As sete peças deste livro não requerem elucidação de maior. A sétima ("O Jardim dos caminhos que se bifurcam") é policial; os seus leitores assistirão à execução e a todos os preliminares de um crime, cujo propósito não ignoram, mas que não compreenderão, julgo eu, até ao último parágrafo. As outras são fantásticas, uma - "A lotaria na Babilónia" - não é de modo nenhum inocente de simbolismo. Não sou o primeiro autor da narrativa "A biblioteca de Babel"; os curiosos da sua história e pré-história podem consultar certa página do número 59 de SUR, que regista os nomes heterogéneos de Leucipo e de Lasswitz, de Lewis Carroll e de Aristóteles. Em "As ruínas circulares" tudo é irreal; em "Pierre Menard, autor do Quixote" é-o o destino que o protagonista se impõe a si próprio. A lista dos escritos que lhe atribuo não é muito divertida, mas não é arbitrária; é um diagrama da sua história mental...
        Desvario laborioso e empobrecedor é o de compor vastos livros; o de espraiar por quinhentas páginas uma ideia cuja perfeita exposição oral cabem em poucos minutos. Melhor procedimento é simular que esses livros já existem e oferecer um resumo, um comentário. Assim procedeu Carlyle em Sartor Resartus; e igualmente Butler em The Fair Haven; obras que têm a imperfeição de serem também livros, e não menos tautológicos que os outros. Mais razoável, mais inepto, mais mandrião, eu preferi a escrita de notas sobre livros imaginários. São elas "Tlön, Uqbar, Orbis Tertius" e a "Análise da obra de Herbert Quain".
J. L. B.      
Texto retirado de
Obras Completas de Jorge Luis Borges, volume I (1923-1949)
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Lisboa, Julho de 1998
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