Copyright© 1985-2001 PPGS-UFPb. Todos os Direitos Reservados. Nenhuma cópia deste artigo pode ser distribuída eletronicamente, em todo ou em parte, sem a permissão estrita da revista Política & Trabalho. Este modo revolucionário de publicação depende da confiança mútua entre o usuário e o editor. O conteúdo dos artigos publicados é de inteira responsabilidade de seus autores.


Política & Trabalho 16 - Setembro / 2000 - pp. 137-149


A CATEGORIA "GÊNERO":
CONSIDERAÇÕES ACERCA DE SUAS VARIAÇÕES E VALIDADE

Mariana Moreira Neto (1)



I

Porque se chamava moço
Também se chamava estrada
Viagem de ventania
Nem lembra se olhou pra trás
Ao primeiro passo, aço, aço...
Por que se chamava homem
Também se chamava sonhos
E sonhos não envelhecem
Em meio a tantos gases
Lacrimogêneos
Ficam calmos, calmos.


Milton Nascimento, Lô Borges e Márcio Borges


É aqui, perto do vau da Sarapalha: tem uma fazenda, denegrida e desmantelada; uma cerca de pedra seca, do tempo dos escravos; um rego murcho, um moinho parado; um cedro alto, na frente da casa; e, lá dentro, uma negra já velha, que capina e cozinha o feijão. Tudo é mato, crescendo sem regra; mas, em volta da enorme morada, pés de milho levantam espigas, no chiqueiro, no curral e no eirado, como se a roça se tivesse encolhido, para ficar mais ao alcance da mão.

Guimarães Rosa



II

Os fragmentos acima epigrafados revelam os escritos literários como discursos produtores de realidade e, portanto, historicamente situados em contextos constituídos e produtores de relações sociais. Relações que, na perspectiva de Laurentis (1994), são “gendradas”, ou seja, marcadas por especificidades de gênero.

Que relações são, portanto, “gendradas” na música Clube da Esquina II, de Milton Nascimento, Márcio Borges e Lô Borges, e no conto Sarapalha, de Guimarães Rosa? Como as relações de gênero são visíveis em manifestações artísticas, usualmente consideradas “neutras”, ou expressão livre e ideologicamente isenta da criatividade humana, portanto, acessível e digerível por todos? Antes de definirmos o gênero como uma proposta metodológica de compreensão e explicação das relações sociais, vejamos como, nos dois trechos artísticos, os discursos são produtores de realidade, ao delimitar espaços, instituir fronteiras, demarcar corpos, atribuir qualidades. Ou seja, produzir discursos que operam no campo das substantivações e adjetivações de sujeitos histórica [fim da página 137] e socialmente contextualizados.

Na música Clube da Esquina II a associação das palavras estrada, ventania, passo e aço vem adjetivar o substantivo moço. São termos que emprestam positividade, revestem de força, maquiam de cores fortes toda a masculinidade investida no termo moço, traduzido como sinônimo de estrada, que está aberta ao público, a aventura, a viagem, que tem a mobilidade e plasticidade da ventania, que corre o mundo livre, sem peias ou amarras. Porque se chamava moço não tinha nenhum vestígio de medo, nenhuma lembrança de passado, de olhar para trás, de demonstrar receio, fraqueza ou qualquer outra qualidade que evoque a semelhança do “caráter feminino”. Ao contrário, o primeiro passo ressoa a rigidez do aço, do macho.

A música dá continuidade ao exercício de associações sinonimizando homem e sonhos. Porque se chamava homem lhe era permitido ser sonhos, mas estes não envelhecem. A perenidade esvaziando qualquer possibilidade de transitoriedade, de efêmero, de frágil e volátil. A fugacidade dos sonhos entrecortados pelos gases lacrimogêneos não causam fissuras em sua rudeza de aço. A serenidade é o atributo derradeiro para superar as agruras do cotidiano. Ele permanece calmo.

O trecho do conto Sarapalha apresenta a descrição da fazenda, com sua geografia, seu mobiliário, sua flora, sua produção. Embutida no universo das “coisas”, lá dentro da casa, uma negra, já velha, que capina e cozinha o feijão. O conto de Guimarães Rosa é habitado por dois personagens masculinos, os primos Argemiro e Ribeiro, cujas existências são marcadas pelo amor à mesma mulher, pela traição, pelo abandono, pela sezão. Com seus corpos jogados ao sol para espantar o frio da doença eles entrecortam diálogos solteiros sobre o tempo, o abandono da roça, os sintomas da maleita com reminiscências da prima Luísa - móvel da disputa entre os dois e que partiu com um moço bonito, com viola enfeitada de fita.

As referências femininas presentes no conto são todas feitas pela voz masculina. E todas trazem as impressões e adjetivações pejorativas que, culturalmente, são atributos femininos. A prima Luísa é pérfida, traidora, tentadora. Ela, casada com um dos primos, desperta no outro os sentimentos mais vis e abjetos. No final, abandona os dois e se lança nos braços do moço bonito, símbolo do capeta. A preta mistura-se às coisas da casa e da fazenda. É um utensílio sem voz, sem autonomia, sem vontade. Silenciosa, ela confunde-se com o anonimato. Até a sezão ganha a personificação de mulher no discurso especializado do médico. Ou seja, a doença que mata é feminina, como reforça a fala do primo Ribeiro:

“- A moça que estou vendo agora é uma só, Primo...Olha!...É bonita, muito bonita. É a sezão. Mas não quero... Bem que o doutor, quando pegou a febre e estava variando, disse... você lembra? ... disse que a maleita era uma mulher de muita lindeza, que morava de noite nesses brejos, e na hora da gente tremer era que vinha... e ninguém não via que era ela quem estava mesmo beijando a gente...”.

As relações de gênero presentes nos discursos acima colocados possibilitam compreender que as relações sociais não se estabelecem em campos [fim da página 138] dicotômicos ou opostos, situando o masculino e o feminino em territórios específicos e irreconciliáveis. A perspectiva relacional que o gênero oferece permite análises sobre estas relações que vão além de postulados metodológicos como o determinismo biológico, a noção marxista de classe ou o conceito antropológico de patriarcado. Como veremos a seguir, o gênero enquanto “categoria útil de análise histórica”, como o define Scott (1990), abre novas possibilidades metodológicas para se compreender como as relações sociais forjam relações “gendradas”.

III

O termo gênero e sua conversão em categoria de análise pelas Ciências Sociais ganha terreno a partir de meados dos anos 80, em função, por um lado, da crise que afeta os paradigmas tradicionais, como a tradição marxista, e, por outro, da emergência de novas abordagens teórico-metodológicas. A História Social, o estudo das mentalidades e do cotidiano; a Psicanálise, sobretudo os postulados elaborados pelos pós-estruturalistas; e a Lingüística, oferecem novos elementos de investigação científica e apontam novas trilhas e uma nova possibilidade de evidência que, interrelacionados, abrem novas dimensões para a construção ou (re)construção do conhecimento.

Scott (1990: 13) ressalta que o termo gênero é uma tentativa das feministas contemporâneas de buscar caminhos de definição que difiram das teorias existentes de explicação das origens da desigualdade entre homens e mulheres.

“É ao meu ver, significativo que o uso da palavra gênero tenha emergido num momento de grande efervescência epistemológica entre os pesquisadores das ciências sociais, efervescência que, em certos casos, toma a forma de uma evolução dos modelos literários (de ênfase posta sobre a causa para a ênfase posta sobre o sentido, confundindo os gêneros da investigação, segundo a formulação do antropólogo Clifford Geertz). Em outros casos, esta evolução toma a forma de debates teóricos entre aqueles que afirmam a transparência dos fatos e aqueles que insistem sobre a idéia de que toda realidade é interpretada ou construída, entre os que defendem e os que põem em questão a idéia de que o homem é o mestre racional de seu próprio destino”.

A emergência do gênero enquanto categoria de análise é recente e surge como uma tentativa de estabelecer compreensões teóricas acerca dos questionamentos que emergem na esteira das práticas políticas que marcam o percurso de alguns movimentos sociais, sobretudo, o feminista. Estes movimentos trazem à cena um amplo espectro de interrogações e debates sobre posturas e comportamentos que, tradicionalmente, vinha sendo adotados como explicações “naturais” para atitudes discricionárias, procedimentos discriminadores e políticas e práticas de dominação e submissão.

A compreensão atual do gênero enquanto categoria de análise histórica carece de um exercício retrospectivo que traga visibilidade ao seu entendimento conceitual. Essa retrospectiva tem uma primeira parada nos anos 60, quando a [fim da página 139] efervescência da chamada “revolução cultural” traz à cena a questão da submissão e da opressão feminina, enfocada pela luta do movimento feminista, que ressurge ampliando bandeiras além das reivindicações sufragistas e iniciando a discussão acerca de questões como sexualidade, corpo, autonomia feminina, aborto, etc.

Estes primeiros momentos são marcados pela estreita relação entre a militância política no movimento feminista e a reflexão e teorização das questões básicas. Dessa forma, ação e reflexão se misturam nos mesmos indivíduos, - as ativistas feministas -, que “reivindicavam uma história que estabelecesse heroinas, prova da atuação das mulheres, e também explicações sobre a opressão e inspiração para a ação” (Scott, 1992: 64). Nos anos 70 verifica-se a tentativa de separação teoria e política, militância, esquematização e explicação científica da opressão feminina. Este divórcio acontece, por um lado, a partir das reivindicações do movimento feminista de que a “história oficial e universal” é parcial, portanto, ideológica, e, por outro lado, com a crescente participação das feministas nas academias e Universidades e, ao mesmo tempo, o tratamento marginal que recebem.

O rompimento definitivo entre política e teoria dar-se nos anos 80, com a emergência do termo “gênero”, que, como define Scott é empregado para designar as relações sociais entre os sexos significando, assim,

“uma maneira de indicar ‘construções sociais’ - a criação inteiramente social de idéias sobre os papéis adequados aos homens e às mulheres. É uma maneira de se referir às origens exclusivamente sociais das identidades subjetivas dos homens e das mulheres. O gênero é, segundo esta definição, uma categoria social imposta sobre o corpo sexuado.” (Scott, 1990: 07)

A introdução e, de certa forma, uma relativa aceitação de gênero enquanto conceito, categoria de análise amplia as possibilidades de abordagens históricas, sobretudo porque minimiza, relativiza ou recusa tradicionais postulados teóricos de explicação da submissão feminina, como a teoria do patriarcado, por exemplo. Como destaca Scott (1990: 15), o gênero “é construído através do parentesco, mas não exclusivamente; ele é construído igualmente na economia e na organização política, que, pelo menos em nossa sociedade, operam atualmente de maneira amplamente independente do parentesco”.

IV

O alargar dessa visão introduz no debate a complexidade das relações sociais entre os sexos mostrando que a “dicotomia” masculino e feminino, dominador (macho) versus dominada (fêmea) não tem sustentação quando se abre a perspectiva da análise relacional que assumem decisiva relevância no processo de construção de gênero. Essa compreensão de gênero como uma construção alicerçada em bases sociais, culturais, econômicas, psicológicas, traz para a discussão dois aspectos importantes: um deles, a íntima vinculação de gênero com as relações de poder, e o outro, a definição de gênero enquanto representação. Tanto um quanto outro aspecto, entretanto, não podem ser [fim da página 140] admitidos ou mensurados como elementos separados, estanques, divorciados, mas, constitutivos de realidades e eventos historicamente situados.

No que concerne a relação gênero e poder, teóricas feministas, como Scott e Laurentis, buscam inspiração no filósofo francês Michel Foucault, que entende as relações de poder como constelações dispersas de relações desiguais constituídas pelos discursos nos campos de forças sociais. Assim é que, de acordo com a concepção foucaultiana de poder, no interior desses processos e estruturas, abrem-se as perspectivas para a constituição de um agente humano como resultante da tentativa de construção de uma identidade, uma vida, um conjunto de relações, uma sociedade permeada por limites e dotada de uma linguagem que, por sua vez, além de ser conceitual, estabelece fronteiras e apresenta a alternativa da negação, da resistência, de reelaboração, das estratégias de reinvenção metafóricas e imaginativas.

Considerando a “tecnologia de poder” de Foucault algumas teóricas feministas reconhecem que o poder produz significados, valores, conhecimentos e práticas, tem aspectos explicitamente positivos e/ou negativos que explicariam por que, em determinados momentos, as pessoas adotam e professam determinadas verdades e não outras. Nessa concepção, o poder modifica “os investimentos” feitos pelas pessoas ao adotar determinadas posições discursivas em detrimento de outras, com esta ação significando, na expressão de Laurentis (1994: 225), “algo entre um comprometimento emocional e um interesse investido no poder relativo (satisfação, recompensa, vantagem) que tal posição promete (mas não necessariamente garante)”.

Essa abordagem, adianta Laurentis (1994: 225), é uma interessante tentativa de reconceitualizar o poder, ao apresentar o “investimento” feito pela pessoa como um dos elementos que, nas relações de poder, determinam as ações, posturas, comportamentos, linguagens, representações que se fazem do ser homem e do ser mulher. Dessa forma, esta autora sugere que seria o agenciamento contextualmente situado que passaria a ser percebido pelo sujeito, especialmente por aqueles que foram vitimados pela opressão social ou desautorizados pelo binômio discursivo poder/conhecimento.

“Tal colocação pode explicar, por exemplo, não só por que as mulheres (pessoas de um gênero), têm historicamente feito investimentos diferentes e, conseqüentemente, tomado posições diferentes quanto ao gênero e a práticas e identidades sexuais (celibato, monogamia, frigidez, papéis sexuais, lesbianismo, heterossexualidade, feminismo, antifeminismo, etc.); mas pode explicar também o fato de que “outras importantes dimensões da diferença social, como classe, raça e idade, cruzam o gênero para favorecer ou desfavorecer certas posições.” (Laurentis, 1994: 225)

Essa compreensão de poder e a relação gênero/poder possibilita quebrar a fixidez que diversas teorias clássicas, como o positivismo e o marxismo, esboçam acerca da questão. Uma fixidez que define a condição pessoal de ser mulher ou de ser homem como natural, restrito ao campo da biologia ou, no mínimo, uma questão de menor importância diluída no embate maior das classes sociais antagônicas, com a diferença e a opressão da mulher sendo superadas [fim da página 141] no compasso da construção de uma sociedade socialista.

V

O outro aspecto refere-se ao gênero enquanto representação e vem sendo elaborado, sobretudo, por Teresa de Laurentis, a partir de categoria de análise emprestada de outras áreas do conhecimento, como a Psicanálise (principalmente a idéia de identidade elaborada pelos pós-estruturalistas franceses), a Antropologia, e a Lingüística. Laurentis estabelece quatro proposições que clarificam seu entendimento:

  1. gênero enquanto representação;

  2. que a representação do gênero é a sua própria construção;

  3. que essa construção dar-se hoje no mesmo ritmo dos tempos passados;

  4. que a construção de gênero dar-se também por meio de sua desconstrução.

Para Laurentis (1994: 221), o termo gênero é uma representação não apenas no sentido de que cada palavra, cada signo representa seu referente, seja um animal, uma coisa, mas também por representar uma relação de pertencer a uma classe (não no sentido marxista), um grupo, uma categoria. Gênero constrói uma relação de pertencimento, uma relação social, não podendo ser entendido como sexo, como a condição natural das pessoas, “e sim a representação de cada indivíduo em termos de uma relação social preexistente ao próprio indivíduo e predicada sobre a oposição 'conceitual' e rígida (estrutural) dos dois sexos biológicos”.

Seguindo sua argumentação Laurentis adianta que,

“se as representações de gênero são posições sociais que trazem consigo significados diferenciais, então o fato de alguém ser representado ou se representar como masculino ou feminino subentende a totalidade daqueles atributos sociais. Assim, a proposição de que a representação de gênero é a sua construção, sendo cada termo a um tempo o produto e o processo do outro, pode ser reexpressa com mais exatidão: ‘A construção do gênero é tanto o produto quanto o processo de sua representação’.” (1994: 212)

A construção de gênero nos dias atuais, na mesma medida de tempos passados, segundo Laurentis, se dá não apenas nos meios de comunicação, nos tribunais, na família, no sistema escolar público e privado; ela se faz, embora de maneira sub-reptícia, “na academia, na comunidade intelectual, nas práticas artísticas de vanguarda, nas teorias radicais, e até mesmo, de forma bastante marcada, no feminismo”, não só produzindo, promovendo e implantando, através dos discursos institucionais e das várias tecnologias do gênero, mas inscritos em práticas micro-políticas, construindo espaços de resistências, na subjetividade e na autorepresentação.

Por mais contraditória e paradoxal que se apresente, a construção do gênero, no argumento de Laurentis, se faz por meio de sua desconstrução, ou [fim da página 142] seja, através de qualquer discurso, seja ele feminista ou não, mas que entenda o gênero apenas como “uma representação ideológica falsa”. Assim posto, o gênero não é somente a conseqüência, o resultado da representação, mas também o seu excesso, aquilo que fica fora ou nas entrelinhas do discurso, como um curso de água que, se não contido, pode romper ou desestruturar qualquer dique de representação.

Seja como representação das relações sociais, políticas, econômicas e culturais que definem, historicamente, o ser homem e o ser mulher, seja como elemento necessário e primeiro da constituição e significação das relações de poder, o gênero somente pode adquirir a postulação de uma “categoria útil de análise histórica” quando investido do movimento de tensão, de contradição, de multiplicidade e heteronomia presente no seio das relações humanas.

O gênero, como define Scott, deve ser utilizado e apreendido como um suplemento que desafia e desestabiliza as premissas teóricas postas sem, entretanto, oferecer ou se propor ser a síntese, ou uma resolução fácil da complexidade que permeia e perpassa as relações sociais entre os sexos. “É algo adicionado, extra, supérfluo, acima e além do que já está inteiramente presente; e também uma substituição para o que está ausente, incompleto, carente, por isso requerendo complementação ou integralidade”, acrescenta Scott (1992: 76).

Para Laurentis, este suplemento é definido como o “outro lugar” ou, na linguagem cinematográfica, o “space-off”, o que está por trás e além das câmaras mas que complementa as imagens exibidas, ou seja, os espaços nas fronteiras dos discursos hegemônicos. Espaços sociais encravados nos intervalos das instituições e nas fendas e brechas dos elementos do binômio do “discurso universal” poder-conhecimento. São nestes espaços, enfatiza a autora, que se procede a construção diferente de gênero, que se afirma em termos da subjetividade e da autorepresentação, e se manifesta

“nas práticas micro-políticas da vida diária e das resistências cotidianas que proporcionam agenciamento e fontes de poder ou investimento de poder; e nas produções culturais das mulheres, feministas, que inscrevem o movimento dentro e fora da ideologia , cruzando e recruzando as fronteiras - e os limites - da(s) diferença(s) sexual(ais).” (Laurentis, 1994: 237)

A ênfase que Laurentis coloca e dispensa ao movimento entre gênero enquanto representação e o que essa representação exclui, ou melhor, torna irrepresentável, é oportuna para a compreensão de que os discursos hegemônicos, institucionais e aqueles que se constituem nas margens, de revés, constituem dois tipos de saberes cuja relação não é dialética, integrada; mas se traduz na tensão da “contradição”, da “multiplicidade”, da “heteronomia”.

Neste sentido, Laurentis (1994: 238) ressalta que,

“habitar os dois espaços, ao mesmo tempo, significa viver uma contradição que, como sugeri, é a condição do feminismo aqui e agora: a tensão de uma dupla força em direções contrárias - a negatividade crítica de sua teoria e a positividade afirmativa de sua política - é tanto a condição histórica de existência do feminismo quanto sua condição teórica de possibilidade. O sujeito do feminismo é 'en- [fim da página 143] gendrado' lá. Isto é, em outro lugar”.

Explicitando melhor a sua compreensão de gênero Laurentis (1994: 230-231) advoga que

“a compreensão da condição pessoal de ser mulher em termos sociais e políticos e a constante revisão, reavaliação e reconceitualização dessa condição vis-à-vis à compreensão que outras mulheres tem de suas posições sociossexuais geram um modo de apreender a realidade social como um todo que é derivado da conscientização de gênero. E a partir desse entendimento, desse conhecimento pessoal, íntimo, analítico e político da universalidade do gênero, não há como retornar à inocência da biologia”.

Entretanto, o uso do gênero como categoria de análise das relações sociais entre os sexos não tem recebido uma aceitação unânime ou consensual. Alguns críticos advertem para o fato de que os estudos de gênero são apontados como sinônimos de estudos de mulher, perdendo sua potencialidade relacional que abrangeria as relações sociais instituidoras do masculino e do feminino. Outros ressaltam que o gênero vem sendo empregado, por outro lado, como estudos de masculinidade, com o perigo de tornar-se um campo especializado e específico de análise e interpretação, com o privilégio de elevar a masculinidade como ponto exclusivo de estudo, negligenciando o caráter relacional que os estudos de gênero devem preservar. Por fim, outros teóricos defendem que o conceito de gênero não dá conta da compreensão da dominação masculina, apreendida como “dominação simbólica”, ou seja, instituída nas relações sociais entre os sexos, naturalizando nos dominados a aceitação da dominação.

VI

A confusão estabelecida entre gênero como sinônimo de estudos sobre a mulher se situa no momento em que ocorre a separação entre política e teoria, ou seja, entre o feminismo enquanto prática política concreta e o gênero como a tentativa de sistematizar e teorizar esta prática. Feministas militantes, mas ausentes das academias e universidades, apontam o gênero como uma forma ideologicamente neutra de tratar os estudos sobre a mulher, retirando destes a pujança e a capacidade de transformação emprestados pela ação política, defendendo um retorno aos estudos sobre a mulher como forma de restabelecer a necessária relação entre a prática política e o pensar desta prática.

O retorno à categoria “mulher” como referencial de análise das relações sociais entre os sexos se justifica através da aceitação desta “mulher” como uma entidade histórica e social multifacetada, construída na prática e nos discursos que a legitimam e consubstanciam. Segundo Costa (1998: 138),

“Quando peço um retorno à noção de mulher como categoria política (em vez do conceito de gênero transformado em masculinidade) quero simplesmente relembrar o fato de que a 'mulher' é uma categoria heterogênea, construída historicamente por discursos e práticas variadas, sobre os quais repousa o movimento [fim da página 144] feminista. Dependendo do contento conjuntural e das exigências políticas, esta categoria é usada para articular as mulheres politicamente. Contudo, ela possui diferentes temporalidades e densidades, existindo em relação a outras categorias igualmente instáveis. (...) a história e o significado de uma categoria deve ser entendida à luz das histórias e significados de outras categorias da identidade (classe, raça, etnia, sexualidade, nacionalidade, etc.)”.

A autora argumenta que este retorno à noção de “mulher” como categoria de análise vem apoiada pela teoria pós-estruturalista, sobretudo na versão delineada por Teresa de Laurentis, Chantal Mouffe, Linda Alcoff. Estas teóricas se posicionam avessas ao essencialismo, ao binarismo e as lógicas identitárias, defendendo uma desconstrução da categoria “mulher” tendo por base o desmonte de sua natureza essencialista. A partir desta desconstrução seriam elaboradas novos mapas de práticas articuladas que estabeleceriam materialidades produtores de identidades e posições para seus sujeitos no campo social.

Finalizando, Costa (1998: 139) argumenta que a mulher, nesta perspectiva, é encarada mais como projeto político do que descrição de uma realidade, constituindo-se em uma

“identidade politicamente assumida, a qual está invariavelmente ligada aos lugares social, cultural, geográfico, econômico, racial, sexual, libidinal, etc., que ocupamos e a partir do qual lemos e interpretamos o mundo. A categoria mulher torna-se, portanto, uma posição política e o campo movediço e arriscado de ação e reflexão dos estudos feministas em contraposição ao porto seguro dos estudos de gênero (ou de masculinidades) dentro da academia”.

Outro aspecto que vem ganhando tons de polêmica quanto ao uso do gênero como categoria de análise refere-se a sua utilização nos estudos de masculinidade, sobretudo, naqueles considerados men’s studies, marcados por uma visão essencialista e parcial. Isto não implica a existência de um grupo de estudiosos da masculinidade que, a partir da metade da década de 80, começam a desenvolver um aspecto interessante na discussão de gênero: a importância de perceber a diversidade de vozes masculinas presentes nas relações sociais entre os sexos.

O risco dos estudos de gênero voltarem-se para o estudo ou a temática da masculinidade, adverte Piscitelli (1998: 153-154), prende-se ao fato da identificação ou vinculação de masculinidade com masculino, com homem, caindo no pantanoso terreno - que em determinados momentos, trilhou (ou ainda trilha) o caminho do feminismo -, da essencialidade de uma natureza masculina. Neste caso, mais perigosa, por ser encarada como “dominante”. Segundo a autora, sobretudo as revisões antropológicas sobre masculinidade apontam a tendência de “identificar masculinidade com homens: com qualquer coisa que os homens pensem e façam; qualquer coisa que pensem e façam para serem homens ou com qualquer coisa que as mulheres não sejam”.

A saída para esta encruzilhada metodológica, segundo Piscitelli (1998: 155), seria encarar os estudos de gênero como um campo complexo e grávido [fim da página 145] de possibilidades de exploração tanto “das construções de masculinidade quanto as de feminilidade, percebendo como essas construções são utilizadas como operadores metafóricos para o poder e a diferenciação em diversos aspectos do social”.

Seguindo uma linha argumentativa no mesmo campo de Piscitelli, Albuquerque Jr. (2000), reconhece a pouca ênfase que a historiografia de gênero dedica ao masculino e as “experiências-de-ser-homem”, considerando ser esta uma importante área para os estudos das relações sociais entre os sexos, desde que abordados pela perspectiva relacional que a metodologia de gênero possibilita. Ao estudar como os discursos e práticas definiram um “ser para o nordestino” centrado na “masculinidade”, no ser “macho”, “cabra da peste”, Albuquerque Jr. (2000: 08), nos lembra que,

“As práticas cotidianas de gênero, de ser homem não estão determinadas nem pela genitalidade, nem pelos códigos de sexualidade. O gênero nem é natural, sendo uma criação histórica e cultural, nem está preso completamente a uma ordem dominante de prescrições. Mesmo dentro de uma cultura como a nordestina, onde as práticas, imagens e enunciados definem e exigem de forma muito estrita o ser masculino, as maneiras de praticar este gênero são variadas, as trajetórias culturais metaforizam a ordem dominante, impõem a esta microresistências, gestando microdiferenças. Trajetórias culturais de homens que, muitas vezes podem ser exemplos da arte no exercício ao mesmo tempo da ordem e da burla”.

Numa perspectiva que difere das duas concepções expostas acima, temos a vertente teórica que explica as relações sociais entre os sexos como decorrentes da dominação masculina situada no campo da dominação simbólica. O principal defensor desta corrente é o sociólogo francês Pierre Bourdieu para quem a dominação masculina se legitima numa sociedade que se constitui, em todos os momentos históricos, na perspectiva androcêntrica que dispensa qualquer estratégia de justificação.

De acordo com esta compreensão, as relações sexuais são socialmente instituídas e engendram o mundo social e simbólico com os referenciais de masculinidade e feminilidade compondo dimensões do habitus e da dominação simbólica, cujas manifestações perpassam o universo habitado por dominantes e dominados.

Tomando como referencial de análise a sociedade cabila Bourdieu (1999: 18) estende a explicação da dominação masculina a todas as formações sociais, ao destacar que

“A ordem social funciona como uma imensa máquina simbólica que tende a ratificar a dominação masculina sobre a qual se alicerça: é a divisão social do trabalho, distribuição bastante estrita das atividades atribuídas a cada um dos dois sexos, de seu local, seu momento, seus instrumentos; é a estrutura do espaço, opondo o lugar de assembléia ou de mercado, reservados aos homens, e a casa, reservada às mulheres; ou, no interior desta, entre a parte masculina, como o salão, e a parte feminina, como o estábulo, a água e os vegetais; é a estrutura do tempo, a jornada, o ano agrário, ou o ciclo de vida, [fim da página 146] com momentos de ruptura, masculinos, e longos períodos de gestação, femininos.”

Esta dominação simbólica, destaca Bourdieu, opera num campo mágico que incorpora não somente o assentimento ao dominante, mas a naturalização desta dominação, por parte de dominantes e dominados, exercendo sobre os corpos um poder que, em nenhum momento, traz o signo da coação física. O combustível que alimenta e move esta dominação simbólica, revela Bourdieu (1999: 50-51),

“encontra suas condições de possibilidades e sua contrapartida econômica (no sentido mais amplo da palavra) no imenso trabalho prévio que é necessário para operar uma transformação duradoura dos corpos e produzir as disposições permanentes que ela desencadeia e desperta; ação transformadora ainda mais poderosa por se exercer, nos aspectos mais essenciais, de maneira invisível e insidiosa, através da insensível familiarização com um mundo físico simbolicamente estruturado e de experiência precoce e prolongada de interações permeadas pelas estruturas de dominação”.

Bourdieu enfatiza ainda que a dominação masculina centrada na dominação simbólica é o princípio que justifica e legitima as demais formas de dominação/submissão, exercitadas de maneiras singulares e múltiplas e, sendo diferentes em suas formas segundo a posição social, geográfica, espacial, étnica, de gênero, dos agentes envolvidos, se homogeneiza separando e unindo, em cada universo social, homens e mulheres, mantendo entre eles, uma mística linha de demarcação.

A dominação simbólica explicando, em última instância, a dominação masculina presente em todas as sociedades marcadas pela composição androcêntrica, finaliza Bourdieu, somente abre possibilidades de transformação quando os dominados se apercebem de que eles, tais como a dominação que os constituiu, contribuem para sua dominação.

“Por em foco os efeitos que a dominação masculina exerce sobre os habitus masculinos não é, como alguns poderão crer, tentar desculpar os homens. É mostrar que o esforço no sentido de libertar as mulheres da dominação, isto é, das estruturas objetivas e incorporadas que se lhes impõe, não pode se dar sem um esforço paralelo no sentido de liberar os homens dessas mesmas estruturas que fazem com que eles contribuam para impô-la” (Bourdieu: 1999: 136).

Diante dos conflitos e paradoxos teóricos acima relacionados estaria a categoria gênero perdendo consistência enquanto paradigma metodológico de análise e explicação das relações entre os sexos vistas como relações sociais?

A resposta se constitui num desafio que, para alguns teóricos (as), seria amenizado ou amortecido pela tentativa de historicização das relações sociais, impressas em campos pontilhados por práticas e discursos, suplementos, resistências, assentimentos, ordens, tensões, silêncios, tesões.

[fim da página 147]

VII

Scott (1998) concorda com a posição de Bourdieu de que a história das mulheres, enquanto parcela considerada diferente, é parte da história da dominação masculina, porque são os homens que formulam as regras, que organizam a sociedade,. que estabelecem os territórios e fronteiras. Contudo, adverte para a necessidade de se considerar a existência de uma história a ser escrita, que aborde a noção de dominação, de poder desigual. Uma história que, reconhecendo a autenticidade das estruturas sociais como locus de construção das relações homem/mulher e da idéia de mulher, também considere que a subjetividade - não vista como essencialista, ou inerente a natureza feminina, ligada ao corpo, à natureza, à reprodução, à maternidade, mas criada para as mulheres em um contexto específico da história, da cultura, da política - e a criação do sujeito são algo mais complexo que a dominação.

Como reforça Scott (1999: 123-124) é imprescindível se colocar a questão em termos históricos, ou seja,

“nos perguntar como as relações entre os sexos foram construídas em um momento histórico, por que razão, com que conceitos de relação de forças, e em que contexto político. Este é o verdadeiro problema: historicizar a idéia homem/mulher e encontrar uma forma de escrever uma verdadeira história das relações homens/mulheres, das idéias sobre a sexualidade, etc..(...) A diferença dos sexos é um jogo político que é, ao mesmo tempo, jogo cultural e social. Para mim o mais importante é insistir sobre a historicidade das relações homens/mulheres, as idéias e os conceitos da diferença sexual.”

Dessa forma, assumir gênero como uma categoria de análise histórica na perspectiva de um termo que não tem a fixidez dos postulados que atribuem ao masculino e ao feminino qualificações naturais, imutáveis, essencialistas, acena possibilidades outras de estudo e análise da participação das mulheres nos movimentos sociais.

Referências Bibliográficas

  • ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. (2000). Nordeste: uma invenção do falo. Uma história do gênero masculino no Brasil (1920-1970). Campinas: Unicamp (mimeo.).

  • AZERÊDO, Sandra. (1998). "Estudos de gênero: percursos e possibilidades na historiografia contemporânea". Cadernos Pagu (11: 55-66).

  • BESSA, Karla Adriana M. (1998). "Posições de sujeito, atuações de gênero". Revista Estudos Feministas (6-1): 34-45.

  • BOURDIEU, Pierre. (1999). A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

  • CHARTIER, Roger. (1995). "Diferenças entre os sexos e dominação simbólica". Cadernos Pagu (4): 37-47.

  • COSTA, Claudia de Lima. (1998). "O tráfico de gênero". Cadernos Pagu (11): 127-140.

  • GROSSI, Miriam; HEILBORN, Maria Luiza & RIAL, Carmem. (1998). "Entrevista com Joan Wallach Scott". Revista Estudos Feministas (6-1): 114-124.

  • KOFES, Suely. (1993). "Categorias analítica e empírica: gênero e mulher (disjunções, conjunções e mediações)". Cadernos Pagu (1): 19-30.

  • LAURENTIS, Teresa de. (1994). "A tecnologia do gênero". In: HOLLANDA, Heloísa Buarque de (org.). Tendências e impasses: o feminismo como crítica da modernidade. Rio de Janeiro: Rocco, pp. 206-242.

    [fim da página 148]

  • MACHADO, Lia Zanotta. (1998). "Gênero, um novo paradigma?". Cadernos Pagu (11): 107-125.

  • MATOS, Maria Izilda S. de. (1998). "Estudos de gênero: percursos e possibilidades na historiografia contemporânea". Cadernos Pagu (11): 67-75.

  • MORAES, Maria Lygia Quartim de (1998). "Usos e limites da categoria gênero". Cadernos Pagu (11): 99-105.

  • PERROT, Michelle. (1995). "Escrever uma história das mulheres: relato de uma experiência". Cadernos Pagu (4): 09-28.

  • PISCITELLI, Adriana. (1998). "Gênero em perspectiva". Cadernos Pagu (11): 140-155.

  • RAGO, Margareth. (1998). "Descobrindo historicamente o gênero". Cadernos Pagu (11): 89-98.

  • ROSA, João Guimarães. (1984). Sagarana. São Paulo: Nova Fronteira/ Círculo do Livro.

  • SCHVARZMAN, Sheila. (1995). "Entrevista com Michelle Perrot". Cadernos Pagu (4): 29-36.

  • SCOTT, Joan. (1990). "Gênero: uma categoria útil de análise histórica". Educação e Realidade 16 (2): 05-22.
    ____________. (1992). "História das mulheres". In: BURKE, Peter (org.). A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Editora da Unesp, pp. 63-95.

  • SOIHET, Rachel. (1997). "História das mulheres". In: CARDOSO, Ciro Flamarion & VAINFAS, Ronaldo (orgs.). Domínios da História: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, pp. 275-311.
    ______________. (1998). "História das mulheres e história de gênero: um depoimento". Cadernos Pagu (11): 77-87.


Nota

1) Professora do Departamento de Ciências Sociais do Centro de Formação de Professores da Universidade Federal da Paraíba (Campus V - Cajazeiras), Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal da Paraíba (Campus I - João Pessoa).

RESUMO
A CATEGORIA "GÊNERO":
CONSIDERAÇÕES ACERCA DE SUAS VARIAÇÕES E VALIDADE


O artigo apresenta uma discussão acerca das relações de gênero que permitem compreender como as relações sociais não se estabelecem em campos dicotômicos, situando o masculino e o feminino em territórios específicos e irreconciliáveis. A perspectiva relacional que o gênero oferece permite analisar as relações sociais além dos postulados como o determinismo biológico, a noção marxista de classe ou o conceito antropológico de patriarcado.
PALAVRAS-CHAVE: gênero; relações sociais; categorias de análise.

ABSTRACT
"GENDER" CATEGORY:
CONSIDERATIONS ABOUT ITS VARIATIONS AND VALIDITY


This article presents a discussion about gender relations which permits an understanding as the social relations are not set in dichotomic fields, situating the male and the female in specifics places. The relational perspective offered by gender permits an analyses of the social relations, beyond postulates such as the biological determinism, Marxist notion of class or the anthropological concept of patriarchal.
KEYWORDS: gender; social relations; categories of analyses.



Índice Principal  |  Normas Para Publicação
Número 16 - set/2000  |   Universidade Federal da Paraíba  |  Programa de Pós-Graduação em Sociologia - UFPb


Este site foi criado em fevereiro de 1998 e
modificado pela última vez em 01 de setembro de 2001, por Carla Mary S. Oliveira.

This page hosted by


Get Your Own Free Home Page