“Esses Animais Maravilhosos!!” (III)
*Esta série de textos pretende elucidar e discutir algumas questões bastante interessantes sobre certos animais e seres especialmente bizarros do nosso imaginário coletivo, sempre sob um ponto de vista acadêmico e científico, não-apelativo e ultra-realista.
Confesso que demorei para definir qual seria o animal que fecharia a série “Esses Animais Maravilhosos!!” com a devida competência. Certamente teria que encontrar um ser que transpirasse demência por todos os poros, para que esta intelectualizada e respeitada série fosse fechada, não com chave de ouro, mas de diamante. Porém, após alguns segundos de profunda reflexão, me deparei com uma infinidade de criaturas que poderiam fazê-lo de maneira convincente. Tive que pesquisar a fundo estas criaturas para encontrar aquela que, de todas, seria a mais demente. E como foi difícil. Galinhas de ovos de ouro me apareciam à frente, assim como unicórnios e medusas. Felizmente, após muito suor e labuta, fiz minha escolha: O LOBISOMEM.
Para começar a resenha, vamos ao que interessa: SIM, É NORMAL UM HOMEM SE TORNAR UM LOBO EM NOITES DE LUA CHEIA. É preciso ter em mente SEMPRE esta afirmação ao ler este texto, já que esta só será questionada ao final do mesmo. Por enquanto, apenas concorde, e boa leitura.
Ora, e eis que o lobisomem não é nem homem nem lobo, apenas um ser monstruoso desagradavelmente faminto. Um meio-termo, podemos dizer. Mas, então, surge a questão: “POR QUÊ UM HOMEM RECÉM-ALIMENTADO, AO VIRAR UM LOBISOMEM, VOLTA A SENTIR FOME?”. E aí vai a resposta: se você tivesse que realizar uma mutação total no seu corpo, desenvolvendo pêlos, cauda e focinho, tudo isso em apenas alguns minutos (sem passar dias num casulo de seda), sem dúvida terminaria o processo no mínimo suado. Daí a predisposição lógica de atletas olímpicos para serem lobisomens.
Outro aspecto interessante deste ser está na circense forma com que podemos matá-lo. Como todos nós sabemos, para se matar um lobisomem é necessária uma bala de prata. Tendo em vista o grande grau de demência explícita contida nesta afirmação, há duas questões cientificamente importantes. A primeira delas: “POR QUÊ BALAS COMUNS NÃO MATAM UM LOBISOMEM?”. Para responder a esta primeira questão, peço que o leitor preste atenção nas baratas. Sim, as baratas. Seres simpáticos odiados injustamente, as baratas são extremamente resistentes a venenos, pois desenvolvem, com o passar das gerações, imunidade a certas substâncias antes mortais. O lobisomem não poderia ser diferente. Caçados durante séculos com armas comuns, estes seres desenvolveram grande resistência a metais não-nobres como chumbo, aço, ferro, etc...Mas não prata, pois foram REALMENTE raras as pessoas que tentaram matar cães esquisitos com objetos deste material. Numa comparação mais mundana, a bala de prata está para o lobisomem assim como o pé direito está para a barata.
Passemos, então, para a segunda questão, que na verdade é uma variação da questão anterior: “POR QUÊ A PRATA MATA O LOBISOMEM?”. Não subestime esta pergunta leitor, pois a bala poderia ser de ouro, platina e até de ouro branco, mas APENAS a prata mata de fato o animal. Isso, obviamente, diz respeito exclusivamente ao material prata, enquanto material, e não ao objeto bala, enquanto objeto. Na prática, isso significa que pouco importa se o que entra no lobisomem é uma bala de prata ou um ioiô de prata, o lobisomem morreria nos dois casos. Mas, POR QUÊ? Bem, assim como há pessoas que têm alergia a certos materiais, o lobisomem poderia ser um ser que possuísse seriíssimos problemas com o material prata, a ponto até de falecer quando em contato mais íntimo com esta substância. Sendo assim, lobisomens em seu estado hominídeo jamais poderiam se dar ao luxo de utilizar aparatos de beleza de material incerto e dispendioso. Bijuterias seriam mais indicadas.
Analisemos agora o comportamento canino do lobisomem. Percebe-se claramente, ao estudarmos este ser, que ele REALMENTE tem algo de canino. Pois bem, “ATÉ QUE PONTO?” é a questão. Ou melhor: “SE UMA VÍTIMA PEGASSE UM GRAVETO E ARREMESSASSE PARA LONGE DO LOBISOMEM, ELE IRIA SE DIVERTIR EM IR BUSCÁ-LO?”. Bem, bem, bem...temos aqui uma excelente questão. E a resposta é SIM, OBVIAMENTE. Um ser que passa seu tempo emitindo uivos sem sentido (já que não possui bando), farejando e comendo, tal qual um cão, poderia muito bem se divertir igual a um. Tal proximidade com os cães (e nem tanto com os lobos) me faz crer que este ser também demarcaria território, urinando em diversos locais, como postes, hidrantes, pneus, paredes e inclusive no chão da própria casa. Esta última observação nos mostra que a casa de um lobisomem seria facilmente reconhecível pelo odor nauseabundo.
Tocamos num assunto vasto e intrigante: A LIGAÇÃO CÃO-LOBISOMEM. Até onde podemos ir? Poderíamos ficar dias estudando esta fabulosa relação, mas preferi selecionar o aspecto que mais soa importante na compreensão e estudo do lobisomem e seu parentesco canino: A REPRODUÇÃO. Afinal, “LOBISOMENS SE SENTEM ATRAÍDOS POR CACHORRAS NO CIO?”. Evidente e certo como o nascer do sol. Mesmo sendo uma criatura solitária, o lobisomem certamente teria manifestações de libido pelo sexo oposto. Assim como lobisomens no estado hominídeo pré-metamórfico sentiriam desejo por humanos do sexo oposto; os mesmos, quando em estado pós-metamórfico, se sentiriam atraídos por cães e/ou lobos. Sem dúvida lobisomens prefeririam outros lobisomens, porém este é um ser extremamente solitário e demente, e encontros entre seres de sexos opostos resultando em acasalamento seriam estupidamente raros, o que explica o reduzido número de indivíduos.
Antes de prosseguir devo lembrar que um lobisomem pré-metamórfico, apesar de se parecer MUITO com um ser humano, NÃO É, DE MANEIRA ALGUMA, UM SER HUMANO. Isso pode-se constatar facilmente após a leitura de tudo o que já foi escrito até aqui.
Voltando ao assunto sexual: “O LOBISOMEM, QUANDO HOMINÍDEO, PODERIA SENTIR DESEJO POR UMA CACHORRA NO CIO?”. Na verdade, não vejo motivos para não crer nisso. Mesmo com aparência bastante diferente antes e depois da metamorfose, é importante lembrarmos que trata-se de um mesmo e único ser. Sendo assim, o contrário também é válido: lobisomens transformados sentem-se atraídos por belas mulheres. O que é nojento, mas também magnífico.
Abordemos agora a questão-chave do SER lobisomem, que foi deixada de lado até agora para evitar maiores complicações. NÃO, HOMENS NÃO SAEM POR AÍ SE TRANSFORMANDO EM LOBOS, NEM MESMO NAS LUAS CHEIAS. Tendo isto em mente, “POR QUÊ UM SER MUITO-PARECIDO-COM-UM-HOMEM SE TRANSFORMARIA EM UM SER MUITO-PARECIDO-COM-UM-LOBO EM NOITES DE LUA CHEIA????”. Definitivamente não é uma questão para amadores. Todos nós acreditamos que o lobisomem é um hominídeo que vira um cachorro esquisito, POR CAUSA DA LUA CHEIA. Pois bem, eu nego esta visão infantilóide. O lobisomem NÃO é um hominídeo problemático que vira um dobermann estranho, mas um cachorro problemático que se TORNA parecido com um homem por necessidades fisiológicas. Vamos por partes. O que as noites de lua cheia têm de diferente das noites comuns? ILUMINAÇÃO, meu caro. Não há dúvidas de que o lobisomem, uma máquina mortal e brincalhona, é um ser noturno. Mas o que ninguém prestou atenção é que ele é um ser noturno QUE NÃO ENCHERGA BEM, confirmando aí o caráter retardado deste animal. Um ser noturno que não enxerga no escuro, certamente está fadado ao insucesso. Mas o pobre, divertido e ingênuo lobisomem desenvolveu uma maneira de poder enxergar nas outras noites de maneira mais convincente. Desenvolveu a habilidade no mínimo idiota de modificar sua aparência, tornar-se um ser humanóide muito parecido com o homo sapiens, para assim, poder sair à noite e desfrutar da escuridão com lanternas e pequenas luzes brilhantes, que apenas a espécie humana poderia proporcionar. Desse modo, o lobisomem também se tornou um ser imensamente camuflado para seus predadores (nós), e conseqüentemente sobreviveria até hoje por este sucesso. Assim, é importantíssimo lembrarmos que, ao contrário do que nos mostram os filmes, o lobisomem não acha um transtorno se metamorfosear, e não é a lua que o transforma, mas ele mesmo, pois é isso que assegura sua sobrevivência. Configura-se assim o lobisomem como um cachorro esquisito que se transforma numa forma humanóide com intuito de tirar proveito da tecnologia humana em iluminação assim como para assegurar sua camuflagem perante os seus predadores (nós).
Bem, para encerrar a dissecação semântica deste animal extraordinariamente atraente, gostaria de mostrar aqui meu profundo pesar pelo fato deste ser sempre ser visto como uma máquina assassina, quando na verdade é um animal felpudo e brincalhão, que na maior parte do tempo se socializa conosco. O lobisomem, assim, emerge da névoa da ignorância e nos aparece como um carinhoso basset míope de 3 metros com hábitos pansexuais, sempre disposto a uma boa brincadeira de busque-o-bastão. Encerro assim esta maravilhosa série de textos esperando ter iluminado muitas mentes, antes ignorantes, acerca da verdadeira natureza dos animais maravilhosos aqui analisados. Meu coração se enche de regozijo e da sensação de trabalho bem feito. Obrigado pela sua atenção, e não se esqueça de ler os outros textos.
Athaulfo Borba
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