
Um dia minha filha me pediu para eu descrever o lugar onde eu moro e saiu esta
preciosidade.
O Quarto.
Um quarto como todos os outros,
3 x 3... ou nem isso.
Um canto xanfrado, mocho,
Um guarda-roupa duplo, mas mixo.
Coisas espalhadas
Como em um quarto de adolescente,
Tentando esconder os escombros
De um quarentão caquete, carente.
Javé
Prudente, 26/9/1995
Aqui uns, se assim puderem ser chamados, hai-kais, bonitinhos:
Magda
Além-mar
Os olhos da cor
Estão.
Verdes floresta
A ver
Voltarão?
Javé
Prudente, 26/9/1995
Olhar
Câmera retínica
Para fotografar
Linda menina
Olhar 1
Câmera fugaz
Para retratar
Belo rapaz
Olhar 2
Óculos, olhos
Cegos que
Fazem enxergar
Paquera
Por que olhos tão lindos
Emanam tantos tristes olhares
Em tão graciosa criatura?
Javé
9/95 e 11/95
Este aqui é para os solteirões desesperados. É só publicar nos classificados de um
grande jornal da cidade que o resultado é imediato.
Procura-se
Procura-se uma mulher,
algo assim:
em torno dos intas ou entas.
Morena, loira, ruiva e negra,
raça, credo, não importa.
Alta, baixa, magra, gordinha,
é o que se quer.
Que tenha:
sedução no olhar,
compaixão e amor no coração,
fogo entre as pernas,
inteligência na caixola,
e como dona Baratinha,
dinheiro na caixinha
e vaga no colchão!
Javé
Dezembro/95
Em um dia de raiva e depressão.
Foda-se Jeová,
Foda-se o Javé,
Que Deus não é!
Foda-se o Antonio,
Foda-se o José,
Que é o Javé,
Que nada é.
Javé
Dezembro/95
Um dia andando pelas plácidas ruas de Campinas (ainda não tinha saído nenhum
tiroteio até aquele momento), eu vi. Vi o que sobrou de um ser humano neste fim de
século. E o que pode acontecer com toda a humanidade de nosso massacrado e vilipendiado
povo. Como um tipo de auto-defesa com tanto sofrimento acabei fazendo um poema
humorístico. Apesar de engraçado é muito triste, deveras triste. O sofrimento é tanto,
que a gente aprendeu a rir da própria desgraça. Como a hiena: come merda e vive rindo.
Cagando e Andando
Outro dia pela rua
caminhando
Eu vi um homem que cagava
andando.
Era um sem-teto, sem-terra
sem-vida,
Sem amor próprio e a dignidade
perdida.
Diante de quadro de tal degradação
humana,
Não sei se me desespero pela condição
insana,
Ou se me comprazo e me admiro por tão
apurada técnica
De primor e sobriedade que o infeliz
defeca!
Javé
Dezembro/95
Algumas quadras, tercetas, duetas e etceteras...
Paradoxo
A porta de um boteco
É um paradoxo:
é a entrada para o céu
e a saída para o inferno.
Oferenda
Como te oferecer
O cândido brilho das estrelas
Se já possuis
A radiante luz do sol?
Vesgo
Abençoado estrábico olhar meu!
Porque quando a olho posso admirar
Sua beleza e gostosura em dobro!
Desamor
O triste não é amar sem ser amado.
Triste é não saber amar.
Sem Título
Eternamente
É ter na mente
Éter na mente.
(Esta preciosidade aí de cima foi uma pixação
que eu vi uma vez, acho que, nas ruas de São Paulo)
Sem Título 1
Mente
Pre mente
Premente
Dormente
Dor mente
Docemente
Doce mente
Demente
De mente
mente
A Vida Passa a Passos Largos
Ao contrário do poeta,
Confesso que não vivi;
Apenas passei pela vida...
Uma mulher
Mulher
Regiane...
Reggia, Regina...
Rainha!
Estonteante figura,
De pele de ébano,
Me desestrutura,
quando para mim caminha.
Javé
Outubro/96
Outra mulher. Está comigo já tem um bom tempo. Apesar do aviso aí abaixo.
Pra Moça que Veio de Longe
Nada tenho a te oferecer.
Nem futuro,
Muito menos amor.
(Esse me foi roubado e vilependiado há muito tempo);
Nem paixão,
(Essa já dissolveu meu coração);
Nem dor,
(Essa é exclusiva dessa minha execrada existência);
Muito menos vida,
(Essa já está mais do que fodida);
Portanto, fuja!
Enquanto há sobrevida.
Javé
Abril/97
Despedida
Já faz tarde
Está na hora
Da gente ir
Embora,
Ir para outros
Ares,
Outros mares,
Outros lares,
Outros bares!
Javé
Setembro/96

|