Poesias - Sonetos

POEMA
Friedrich Rückert

O diamante melhor corta tudo o que existe,
Mas ao crote de tudo ele sempre resiste.
O melhor coração é aquele que suporta
O corte que outrem faz, mas a nenhum não corta.

SONETO - TEMPO - SHAKESPEARE
MAR PORTUGUÊS - FERNANDO PESSOA
MEU CORAÇÃO - ALCEU WAMOSY
SONETO - BUSQUE AMOR - CAMÕES
SE EU DE TI ME ESQUECER - BERNARDO GUIMARÃES
FELICIDADE - RAUL DE LEONI
SONETO - HORAS BREVES - CAMÕES
RENASCIMENTO - RAIMUNDO CORREIA
TEORIA - RONALD DE CARVALHO
ENGANOS DO ENGANO - RAMON DE CAMPOAMOR
ALMAS PARALELAS - AUGUSTO DE LIMA
OS RIOS - OLAVO BILAC
SORRISO INTERIOR - CRUZ E SOUSA
SINCERIDADE - RAUL DE LEONI
ANOITECER - RAIMUNDO CORREIA
PSICOLOGIA DE UM VENCIDO - AUGUSTO DOS ANJOS
SAUDADE - AUGUSTO DOS ANJOS
O CANTO DOS PRESOS - AUGUSTO DOS ANJOS
ETERNA MÁGOA - AUGUSTO DOS ANJOS
SABEDORIA - PAUL VERLAINE

Poetas
Espaço reservado para Notas Biográficas

Resumos Literários

Nótulas diversas
(*********)

 
SONETO
WILLIAM SHAKESPEARE

Desgasta, voraz Tempo, as garras ao leão,
Do tigre arranca o dente à fauce que tem fome,
Faze que a terra coma a própria criação
E a fênix sempre-viva em seu sangue consome.

Torna triste ou alegre a estação, quando passas,
E faze o que quiseres, Tempo vertiginoso,
Ao vasto mundo e a seus fugazes dons e graças;
Só não cometerás um crime mais odioso:

Não craves teu buril, do meu amor, na fronte,
Não desenhes ali com teu cálamo antigo,
Deixa que tua nódoa em seu rosto não conte,

Que seja da beleza o padrão sempre vivo.
Mas, por mais que essas mãos, Tempo cruel, o provem,
No meu verso ele vive eternamente jovem.

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  MAR PORTUGUÊS
Fernando Pessoa

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Qnatos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fôsses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena!
Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nêle é que espelhou o céu.

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  MEU CORAÇÃO
Alceu Wamosy

O triste coração que eu trago, é tão velhinho
E tanto tem amado, e tem vivieo tanto,
Que não suporta mais o fogo de um carinho,
Nem de outro coração o cálido quebrante.

Às vezes, alta noite, ouço-o chorar sozinho,
Do meu peito escondido ao último recanto,
Assim como quem sente a dor de algum espinho,
Que o fere, e quer leni-la, ao afogá-la em pranto.

É ele! É o coração, tristíssimo, que chora
De saudade de alguém, que o fez antegozar
Um grande, um santo amor, e que se foi embora.

E escuto-o palpitar, tão leve, que parece
Um ser que sente frio, e treme, a murmurar
Num soluço infinito, os restos de uma prece ...

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  SONETO
CAMÕES

Busque Amor novas artes, novo engenho,
pera matar-me, e novas esquivanças;
que não pode tirar-me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vêde que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mate e não se vê;

que dias há que na alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei por quê.

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  SE EU DE TI ME ESQUECER
BERNARDO GUIMARÃES

Se eu de ti me esquecer, nem mais um riso
Possam meus tristes lábios desprender;
Para sempre abandone-me a esperança,
Se eu de ti me esquecer.

Neguem-me auras o ar, neguem-me os bosques
Sombra amiga em que possa, adormecer,
Não tenham para mim murmúrio as águas,
Se eu de ti me esquecer.

Em minhas mãos em áspide se mude
No mesmo instante a flor que eu for colher;
Em fel a fonte a que chegar meus lábios,
Se eu de ti me esquecer.

Em meu peregrinar jamais encontre
Pobre alberque onde posse me acolher;
De plaga em plaga, foragido, vague,
Se eu de ti me esquecer.

Qual sombra de precito entre os viventes
Passe os míseros dias a gemer,
E em meus martírios me escarneça o mundo,
Se eu de ti me esquecer.

Se eu de ti me esquecer, nem uma lágrima
Caia sobre o sepulcro em que eu jazer;
Por todos esquecido viva e morra,
Se eu de ti me esquecer.

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  FELICIDADE
RAUL DE LEONI

Basta saberes que és feliz, e então
Já o serás na verdade muito menos:
Na árvore amarga da meditação,
A sombra é triste e os frutos têm venenos.

Se és feliz e o não sabes, tens na mão
O maior bem entre os mais bens terrenos
E chegaste à suprema aspiração,
Que deslumbra os filósofos serenos.

Felicidade... Sombra que só vejo,
Longe do Pensamento e do Desejo,
Surdinando harmonias e sorrindo,

Nessa tranqüilidade distraída,
Que as almas simples sentem pela Vida,
Sem mesmo perceber que estão sentindo...

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  SONETO
CAMÕES

Horas breves de meu contentamento,
Nunca me pareceu, quando vos tinha,
Que vos visse mudadas tão asinha
Em tão compridos anos de tormento.

As altas tôrres, que fundei no vento,
Levou, enfim, o vento que as sustinha:
Do mal, que me ficou, a culpa é minha,
Pois sobre coisas vãs fiz fundamento.

Amor com brandas mostras aparece,
Tudo possível faz, tudo assegura;
Mas logo no melhor desaparece.

Estranho mal! estranha desventura!
Por um pequeno bem que desfalece,
Um bem aventurar, que sempre dura!

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  RENASCIMENTO
RAIMUNDO CORREIA

Venha, após tanta lágrima bebida
E tanto fel provado, a doce e branda
Alegria, em que a murcha flor se expanda
Do sorriso, e eu de novo surja à vida!

De novo em festas, gárrula e florida,
A alma se rasgue inteira - ampla varanda Escancarada de uma e de outra banda
Ao fresco e à luz, de alegre sol batida...

Parta a loisa ao sepulcro que a devora,
E, livre assim dessa mortal tristeza,
Desfeita em hinos, vá pela floresta...

Vá pelo mar... vá pelo azul afora...
Derramando por toda a natureza O pouco de ilusões que ainda me resta.

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  TEORIA
RONALD DE CARVALHO

Cria o teu ritmo a cada momento.

Ritmo grave ou límpido ou melancólico;
ritmo de flauta desenhando no ar imagens claras
de bosques, de águas múrmuras, de pés ligeiros e de asas;
ritmo de harpas,
ritmo de bronzes,
ritmo de pedras,
ritmo de colunas severas ou risonhas,
rimto de estátuas,
ritmo de montanhas,
ritmo de ondas,
ritmo de dor ou ritmo de alegria!
Não esgotes jamais a fonte da tua poesia,
enche a bilha de barro ou o cântaro de granito
com o sangue de tua carne e as vozes do teu espírito!
Cria o teu ritmo livremente,
como a natureza cria as árvores e as ervas rasteiras.

Cria o teu ritmo e criarás o mundo!

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  ENGANOS DO ENGANO
RAMON DE CAMPOAMOR

Trad. de Ary de Mesquita

Ah! quanto acreditava em ti!Ah! quanto!
Juro que mesmo infiel sou inocente... Não pensava em amar-te eternamente?
Pensava assim, pois te adorava tanto!...

De meu erro em desculpa este letreiro
Na minha campa deixarei gravado;
"Perdoa ao infeliz que te há enganado,
Porque a si mesmo se enganou primeiro".

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  ALMAS PARALELAS
AUGUSTO DE LIMA

Alma irmã de minha alma, espelho vivo
de outro espelho fiel que te retrata,
alma de luz serena e intemerata,
cujo influxo de amor me tem cativo!

Bem sinto, que em mim vives e em ti vivo;
no entanto (e eis o desgosto que me mata)
do amor a doce vaga me arrebata
e não posso atingir teu vulto esquivo.

O mesmo curso têm nossos destinos:
do gozo o mel, da dor os desatinos
a um nada inspiram, sem que ao outro inspirem.

Mas, triste sorte! ó bela entre as mais belas!
eles são como duas paralelas;
- Próximo correm, sem jamais se unirem! ...

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  OS RIOS
OLAVO BILAC

Magoados ao crepúsculo dormente,
Ora em rebojos galopantes, ora
Em desmaios de pena e de demora,
Rios, chorais amarguradamente.

Desejais regressar... Mas, leito em fora,
Correis... E misturais pela corrente
Um desejo e uma angústia, entre a nascente
De onde vindes, e a foz que vos devora.

Sofreis da pressa, e, a um tempo, da lembrança...
Pois no vosso clamor, que a sombra invade,
No vosso pranto, que no mar se lança,

Rios tristes! agita-se a ansiedade
De todos os que vivem de esperança,
De todos os que morrem de saudade...

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  SORRISO INTERIOR
CRUZ E SOUSA

O ser que é ser e que jamais vacila
Nas guerras imortais entre sem susto,
Leva consigo este brasão augusto
Do grande amor, da grande fé tranquila.

Os abismos carnais da triste argila
Ele os vence sem ânsias e sem custo...
Fica sereno, num sorriso justo,
Enquanto tudo em derredor oscila.

Ondas interiores de grandeza
Dão-lhe esta glória em frente à natureza
Esse esplendor, todo esse largo eflúvio.

O ser que é ser transforma tudo em flores...
E para ironizar as próprias dores
Canta por entre as águas do dilúvio!

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  SINCERIDADE
RAUL DE LEONI

Homem que pensas e que dizes o que pensas!
Se queres que entre os homens e entre as cousas
Tuas idéias vivam pelo mundo
Crê bem nelas primeiro, sofre-as bem,
Faze com que elas vivam na tua alma,
Na mais sincera intimidade do teu Ser!

Há idéias que na vida cultivamos,
Pela volúpia inútil de pensar,
Pela simples beleza, pela graça
Floral, pelo prazer que elas nos dão...
Por esse estado de ilusão chinesa
Em que nos adormecem a consciência:
Aquarelas efêmeras do espírito,
Paisagens meigas da imaginação,
Idéias lindas que não criam nada!

Elas passam, radiantes, coloridas,
Na flutuação superficial do Pensamento;
Sim, são plantas aquáticas, nelumbos
De ouro equatorial, ninféias encantadas
Pela prata dos luares sedativos,
Leve vegetação de tintas luminosas,
Sonhos das águas trêmulas que passam
- Raízes a boiar no espelho das correntes, -
Com músicas de cores pelas plumas,
Vaidades femininas pelas palmas,
Mas em um grão de vida, sem um fruto,
Nessa esteridade deslumbrante...

As idéias que criam, as idéias
Vivas que elevam religiões e impérios,
Gênios e heróis e mártires e santos;
As idéias orgânicas e eternas
Que dão nomes aos séculos, destinos
As raças, glória aos homens, força á Vida,
Que nutrem almas e orientam povos,
Fecundam gerações e geram deuses
E que semeiam civilizações,
Essa terão que vir da nossa fonte humana,
Deitando profundíssimas raízes
No generoso espírito em que nasçam:

Terão que ser humanas, quer dizer,
Ser a nossa energia e a nossa fé,
Ser sementes recônditas, ser dores,
Sentimentos, paixões e quase instintos.
Ser vozes dos abismos transcendentes
Da consciência profunda... ser nós mesmos...
Porque as árvores mais fecundas são aquelas
Que mais fundas estão nas entranhas do solo
E mais fazem sofrer o coração da Terra...

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  ANOITECER
RAIMUNDO CORREIA

Esbraseia o Ocidente na agonia
O sol... Aves em bandos destacados,
Por céus de oiro e de púrpuro raiados,
Fogem... Fecha-se a pálpebra do dia...

Delineiam-se, além da serrania
Os vértices da chama aureolados,
E em tudo, em torno, esbatem derramados
Uns tons suaves da melancolia...

Um mundo de vapores no ar flutua...
Como uma informe nódoa, avulta e cresce
A sombra à proporção que a luz recua...

A natureza apática esmaece...
Pouco a pouco, entre as árvores, a lua
Surge trêmula, trêmula... Anoitece.

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  PSICOLOGIA DE UM VENCIDO
AUGUSTO DOS ANJOS

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme - este operário das ruínas -
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

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  SAUDADE
AUGUSTO DOS ANJOS

Hoje que a mágoa me apunhala o seio,
E o coração me rasga atroz, imensa,
Eu a bendigo da descrença, em meio,
Porque eu hoje só vivo da descrença.

À noute quando em funda soledade
Minh'alma se recolhe tristemente,
P'ra iluminar-me a alma descontente,
Se acende o círio triste da saudade.

E assim afeito às mágoas e ao tormento,
E à dor e ao sofrimento eterno afeito,
Para dar vida à dor e ao sofrimento,

Da saudade na campa emagrecida
Guardo a lembrança que me sangra o peito
Mas que no entanto me alimenta a vida.

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  O CANTO DOS PRESOS
AUGUSTO DOS ANJOS

Troa, a alardear bárbaros sons obstrusos,
O epitalâmio da Suprema Falta.
Entoado asperamente, em voz muito alta,
Pela promiscuidade dos reclusos!

No wagnerismo desses sons confusos,
Em que o Mal se engrandece e o ódio se exalta,
Uiva, à luz de fantástica ribalta,
A ignomínia de todos os abusos!

É a prosódia do cárcere, é a partênea
Aterradoramente heterogênea
Dos grandes transviamentos subjectivos...

É a saudade dos erros satisfeitos,
Que, não cabendo mais dentro dos peitos,
Se escapa pela boca dos cativos!

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  ETERNA MÁGOA
AUGUSTO DOS ANJOS

O homem por sobre quem caiu a praga
Da tristeza do mundo, o homem que é triste
Para todos os séculos existe
E nunca mais o seu pesar se apaga!

Não crê em nada, pois, nada há que traga
consolo à mágoa, a que só ele assiste.
Quer resistir, e quanto mais resiste
Mais se lhe aumenta e se lhe afunda a chaga.

Sabe que sofre, mas o que não sabe
É que essa mágoa infinda assim não cabe
Na sua vida, é que essa mágoa infinda

Transpõe a vida do seu corpo inerme;
E quando esse homem se transforma em verme
É essa mágoa que o acompanha ainda!

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  SABEDORIA
PAUL VERLAINE

Trad. de Onestaldo de Pennafort

Escutai a canção suave
que só para agradar-vos chora.
Ela é plácida: água sonora
que, entre relvas flui, mansa e grave.

Familiar e amada (seria?)
era outrora essa voz. Velada
como uma viúva desolada,
ei-la hoje, altiva, todavia.

E, através do véu que a envolvê-la
ao sabor da brisa palpita,
ora esconde ou mostra à alma aflita
a verdade, como uma estrela.

Diz essa voz reconhecida
que o que vale e só a bondade,
e que a inveja, como a maldade,
para nada serve na vida.

Ela fala também da glória
de ser simples bem simplesmente,
e de bodas de ouro e igualmente
de uma paz sem luta ou vitória.

Acolhei a voz que em seu canto
epitalâmico persiste.
Ah! consolar uma alma triste,
que outra coisa consola tanto?

Ela é sensível, timorata,
a alma que em silêncio padece.
E que belo exemplo oferece! ...
Escutai a canção sensata.

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E-mail - selerd@ultranet.com.br

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