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Política & Trabalho 16 - Setembro / 2000 - pp. 171-184


TREM E CINEMA:
MODERNIDADE E MEMÓRIA

Cid Vasconcelos de Carvalho (1)




O trem tem sido uma fonte generosa para representações por parte das mais diversas artes. Das pinturas de Turner e Hooper ao Trem Caipira de Villa-Lobos, passando pelos versos de Blaise Cendars (1887-1961) no seu poema Prosa do Transiberiano e da Joaninha da França:

“E o apito do vapor/ E o barulho eterno das rodas numa loucura nos trilhos do céu/ Os vidros estão cobertos de geada/ Não há natureza/ E atrás as planícies siberianas o céu baixo e as grandes sombras dos Taciturnos que sobem e descem/ (...) As locomotivas furiosas/ Escondem-se/ Nas aberturas do céu/ E nos buracos,/ As rodas vertiginosas as bocas as vozes/ E os cães malditos que uivam atrás de nós/ Os demônios estão soltos/ Ferragens/ É tudo um acorde falso/ O brum-brum-brum das rodas/ Choque/ Saltos/ Somos uma tempestade sob o crânio de um surdo”(2).

Na literatura de língua portuguesa, Fernando Pessoa foi um dos nomes destacados que abordou o trem em seus poemas. Curiosamente enquanto este foi motivo para geralmente se destacar a especificidade de sua modernidade, nesse poema de Pessoa (1998: 350) ele é igualado com todas as outras formas de energia, inclusive as pré-industriais: “Toda a energia é a mesma e toda natureza é o mesmo.../ a seiva da seiva das árvores é a mesma energia que mexe/ as rodas da locomotiva, as rodas do elétrico, os volantes dos Diesel/ e um carro puxado a mulas ou gasolina é puxado pela mesma coisa”.

Na música o trem pode, inclusive, fazer parte da própria construção rítmica seja do blues clássico americano, que o utilizou também nas letras das suas composições, seja no caso do forró nordestino. A canção Estrada de Ferro Madeira Mamoré, com letra de José Cândido e adaptada por Marlui Miranda em 1981 procura, em rápidos versos, evocar o difícil período de construção da célebre ferrovia a partir da perspectiva da época de seu fechamento: “caminho de ferro do oeste do Brasil/ de Porto Velho até Guajará Mirim/ tanto progresso conduziu aquele trem/ hoje em regresso vai chegando a um triste fim./ (...) cada dormente colocado no seu leito/ a lenda diz e não é mentira não/ representa um operário morto em sua construção”.

A opção por seguir a relação entre o trem e o cinema deve-se tanto a fuga de um enciclopédico alinhavar de obras nos mais diversos gêneros artísticos como a sempre enfatizada identidade que vem sendo sublinhada entre os dois meios. Produtos de uma modernidade industrial em que a massa de cidadãos anônimos passa a ser a usuária por excelência, ambos também seriam superados, em termos de alcance e influência social, por novos veículos que, por motivos diversos, acabariam lhes roubando a posição privilegiada no cenário moderno, [fim da página 171] por volta da mesma época, década de 50: o automóvel e a televisão(3).

***

“(...) sem barulho, a locomotiva desapareceu depois de ter atingido a borda da tela. O trem parou. Personagens cinzentas descem silenciosamente. Em silêncio, saúdam seus amigos, riem, andam, correm, se agitam...e somem.”

(descrição de Máximo Gorki, em 4/ jul./ 1896,
sobre A Chegada do Trem à Estação Ciotat de Lumiére,
citado por Prieur, 1995: 29)

“Pode-se fazer coisas horríveis com máquinas. Por exemplo, a rede ferroviária fez, eu acho, cerca de 500 ou 600 filmes. Não acredito que haja um bom. Se não se é capaz de fazer uma maravilha com uma locomotiva, então que seja o maquinista, mas que não se faça cinema.”

(Depoimento do cineasta Georges Franju, 1964,
compilado por André S. Labarthe e Janine Bazin
para a série Cinéma de Notre Temps)

As afinidades entre o cinema e o trem são amplas demais para serem evocados de forma genérica, sem que se faça presente uma necessária delimitação. Abordar essa ligação é tentar compreender a quem muito se deve essa solidificação do trem como ícone da modernidade e de memória no imaginário coletivo.

Para tanto, utilizo-me de um recurso crítico talvez questionável, por sua relativa pobreza diante da infinidade de possibilidades que poderiam ser igualmente sugeridas, mas que se me apresenta como defensável, devido ao seu caráter didático e sua ligação com o tema mais amplo da pesquisa. Procuro apresentar, portanto, uma oposição entre a imagem do trem enquanto “modernidade” ou “memória” no cinema.

Pretendo seguir um itinerário que possui três paradas. Na primeira, procuro destacar as semelhanças entre o trem e o surgimento do aparato cinematográfico, lançando uma nova perspectiva de olhar o mundo. Na segunda, passados os anos de objeto de curiosidade, o cinema desenvolve-se enquanto narrativa e se transforma em hábito. Ainda assim sua abordagem sobre o trem reflete, sobretudo, a modernidade do mesmo, agora, antes de tudo, no conteúdo dos filmes. Em um terceiro momento, esse hábito também se desloca para o [fim da página 172] objeto, ganhando a representação do trem proporção mais modestas, menos épicas, mas ainda assim significativas como momentos de memória.

No período do surgimento do trem, do cinema e de sua difusão, que vai de meados do século XIX ao início do século XX, ocorre uma confusão dos sentidos, onde espaço e tempo(4)  já não são os mesmas da vida cotidiana anterior, características que cinema e trem podem compartilhar com a própria experiência moderna de forma mais ampla. O período em que a revolução burguesa foi mais intensa, que se inaugura com a Revolução Francesa e permeia boa parte do século XIX é identificado com o período onde a noção de tempo perde sua estabilidade, com sua brutal aceleração que caracteriza a modernidade revolucionária, tempo esse que a sociologia, aliás, terá um papel importante na reconquista de sua normatização, com o intuito de fazê-lo voltar ao seu eixo.

Esse novo tempo, com sua radical desierarquização, abre um espaço que deixa brechas para o antes impensável, já que aprisionado por mais rígida estrutura social. Fantasmagorias, delírios, convulsões, uma mescla entre o presente e o futuro, vividos em simultaneidade. Tempo típico das realidades revolucionárias, que Walter Benjamin analisou tão perspicazmente seus efeitos sobre a criação artística nos primeiros anos da União Soviética, celeiros de muitas correntes modernistas como o construtivismo e o cinema de Eisenstein, que, por sinal, possuem entre suas características, a fragmentação da realidade do espaço.

Além das semelhanças acima apontadas, não pode ser esquecido o parentesco de cinema e trem, em seus primeiros passos, enquanto atrações populares mais próximas das feiras de curiosidades. Assim a primeira locomotiva, surgida em 1808, Catch Me Who Can, não era mais que motivo de curiosidade daqueles que atravessavam os tapumes montados em Euston Square, Londres, para observar aquele mecanismo que se desloca em um cenário circular, apenas acentuando seu paralelo com os fenômenos circenses (Foot Hardman, 1991).

Da mesma forma, o cinematógrafo, como todos os outros aparelhos inventados no último quartel do século XIX que obsessivamente buscavam uma reprodução o mais próxima possível do movimento dos seres vivos, se aproximava mais de uma grande sensação mundana, que de qualquer reconhecimento científico ou artístico. Assim o efeito da locomotiva se aproximando “perigosamente” da tela contava mais do que qualquer pretensão propriamente narrativa. Característica que se mantém firme até os primeiros anos do século XX, em que ele se integra entre outras atrações no mundo dos espetáculos de vaudeville.

O aspecto “sensacional” do cinema que na Europa, muitas vezes era evocado pelo ato em si da exibição do que ocorresse nas ruas - mesmo assim, acentuando o lado fenomenal da parada militar ou danças nativas - ganha dimensão franca e irrestrita nos EUA. Lá fazem parte do repertório “os trens expressos Empire ou Black Diamond dobrando uma curva e correndo em alta velocidade em direção à câmera, lutas de boxe, brigas de galo, a flexão de músculos do professor [fim da página 173] Sandow, ou cenas de Annie Oakley atirando em pombos de barro. Dava-se ainda mais importância às cenas curtas de teatro - números de vaudeville e circo, trechos de peças, atos de novidade de dançarinos, prestidigitadores e acrobatas” (Knight, 1970: 08-09).

Antes da estandardização da sala fixa como o modelo imperante, eram modelos nômades que predominavam na exibição cinematográfica, mais uma vez seguindo os padrões usuais dos espetáculos circenses.

Embora muitas sejam as afinidades entre o trem e o cinema, principalmente no que se refere a esse primeiro momento, gostaria de me deter aqui sobre uma, até mesmo para evitar um maior dispersão: um nova percepção sensorial sobre o mundo.

Tais afinidades já iniciam antes mesmo do surgimento do cinema. Fazendo referência ao grande evento que representou a primeira viagem de trem, ocorrida em Liverpool, em 1830, o Reverendo Stanley, se refere ao “agigantamento dos objetos”, propiciado por essa nova percepção que ele não se escusa em caracterizar como “fantasmagoria”, consciente do sentido que a palavra então carregava fortemente, referente à formas diversas de técnicas pré-cinematográficas como a lanterna mágica (Foot Hardman, 1991).

Com forte papel nessa confusão de sentidos que se instaura em uma sociedade que a relação do homem com a paisagem que o circunda e com as percepções referentes a seu próprio corpo ganham novas formas, nada mais justificado do que uma primeira estranheza frente a essas novas representações. Da mesma forma que o Reverendo Stanley se assusta com a nova percepção proporcionada pela viagem de trem, os espectadores das inúmeras formas de representação da realidade que são desenvolvidas no período, dos quais o cinematógrafo acabará por se destacar com o correr dos anos, referem-se ao seu primeiro contato com elas como uma transgressão na ordem “natural” dos sentidos. Luis Buñuel, por exemplo, que acabaria por se transformar em uma das figuras de destaque da nova arte décadas depois, relembra sua primeira experiência na sala de cinema como assustadora, devido a desproporção que a cabeça do homem ganhava em relação ao corpo quando se aproxima da câmera(5). Ou ainda anônimos espectadores que se indignavam com os primeiros filmes a utilizarem-se de planos que parcializavam o corpo humano, tomando tal atitude como mau gosto, já que as pessoas na “vida real” não existiam somente da cintura pra cima.

Como, ao mesmo tempo, não identificar o facho de luz emanado do farol da locomotiva a vapor na escuridão da noite e a luz igualmente direcionada que atravessa a sala escura do cinema, elementos que realçam o caráter fantasmagórico de ambos os mecanismos?

Pode-se perguntar se o elemento fantasmagórico presente no imaginário social a respeito do trem não teria sucumbido frente a fria e impessoal imagem que parecem evocar seus mais modernos representantes, sobretudo nos países europeus, norte-americanos e Japão. Já em 1913 surge o primeiro modelo a diesel na Suécia. Com a I Guerra Mundial, a inovação não terá maiores progressos até meados da década seguinte, quando se popularizará mais rapidamente. Acredito que não, principalmente em casos como o brasileiro, [fim da página 174] onde o sistema ferroviário não só não absorveu com a mesma rapidez a evolução, como até mesmo foi relegado a papel extremamente secundário, com o boom do automóvel a partir da década de 1950.

É através do elo da fantasmagoria, da distorção dos sentidos do espaço e tempo, propiciados tanto pela viagem de trem como pelo cinema, que Foot Hardman trabalhará a breve analogia que realiza. Embora a retórica que faz alusão à fantasmagoria tenha sido mais duradoura com relação ao cinema, o impacto semelhante provocado pelas novas sensações propiciadas pelo trem, dificilmente pode ser compreendido nos dias de hoje, como afirma Perrot (1995: 314).

As mudanças que o surgimento do trem provocou no cotidiano da humanidade ainda estão para serem avaliadas com justiça. A capacidade de deslocamento em alta velocidade possibilitou uma nova compreensão do espaço vivido, agora muito menos restrito. E tal conseqüência pode ser evidenciada até na esfera onírica, onde as viagens passam cada vez mais a fazer parte do repertório, como no caso de Maury, que relata a existência de seis cidades presentes em seus sonhos e que afirma ser quando viaja “que fico sujeito a estas pitorescas alucinações”.

Essa confusão dos sentidos muito se deve a uma concepção espaço-temporal naturalizada que vê as viagens de carruagem como que perfeitamente integradas ao mundo circundante, sendo o trem a novidade que romperá com essa aparente naturalidade, provocando uma reavaliação do que era tido como natural. Uma mudança que parece abarcar não somente a noção de tempo como também de espaço, já que a impressão que fica é que o espaço geográfico também diminuiu. Toda essa transformação é provocada pela eqüivalente mudança de paradigma na tecnologia de transporte, a base material que rege a percepção espaço-temporal do viajante (Schivelbusch, 1986).

Muito dessa resistência a um novo modelo de compreensão do espaço e tempo pode ser compreendida a partir da análise de Durkheim (1989), que recusa uma universalidade a priori para tais categorias, a moda de Kant, percebendo-os como construídos em conjunto com cada meio social e histórico específico. Do mesmo modo Marx evidenciará como a construção dos sentidos, principais responsáveis pela percepção diferenciada de espaço e tempo é eminentemente sócio-histórica: “O olho tornou-se um olho humano, no momento em que seu objeto se transformou em objeto humano, social, criado pelo homem e para o homem” (1993: 197). E, mais adiante: “A formação dos cinco sentidos é a obra de toda a história mundial anterior” (Marx, 1993: 199).

O que tanto trem como cinema apresentam de inequivocamente moderno na relação entre espaço e tempo do meio social e histórico em que surgiram, portanto, é essa ruptura com uma tecnologia onde o espaço parece reinar soberano sobre o tempo, condição que se torna mais tênue com o avanço tecnológico, que não mais permite que a distância geográfica seja percebida com a mesma precisão dos meios de transporte pré-industriais. Da mesma forma o cinema, através da montagem, possibilitará a experiência da visualização de espaços físicos diversos em questão de segundos, ou até mesmo simultaneamente.

Schivelbusch refere-se ao que ele chama de “percepção panorâmica”, onde [fim da página 175] o olhar é lançado através do aparato que se move juntamente com o observador. A máquina e o movimento criado se integram de tal forma que as paisagens só podem ser percebidas em movimento.

Para melhor compreender o surgimento da “percepção panorâmica” primeiro através dos trens, e posteriormente no cinema deve-se compreender a irresistível atração que a percepção visual passou a exercer, inclusive sobre a cultura literária, a partir de meados do século XIX. A Monarquia de Julho francesa é emblemática desse momento, com o surgimento de uma literatura panorâmica, que procura dar conta do espaço físico em que se desenrola as narrativas o mais fielmente possível. Benjamin chega a comparar a literatura panorâmica com um meio visual, não somente no sentido de escrutinador do ambiente físico como ao destaque que é dado a ilustração para a construção do sentido do mesmo(6). No campo da identificação pessoal, ocorre uma ruptura com o padrão anterior que se orientava pela assinatura, com a introdução da fotografia (Benjamin, 1994: 45). Também na mesma perspectiva podem ser compreendidas o surgimento das galerias, espaço privilegiado do olhar e a revolução operada nos jornais com a introdução de gravuras.

Identificado com essa possibilidade de descortinar paisagens de forma menos restrita, logo o cinema incorporará em seu linguajar a chamada panorâmica, movimento em que a câmera se movimenta sobre seu próprio eixo e que, como o próprio nome já evidencia, tem como função básica, destacar o ambiente em que se insere a ação.

Certos filmes do início do século se apropriarão ao máximo do recurso da panorâmica e seu amplo potencial descritivo. Menos preocupados em seguir um fluxo narrativo, o cinema em seus primeiros anos, parece sobretudo encantado com sua própria capacidade de observar o mundo e, via de regra, de apresentá-lo ao seu espectador. Muitos dos filmes da época só possuem seu motivo de ser enquanto percepções panorâmicas dos eventos de destaque no momento. Assim tanto Panorama of Esplanade by Night (Porter, 1901) quanto Circular Panorama of Eletric Tower (Edison, 1901) se detém sobre o mesmo tema, aliás símbolo da emergente modernidade, a exposição internacional, grande feira que congrega todas as novidades tecnológicas que surgem (Costa, 1995).

As panorâmicas parecem congregar em forma e conteúdo essa sensação eufórica da experiência moderna: o movimento. Não satisfeita em acompanhar o movimento, a câmera também passa a perseguir esse movimento:

“As panorâmicas parecem estar em relação direta com a ordem da máquina. De um filme a outro os automóveis, os trens e as ferrovias passam diante da câmera que, sendo ela mesma uma máquina, entra dentro da dança do movimento.” (Gartenberg apud Costa, 1995: 104)

Ainda mais que a panorâmica é o travelling, em que a própria câmera por inteiro se movimenta, que será o aliado natural da representação do trem no cinema, sobretudo por possibilitar tomadas realizadas sobre a perspectiva de [fim da página 176] quem se encontra em algum veículo em movimento, ou seja, uma percepção panorâmica bem semelhante à do passageiro. O primeiro travelling registrado na história do cinema parte de uma câmera situada em uma gôndola, porém logo ele se popularizará sobretudo apresentando tomadas a partir de navios e trens.

São poéticos travellings que separam a curta ação que dá título a The Kiss in the Tunnel (1899), de T. H. Smith. Entre a cena que apresenta a aproximação do túnel e a sua saída, o marido toma a iniciativa de beijar a tímida esposa. O contraste entre a cena do vagão, evidente construção em estúdio, e as cenas naturais do trem, era típica da época. Assim como esse tipo de filme, onde acompanhamos a perspectiva da locomotiva, conhecidos como phantom rides. O veículo trem foi tão satisfatório para a realização de “travellings naturais”, que quando se construiu em estúdio um mecanismo específico para realizá-lo, esse passou, em algumas versões, a correr sobre trilhos. Trata-se aqui, do próprio aparato cinematográfico buscando tirar vantagens das semelhanças compartilhadas tanto pelo cinematógrafo quanto pela viagem de trem em relação à sensação de movimento. E nessa mesma época, por volta de 1905, surgem os Hale’s Tours, uma reelaboração tecnológica de um espetáculo já tradicional que era apresentado nas feiras circenses.

O espetáculo, em sua primeira forma, chamada panorama, consistia em um cenário que reconstituía personagens e locais célebres e data do século XVIII. Nas últimas décadas do século XIX, no entanto, eles ressurgem tendo como principal atração reconstituir o movimento de uma carruagem, navio ou vagão de um trem, em que as pessoas assistiam o desfilar de gravuras que representavam imagens de cidades célebres da Europa ou de paisagens naturais de grande destaque, sendo geralmente essas imagens desenhadas sobre um rolo de papel que era movimentado a partir de tração humana, na figura do homem que pedalava uma bicicleta que impulsionava o mecanismo(7). O que o Hale’s Tour acrescentará é a maior verossimilhança das imagens captadas pelo cinematógrafo, precursora dos espetáculos de terceira dimensão ou realidade virtual produzida por computadores nos dias de hoje, sendo “a ilusão (...) tão boa que quando se mostrava o trem atravessando cidades, membros da audiência freqüentemente acenavam para que os pedestres saíssem do caminho e não fossem atropelados” (Fielding apud Costa, 1995: 06). Muitas das pessoas terão seu primeiro contato seja com o cinema, seja com a experiência de andar de trem, através do invento de George C. Hale, que incluía ainda para reforçar a ilusão sacudidelas no vagão, o barulho das rodas e do apito do trem.

Assim como os panoramas e os phamtom rides, os Hale’s tours (que, por sinal, utilizavam muito do material desses últimos, produzidos alguns anos antes) tinham como principal pretensão transmitir a experiência sensorial do movimento panorâmico, se encontrando dentro de uma definição sócio-econômica específica de modernidade que Ben Singer (1995: 72), chamará de “neurológica”, que evidencia o choque, em termos tanto físicos quanto perceptivos, [fim da página 177] portanto fundamentalmente subjetiva, em que se configura a compreensão do ambiente moderno. Tal concepção, embora seja amparada pela teoria de Benjamim e Simmel, direta ou indiretamente também deve muito a Bergson que, consciente da ascensão do psíquico na compreensão humana, elabora o conceito de duração (durée) em que, por exemplo, procura compreender o deslocamento de um transeunte de um ponto a outro da calçada como uma experiência espaço-temporal subjetiva e não matemática. Nas palavras de Prado Júnior é “a extinção do fisicismo na descrição do mundo psicológico” (1989: 77).

Trem e cinema já surgem juntos na primeira exibição cinematográfica, promovida pelos irmãos Lumiére. Do programa de 4 ou 5 filmes curtos, o que entraria definitivamente para a história do cinema seria A Chegada do Trem à Estação Ciotat (1895), sendo sua fama vinculada ao suposto efeito aterrorizante que teria provocado na platéia a imagem de um trem que se aproximava da tela.

Também é impossível se pensar alguns gêneros emergentes no cinema americano do início do século como o filme de perseguição e o western sem a presença do trem. O Grande Roubo do Trem (1903) de Edwin S. Porter, é tido como um filme que revolucionou a linguagem cinematográfica, indicando o modelo narrativo padrão contemporâneo.

Após o boom inicial de “filmes de trem” que procuravam tirar partido do movimento privilegiado e das semelhanças de ponto de vista, com a gradual tendência à narrativização do cinema, essa característica espetacular que unia a imagem do trem ao aparato cinematográfico perde destaque. Na década de 20, por exemplo, o trem pode ser associado a formas de vanguarda narrativa ou, e mais comumente, em formas de narrativa mais clássicas, em que se destaca o seu papel de elemento civilizador. Embora grandemente associado a este período, a representação do trem como elemento “civilizador” obviamente não desaparecerá como um todo, embora seja cada vez menos lembrada a partir do momento que se alarga o hiato entre o tempo histórico em que ocorreram a construção das ferrovias pioneiras e sua posterior dramatização nos filmes. Ou ainda sua modernidade pode ser destacada dentro do próprio mundo contemporâneo à produção do filme em questão.

Dentro dessa primeira caracterização se destacam filmes como A Roda (1927) de Abel Gance, em que os dois momentos cruciais são provenientes de uma analogia que ocorre entre um acidente de trem e o estado mental perturbado do protagonista, um maquinista. Ele também se faz presente, mesmo que secundariamente, em O Homem com a Câmera (1929), de Dziga Vertov. Vertov fazia parte de um dos grupos de maior destaque do então efervescente cinema soviético, que era formado por documentaristas que partiam em um trem, onde tanto filmavam muito da realidade geográfica e humana que vivenciavam, como também revelavam e exibiam os próprios filmes.

Em formas mais clássicas de narrativa seria ressaltada a imagem do trem sobretudo enquanto elemento desbravador e pioneiro, ponta de lança do processo “civilizatório”, que abarca sobretudo países de dimensões continentais como os EUA e a ex-União Soviética. São exemplos, no caso americano, entre muitos outros, The Covered Wagon (1923), de James Cruze, The General (1927), de Buster Keaton e The Iron Horse (1924), de John Ford, que narra a história da [fim da página 178] primeira ferrovia transcontinental americana, a Union and Central Pacific Railway, ou seja, a marcha dos primeiros colonizadores para o Oeste “bravio”.

Provavelmente nenhum outro filme traduzirá de forma mais aproximada o ideal de modernidade e progresso levado pelo trem como o filme de Ford, assim como a inevitável violência entre o choque de duas culturas, já presente nas entrelinhas da epígrafe que homenageia Abraham Lincoln, “cuja intuição do futuro e firmeza uniram norte e sul, enquanto forjava com sangue e ferro o leste e o oeste”(8).

A todo momento se torna patente a orgulhosa afirmação de superioridade sobre a cultura autóctone, seja quando o pai do herói, um visionário agrimensor bem ao estilo dos “intérpridos engenheiros e operários” que também são homenageados na abertura, consegue visualizar a ferrovia atravessando um íngreme despenhadeiro, tornando-o “muito mais curto que o velho caminho índio”. Seja ainda impresso na própria forma fílmica. Num único plano, de poucos segundos, em que Ford reproduz a perspectiva da locomotiva de forma idêntica ao que era comumente apresentada nos phantom rides, aqui interessa menos a exaltação de um produto de pretensões fenomenológicas como a de reproduzir uma realidade sensorial tal e qual nos primeiros filmes, que uma constatação da supremacia cultural intrínseca que faz com que o maquinista e seu ajudante riam da obsolência dos índios e seus cavalos. O elemento ideológico se faz, portanto, mais explícito. O mesmo pode ser dito da cena em que vemos o trem avançando progressivamente para o encontro histórico que selará a união das duas maiores ferrovias em uma única só, a partir de uma câmera baixa que destaca toda sua majestosidade - por sinal, a seqüência final do encontro foi filmada com as locomotivas originais, modelos visualmente bem menos impactantes que os utilizados ao longo do filme.

Na União Soviética, onde a sede de apresentar um novo país surgido das cinzas de uma excrescência quase medieval era enorme, o trem teve uma representatividade tão importante quanto no caso americano. Turkshib (1929), é um congênere do filme de Ford, acompanhando a trajetória de uma via férrea que atravessa o Turquistão e a Sibéria, detendo-se no exotismo das paisagens, que mesclam desertos com territórios gelados. A imagem da ferrovia ressalta o caráter demiúrgico da modernidade apontada por Berman (1994), em que uma fé irrestrita no progresso, pouco se apercebe do caráter igualmente devastador frente às culturas autóctones das regiões “desbravadas”.

Produto de uma modernidade essencialmente futurista, talvez seja demasiado injusto falar em destruição apenas, quando lembramos com Berman, que a modernidade também representou um novo campo de experiências compartilhadas por uma maior quantidade de pessoas.

Porém na imagem do trem enquanto “modernidade”, também podem ser citados exemplos mais traumáticos de reação à potencial ameaça e instabilidade que pode representar a presença da ferrovia. Em Zvenigora (1928) de Dovjenko, um avô acostumado a contar histórias sobre uma terra mítica ao neto tenta, sem sucesso, descarrilar o trem, como que querendo a tudo custo preservar sua terra dos males do progresso. Porém as forças míticas pouco [fim da página 179] podem contra o trem - literalmente - da história. Em Johnny Guitar (1954), de Nicholas Ray, Emma, arqui-rival da dona do saloon local, tenta impedir a chegada do trem, como que pressentindo uma instabilidade tamanha que abalaria não só o universo em que vive, permeado de pequenas intrigas, vingança e honra, como o próprio gênero em que ela se insere, enquanto personagem. Cultura essa que viveu seu apogeu entre 1860 e 1900 e que, posteriormente, só poderá ser revivida através de meios como o próprio cinema.

Também nesse mesmo período existem filmes que, mesmo sem deixar de enfatizar a modernidade representada pelo trem, a inserem na sociedade contemporânea desenvolvida. Dentro dessa linha se encontram, por exemplo, Berlim, Sinfonia de uma Metrópole (1927) de Walter Ruttman e Nightmail (1933) de Basil Wright e Harry Watt.

O primeiro, como o próprio título deixa entrever, é uma ode à metrópole moderna, numa colagem visual que acentua todos os elementos mais representativos da noção sócio-econômica de modernidade: industrialização (diversas imagens de chaminés fumaçentas), urbanização (inúmeros planos destacam de uma perspectiva aérea trechos da cidade descrita), a explosão do consumo de massa e novas tecnologias (cenas apresentam tanto o maquinário de uma indústria de produção em massa como sua conseqüência: fornadas de pães e litros de leite dispostos em série). Para chegar a tudo isso, no entanto, somos iniciados a partir de um outro instrumento dessa revolução, no campo dos transportes: o trem. E é tanto dentro dele - espectadores privilegiados de um panorama dos subúrbios de Berlim - como ao seu redor - observando em detalhe diversos de seus mecanismos que nos aproximamos em velocidade inaudita da cidade, que agrega todos esses novos valores em seu espaço. O trem aqui carrega consigo uma identificação com potência e velocidade nessa austera colagem que tão bem descreve o caráter de infinita circulação do mundo moderno. Circulação em massa de bens e agora também de pessoas.

O segundo, retrata o cotidiano de ferroviários e trabalhadores dos correios britânicos, que tem no trem um instrumento referencial para a maior eficácia dos seus serviços. Documentário de cunho institucional, o filme acentua apenas a eficiência e a cordialidade nas relações de trabalho. Ocorre uma verdadeira naturalização das atividades descritas. Muitos são os elementos que confluem para tal atitude. Antes de tudo, a utilização de uma técnica narrativa compartilhada pelos documentários de então que, pela ausência de material de gravação sonora portátil, utilizavam geralmente a presença “panóptica” de um único narrador. Anônimos em sua mudez, os funcionários são apresentados dentro de uma suspeita divisão do trabalho orgânica e harmônica. Inexiste qualquer noção de conflito, quanto mais qualquer referência à organização trabalhista ou acidentes de trabalho, mesmo o filme deixando evidente o grande risco que envolvia certas operações. O único momento que abdica da narração in off, apresenta comentários de funcionários “encenando” suas próprias atividades cotidianas, da forma mais didática possível. Naturalização também presente numa seqüência de acentuada montagem que une às imagens da natureza à margem da ferrovia com o trem, através de uma lúdica canção que apresenta os serviços prestados pelos correios. Ou ainda nas recorrentes tomadas aéreas que reforçam essa união entre esses trabalhadores esforçados e a natureza [fim da página 180] circundante - natureza essa também humana, como o senhor que recebe feliz as novidades através do jornal que é jogado do trem. E ainda também presente na panorâmica final que une o fluxo cotidiano da cidade à atividade dos trabalhadores que lustram as locomotivas, acentuando o ritmo orgânico em que se desenvolvem todas as atividades cotidianas.

O que esses dois filmes ilustram é uma tendência a apresentar o trem como elemento perfeitamente integrado ao mundo moderno, sendo esse apresentado quase sempre de forma elegíaca, o conflito existindo apenas quando a relação entre a ferrovia e partes da sociedade ainda “não civilizadas” se dá, seja esse um momento do passado (como em The Iron Horse) ou ainda presente (como em Turkshib).

A diferença que pode ser apontada na representação que o trem ganha nessas duas películas, se refere ao fato de o trem ser identificado, no filme da escola documental britânica, dentro de um espírito de utopia e fé irrestrita no progresso, enquanto no filme alemão, o trem, assim como todos os outros elementos modernos descritos no filme, como bem observou Siegfried Kracuer, são apresentados de uma forma neutra e formal, pobre de conteúdo. Aqui a modernidade deixa de ser mero encanto e apresenta já seu lado mecanicista, característica também presente no documentário inglês, mas que é contrabalançada por uma série de elementos que procuram humanizá-la. No filme de Ruttman, pelo contrário “a excitação desapareceu. A indiferença permanece” (Kracauer, 1988: 217). Temos uma sociedade por excelência moderna, mas sem qualquer energia vital. No documentário britânico os sentimentos se encontram presentes, sejam nos versos do poeta W.H. Auden, que escreveu o roteiro do filme, assim como na letra da canção que homenageia os trabalhadores, ou ainda na euforia que o narrador apresenta, por exemplo, o volume de carga transportada a cada ano.

Um dos poucos filmes a apresentar o outro lado da modernidade, no sentido de ilustrar a dura vida dos ferroviários é A Besta Humana (1939) de Jean Renoir. Seu protagonista é um maquinista atormentado com a herança maldita legada por seus antepassados alcoólatras. Mesmo que as intenções do filme, assim como da fonte literária da qual foi extraído, utilizem da problemática social como pano de fundo para um enredo mais voltado para intrigas pessoais, nele surgem como poucas vezes nos filmes aqui referenciados a imagem de maquinista e foguista completamente sujos na sua lide com uma tecnologia e uma modernidade que ainda não dispensam o gasto de muita energia humana(9). No mesmo sentido se encontra sua descrição das condições precárias dos dormitórios coletivos e da alimentação, preparada pelos próprios operários.

Com um prólogo de cinco minutos em que, a exemplo do filme de Ruttman, observamos a chegada do trem à cidade, apresentando alguns dos mais longos e belos “travellings ferroviários” da história do cinema, o filme, segundo o esquema que propus, mescla características de períodos diversos. [fim da página 181] Dentro da lógica aqui proposta, ele se aproxima mais dos filmes que expressam a modernidade do trem através do seu conteúdo, ainda que enfatize um lado pouco abordado e como que inverso ao filme de Ruttman, onde os mecanismos parecem regidos por uma lógica que lhes é intrínseca, também não ignora esse olhar da percepção panorâmica do primeiro cinema; porém aqui essa aproximação é mais dirigida a precisar uma noção de tempo-espaço, subordinando-se a uma lógica narrativa mais ampla, que longe de se satisfazer apenas com essa identidade, a utiliza como um meio e não como um fim em si.

Com o passar dos anos, no entanto, o trem passa a se tornar cada vez mais um lugar comum na narrativa cinematográfica. Longe já vai a época da lenda sobre a platéia assustada com a locomotiva que se aproxima no célebre filme dos Lumiére. Seguindo uma tendência do próprio cinema como um todo, o trem passa então a ser apresentado de forma mais realista. E sobretudo, através de sua imagem associada a da estação ferroviária, passa a ser um desses “lugares da memória”, como afirma Pollak, onde ocorrem momentos marcantes de separações, muitas das quais irreversíveis.

Melodrama típico de sua época, Intermezzo, producão sueca de 1938 que, mesmo tendo o trem presente em apenas em uma rápida cena, dá o tom com que ele passará ser representado. Na estação ferroviária, Anita, amante de Holger, um nacionalmente famoso violinista, se encontra preparada para embarcar no trem que a distanciará desse amour fou. Logo, no entanto, surge Holger e a deixa confusa ao afirmar que “não se pega um trem e diz adeus a tudo. Sempre fica alguém na plataforma”. Desistindo da fuga e aceitando viver com Holger, Anita passa a ser sua parceira também nas apresentações musicais. O relacionamento logo se inviabiliza tanto pelo desejo de crescimento artístico de Anita, que sente-se sempre à sombra do amante famoso quanto pelo sentimento de culpa de Holger por ter abandonado sua família. Anita, decidindo-se a pôr um termo na relação, volta a repetir o que Holger lhe dissera na estação ferroviária, remetendo-se ao passado em comum com a família que o amante abandonara, sendo essa a frase-chave para se entender a estrutura dramática da narrativa.

O trem, portanto, como potencial inimigo da continuidade das relações afetivas ou motivo de escolha entre dois mundos. Assim é em Os Girassóis da Rússia (1970), de Vittorio de Sica, onde separa dois amantes. O filho, que parte para o internato, rompendo involuntariamente muitos dos laços de dependência afetiva que o ligam a sua mãe e observa melancólico a paisagem com o rosto colado à janela do trem no início de Adeus Meninos (1987) de Louis Malle. Ou ainda a brusca ruptura entre a cidade natal/adolescência e cidade grande/mundo adulto sugerida no final de Os Boas Vidas (1958), de Fellini. Todas estas cenas nos evocam Maurice Halbwachs (1990:47-48), quando acentua que muitas das lembranças mais marcantes ocorrem nesses momentos de ruptura com o espaço social anteriormente vivido.

É um homem em viagem que, repentinamente, se sente tomado por influências que emanam de um meio estranho a seus companheiros. É uma criança que se encontra, pelo concurso inesperado de circunstâncias, numa situação que não é de sua idade, e cujo sentimento se abre para sentimentos e preocupações de adultos. É uma mudança de lugar, de profissão, de família, [fim da página 182] que não rompem ainda inteiramente os liames que nos amarram a nossos antigos grupos.

Existe ainda toda uma extensa representação sobre um trem mais sombrio, o trem da morte dos campos de concentração, enfatizando o drama coletivo -as crianças que se separam alegremente dos pais, sem saberem que vão ser enviadas às câmaras de gás em A Lista de Schindler (1994) de Spielberg - ou individual - a mãe que, instada a escolher entre um dos filhos para ter consigo, acaba se recusando a fazer a perversa escolha em A Escolha de Sofia (1982), de Reisz. Ou ainda a mulher que pretende seguir com a família para o campo de concentração em A Vida é Bela (1998), de Benigni.

Porém, como a frase do melodrama sueco evidencia, e Halbwachs destaca, a separação física não pressupõe um esquecimento dos que ficaram na plataforma. Caso assim o fosse não haveria razão de ser das próprias narrativas. É aqui que se faz central o elemento da memória na construção dessas narrativas. Tal caracterização como filmes de “memória” só pode, no entanto, ser considerada se tomarmos cada filme no todo de sua narrativa. Não se trata, geralmente, da clássica utilização do flashback que vem a destacar algum evento ocorrido no passado, com relação a ação presente em que se desenvolve a narrativa. Não. Porém, quando destacadas dentro do enredo como um todo, tais momentos ganham um potencial dramático que não poucas vezes coincide com o clímax emocional - como no caso dos filmes de Reisz e Spielberg. E que, portanto, potencialmente se apresentariam como os momentos mais marcantes na memória dos personagens que os vivenciaram.

Referências Bibliográficas


Notas

1) Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Ceará.

2) Tradução de Liberto Cruz in Folha de São Paulo, 15/abr./ 1998. Curiosamente Cendars também foi um dos primeiros literatos de prestígio a se empolgar com a experiência também moderna por excelência que representa o cinema, apresentando-a como próxima do delírio, escrevendo já em 1919 sobre o tema. Ver Rhode (s.d.).

3) Obviamente tal período histórico possui variações a depender dos países em questão, porém a lógica dos países industrializados, via de regra, logo seria seguida pelos países periféricos. Nos países industrializados, mesmo que a cultura automobilística tenha se implantado com bem antecedência, a década de 50 é considerada como um marco definitivo na secundarização do transporte ferroviário, o mesmo ocorrendo com o cinema, que enfrenta uma grave crise de diminuição do público pagante, refletindo-se na procura de novas tecnologias que façam frente à televisão, como é o caso do Cinemascope. Com relação ao primeiro tópico, ver Meeks (1995) que, aliás, delimita seu estudo a partir dessa premissa. Em relação ao cinema, a bibliografia sobre o tema é vasta.

4) Para uma discussão mais complexa sobre a noção de tempo como apreendida por disciplinas e momentos históricos diversos ver Reis (1994).

5) Depoimento presente no programa Profiles, produzido pela BBC de Londres, com direção de Anthony Wall(1984).

6) Para uma visão mais detalhada da influência do texto panorâmico na Monarquia de Julho ver Cohen (1995). Uma percepção da pouca sensibilidade do texto panorâmico para as exacerbantes desigualdades sociais do período ver Oehler (1997: 29-46).

7) Uma representação de como se dava a exibição desse mecanismo para a platéia, apresentando inclusive o homem se esforçando na bicicleta fixa está presente em uma cena do filme Carta a uma Desconhecida (Letter to an Unknown Woman, 1948, Max Ophüls).

8) Todas as referências ao filme de Ford entre aspas são reproduções de intertítulos do filme, que foi realizado antes do surgimento do cinema sonoro.

9) Mesmo que The General, filme de Buster Keaton anteriormente citado, por exemplo, utilize-se de uma grande precisão na reconstituição dos elementos tecnológicos que compunham uma ferrovia, ainda mais quando sabe-se tratar de uma comédia, o filme não estende tal precisão ao maquinista, seu protagonista, que surge de face e corpo limpos do início ao final do filme.

RESUMO
TREM E CINEMA:
MODERNIDADE E MEMÓRIA


Este artigo discorre sobre a relação entre o trem e o cinema, sobretudo no que concerne as formas como o primeiro foi representado pelo segundo e, dentro desse contexto, sua trajetória predominante de ícone da modernidade à símbolo de memória.
PALAVRAS-CHAVE: trem; cinema; modernidade.

ABSTRACT
TRAIN AND MOVIE PICTURES:
MODERNITY AND MEMORY


This article analyses the relationship between train and movie pictures and how the first was represented by the second. In these context, the main point is how the train was represented through the years: from modernity's icon to symbol of memory.
KEYWORDS: train; movie pictures; modernity.



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Número 16 - set/2000  |   Universidade Federal da Paraíba  |  Programa de Pós-Graduação em Sociologia - UFPb


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