Harry
Potter e a Filha do Auror
by
Talita Teixeira
Capítulo 2 ~ Estranhas fotografias
Espantado
e agradavelmente surpreso, Harry focou as três fotografias com a luz da
lanterna. Decididamente, não esperava por aquilo, e uma febril agitação
despertou-o por completo, pois, afinal, já havia folheado aquele álbum
incontáveis vezes e nunca havia reparado na página dupla com fotos
escondidas. Apanhou uma e começou a investigá-la: parecia bem
antiga, e, portanto, não se tratava de uma das fotos de Colin. Era uma
fotografia em preto-e-branco, na qual um velho homem parecia estar dormindo
em uma cama de baldaquino, muito parecida com aquela que ele utilizava em Hogwarts,
exceto pelos belos entalhes em madeira. Harry achou, por um instante, que tratava-se
de uma foto trouxa, porque o homem tinha suas mãos cruzadas sobre o peito
e sequer se movia; observou a foto por mais alguns segundos e então atirou-a
no outro extremo da cama, compreendendo tudo.
O homem estava morto.
Engolindo em seco, e com o coração pulsando forte, Harry apanhou novamente a foto. O homem ainda estava lá, inerte, só que agora não estava mais sozinho: um menino, de pouco mais de cinco anos, havia saído sorrateiro de seu esconderijo, exatamente embaixo da cama onde o homem estava deitado, e agora abraçava-o, enterrando a cabeça nos travesseiros. Harry não precisava adivinhar que o garoto estava debulhando-se em lágrimas, forçando-se a ficar nas pontas dos pés para poder abraçá-lo. Observando melhor, Harry podia notar que um filete de secreção, que só podia ser sangue, escorria do nariz do homem morto. Um segundo depois, o menino parecia ter-se dado conta de estar sendo observado, e então virou-se rapidamente para Harry. Por instantes, ambos se encararam, e Harry pode observar a expressão do menino, que passava da tristeza extrema para a raiva absoluta.
Harry conhecia bem aqueles sentimentos, pois já os havia sentido dentro de si mesmo. Acompanhando a cena intrigado, observou o menino esconder-se desajeitado novamente sob a cama. Estranhamente, o rosto do menino lhe parecia familiar, mas o vira tão rapidamente que não pudera guardar-lhe os traços. Fixou a fotografia por mais alguns minutos, para ver se o garoto saia de seu esconderijo, mas ele sequer espiou por debaixo da colcha (naturalmente, da primeira vez em que Harry vira a foto, o menino fora pego de surpresa, e agora não sairia de debaixo da cama tão cedo). Ainda assim, Harry, mais calmo, pode observar detalhadamente aquela estranha fotografia. O morto sobre a cama trajava calças e colete negros (bem, poderiam ser verde musgo ou azul escuro, ponderou Harry, uma vez que a foto estava em preto e branco), com uma camisa branca cheia de rufos que se fechava no pescoço. Sua capa, que também era escura, caia pelos lados da cama. Embora o garotinho estivesse escondido, Harry lembrava-se de tê-lo visto trajar vestes negras também, algo como um suéter e calças negras.
O
velho homem, ao contrário do menino, não era nem um pouco familiar
a Harry: tinha vastos bigodes que deixavam os de tio Válter no chinelo,
e suas sobrancelhas eram tão espessas que mais pareciam duas gordas taturanas.
Seu cabelo caia-lhe revoltado por todos os lados da cabeça, e até
de suas orelhas escapavam-lhe tufos peludos. Tudo - cabelo, bigode, sobrancelhas,
pêlos nas orelhas - profundamente negro, salpicado por fios brancos. A
pele, muito branca, contrastava com os escuros cabelos e Harry, agora já
mais familiarizado com o morto, até achou sua derradeira expressão
bastante divertida.
Largando
a foto sobre a cama, Harry apanhou uma outra, colorida e nitidamente mais nova
do que a anterior. Tratava-se, também, de uma foto do mundo dos bruxos,
pois as pessoas ali moviam-se. Quatro jovens bruxos, três rapazes e uma
moça, trajavam as vestes de Hogwarts. Talvez fosse pelo sono, talvez
pela surpresa, mas Harry não reconheceu os rapazes de pronto. Precisou
de uns dois ou três minutos para vê-los mais claramente, e então
tapou a boca com uma das mãos.
Severo
Snape, Pedro Pettigrew e Lúcio Malfoy, adolescentes, olhavam para ele.
Harry
demorou-se ainda mais observando esta foto do que a anterior, ainda mais porque
ela parecia ter sido tirada em um momento de alegria. Num cenário que
ele reconhecia ser em algum bar em Hogsmeade, um jovem e pálido Snape
de vinte anos atrás, com os mesmos cabelos negros caídos pelos
ombros, enlaçava com o braço direito o ombro de uma menina um
pouco mais nova que ele. Seu outro braço estava sobre o ombro de Lúcio
Malfoy, então um imberbe adolescente de pele translúcida como
a de seu filho, Draco. Todos estavam sentados em volta de uma mesa redonda como
as que haviam no Três Vassouras, e um gorducho Pedro Pettigrew, com um
sorriso indisfarçável, sentava-se um pouco mais afastado deles.
Quatro canecas de cerveja amanteigada estavam dispostas na frente de cada um,
e os punhos de Harry se fecharam com violência ao reconhecer as três
odiosas figuras, e só então ele se deu conta do quanto a foto
lhe lembrava os seus amigos. Ali estavam - como que representados por Malfoy,
Snape e pela menina - Rony, Hermione e ele mesmo, Harry. Um pouco afastado deles,
Pedro Pettigrew, o traidor Rabicho, com sua cara redonda que lembrava-lhe Neville
Longbotton. Ele não compartilhava do abraço entre Malfoy, Snape
e a garota, assim como Neville não partilhava dos segredos entre Harry,
Rony e Hermione.
Suspirando tremulamente, Harry observou melhor a fotografia. Lúcio Malfoy tinha um sorriso arrogante no rosto comprido, um sorriso que vinha acompanhado de dois olhos cinzentos e frios. Snape parecia feliz, num único e raro momento de felicidade que não envolvesse as humilhações a Harry ou ao pessoal da Grifinória. Sua boca abria-se num sorriso autêntico que o deixava decididamente mais humano, e seus olhos pareciam envolvidos em sonhadores planos para o futuro. Rabicho observava-os sorrindo de soslaio, e seu olhar demonstrava um tantinho de medo.
Tamborilava
os dedos nervosamente na mesa. A garota que os acompanhava era a única
desconhecida para Harry. Parecia um pouco mais jovem que eles, talvez tivesse
treze ou catorze anos, e era extremamente bonita. Lembrava-lhe um pouco Cho,
com longos cabelos castanho escuros que enrolavam em suaves cachos nas pontas.
Sua pele era de um tom levemente moreno, e trajava as vestes amarelo-ouro da
Corvinal. Somente ela estava com o uniforme de Hogwarts.
Harry
fechou os olhos resoluto. Aquele momento congelado no tempo parecia ter-lhe
feito muito mal. Sentiu-se enjoado, não pelas pessoas que pareciam vivas
no retrato, mas por ter-se dado conta de que Pedro Pettigrew - talvez ali, naquele
exato momento - estivesse se deixando seduzir pelos partidários de Voldemort.
Pettigrew, o fiel do segredo de seus pais, o traidor, parecendo um Neville Longbotton
medroso e indeciso, enquanto Malfoy, Snape e a garota desconhecida certamente
comemoravam a conquista de mais um pretenso comensal da morte.
Já eram quase quatro horas quando Harry deixou de olhar para aquela fotografia,
perdido em pensamentos tristes. Havia
uma última foto ainda, e Harry achou que estava preparado para tudo,
menos para aquilo.
Era
mais uma foto de Hogwarts, e, ainda que fosse tirada de longe, Harry podia reconhecer
o amplo salão onde faziam as refeições. As mesas, entretanto,
estavam afastadas, dando lugar a um tablado alto. Como a foto fora tirada de
surpresa, as pessoas se moviam daqui para lá sem nem lembrarem-se de
acenar ou fazer quaisquer outras gracinhas. Ao fundo da foto, Harry podia ler,
em letras brilhantes pintadas em um cartaz, que se tratava do Concurso anual
de práticas mágicas. Parecia que haviam acabado de entregar os
primeiros prêmios e Harry pode reconhecer Dumbledore e a professora McGonagall
sorrindo para os finalistas. Ao apertar os olhos para ver melhor, Harry tomou
um grande susto, e correu para apanhar uma lupa trouxa que estava com o cabo
quebrado no meio dos brinquedos estragados de Duda.
A
despeito dos vencedores parecerem ter doze anos, eles formavam uma dupla bastante
incomum: um garoto de cabelos ensebados, com a gravata da Sonserina, e uma menina
de cabelos castanho avermelhados, trajando o uniforme de Hogwarts com o brasão
da Grifinória, que em tudo parecia ser a sua mãe.
Estupefato,
essa fora demais para uma madrugada de insônia. Correndo os olhos pela
foto, Harry ainda pode reconhecer três garotos que olhavam ferozmente
para o Snape de doze anos ao lado de sua mãe. Sirius, Tiago e Lupin,
ainda que no meio de dezenas de alunos, podiam ser facilmente reconhecidos.
Olhavam contrafeitos para o tablado, encarando Snape com uma raiva contida.
Do alto do tablado, o professor de poções parecia ter uma expressão
de vitorioso desdém dirigido exatamente para o lado dos alunos da Grifinória,
enquanto Lílian mantinha o olhar fixo em seus sapatos. No peito de ambos,
duas medalhas reluziam como ouro puro.
Harry sentiu sua cabeça girar, tonto de sono e espanto. Só então lembrou-se que era véspera de seu aniversário, e muitas coisas incomuns pareciam acontecer justamente naquela data.
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