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Política & Trabalho 16 - Setembro / 2000 - pp. 65-72
SUJEITOS ERRANTES:
A EMERGÊNGIA DA SOCIOLOGIA HISTÓRICA
Adriano de León (1)
Para um começo
Ao se falar numa Sociologia do presente não posso deixar de citar os nomes de Max Weber, Norbert Elias, Anthony Giddens, Walter Benjamim, Fernand Braudel e Michel Foucault, entre outros, os quais chamaram às suas teses diversos domínios do conhecimento humano, percorrendo as veredas da História, da Sociologia, da Filosofia e da Teoria Política. Daí a facilidade de tratar de uma amplidão de temas a partir destes teóricos.
Somente a partir da publicação d’Arqueologia do Saber de Michel Foucault, em 1969, é possível se falar num domínio próprio da Sociologia, diria melhor, um estilo da escrita sociológica chamada Sociologia Histórica. Não que A Arqueologia do Saber seja um livro sociológico, mas a abordagem de Foucault neste livro permitiu, com grande amplidão, a busca de uma metodologia que colocasse em questão as teses gerais das Ciências Sociais, sobretudo as metanarrativas do século XIX.
No concernente aos domínios paradigmáticos da Sociologia, três eixos básicos podem ser desmembrados(2):
a Teoria Progressiva, a qual propõe um modelo de evolução social através da teleologia da razão, da tecnologia e da produção, foco das narrativas Iluministas, Positivistas e da Teoria Marxista da História.
a Teoria Crítica, representante de uma crítica aos avanços da tecnologia racional instrumental, objeto do marxismo ocidental, da Teoria da Ação Comunicativa de Habermas e do novo Iluminismo da Escola de Frankfurt.
a Teoria Genealógica, que estabelece uma análise das formas históricas do saber, da multiplicidade de temporalidades e espacialidades, envolvendo Foucault, Elias e a Nouvelle Histoire Française.
A Sociologia Clássica pretendeu gerar conceitos que descrevam processos que envolvessem a produção, a modernização, administração, urbanização, Estado Burguês Democrático entre outros. Tem-se, pois, como foco privilegiado da Sociologia particularmente o estudo das sociedades modernas. ABRAMS, Peter. (1982). History, sociology, historical sociology. London: Open Books. BRAUDEL, Fernand. (1990). História e ciências sociais. Lisboa: Presença. CHARTIER, Roger. (1996). História cultural. Lisboa: DIFEL. COMPAGNON, Antoine. (1996). The five paradoxes of modernity. New York: McGuee. DEAN, Mitchell. (1997). Foucault’s methods and historical sociology. London: Routledge. DELEUZE, Gilles. (1998). Foucault. São Paulo: Brasiliense. DREYFUS, Hubert & RABINOW, Paul. (1997). Michel Foucault: beyond structuralism and hermeneutics. London: Routledge. ELIAS, Norbert. (1986). Sociology. New York: New Press. FOUCAULT, Michel. (1980). A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária. GIDDENS, Anthony. (1990). Sociology. London: Routledge. PONTES, Heloísa. (1999). "Elias, renovador das Ciências Sociais". In: WAIZBORT, Leopoldo (org). Dossiê Norbert Elias. São Paulo: EDUSP, pp. 17-36. VEYNE, Paul. (1995). Como se escreve a história. Brasília: Editora da UnB. WEBER, Max. (1964). Economía y sociedad. 2ª ed. Madrid: Castillo y Fuentes.
Para Michel Foucault, Norbert Elias, Paul Veyne, Jacques Revel, Keith Thomas, seguidores, entre outros, de Nietzsche e Weber, os estudos que põem em suspenso a pretensa racionalidade moderna talvez formem menos que um campo disciplinar ou interdisciplinar, mas um campo transdisciplinar erudito [fim da página 65] e crítico da atividade intelectual. Investiga o mundo a partir da genealogia como meio de análise, cuja função primária não é interpretar textos ou documentos; ao invés disto, ela organiza documentos, divide-os, distribui-os, ordena-os, estabelece séries, descobre elementos, descreve relações. É uma Sociologia do Discurso, pois.
Sociologia e História: eis dois discursos; eis um só campo
As relações entre Sociologia e História são um problema complexo. Desde a exaustão das teses iluministas no final do século XVIII, o desenvolvimento do que hoje é tido como pensamento sociológico tem sido entrecortado com análises históricas e esquemas de interpretação, compreensão e explicação histórica dos fatos. O foco destas análises tem por fundamento a Modernidade e todo novo estilo de vida que emerge neste cenário.
As características da Modernidade variam de autor para autor, mas são praticamente as mesmas. O cerne da grande transformação nos modelos a partir da Modernidade pode ser identificado através da combinação de fatores como tecnologia industrial, produção generalizada de bens, administração burocrática, modo de vida urbano, individualismo, dicotomia público e privado, todas estas e mais outras arranjadas num contexto que Compagnon (1998: 33) chama de “mania teórica”. A partir destas características foram criados termos que pudessem, mesmo que incompletamente, descrever estes processos, a exemplo de modernização, racionalização, urbanização, burocratização, secularização. Aparentemente a Sociologia tem sido bem sucedida em gerar termos que definem e constróem o que chamamos de Modernidade. Talvez seja por isto que a Sociologia concentre seu arranjo teórico nas “sociedades avançadas”, conforme ironiza Anthony Giddens (1990: introdução).
A Sociologia, pois, pode se apresentar como uma disciplina geral que formula teorias a serem aplicadas num vasto campo de fenômenos, enquanto à História restaria a descrição ideográfica do singular, como um suporte para as teses gerais da Sociologia. Desta maneira, a Sociologia pode reivindicar ser a ciência social par excellence, deixando a História e a Filosofia como abordagens de apoio.
Entretanto a separação da Sociologia e História não tem uma justificação racional. Estes dois campos do conhecimento tornam-se metodologicamente indistinguíveis se colocarmos a Sociologia como campo analítico capaz de superar os domínios da Modernidade. Teremos, com efeito, a Sociologia Histórica como quebra desta hierarquia de saberes proporcionada pelos teóricos do século XIX, uma Sociologia que não parte de conceitos já prontos, mas os constrói segundo uma arqueologia de sujeitos, uma arqueologia de conceitos e modelos.
A Sociologia Histórica talvez não seja uma disciplina unificada ou mesmo um campo interdisciplinar, mas uma atividade intelectual erudita, crítica, desconstrutora e transdisciplinar nas palavras de Chartier (1996). Na verdade, esta atividade poderia ser entendida como uma anti-sociologia, pois que representa múltiplas possibilidades no tocante à teoria social, à sociedade como entidade global, perfazendo um trajeto de análise genealógica dos conceitos mais usuais, das tradições sociológicas em voga, das teses gerais do século XIX.
É tido como verdade que nem todos os estudos deste novo campo de [fim da página 66] conhecimento envolvem a contestação das teorias sociológicas e seu suposto grau de cientificidade. Ainda que a Sociologia Histórica sugira que as narrativas e tipologias oriundas destas teorias sejam problemáticas, a própria construção destas narrativas permite-nos compreender que de fato não há os sujeitos dados a priori, mas processos de sujeição. O sujeito é, pois, posicional sempre.
Longe de tomar Michel Foucault como um sociólogo, é mister que se lance um olhar sobre sua abordagem na história das idéias, bem como sua influência em todos os aspectos das Ciências Humanas. Foucault tem sido chamado “o maior dos historiadores” por Paul Veyne (1995), “o inventor da filosofia do questionamento que reavivou a História” por Gilles Deleuze (1998). Assim, aproxima-se Foucault, ao mesmo tempo, das margens do conhecimento bem como da linha transversal dos saberes por ele denominada de discurso. O autor em tela estuda as arqueologias ou genealogias dos saberes produzidos na Modernidade, sugerindo ao leitor uma forma de observar a História a partir de uma reflexão de como ela foi escrita, quem a produziu e quais as condições exteriores a esta produção. Não é errôneo considerar a genealogia proposta por Foucault como uma história do presente, na qual a arqueologia representa um meio de análise. Seguindo os passos de Friedrich Nietzsche, a trajetória metodológica de Foucault tem influências da Escola dos Annales e da também francesa história das ciências de Gaston Bachelard e Georges Canguilhem. A problemática básica destes autores e escolas é a questão crucial da relação entre continuidade e descontinuidade das narrativas sociais, obtidas através do princípio da problematização. Para tal princípio, qualquer texto, seja ele escrito ou oral, iconográfico ou emblemático, seria um discurso vivo, o qual deveria, antes de mais nada, ser posto em questão quanto a sua autoria, enunciados e conceitos. Busca-se, assim, pela abordagem arqueológica, não o discurso puro - este não existe ! - mas as imbricações deste com outros discursos numa trajetória não retilínea, não ordenada, mas descontínua e, às vezes, caótica.
A função primária da abordagem da Sociologia Histórica não é interpretar documentos, muito ao contrário, é organizar estes documentos, dividi-los, distribui-los, ordená-los, arranjá-los em estratos, estabelecer séries, descobrir elementos, definir unidades, descrever relações, segundo o próprio Foucault (1980). Claramente contrária à hermenêutica, a arqueologia não se propõe a interpretar nenhum tipo de discurso, pois que não haveria este discurso livre de outros. Os discursos são linhas de um grande traçado de eventos de vários indivíduos, instituições e estruturas de organização tempo-espaciais. Foucault trata os discursos como campos, como sistemas de relações dispersas responsáveis pela construção destes discursos.
A despeito de certas insinuações sobre as teses foucaultianas, a base epistemológica da arqueologia não é um puro relativismo, tampouco um niilismo o qual argumenta que tudo não passa de interpretações e que os fatos não existem objetivamente. De fato, para a arqueologia o discurso tem uma densidade específica, solidez e constitui um nível de realidade que é irredutível aos atributos subjetivos dos produtores do discurso. Ao contrário de usar os documentos para reconstruir a realidade histórica, Foucault afirma que o problema é descrever os sistemas de formação do discurso.
A Sociologia Histórica pode ser caracterizada, assim, pelo uso dos recursos [fim da página 67] históricos que refletem a contingência, a singularidade, as interconexões e potencialidades das diversas trajetórias dos elementos que compõem os arranjos sociais do presente. Os estudos originados deste recente campo representam os primeiros frutos de um novo estilo que se pretende uma alternativa aos dois tipos de "regime de verdade", segundo Peter Abrams (1982): de um lado, a teoria social e a Sociologia que busca o sacrificar a inteligibilidade histórica em favor de modelos, tipologias e métodos; de outro lado, a historiografia convencional que procura abandonar conceitos em favor da reconstrução do passado. A Sociologia Histórica, em contraste, tem mostrado uma maior capacidade de enfocar problemas que envolvam discussões no campo da epistemologia, desde que lida com discursos, costumes, idéias, mentalidades, oralidades, anonimato e silêncio.
Eles, os arqueólogos, em busca dos vestígios
Braudel e Elias têm muitas coisas em comum na maneira como eles tratam a relação presente e passado. Ambos concebem o presente como um desenvolvimento do passado e os estudos nos quais eles se engajaram possuem a tendência de unificar ou sintetizar as Ciências Sociais. Neste sentido, eles formam parte de uma consciência histórica dos meados do século XX que repudiou o legado das narrativas históricas do século XIX, estas unificadas pela referência aos eventos macro da história.
Há, no entanto, entre eles importantes diferenças. Enquanto Braudel, particularmente nos seus escritos de cunho mais metodológico, se preocupou em providenciar uma justificativa ao presentismo da História, Elias, paradoxalmente, rejeita o presentismo na Sociologia.
Os escritos de Norbert Elias começam a partir do problema do envolvimento da Sociologia com o presente, o lastro histórico tomado por suporte através da apreciação dos processos históricos. Diz Elias ter havido um retrocesso dos estudos do presente na Sociologia desde a Segunda Guerra Mundial. Para o autor este retrocesso é oriundo de um problema duplo: primeiro a politização da teoria social e, segundo, o isolamento dos estudos empíricos neste período. Ele argumenta que a divisão da teoria entre o funcionalismo parsoniano e o neo-marxismo representa uma versão atenuada da luta de classes no âmbito de uma disciplina acadêmica. Insiste o autor em tela que esta situação é em muito análoga ao processo percorrido pelas ciências naturais para se livrarem da metafísica ligada especialmente à religião, crenças e formas ideais.
Elias valeu-se de manuais de boas maneiras(3) para estudar os processos sociais envolvidos na criação e difusão de novos comportamentos e novas formas de expressão dos sentimentos. Para Heloísa Pontes (1999: 17 e segs.), Elias, um sociólogo de formação, contribuiu de forma decisiva para considerar a importância da dimensão simbólica e do significado na análise dos fenômenos sociais e culturais.
[fim da página 68]
Os estudos históricos sob a ótica sociológica têm um grande suporte nos termos weberianos de racionalização. Compartilham com este conceito, sob diferentes formas é claro, Nietzsche, Heidegger e a Escola de Frankfurt, todos preocupados com a crescente racionalidade nas sociedades modernas. Também Foucault compartilha com a idéia de racionalização quando propõe que as formas de racionalidade dependem e operam através de instituições históricas e sociais e de práticas, técnicas e estratégias e modelos racionalizantes que as atravessam. A racionalização é uma característica específica da construção das práticas sociais e inscrita em termos da relação de poderes e saberes, e não como simplesmente uma capacidade geral da natureza humana para atingir seus objetivos.
A discussão de racionalização aparece em Weber nas suas análises sobre religião e secularização, como também na sua tipologia da ação social. Para o autor, a racionalização, característica da Modernidade, consiste na dominação de um tipo particular de ação social voltada a fins ou voltada a valores num contexto de institucionalização de cunho burocrático-administrativo e baseada num tipo legal de dominação racional.
A racionalização weberiana pode ser percebida através do sujeito e sua conduta, principalmente na sua tipologia das formas da ação social em Economia e Sociedade, e mais ambiguamente n’A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Neste aspecto, a posição do autor assume a concepção de um sujeito humano como ser livre e racional, centro de consciência e vontade. Com efeito, para Weber a Sociologia significa interpretar e compreender a ação social. Isto significa que sua definição do objeto da Sociologia conduz à existência de um ser que busca conferir sentido ao mundo, capaz de representar este mundo a partir de uma livre orientação com relação aos seus propósitos.
Na sua criação de uma ciência positiva fundada na capacidade do sujeito humano para a racionalidade, a posição de Weber se encontra no sentido oposto do espectro da história da racionalidade proposta pela arqueologia de Foucault. Apesar deste ponto de discordância, Foucault compartilha com Weber de uma perspectiva teórica da racionalização do conhecimento. No caso de Weber, entretanto, esta perspectiva toma a forma de um subjetivismo quase radical. Este subjetivismo é baseado na capacidade que tem o sujeito de representar o mundo racionalmente mesmo diante da grande irracionalidade do mundo. Para Weber, o mundo cultural é um mundo de fatos já dados. Assim, a Sociologia Compreensiva consiste em estabelecer conexões entre estes fatos, papel fundamental do investigador.
Para Foucault e sua arqueologia, as posições do sujeito do conhecimento são comandadas por condições particulares de cunho discursivo ou institucional, o que nos leva a considerar que não há um campo definitivo de saberes. A perspectiva analítica de Foucault é, desta maneira, desvinculada de qualquer capacidade inata ao sujeito. Para Foucault não há a natureza humana. O que há, de fato, é uma trama de formas discursivas na qual se encontram imersos os sujeitos, suas práticas e as formas de autoridade que elas pressupõem.
Foucault e Weber se acham no domínio comum do pensamento do século 20 que interroga o papel da racionalidade nas sociedades modernas. Ainda que eles partam de horizontes diferentes a busca pelas instituições de controle social [fim da página 69] é uma temática recorrente em ambos. De um lado Weber busca o sujeito humano, sua experiência no mundo, seu potencial para certa racionalidade e seus dilemas num mundo que se apresenta caótico. De outro, Foucault persegue as múltiplas formas de racionalidade inscritas em sistemas de práticas as mais variadas através das quais as várias identidades dos sujeitos são construídas e desconstruídas. Em Weber, a razão é inerente à conduta humana. Em Foucault, a razão é uma forma discursiva exterior aos sujeitos, mas que os conduzem através de instituições e formas de controle social.
Um final ainda por se fazer
O percurso da Sociologia Histórica estabelece uma análise da trajetória das formas históricas do saber sem preocupar-se com sua origem ou fim. Este modelo teórico pretende deixar em aberto a dispersão da transformação histórica, a rápida mutação dos eventos, a multiplicidades de temporalidades, as diferentes formas de espaço e tempo, bem como a possibilidade da revisão de fatos tidos como verdades históricas. Isto começa com a crítica de Foucault, via Nietzsche, chamada história efetiva ou história do presente, uma síntese do percurso histórico das formas de saber e sua organização social.
Em se tratando de uma ciência da Modernidade, a Sociologia tem como cerne de suas teorias as grandes transformações ocorridas no século XIX, as quais combinam campos de investigação tão vastos quanto a tecnologia industrial, o capitalismo e a produção generalizada de bens de consumo, os modelos de administração do Estado Moderno, a dicotomia público/ privado, entre tantos outros. A investigação destes campos dá vazão a conceitos dos mais variados que acomodam modelos explicativos, a exemplo de modernização, industrialização, racionalização, urbanização, secularização, globalização etc.
A “história do presente” de Foucault não deixa de ser um instrumento analítico baseado na genealogia nietzscheana (Rorty, 1986: 55), a qual intenta não interpretar documentos, mas, ao contrário, organizar, dividir, ordenar, estabelecer critérios e séries e definir relações entre algum documento e a sociedade na qual este se acha circunscrito.
Sem o sentido da hermenêutica, tampouco o positivismo do “fato como coisa”, Foucault persegue a formação e o curso dos discursos, considerando-os como campos, como sistemas de dispersão de relações que tecem a rede discursiva, mais usualmente conhecida como sociedade.
A tese básica da Sociologia Histórica pode ser caracterizada pelo uso de fontes históricas que reflitam contingências, singularidades, interconexões e potencialidades dos elementos que se arranjam para compor a teia social. Os estudos lastreados por esta tese representam uma negação a dois regimes de verdade: de um lado, a Teoria Social Clássica que sacrifica a inteligibilidade da História em favor de modelos tipologias e métodos de mensuração do real; por outro lado, a História Clássica que abandona as análises do momento histórico, apenas nos apresentando os fatos pelos fatos simplesmente.
Não é por Foucault que se dá o nascimento da Sociologia Histórica. Um dos seus máximos autores é, sem dúvida, o sociólogo alemão Norbert Elias. Elias sugere que a compreensão dos problemas atuais só pode ser levada a [fim da página 70] cabo dentro de um projeto de uma história total da humanidade. Norbert Elias, sociólogo alemão, ao elaborar a noção de civilização examina a Modernidade na sociedade ocidental perseguindo as alterações nas imagens que os indivíduos fazem de si mesmos em função da introdução de novos costumes. Ao abandonar as análises mais abrangentes, Elias lança mão da interdisciplinaridade quando analisa cadeias de interdependências cada vez mais complexas para aproximar-se da noção de civilização. Abre, pois, este autor, a discussão sobre os paradigmas metodológicos do discurso sociológico refutando o cientificismo em nome da transdisciplinaridade.
Nesta esteira, Max Weber aponta, com seu conceito de racionalização, para uma confluência com as críticas da Modernidade presentes na obra de Foucault. Para Foucault, as formas de racionalidade dependem de instituições históricas e através delas operam, no percurso dos discursos tecnológico, estratégico, geopolítico, religioso, entre outras formas. A racionalidade é característica específica dos arranjos sociais descrita no interior de relações de saber e de poder, e não simplesmente como uma capacidade, necessidade ou propósitos humanos.
Estudar a produção e divulgação de discursos - esteio metodológico da Sociologia Histórica - é investigar como se dá a construção de um conjunto de elementos formados de maneira regular, em outras palavras, a formação de saberes. Os discursos são, neste sentido, um campo de enunciados onde o sujeito ocupando determinadas posições pode compreender e conceituar o mundo.
Ao percorrer tal senda, objetiva-se descaracterizar o conceito de Ciência como um saber separado de outros de forma hierarquizada e evolutiva, e mais, um saber que, como outros, também toma a imaginação como ponto de partida - e algumas vezes de chegada - para a elaboração de suas teses gerais. Só assim se é possível falar de Modernidade sem negar a Tradição, de razão sem esquecer a imaginação, de verdade sem citar o falseamento, de discurso sem obscurecer o silêncio.
Referências Bibliográficas
_________________. (1990). As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. 5ª ed. São Paulo: Martins Fontes.
___________. (1980). A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Pioneira.
[fim da página 71]
Oriunda dos estudos de Michel Foucault, Norbert Elias, Paul Veyne e a Nova História Francesa, a Sociologia Histórica compreende um domínio transdisciplinar que busca as interconexões entre os elementos que compõem os arranjos sociais do presente. Seu enfoque considera o sujeito como entidades errantes a partir de metodologias voltadas para temas como discursos, mentalidades, anonimato e silêncio.
Derived from Michel Foucault's, Norbert Elias', Paul Veyne's and the New French History studies, the Historical Sociology reaches a transdiciplinar realm which pursuit the interconnections between the elements that form the present social arrangements. Its focus gets the subject as diffused entities through methodologies addressed to topics as discourses, mentalities, secrets and silence.
Notas
1) Professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal da Paraíba (Campus I – João Pessoa).
2) Vide Dean (1998: introdução), Abrams (1983: 55), Dreyfus & Rabinow (1997: cap 2). Todos estes autores tratam da Sociologia Histórica como fundamento de uma Ciência Social interdisciplinar no seu nascedouro.
3) Considerados como "fontes menores" pelos sociólogos de carteirinha. Vale salientar que, na esteira de Mauss, o antropólogo que nunca foi ao campo, Elias foi duramente criticado pela sua ligação com a História e sua ousada metodologia. Não se sabia, à época, se os escritos de Elias eram históricos ou sociológicos, quando, na verdade, eram brotos da Sociologia Histórica.
SUJEITOS ERRANTES:
A EMERGÊNCIA DA SOCIOLOGIA HISTÓRICA
Palavras-chave: sociologia histórica; sujeito; metodologia.
DIFFUSED SUBJECTS:
THE EMERGENCE OF THE HISTORICAL SOCIOLOGY
Keywords: historical sociology; subject; methodology.