TRIIIIIM ð
-
Alo?
-
Oi, Zachary! É a Ló.
-
Você me acordou, sabia sua Ló...garitmo?
-
Você estava dormindo em plenas três horas da tarde?
-
As pessoas sentem sono, sabia?
-
Mas às três da tarde, Zachary?
-
É. Eu tenho uma disfunção cerebral e... Ah, esquece. Eu estou com sono demais
para pensar num comentário irônico.
-
Escuta, não quer vir aqui em casa cantar no karaokê?
-
O quê?
-
Karaokê. Eu acabei de ganhar um do meu pai. É liiiindo, Zachary - toda
empolgada.
-
Eu não acho uma boa idéia.
-
Ah, vem, Zachary, por favor!
-
Hoje eu já tenho compromisso.
-
O que você vai fazer? - decepcionada.
-
A minha mãe pediu para eu ficar olhando a grama crescer, então...
-
Zachary, pô! É super legal. Vai, garoto, faz alguma coisa divertida pelo menos
uma vez na vida.
-
Hey! Eu faço coisas divertidas.
-
Gritar com todo mundo e xingar o Taylor de bicha o dia inteiro não contam.
-
Eu nem sei onde você mora.
-
Eu te explico, imbecil.
-
Se eu não estivesse com tanto sono, eu responderia a isso de maneira bem
hostil.
-
Puxa, eu preciso te acordar mais vezes.
A Ló
disse o endereço certinho.
-
E vê se não demora. Tchau.
O
Zac desligou totalmente desanimado.
-
Mais essa agora - ele resmungou. - "Três horas da tarde, Zachary?" -
ele imitou a Ló com voz fininha.
E
reclamando até não poder mais, o Zac pegou o carro e foi. Chegou no endereço
e ficou olhando a casa antes de descer. Apoiou a cabeça no volante e falou
sozinho:
-
O que é que eu estou fazendo aqui...? Eu quero dormir, porra. Tudo bem, eu desço,
falo que não quero ficar e volto para casa. É, isso mesmo.
O
Zac desceu do carro e tocou a campainha.
-
Zachary, oi! - a Ló berrou quando abriu a porta. E antes que ele pudesse pensar
na palavra "pé", ela o puxou para dentro e trancou a porta. - Vem, o
karaokê está no escritório.
-
Não tem ninguém em casa?
-
Não.
-
Por que você não chamou o Dave para cantar com você? Eu estava dormindo.
-
Porque o Dave trabalha à tarde. De amigo vagabundo eu só tenho você. Por isso
te chamei - ela explicou, sorrindo.
-
Puxa, que simpático.
-
Que música você quer cantar? - a Ló perguntou
-
Eu não vou cantar nessa joça.
-
Como assim não vai cantar?
-
Não cantando, oras.
-
Ah, você vai sim - a Ló fez cara de brava.
-
Ló, olha - o Zac começou, paciente. -, eu estou muito feliz por você. Eu
entendo que você esteja realizada enquanto pessoa, que com o karaokê você
poderá explorar novos horizontes, se descobrir... - ele gesticulava. - mas eu não
quero cantar nisso.
-
Vamos fazer o seguinte. Eu canto primeiro para você ver como é fácil. Aí
depois é a sua vez. Tudo bem?
-
Whatever...
A Ló
escolheu a música Black or White do Michael
Jackson. Então ela começou a cantar, empolgada. Foi ela abrir a boca com a
primeira frase da canção, para os ouvidos do Zac latejarem. Caramba, como era
desafinada. A Ló não tinha o mínimo de ritmo e ginga. O seu timbre era dos
piores que o Zac já tinha ouvido. Ele arregalou os olhos e apertava-os a cada
agudo da garota. Parecia que ela arrastava os versos num chão com muito atrito.
Então,
finalmente, a música terminou.
-
E aí, o que achou? - ela perguntou, sorridente.
-
Nossa, foi... Foi muito... Carregado.
-
Carregado? - ela não entendeu.
-
É, carregado.
-
Carregado de quê?
-
De... De... De energia positiva - ele inventou.
-
Você achou mesmo? - ela sorriu.
-
Achei.
-
Então vem, agora você.
-
Ló, eu não tenho certeza...
-
Tudo bem, eu canto mais uma para você...
-
Não! - o Zac levantou correndo e pegou o microfone. - Pensando melhor, eu acho
que já estou preparado.
-
Que bom. Que música você quer?
-
Qualquer uma, vai.
-
Escolhe.
-
Escolhe você, Ló. Eu canto qualquer coisa. Tudo para você não ter que gastar
a sua energia positiva no microfone de novo - ele sorriu amarelo.
-
Oasis, com Don't go Away. Pode
ser?
-
Pode, vai. Coloca de uma vez.
Alguns
minutos depois...
-
Mas Ló, o que foi que eu fiz?
-
Você canta bem demais! Sai, sai, vamos! - ela gritava, brava. - Não quero mais
saber de você cantando no meu karaokê!
-
Mas Ló, eu...
-
Não, não quero saber! - ela o empurrava para fora da casa dela. - Que saco, só
para humilhar, né?! Escroto!
-
Mas eu não...
-
Só porque você já foi cantor e eu não! Seu cocô! Vamos, vamos, sai logo!
A Ló
o empurrou para fora e bateu a porta. O Zac ficou com a maior cara de tacho, não
entendendo nada. Então ela apareceu na porta mais uma vez e disse:
-
Chato!
E
bateu novamente.
-
Gee - o Zac sussurrou, assustado. - Que louca.
Voltou
para o seu carro rapidamente antes que ela aparecesse de novo e resolvesse socá-lo.
...
As
nuvens dos céus de Tulsa resolveram mudar um pouco os ares e decidiram mandar
chuva. Mas muita chuva. Daquelas grossas mesmo, barulhentas, que parecem ser
capazes de furar até o telhado da sua casa com seus pingos. Pingos? Verdadeiras
granadas.
O
Taylor brincava com os brincos de sóis que comprara para a Patty, sentado em
sua estante, pensativo. Olhou pela janela e não conseguiu ver nada. Espremeu os
olhos na tentativa de enxergar algo além do jardim da casa, mas não conseguiu.
A chuva estava densa, um pano cinza na vidraça de seu quarto.
Ouviu
a porta lá embaixo batendo. Era o Zac, chegando da casa da Ló. Tivera sorte,
pois a chuva começou a cair assim que este entrou no carro. Não precisou
molhar-se, pois a garagem dava direto para dentro da casa. Não vendo ninguém
ali pela sala, o Zac foi até a cozinha. Serviu-se de água e sentou na pia.
O
Isaac estava lendo em seu quarto. Era uma obra interessantíssima sobre a vida
dos esquimós e sua organização social.
O
telefone toca. Taylor atende:
-
Alo?
-
Hey
partner.
-
Oi, George. Nossa,
quanto tempo.
-
Pois é. Mas apareci.
-
Por que você embora cedo da reunião que eu fiz aqui em casa, aquele dia?
-
Minha avó ligou no celular, disse que não estava se sentindo bem.
-
Mas ela está melhor agora?
-
Está sim - o George respondeu. - Mas o que eu perdi?
-
Nada. Só a Yohanna que vomitou no meio da minha sala, o Zac chutou todo mundo
daqui na base do grito e a Gina que nos obrigou a limpar tudo até às cinco da
manhã.
-
Caramba. Ainda bem que eu não estava - o George riu.
-
É, não perdeu muita coisa mesmo.
-
Mas espera... Você convidou a Yohanna?
-
Na verdade, não. Ela e as outras seiscentas e vinte e quatro pessoas apareceram
sem serem convidadas - o Taylor exagerou.
-
Nossa. Eu temi que isso acontecesse. Sabe como é o povo de Tulsa, não é?
-
É, eu sei sim - o Taylor lamentou.
-
Bom, na verdade, eu só liguei para saber como você está. E para saber se você
não quer sair hoje.
-
Com essa chuva? Acho que não.
-
Você está bem? - o George perguntou, preocupado.
-
Estou. Por quê?
-
Você parece que está meio triste.
-
Não, já passa - o Tay sorriu.
-
Bom, eu tenho que ir.
-
Ok. Talk to you later.
-
Tchau - o George disse.
-
Tchau.
O
Taylor desligou o telefone. A chuva continuava forte lá fora. Levantou e foi até
a janela. Suspirou pensando na Patty e seu coração apertou com a saudade. Ele
gostava mesmo dela... E sorriu ao perceber isso mais uma vez naquele dia.
"Então é isso
que é gostar de alguém?"
- ele pensou. - "Ficar todo esse
tempo olhando para o nada, pensando na pessoa?" - riu sozinho.
Além
disso, o Taylor se sentia mais vulnerável. Sabia que qualquer coisinha poderia
lhe magoar. Morria de medo de ver a Patty com outro cara de novo e sentir mais
uma vez a dor que ele sentiu no dia do shopping. Ele não sabia se agüentaria
perder a Patty para o Eduardo e tê-la de ver todo o dia andando por aí de mãos
dadas com ele.
O
Zackito continuava com a sua água, sentado na pia, olhando para a chuva. Com o
copo nas mãos, girou-o e observou a água lá dentro rodar de maneira sincrônica.
Talvez estivesse na hora de ele começar a procurar alguém para gostar
também. Não tinha como não se inspirar com o Taylor andando todo apaixonado
pela casa. Dava vontade de ter um amor para si.
O Isaac parou de ler o livro um instante e olhou para o teto. Sorriu.