânicas, padarias, bares, lanchonetes(quiosques), catadores de lixo, distribuidores de jornal, vendedores ambulantes, biscateiros, engraxates, olheiros de carros, lavadores de carro, ajudantes de empresas de fundo de quintal, ajudantes de feirantes e barraqueiros, domésticas, fretistas(carregadores de feiras), prostituição, tráfico de drogas, furtos e assaltos (nestes três últimos casos, são usados pelo crime organizado).
Dados iniciais da nossa pesquisa empírica dão conta de que as condições de vida e trabalho deste trabalhador precoce são as seguintes:
A maior porcentagem está na faixa entre os dez e os quatorze anos;
As atividades variam de acordo com a idade e com o domínio que exercem no território - espaço geográfico das ruas, delimitado e demarcado por grupos, a partir do tempo de chegada no local, da idade e da força para se imporem, declarando-se os donos;
Embora se encontre meninas em algumas atividades de trabalho, o sexo feminino predomina na prostituição. Nas outras atividades predomina o sexo masculino;
Predominam as crianças de cor negra ou parda;
Todas têm famílias, mas varia a qualidade e a quantidade do contato;
Estão nas ruas desacompanhadas de adultos ou responsáveis;
São crianças e adolescentes cujos pais têm origem rural, expulsos das terras pela cana-de-açúcar ou pela seca. São filhos que já nasceram nas cidades;
Moram em áreas periféricas e nas cidades que compõem a área metropolitana de João Pessoa;
O número de membros da família varia de dois a dezoito pessoas, predominando o número de dez pessoas;
Essas famílias necessitam do trabalho do menino, como estratégia de sobrevivência, para adicionar-lhes os ganhos advindos de todos os membros;
Quanto menos ganha a família, mais cedo os filhos trabalham;
A maior parte das famílias são mantidas e chefiadas por mulheres ou o pai não é a principal fonte de renda;
O modelo de família nuclear que tinha o pai como provedor da [fim da página 47] prole já não possui mais a mesma característica, embora em algumas famílias o pai esteja presente, seu trabalho não é suficiente para manter a família, ou ele não consegue trabalho;
As mais das vezes, os pais exercem funções desqualificadas (biscates) ou só a mãe e as crianças e adolescentes trabalham. Isto garante a essas famílias rendas familiares diversificadas, decorrentes do número de membros inseridos no mercado de trabalho, da função que desempenham e do percentual que recebem no conjunto. A responsabilidade do sustento da família, as mais das vezes, é inteiramente do trabalhador precoce;
Essas crianças e adolescentes têm jornadas de trabalho entre oito e dez horas diárias, todos os dias da semana, sem férias. Não informam quanto ganham, mas afirmam contribuir, sistematicamente para o sustento das famílias;
Com relação à escolaridade, os dados revelam que não estudam. Não obstante, alguns já estudaram ou foram matriculados. Todos expressaram o desejo de estudar. Dentre os que já estudaram, o grau de escolaridade varia da alfabetização à 1ª série;
Segundo dados do Censo Meninada, realizado pela Prefeitura Municipal de João Pessoa, em janeiro de 1997, com o objetivo de fazer a contagem das crianças e adolescentes que vivem nas ruas, foram cadastradas 348 meninos e meninas. Dentre este quântico, 131 dormem nas ruas de João Pessoa e 217 não dormem nas ruas da referida cidade.
Vale salientar que estes dados abrangem crianças e adolescentes entre os cinco e os dezessete anos. Além disso, embora não trabalhemos com contagem de crianças, acreditamos que estes números poderão ser diferentes, uma vez que em nossa experiência encontramos uma outra categoria: a dos que dormem de vez em quando. Todavia, respeitamos os dados da Prefeitura porque são uma referência, até que se prove o contrário. Aliás, afora esta, uma outra pesquisa do mesmo tipo de que se tem conhecimento é uma contagem realizada pela FUNDAC, em 1993, a qual contou apenas os que dormiam nas ruas, em número de 123. Os dados da FUNDAC em comparação com o do Censo Meninada não são muito diferentes, considerando-se o tempo em que foram feitos.
Os impactos do trabalho precoce
O trabalho, do ponto de vista sociológico, é visto como um campo de experiências que são determinantes da consciência e na consciência, na formação da identidade, e determinantes das ações sociais. No caso dos nossos sujeitos o trabalho, tem relação com todo o desenvolvimento psicossocial: as condições e a organização do trabalho funcionam como instrumentos de sociabilidade que repercutem de modo nefasto no desenvolvimento dos meninos. É devido ao trabalho que vivem nas ruas e conseqüentemente, têm menos contato com a família, socializam-se nas ruas com estes segmentos: clientes, companheiros, adultos que os exploram, donos de pontos, traficantes, policiais, donos de estabelecimentos, funcionários de estabelecimentos (aí as crianças trabalham como engraxates, vendedores, fazem pontos, no caso da prostituição). É devido ao trabalho que a saúde é posta em risco(não dormem à noite, precisam estar [fim da página 48] acordados porque são os horários de maiores movimentos).
Nas ciências sociais, os relatórios médicos sobre a relação do trabalho com as condições morais, sociais e físicas dos trabalhadores foram objeto de estudo e de pesquisa dos autores que escreveram a respeito das condições de vida da classe operária. Por ex: Gaskel, Villermé e Hammond. Dentre aqueles autores que escreveram sobre a Inglaterra no início do processo manufatureiro, o capitalismo industrial e suas conseqüências sociais e políticas, destacamos Marx, Engels e Thompson.
Este referencial teórico sobre as condições de vida abrange autores que utilizam o termo para sugerir a influência preponderante do meio, de fora, sobre a vida dos trabalhadores (no caso em questão as crianças), e autores que analisam as condições de vida, através das disposições culturais dos grupos sociais.
Quer enfatizando-se os aspectos econômicos e políticos, quer enfatizando-se as condições sanitárias, populacionais, físicas e biológicas das relações sociais, ambos os tipos têm como parâmetro de análise as consequências do trabalho e da revolução industrial - do sistema de fábrica sobre a vida do trabalhador e de sua família. Segundo o modelo presente, a estes autores, as condições de produção e as circunstâncias de vida resultantes delas causam-lhes efeitos nefastos para a saúde e para a integridade moral.
O trabalho precoce e os efeitos da exploração sobre o desenvolvimento físico e moral dessas crianças são fatos - entre outros - que servem de instrumento para se analisarem as condições a que estava submetida a população trabalhadora, as quais atingiam o comportamento, os hábitos, o pensamento e a cultura da população. São processos disciplinares impostos pelos capitalistas ao trabalhador - a domesticação do corpo e da mente - visando-se à obtenção do lucro. Estudos, como os de Foucault (1987), mostram como se foram constituindo saberes e práticas disciplinares na introjeção de uma disciplina à classe trabalhadora.
É fato que as condições tratadas tanto por Marx (1987) quanto por Engels (1977) e Thompson (1987) referem-se ao início da industrialização, às atividades de trabalho em fábricas. Todavia, há nos seus textos argumentos que mostram os efeitos da exploração do capitalismo sobre o trabalhador. Estes são argumentos que possibilitam entrever uma história da infância operária do século XIX. Em particular o que nos interessa são as conseqüências do trabalho precoce: a degradação humana. Ao tomarmos como referência os aspectos por eles apontados na época e os transformarmos para os dias atuais, verificamos que ainda há semelhanças - condições de vida e de trabalho precárias pauperização da classe trabalhadora; no caso das crianças, o ingresso precoce, na mais tenra idade; o trabalho penoso, noturno, sem acesso à instrução, à escolaridade e à qualificação, que produzem danos ao desenvolvimento psicossocial dos delas.
Entretanto, cumpre-nos salientar que Thompson, apesar de referir-se ao trabalho industrial ou com tal fim (por exemplo, nas minas de carvão), faz referências a existência já no século XIX à precariedade dos empregos, do subemprego, ameaçados pelas inovações tecnológicas e pela subcontratação, com o aumento do emprego de jovens e crianças sem qualificação. Tais aspectos [fim da página 49] que chamam a nossa atenção, pois, guardadas as devidas proporções, no que pese o anacronismo, assemelham-se à nossa contemporaneidade. Se na época retrata o ingresso precoce de crianças no trabalho era uma conseqüência das inovações tecnológicas e da substituição da mão-de-obra adulta, com vistas ao lucro mediante o barateamento dos salários, hoje, estas situações, ao mesmo tempo que se agravam, tomam uma outra conotação, a criança não substitui o adulto, porque já não existe mais o emprego. Ela é, as mais das vezes, a única possibilidade que o adulto (pais, responsáveis ou exploradores) tem de conseguir sobreviver às custas de quaisquer formas de ganho dessas crianças. Assim sendo, a informalidade nas ruas, faz fronteira entre a exclusão e a marginalidade, e é a única fonte de ganho que a maioria das crianças consegue.
Outro aspecto digno de nota é a semelhança na concepção do trabalho infantil como alternativa à marginalização. Havia, na época retratada pelo citado autor, uma concepção da fábrica como uma espécie de casa de correção para crianças e indigentes.
Estes cientistas sociais, embora não pretendessem analisar o trabalho infantil, retrataram - eu diria que o fizeram com profundidade - em suas obras a problemática. A nossa intenção, ao usá-las, é a de fazer referências que mostrem a relação entre as condições de trabalho e de vida - da classe que vive do trabalho ou que precisa do trabalho para sobreviver -, cuja relação possa demonstrar, inclusive historicamente, o sofrimento advindo para os trabalhadores, em decorrência das condições de trabalho e do ingresso precoce nele.
Os estudos sobre a relação do trabalho com as condições de vida dos trabalhadores abordam, por um lado, o processo do nascimento da consciência social e, por outro, a determinação dela, pelo sistema de produção. Por conseguinte ,aos poucos se configura a existência de uma relação entre o trabalho como mundo material e a vida mental como estrutura psíquica. Portanto, é o próprio Marx, quem vislumbra, no processo histórico, um produto que é de ordem também material ou o que ele chamou o desenvolvimento histórico do aparelho psíquico. Mas foi Freud, sem dúvida, quem situou o aparelho psíquico como um elemento determinado pela estrutura material, pelas relações sociais de produção. Para Marx, sob as condições de produção do capital, a própria estruturação psíquica condicionar-se-á à forma de mercadoria e ao fetichismo. É a natureza coisificada, transformada em mercadoria que determina os sujeitos físicos, dando-lhes uma forma histórica, corpórea e psicológica.
Não são apenas as condições de trabalho que geram pressões sobre a saúde do trabalhador, mas também a organização do trabalho limitadora, que entrava os projetos do trabalhador e provoca o acúmulo da energia psíquica. A Sociologia, particularmente a Sociologia Industrial, já estudava as relações entre as dimensões psíquicas e o mundo do trabalho. Mas os estudos sobre os aspectos psicológicos do trabalho ganharam espaço no seio de outras ciências que fizeram parceria com a Sociologia. Estes estudos tomaram forma desde 1913, mas só se desenvolveram a partir de 1920, com os trabalhos de Minayo. Entretanto, os estudos se concentraram nas técnicas psicológicas de controle laboral e de psicologia aplicada, com ênfase na busca da eficiência e da eficácia máxima da dimensão mental do fator humano. Só após a Segunda Guerra Mundial “(...) as observações realizadas por diferentes profissionais da área de saúde nas situações [fim da página 50] ansiogênicas do confronto bélico contribuíram para que surgisse um interesse maior dirigido à identificação de causas coletivas, relacionadas à própria situação de trabalho capazes de conduzir a quadros psicopatológicos” (Minayo, 1993: 49).
Na década de 1980 tomam corpo os estudos de Déjour, para quem os modelos de organização do trabalho - compreendidos pela divisão de tarefas e relações intersubjetivas - são geradores do acumulo de energia, o que provoca o sofrimento. Estes modelos de organização são aqueles em que o trabalhador não tem liberdade para exercer a criatividade, os trabalhos desqualificados, a inatividade, as organizações autoritárias, - onde o trabalhador está impedido de exercer a subjetividade e condicionado ao cumprimento de ordens. Déjour denomina estas situações de subemprego de aptidões psíquicas.
Compartilhamos as concepções de Déjour e acreditamos que, no caso do trabalho precoce dos meninos em condição de rua, os fatores que ocasionam o acúmulo da carga psíquica ou tensão nervosa são os seguintes: as atividades desqualificadas ou marginalizadas, sem o requisito do emprego das aptidões psíquicas, da criatividade; a obrigatoriedade do trabalho precoce para sujeitos que precisam abrir mão de atividades apropriadas e necessárias às suas idades, como o brincar, o tempo livre e a escolaridade.
Compreendo que o trabalho precoce em condição de rua produz efeitos irreversíveis no desenvolvimento psicossocial dessas crianças e adolescentes. Os efeitos são heterogêneos considerando-se que o trabalho na rua, especificamente para elas, relaciona-se a uma série de aspectos que dizem respeito às condições de trabalho, família, escola, à organização do trabalho e ao desenvolvimento psicossocial.
O trabalho precoce no setor informal produz efeitos discriminatórios, pois a criança tem violado os seus direitos humanos fundamentais, não tem acesso aos aspectos inerentes e imprescindíveis ao desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social.
Os impactos do trabalho precoce, no setor informal, para os meninos em condição de rua afetam o desenvolvimento físico - por eles crescerem em condições físicas desfavoráveis - e mental, por crescerem sem carinho nem afeto, e, principalmente pelo não acesso a escola, o que provoca atraso no desenvolvimento intelectual. Os impactos afetam o desenvolvimento moral e social porque os locais de trabalho nas ruas, o contexto delas, no contato com determinadas pessoas, sem a orientação social de um adulta em quem possa confiar e lhes orientar, exercem sobre essas crianças uma socialização divergente, provocam-lhes efeitos nefastos sobre o desenvolvimento psicossocial. Estes impactos lhes imprimirá uma marca discriminatória, em comparação com outras crianças de mesmo padrão etário. Discriminatório porque:
Em relação às outras crianças, terão um desenvolvimento diferenciado, atrasado. Mesmo que as suas atividades de trabalho facilitem, na aquisição de mais destreza e agilidade em atividades físicas de deslocamento nas ruas, reconhecimento geográfico da topografia das cidades ou outras atividades congêneres, são do ponto de vista do desenvolvimento físico mais raquíticos devido as privações nutricionais e ao pouco sono, já que muitas das atividades de trabalho requerem que permaneçam acordados a maior parte [fim da página 51] da noite e/ou em situação de vigília.
São atrasados intelectualmente, no sentido das estruturas lógicas do pensamento, da escolaridade, por não poderem freqüentar a escola uma vez que precisam estar nas ruas ou porque o horário de funcionamento das escolas são incompatíveis com o horário de trabalho, ou porque dado o esforço físico que dispendem, não conseguem mais estudar ou porque as escolas não os aceitam, principalmente pelas suas aparências físicas que não se coadunam com os hábitos exigidos pela escola.
Por crescerem à margem da sociedade, representados como marginais, sem o estatuto de trabalhadores, segregados em guetos, nas ruas e ruelas, associados à marginália da sociedade. Seus trabalhos exercidos na periferia do sistema capitalista, beneficiam os seus fornecedores (comerciantes do setor do varejo que comercializam pequenos produtos, traficantes, cafetões, comerciantes do setor informal, barraqueiros e exploradores, adultos ou familiares), mas configuram-lhes uma representação de perigosos.
O trabalho que desempenham fragmenta as suas cidadanias, porque lhes retira o acesso aos direitos inalienáveis de que são sujeitos, garantidos pela Constituição Federal, pelo ECA e pelas Convenções Internacionais assinadas pelo Brasil, como a Convenção no 138 da OIT.
No caso dos meninos em condição de rua, o trabalho precoce gera o sofrimento psíquico porque:
As atividades marginalizadas ou desqualificadas, sem o requisito do emprego das aptidões psíquicas, da criatividade, ocasionam o acumulo da carga psíquica ou tensão nervosa. Essa se expressaria pela desmotivação para o trabalho (futuro) e pela perda das expectativas de futuro e da capacidade de sonhar.
A obrigatoriedade do trabalho precoce para sujeitos que precisam abrir mão de atividades apropriadas e necessárias às suas idades, como o brincar, o tempo livre e a escolaridade, gera por si só uma tensão nervosa porque sobrecarrega a criança impondo-lhe, prematuramente, responsabilidades e o acúmulo de funções.
As condições inadequadas provocam stress emocional, fadiga psíquica depressão e problemas de relacionamento.
Compreendemos que, a partir da infância, ocorre um processo de “domesticação” do trabalhador precoce, em nome de um processo educativo ou de profilaxia à marginalização. Conseqüentemente, o trabalho precoce acaba repercutindo negativamente sobre o desenvolvimento psicossocial desses sujeitos. Retira da criança e do adolescente todas as condições consideradas - quer pela psicologia quer pela lei (ECA) - imprescindíveis a formação e ao desenvolvimento integral do cidadão criança. ALVIM, R. (1993). O trabalho infanto-Juvenil em discussão através dos temas da educação e da violência. In: Anais do III Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos do Trabalho. Rio de Janeiro: ABET, pp. 227-235. ALBERTO, Maria de Fátima Pereira (1996). A representação social dos meninos em condição de rua de João Pessoa sobre a família e as drogas: Relatório Final de Pesquisa. João Pessoa: SEAMPO/ UFPb. ARIÈS, Philippe. (1981). História social da criança e da família. 2a ed. Rio de Janeiro: Guanabara. CARRAHER, T.; CARRAHER, A . & SCHLIEMANN, A . (1989). Na vida dez, na escola zero. São Paulo: Cortez. CARVALHO, Maria do Carmo Brant de. (1996). Trabalho precoce: qualidade de vida, lazer, educação e cultura. Oficina sobre os Impactos do Trabalho Precoce na Saúde de Crianças e Adolescentes. Brasília: s.r. (mimeo.). COSTA, Gomes da. (1990). Participar é preciso. Brasília: Ministério da Ação Social/ CBIA. DÉJOUR, Christophe. (1997). Psicodinâmica do trabalho: contribuições da escola déjouriana. São Paulo: Atlas.
ENGELS, Friedrich. (1977). A situação da classe trabalhadora na Inglaterra. Lisboa: Presença; São Paulo: Martins Fontes. FERREIRA, Rosa M. F. (1980). Meninos de rua: valores e expectativas de menores marginalizados em São Paulo. São Paulo: Poligráfica. FREITAG, Bárbara. (1993). Sociedade e Consciência: um estudo piagetiano na favela e na escola. 5a ed. São Paulo: Cortez. LONDOÑO, Fernando T. (1991). A origem do conceito ‘menor’. In: del PRIORE, Mary (org.). História da criança no Brasil. São Paulo: Contexto. MARTINS, Maurício Vieira. (1992). Marxismo e subjetividade: uma leitura dos ‘Manuscritos de 44’. In: BAPTISTA, L. dos S. (org). Anuário do Laboratório de Subjetividade e Política. Niterói: Depto de Psicologia - UFF. Ano I, Vol. I. MARX, Karl. (1987). O Capital. Livro I, Vol. I. 11a ed. São Paulo: Bertrand Brasil/DIFEL. MINAYO, Maria C. de S. (1993). O limite da exclusão social: meninos e meninas de rua no Brasil. São Paulo: Hucitec/Abrasco. MINISTÉRIO da Saúde; Ministério da Criança. (1991). Estatuto da criança e do adolescente. Brasília: MS/ MC. MINISTÉRIO do Trabalho. (1996). Diagnóstico do trabalho infanto-juvenil no Estado da Paraíba. João Pessoa: Delegacia Regional do Trabalho no Estado da Paraíba. PILLOTTI, F. & RIZZINNI, I. (org.). (1995). A Arte de governar crianças: a história das políticas sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Universitária Santa Úrsula. RIZZINI, I. & RIZZINI, I. (1991). Menores institucionalizados e meninos de rua: os grandes temas de pesquisa na década de 80. In: O trabalho e a Rua: crianças e adolescentes no Brasil urbano dos anos 80. São Paulo: Cortez. SAMPAIO, I. I. C. & RUIZ, E. M. (1996). Trabalho precoce e psiquismo Infantil. São Paulo: s.r. (mimeo.). SELIGMANN-SILVA, E. (1994). Desgaste mental no trabalho dominado. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; São Paulo: Cortez. THOMPSON, E. P. (1987). A formação da classe operária inglesa: a maldição de Adão. Vol. II. 2a ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
Notas
Este artigo caracteriza a situação do trabalhador precoce no mercado informal em condição de rua, em João Pessoa. Descreve as atividades de trabalho que são por eles desempenhadas e analisa as causas da inserção precoce no mundo do trabalho. Apresenta um perfil desse trabalhador e os impactos do trabalho precoce sobre o desenvolvimento psicossocial: efeitos discriminatórios, exclusão da escola, atraso no desenvolvimento intelectual, negação da cidadania e sofrimento psíquico.
Cet article essaie de faire le point sur la situation de l’enfant ouvrier “en condition de rue” sur le marché informel à João Pessoa (au nord-est brésilien). Ensuite, on fait la description des travaux qu’ils exercent à la ville de João Pessoa et on fait l’analyse des motifs de l’insertion précoce. Aussi l’article présent-t-il en plus un profil de cet ouvrier et de cette ouvrière de même que les conséquences du travail précoce sur le développement psycho-social, lesquelles vont depuis les effects discriminatoires, l’exclusion de l’école, le retard du développement intellectuel, la négation de la citoyennité, jusqu’à la souffrance psychique.
Segundo dados do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST/SP), as inadequadas condições de trabalho geram nas crianças insatisfações pelo exercício de uma tarefa, na qual não há aprendizado técnico [fim da página 52] ou motivação secundária. As condições inadequadas podem, conseqüentemente, levar ao stress emocional ou a fadiga psíquica. Ambas ocorrem quando há interrelação entre contexto, vulnerabilidade e agentes agressivos. Por contexto entenda-se baixo padrão de vida, falta das necessidades básicas, segregação social e problemas de ajustamento familiar.
A junção desses fatores faz com que muito cedo a criança perca a capacidade de sonhar, a perspectiva de futuro e a auto estima em relação às suas capacidades intelectuais e produtivas - o que implica riscos para o seu desenvolvimento psicossocial. Tais fatores são determinantes para a perspectiva de futuro.
Os aspectos acima expostos enunciam que o trabalho precoce afeta o desenvolvimento psicossocial de crianças e adolescentes inseridos no mercado informal em situação de rua. As formas de organização do trabalho explorador, os tipos de atividades, a jornada de trabalho, os padrões relacionais na rua, as condições de vida, o pouco contato familiar, a ausência de escolaridade, tudo isso repercutirá no seu desenvolvimento, nas suas potencialidades, adultizando-os, desqualificando-os para atividades profissionais futuras, condicionando-os à perda de capacidades motoras, cognitivas, afetivas e culturais.
Referências Bibliográficas
1) Este artigo foi apresentado no I Congresso Internacional de Segurança na Infância e Adolescência, realizado no Rio de Janeiro entre os dias 28 a 31 de outubro de 1998.
2) Professora do Departamento de Psicologia da Universidade Federal da Paraíba.
E-Mail: jfalbert@netwaybbs.com.br
3) Esta é uma categoria que está sendo construída empiricamente e que será explicitada no corpo do artigo.
4) Esta é a tese que defendo na pesquisa que desenvolvo como doutoranda em Sociologia pela UFPE.
5) Sobre este conceito ver Moisés (1982).
6) Sobre esta discussão ver Friedmann & Naville (1973).
7) Sobre este conceito, vide Rizzini & Rizzini (1990).
8) Alberto (1996).
A SITUAÇÃO DA CRIANÇA TRABALHADORA
NO MERCADO INFORMAL EM JOÃO PESSOA
PALAVRAS-CHAVE: trabalho infantil; meninos em condição de rua; impactos na saúde.
LA SITUATION DE L'ENFANT OUVRIER SUR LE MARCHÉ INFORMEL
À JOÃO PESSOA, PARAÍBA, BRÉSIL
MOTS-CLÉS: travail de l’enfant; l’enfant “en condition de rue”; conséquences sur la santé.