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Interessado como sou pelo Budismo e suas manifestações
escolásticas e culturais há uns quinze anos, as pessoas ao
saberem deste meu interesse vem a mim e tecem comentários à
respeito do Budismo, muitas vezes sem o menor conhecimento de causa. Digo
isto porque muitos destes comentários me fizeram refletir porque
gosto do Budismo e o que me atrai para ele, e com sinceridade pesei e analisei
fatos.
Nascido, como a maior parte dos brasileiros, em berço de religiosidade
cristã, certamente que conheço as propostas cristãs.
Mas elas nunca me satisfizeram nem psicológica, nem metafisicamente.
Até bem uns 18 anos, não participava de nenhum tipo de atividade
religiosa. Achava missas e padres enfadonhos, os "crentes" muito desesperados,
e o medo do Inferno muito brutal e angustiante. Não entendia como
um Deus misericordioso, que dizem ser pai de todos, deixaria seus
filhos queimando eternamente na brasa...
Estas coisas são ditas porque a gente não faz a idéia
- mesmo entre as pessoas "mais esclarecidas" - do quanto o condicionamento
religioso de nosso país finca raízes em nossas mentes subconscientes.
Talvez seja devido ao condicionamento religioso, além das nossas
limitações particulares, que alguns ocidentais encontrem
dificuldades no Budismo. Por exemplo, tem gente que não sabe até
hoje se o budista é ateu, politeísta ou monoteísta.
Outro impedimento comum entre neo-budistas é uma certa aversão
a seus rituais. Pessoas até culta s comentam que, se Buddha
classificou ritos e rituais como impedimentos à libertação,
faríamos bem em eliminá-los. E poderiam também completar:
fazer sumir o Budismo da face da Terra. Pois é justamente os ritos
e rituais que resguardam o Budismo para o futuro. Não é o
rito que é impedimento, mas o apego a eles. Um dos comentários
que mais escuto é: "qual é a diferença do Budismo
para as outras religiões, se também tem templos, ordens monásticas,
monges e monjas, imagens, devoções e rituais?".
Os ritos e rituais budistas são herdeiros diretos da tradição oral antiga. Antigamente na Índia - e talvez fosse assim também no mundo inteiro - as coisas religiosas eram passadas de mestre a discípulo, quase como numa aula particular, de boca a ouvido (daí às vezes falar-se em veículo dos ouvintes - "Shravakayana" - com relação aos primeiros budistas). Não haviam escrituras em papel. Para memorizar qualquer coisa, os discípulos tinham de repetir diversas vezes em voz alta aquilo que aprendiam. Isto funcionava muito bem, pois não havia ainda televisão para distrair-lhes... Até hoje existem monges que sabem de cor muitos discursos do Buddha (sutras) por causa do aprendizado de memorização que tiveram. Uma ferramenta muito importante na memorização, é que as coisas eram cantadas, metrificadas, ritmadas. Os sutras são cantados em "Pujas" (ato devocional ou "oferenda"). Muitos discursos do Buddha em páli são versificados e rimados. E isto não era porque Buddha fosse poeta, mas porque Ele sabia que Sua mensagem entraria muito melhor na cabeça das pessoas se houvesse um certo ritmo, uma certa musicalidade. Quantas e quantas letras de música nós não sabemos de cor, não é verdade? Poderia-se argumentar que hoje existem computadores, papel, videocassetes,
mídia eletrônica, e que poderiam substituir bem escrituras
em papel ou aprendizados longos de memorização. É
louvável que o Budismo esteja sendo transferido hoje para os computadores,
e até CD-ROMs, mas nunca substituirão o valor salutar que
tem um treinamento em memorização. Nós estamos tirando
as informações de nossas cabeças e transferindo-as
para discos e disquetes, mas enquanto elas estão em nossas mentes
estão vivas e dinâmicas, por estarem ligadas às emoções.
Entretanto, voltando à discussão dos rituais no Budismo,
eles tem um papel definitivo na preservação dos Ensinamentos
porque são memórias vivas, e não arquivos de memórias,
ou racionalizações. Se o Budismo algum dia estiver todo catalogado
e arquivado eletronicamente ou só em livros, e não mais houver
ninguém que saiba conduzir um Puja, então estará
extinto, tal qual milhares de filósofos que se encontram hoje somente
nas prateleiras de bibliotecas empoeiradas. O ritual budista não
é vazio. Primeiramente sutras inteiros ou partes deles são
cantados, para você interiorizar a sua mensagem. Depois temos posturas,
gestos, procedimentos, imagens e altares, que tem também todo um
significado de treinamento espiritual. Para aquele que chega da igreja
católica, por exemplo, fugindo justamente de ritos e rituais e imagens
de santos, bate forte encontrar coisas parecidas no Budismo. Mas somente
parecidas. Aparentemente parecidas. Não estou querendo justificar
o Budismo em detrimento das outras, até porque este choque aconteceu
comigo também. Até o dia em que entendi que os sutras são
ali cantados como ferramenta para memorizar, a cada repetição,
a mensagem do Abençoado; que o monge é somente seu exemplo
de modelo espiritual e seu amigo; que as imagens são somente lembretes
de que um homem atingiu a perfeição, e que o caminho também
é aberto e possível para nós.; que velas, incensos,
flores e oferendas são lembretes, respectivamente, da luz da Sabedoria,
da transformação espiritual, da impermanência e da
generosidade. O altar do Buddha, rodeado com estas coisas,
não só compõem um belíssimo ambiente estético,
agradável, como também serve de foco da meditação
sobre estes valores acima mencionados. Ninguém está ali acendendo
vela e incenso para pedir favores ao Buddha. Ninguém
está num Puja negociando com o Buddha
um emprego, etc. Pelo menos não um budista sincero, que siga as
orientações budistas. Esta é a diferença básica
da religiosidade popular budista com relação às outras.
Assim, através do Puja budista aprendi uma outra
coisa, que muitas pessoas também acham difícil de se ter
ou fazer, que é a devoção pura. Não
há nada de errado com a devoção. Acontece que os novos-budistas,
vindos de tradições cristãs, às vezes implicam
com esta qualidade natural do coração que é a devoção
a um Ser Perfeito, e querem tirar de suas práticas pessoais os Pujas
e Refúgios no Buddha, no Dharma e na
Sangha ideal, porque eles conheceram e aprenderam uma devoção
interesseira, que sempre pedia, e pedia sempre mais. Adoro o Buddha
simplesmente por Ele ser o que Ele é - um Iluminado -, e do que
representa de combinação perfeita de Compaixão e Sabedoria.
A mensagem budista é aquela que diz para você procurar
com diligência a sua melhora espiritual, ajudando os outros no processo.
Sem o intuito de agitar ânimos, desejaria comentar a existência de um movimento leigo budista, de cunho japonês, chamado Sokka Gakkai Internacional, muito difundido aqui no Brasil, no qual os adeptos recitam o Sutra de Lótus fervorosamente, tendo em mente alcançar algum benefício (material). Em suas reuniões, que se realizam em casas de adeptos, dão depoimentos do que conseguiram. Não duvido do que conseguem. Só acho que este espírito não é bem budista. Como participei de poucas reuniões deles, não posso afirmar categoricamente, mas a impressão que deixam é esta: parecem os evangélicos do Budismo. Se a Divindade, ou Lei Mística do Universo - como quiserem chamar - é Onisciente e Onipresente como dizem, será que precisa que digamos a Ela o que queremos e o que deverá fazer por nós? |
Este assunto tem mais a ver com quem se preocupa com o movimento budista
e que formas e rumos ele está tomando no Ocidente. Recentemente
a revista Time de 13/10/97 publicou uma matéria grande à
respeito da "onda" sensacionalista em torno do Budismo, que filmes e celebridades
estão promovendo. Entre tendências múltiplas, encontramos
gente muito séria e outras nem tanto. Isto, para mim ao mesmo
tempo que reflete a maneira americana de tratar e sentir o mundo, transformando
tudo em um "show" hollywoodiano reflete também sinais promissores
de transmissão do Dharma para o Ocidente. É
assim mesmo. O início é sempre caótico.
O Budismo levou 300 anos para fincar pé na China, e sua transmissão
para o Brasil, por exemplo, vai levar tempo parecido para fincar suas raízes.
Porém, como ocorreu na China, quando o nível de estudos
dos Sutras já estava muito avançado e cristalizado, começaram
a aparecer personalidades que desejavam traduzir a mensagem intelectualizada
para o nível da compreensão popular. O Budismo "vazou" para
fora dos círculos fechados. Só o fato de existir chineses
interessados em Budismo a nível mais aberto e popular atraiu mais
e mais mestres estrangeiros, notadamente da Índia, e entre eles
o famoso Bodhidharma. Bodhidharma é
dito ser patriarca do Zen, uma das escolas mais estóicas do Budismo,
mas foi ele precisamente quem contribuiu mais para a popularização
do Budismo na China. Acho que o mesmo paralelo acontecerá por aqui.
Vejam bem, Budismo não é mero estudo, nem simples filosofia. Mas sem uma base filosófica bem assimilada, nenhum movimento perdura. E Budismo tem esse aspecto filosófico profundo, que precisa ser estudado, analisado e assimilado pela experiência. Aliás, um sonho particular meu se realizaria quando houvesse em nossas terras uma Universidade Multidisciplinar Budista, onde todas as escolas teriam seus espaços para ensinar suas visões particulares e seus métodos de prática e meditação, em ambiente harmônico, tolerante e multicolorido. Algo como existiu na Índia em Nalanda e em Vikramashila, destruídas pelos invasores muçulmanos. Esse lugar teria condições também de formar monges, instrutores de meditação, inclusive com espaço para retiros de 10 dias, 20 dias, 3 anos 3 meses e 3 dias, retiros de silêncio, etc. Registro aqui meu desejo e sugestão para as escolas budistas existentes no Brasil; que ganhariam mais em união de esforços do que sozinhas, refutando-se umas às outras. O movimento budista começou com o Buddha dando
ênfase ao ensino popular, para o entendimento leigo e para a vida
diária. Filigranas filosóficas Ele só falava para
aqueles que poderiam acompanhá-Lo na mesma viagem, e quando servisse
para ajudar, ao invés de falar por pura especulação.
Na minha visão particular, uma idéia melhor dos Ensinamentos
do Buddha e do Dharma se depreende do conhecimento
do que todas as escolas dizem à respeito Dele e de Seus Ensinamentos.
Até que estejamos prontos para começar a nossa própria
viagem brasileira de Budismo, ainda dependeremos muito das escolas tradicionais
orientais. Não diminuímos aqui a importância de cada
escola tradicional do Budismo, mesmo porque cada uma delas é capaz
de dar a seus adeptos maneiras significativas de viver e de encarar a vida
e o sofrimento. Elas também cumprem seu papel de mantenedoras do
Dharma. E a realidade é que ainda dependeremos por
muito tempo da transmissão do Budismo por escolas tradicionais.
Rigidez e tradicionalismo são barreiras muito fortes. Só
mesmo pessoas muito determinadas e pacientes podem cortar através
destas dificuldades que são criações humanas e não
do Dharma - e compreender a mensagem de Buddha.
Só mesmo muito amor ao Budismo para trabalharmos com a personalidade
intransigente de um monge ou de um diretor brasileiro de Centro de Dharma,
que acaba imitando o oriental. Em geral, é mais fácil debandar
do que permanecer e contribuir para a mudança de uma situação
desagradável.
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Vi na tv outro dia um rapaz jovem, bonito, bem vestido, dando um depoimento
das bênçãos que ele dizia ter recebido após
sua conversão à Igreja Universal. Não duvidei que
ele tenha obtido sucesso, dinheiro, carro, e novo casamento; só
achei que o discurso dele tinha, no mínimo, três pontos falhos:
O primeiro ponto é o materialismo implícito nestas práticas e doutrinas. Sob uma roupagem "espiritual" escondem-se práticas que somente desenvolvem a ferocidade dos desejos e do egoísmo. Exploram o lado desesperador das necessidades básicas das pessoas. Além do mais, os adeptos aprendem a pedir e barganhar com o divino. Materialismo espiritual. Este tipo de religião não esclarece a ninguém, e não constitui realmente nenhuma "religare" ao divino. Os adeptos do materialismo espiritual medem a veracidade de sua religião pelo que se conseguiu materialmente. O segundo ponto é que, se Deus tem a metade da força que as religiões monoteístas e profetas dizem que Ele tem; se Deus tem o todo aquele poder de dotar aquela criatura convertida com um kit de bênçãos tão espetacular, este Deus é omisso e criminoso. Lembro-me de uma entrevista de um judeu, fugido dos horrores da II Guerra, em que ele declarou precisamente isto: a sua indignação por Deus haver abandonado o povo judeu teoricamente o mais crente e temente a seu Deus a ponto de causar-lhes uma diáspora pelo mundo e serem deixados a sofrerem terrivelmente. Isto fez com que este homem rejeitasse sua religião natal por muitos anos. Se Deus é capaz de dotar só uma criatura com tantas bênçãos,
porque não faz o mesmo com os mendigos nas ruas??? O que falar dos
milhões de sofredores e famintos? Porque eles não tem as
mesmas realizações que aquele "crente"? Será que o
mendigo na rua é menos merecedor? Será preciso que se bajule
esse Deus para obtermos coisas? Esse Deus o budista não crê.
O terceiro ponto é que cada grupo religioso tem uma egrégora
ou energia própria, que sempre procura ajudar a seus adeptos. Por
outro lado, temos o Karma de cada um, individual e de grupo,
que são fatores por si só limitantes ou não. Na rede
de inter-relações, que é a vida, o jogo de forças
espirituais é uma dinâmica viva, e Karma está
lá, favorecendo ou não estas forças externas a nós.
Depende. Fato é que encontramos pessoas relatando curas e bênçãos
em todos os caminhos e tendências religiosas, sejam elas indígenas,
de cultos afro-brasileiros, espíritas, esotéricos e orientais.
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A degradação de nosso planeta Terra é um fato,
parece que sem reversão. É o que eu constato hoje. E fico
pensando que mundo as crianças e gerações futuras
herdarão. O mundo já tem muita gente. E muita gente inescrupulosa.
Usamos dos recursos naturais da pior forma possível. O homem derruba a árvore, que segurava o solo e a umidade. A chuva vem e leva o solo embora, enche o fundo dos rios de terra, que transbordam e levam a destruição por onde passam. A água deixa de ser potável, doenças se espalham, novos vírus adormecidos nas florestas são reativados. Agora sem árvores, o sol esturrica o solo, e a água não é mais retida. Secam-se as fontes e olhos dágua. Sem falar da flora e da fauna variadas que habitavam aquela árvore derrubada. Até a época das grandes navegações e colonizações européias, os países asiáticos, ainda na sua maioria budistas, eram paraísos de natureza exuberante, pois aqueles povos eram mais imbuídos do sentido de reverência à todas as formas de vida, como o Buddha ensinara. O Buddha foi o primeiro ecologista histórico. A degradação ambiental começou mesmo com a colonização européia, que trouxe não só a ganância pelo consumo das riquezas naturais (a Europa já estava exaurida), bem como a doutrina de que o homem é senhor da criação e criatura superior. Mas até hoje os países budistas são mais preservados que os ocidentais. O Sr. Kaled, que viveu como monge no Sri Lanka e na Tailândia, conta-nos como ainda se via muita vida selvagem nestes países. Precisamos reavivar esta reverência pela vida. É a única maneira de garantir nossa sobrevivência e a dos nossos filhos. Esforços isolados diversos vem sendo feitos, especialmente depois da década de 60, depois do "flower-power" dos hippies , e da crescente consciência ecológica. Mas cada um contribuiria no seu dia-a-dia, por exemplo, se não desperdiçasse água. Se, ao invés de consumir 10 latas de leite condensado ou 30 cervejas, consumisse aquilo satisfizesse a barriga e não o olho. Se, ao passar sabão nos pratos ou no corpo, a torneira fosse fechada. O Buddha ensinou a passarmos pelo mundo tocando-o de leve. Tocar o mundo de leve também faz parte do Meio de Vida Correto! Assim as gerações futuras receberão este mundo ainda habitável e bendirão o teu nome. O problema do lixo nas cidades grandes é muito grande. A reciclagem
do lixo no Brasil ainda é ridícula, e este plano econômico
contribuiu muito para o aumento do consumo e do desperdício. Por
outro lado, este mesmo plano econômico lançou milhões
de pessoas na economia informal, cuja forma mais conhecida são os
chamados "camelôs". Sempre houveram camelôs nas ruas, mas de
uns tempos para cá a legião se multiplicou. Nada contra a
"camelotagem" - que é uma tentativa de se ter um meio de vida digno
em tempos difíceis - mas é fato inquestionável que
eles também contribuem para a poluição das ruas. O
povo carioca e de outras grandes cidades brasileiras não é
lá muito educado quando se trata de manter as ruas da cidade limpas.
Fiquei estarrecido com a reportagem do Jornal Nacional sobre a sujeirada
que o povo que mora em palafitas fazem, lá em Salvador. A limpeza
urbana colocou uma rede em volta das palafitas para impedir que o lixo
se espalhe para a Baía de Todos os Santos. Algo em torno de 70 toneladas
de lixo... Fico pensando: a nossa Baía de Guanabara não deve
ter mais um fundo natural, deve estar coberta de latas e plásticos.
Lucélia Santos realizou um trabalho de filmagem sobre a cultura
na China comunista, e num dos programas ela comentou que cada cidadão
é obrigado a plantar todo ano uma árvore. Milhões
de árvores surgem a cada ano por lá. Diversas cidades tem
árvores frutíferas nas ruas, com frutas à mão...
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