No dia seguinte, a Gina acordou mais cedo do que o normal. Arrumou a mesa na cozinha para a família, deixou tudo pronto. Walker e Diana desceram muito cedinho como de costume, tomaram seus cafés e deixaram a casa. Então a Gina tirou a mesa e pegou duas bandejas no armário, daquelas apropriadas para tomar-se café na cama: com pezinhos e alças. Distribuiu iogurte, pães, queijo e presunto, da maneira mais organizada possível no pequeno espaço. Por fim, foi até o jardim e apanhou duas margaridas, uma para cada bandeja. Encheu dois copinhos de água e colocou as flores em cada um deles.

            Pegou a primeira bandeja e subiu as escadas. Entrou no quarto do Zac, com todo o cuidado para não acordá-lo de repente. Afinal, se isso acontecesse, ele com certeza ficaria mal-humorado e não é o que a Gina queria.

            Aproximou-se da cama e com a característica delicadeza, a mulherzinha de tão pouca estatura passou a acariciar os cabelos do Zac, começando da testa e descendo para as longas e loiras madeixas.

- Zaquizinho, acorda, querido. A Gina trouxe café - ela sussurrava.

- Ãã, que...?

- Café na cama, Zac.

- Gina? - o Zac disse, abrindo os olhos.

- Bom dia, querido. Olha só o que a Gina fez para você.

            O Zac sorriu e sentou-se na cama. A Gina então segurou a bandeja na frente do Zac e disse, sorrindo:

- Vocês estão de castigo, mas isso não impede que eu os mime.

- Obrigado, Gina - o Zac sorriu sincero. - Eu acho que era bem isso que eu estava precisando. De mimo.

- Pode deixar que eu vou ficar encarregada desta parte, viu? Eu não quero ver você nem o Cumprido tristes pela casa.

            Sorrindo um pouco desanimado, o Zac virou seu olhar para baixo. Vendo a tristeza do garoto, a Gina colocou a bandeja um instante na escrivaninha e sentou-se ao lado dele.

- Meu espuletinha... - a Gina sorriu. - Você sempre vai ser o meu espuletinha. - O Zac sorriu grande. - Sempre o que arranjou confusão nesta casa.

- É... Mas acho que agora eu peguei pesado, Gina. Não sei se o Taylor vai me desculpar.

- Zac, desde que eu estou nesta casa, eu já vi você e o Taylor brigarem muitas vezes. Mas sabe quantas vezes eu vi vocês permanecerem brigados? Nunca. Foi assim a vida toda... Você provocava o Taylor até que ele se irritasse e fosse para cima de você. Aí, ao invés de bater nele, você ficava só se defendendo. Não tocava no Cumprido.

- Só você sabe disso, né Gina? Só você sabe que eu nunca teria coragem de encostar nele.

- Eu, ele, o Isaac... Todos nós sabemos disso, Zac - falou, deslizando os dedos pelo cabelo loiro. - Logo, logo vocês estarão batendo boca e rindo e brincando pela casa de novo.

            O Zac sorriu. E encostou a cabeça no ombro da Gina, de olhos fechados. Em anos estando com a família Hanson, a Gina nunca tinha visto aquilo. O Zac nunca tinha feito algo assim. Dos três, ele era o único que não ficava abraçado a ela o tempo todo, não ficava beijando e não pedia colo nas horas tristes. A atitude do Zac fez a Gina se emocionar.

- I hate that, you know? - o Zac desabafou. - Eu odeio essa situuação, esse clima ruim.

- Eu sei, querido... Eu também não gosto.

- Tudo por causa de um sonho cretino. Damn... Por que eu tinha que sonhar aquilo? Se eu não tivesse sonhado, eu nunca teria conversado aquelas coisas com o Ike e o Tay, e nós nunca teríamos discutido.

- Mas tudo vai passar, querido. E tudo vai ficar bem.

- Eu espero.

            A Gina ficou ali com o Zac, fazendo cafuné no cabelo dele, até que ouviu a barriga do menino roncar. Eles riram e a Gina levantou pegar a bandeja para ele poder comer um pouco. Então deixou o quarto, descendo para pegar a segunda bandeja. A parada agora era o quarto do Taylor.

            Entrou no quarto do Cumprido com a mesma estratégia que usou para o quarto do Zac: devagar para não acordá-lo com antecipação. A Gina olhou para o Taylor e levou a mão ao peito, sentindo um aperto no coração: ele dormia com a mesma roupa do dia anterior, sobre os lençóis, o que queria dizer que ele havia passado horas chateado com as brigas com o Zac. Se a Gina conhecia bem o seu Cumprido, ele deveria ter atravessado a noite em frente à janela pensando sobre tudo o que aconteceu.

            E pensando nisso, a Gina deixou a bandeja de café na escrivaninha e saiu, fechando a porta de maneira delicada.

 

...

 

            Era quase meio-dia. A Patty estava em casa agoniada com o que havia acontecido dia anterior, com as meninas atrás dela. Ela só queria o seu namorado por perto naquele momento. Pegou o telefone e discou os números do celular do Taylor. E este, que continuava dormindo, abriu os olhos devagar assim que ouviu aquele toque parecido com um grilinho que ele mesmo programou. Acordou devagarzinho e apanhou o telefone em seu criado-mudo. Antes de atender, reparou na bandeja de café sobre sua escrivaninha e sorriu, já sabendo que era coisa da Gina.

- Alo?

- Tay, oi, é a Patty.

- Hey honey. How are you? - coçando os olhos.

- Você estava dormindo? Me desculpe, eu...

- Imagina, Pá. Eu já ia acordar mesmo. Está tarde, eu não posso ficar dormindo muito.

- Bom, então... Assim que você acordar direitinho, se trocar... Será que você podia passar aqui?

- Claro. - Então lembrou-se do dito castigo. - Ai, merda... Patty, eu não vou poder te ver.

- Por quê? - chateada.

- Porque ontem eu e o Zac brigamos feio e o nosso pai colocou a gente de castigo.

- Castigo? Nossa, mas não é muita coisa por só uma briga?

- Não, é que... Bom... A briga foi meio feia e o meu pai ficou realmente puto.

- Mas por que vocês brigaram?

- Ahm... Bom, é, você sabe como é o Zac, não é? A gente começou discutindo por uma idiotice e eu acabei me irritando com ele e o negócio foi ficando mais sério e... Só sei que no final, a gente estava se pegando na porrada. Meu pai chegou, deu uma puta bronca na gente e, quando eu vi, estávamos de castigo.

- Puxa, Tay... Eu não sabia. Como está o Zac?

- Não sei. Eu não falei com ele ainda.

- Desde a briga?

- Desde a briga.

- Você continua bravo com ele?

            O Taylor pensou um minuto e respondeu:

- É, eu acho que sim.

- Nossa, mas quando vocês brigam, você sempre esquece logo, Tay. Não fica guardando rancor.

- O Zac exagerou dessa vez.

- Ele não se desculpou ainda?

- Não e duvido que faça isso.

- Se ele estiver arrependido, é claro que ele vai pedir, Tay.

- O Zac não pede desculpas, Patty. Por mais que ele queira. Ele não sabe pedir desculpas.

- Fala com ele então, Tay.

- Não.

- Fala, Tay. O Zac ama você.

- Eu acho que eu não quero falar com ele, Patty.

- Você vai ficar sem falar com ele até quando, Taylor?

- Não tem clima para falar com o Zac ainda.

            Dava para ver na voz do Taylor o quanto ele estava triste com o que tinha acontecido.

- Logo as coisas vão se resolver, você vai ver - a Patty disse otimista.

- O clima aqui em casa está horrível, sabia?

- Eu imagino... Para você não querer falar com o Zac, a briga deve ter sido feia mesmo.

- Eu queria que você estivesse aqui comigo.

            Aquilo cortou o coração da Patty. Nossa, tudo o que ela mais quis naquele momento era estar abraçadinha ao Taylor em um lugar bem confortável e silencioso, só os dois, sem nenhuma garota chata ou castigos ou pais para atrapalhar. Lembrou-se então do cheirinho do Taylor. Aquele cheiro completamente masculino de loção pós-barba. Às vezes, quando ele se arrumava para sair com a Patty em algum lugar especial, assim que ele chegava perto da namorada, ela sentia o perfume cujo cheiro ela tanto amava: Polo, da Ralph Lauren.

- Ai, Taylor... Não faz isso. Eu estou morrendo de saudades de você.

- I miss you too, baby.

- Será que amanhã a gente pode se ver?

- Não dá, Patty - ele disse com voz de quem ia chorar de tristeza. - Eu queria muito, mas o meu pai me proibiu.

- De me ver? Mas o que eu tenho a ver com a sua briga com o Zac?

- Pois é, nada. E o meu pai até disse isso, mas ele quer que por uns dias eu fique em casa sem ver você nem ninguém, refletindo sobre o que eu fiz.

- Mas Tay... Eu preciso muito de você agora.

- Eu sei, Pá. E eu preciso de você o tempo todo. Mas eu não posso desobedecer o meu pai.

            Silêncio.

- Aconteceu alguma coisa que você não me contou, Patty?

- Não, Tay, não é nada.

- Fala, Patty. Eu sou seu namorado. Se aconteceu alguma coisa com você, eu preciso saber.

- Eu sei que sim, mas está tudo bem.

- Mais alguma menina te fez alguma coisa?

            Silêncio.

- Fala, Patty.

            A Patty sabia o quanto o Taylor ficava preocupado sobre a perseguição constante das meninas da cidade em relação à ela. Ela não queria lhe dar mais uma coisa para se preocupar.

- Sério, Tay, está tudo bem.

- Porque você sabe que se acontecer mais alguma coisa como a que aconteceu no The SS, você tem que me contar. Sabe, não sabe, Pá?

- Sei sim, honey - ela respondeu, sorrindo, encantada coom a preocupação dele.

- Ok. So...

- Vai se trocar, comer alguma coisa... Fica bem bonitinho aí.

- Mas a gente não vai poder se ver.

- Eu sei... Mas ah, fica bonitinho e fica pensando em mim.

            Ele riu.

- Ok. I will.

- Então se troca, acorda direitinho... E fica bem, tá?

- Te amo muito, sabia?

- Eu também. E não é pouca coisa, não.

- Se cuida.

- Você também.

- Beijo.

- Outro. Tchau.

            A Patty desligou o telefone sorrindo, mas com aquela saudadinha incomodando dentro dela. Ela realmente amava muito aquele menino e começava a achar que apanhar de vez em quando e ser perseguida pelas fãs do Taylor Hanson até valia a pena desde que o Taylor estivesse ao lado dela.

 

...

 

            Horas mais tarde, o Taylor decidiu que era hora de deixar um pouco as quatro paredes de seu quarto. Abriu a porta e observou o corredor e os inúmeros quadros e porta-retratos das mesas de mármore como se fosse a primeira vez. Ah, a sua família... Apesar das brigas, das diferenças, das discussões, o Taylor pensava que a família dele era a mais perfeita do universo. Amava a maneira com que ele e seus irmão foram criados, amava a maneira com que seus pais lhes ensinavam as coisas da vida, amava até mesmo a maneira como eram punidos. Tudo lhe parecia correto.

            Porém, agora sentia-se receoso, pois não sabia como reagir assim que se encontrasse com qualquer pessoa dali. Especialmente o Zac. Ainda não queria falar com o irmão, mas sabia que era o tipo de situação inevitável. A casa que era tão grande, nessas horas tornava-se tão pequena.

            Desceu as escadas lentamente, pois sabia que a qualquer momento alguém apareceria. Estava tudo muito silencioso. Assim que pisou o último degrau, pode ver a família toda sentada na sala, com as crianças no tapete montando e inventando verdadeiras esculturas com seus Legos.

            Ainda não o haviam visto ali. Para ser notado, Taylor disse, sem jeito:

- Hey guys...

            Todos o olharam sérios. Por alguns segundos, ficou uma tensão no ar. Mas foi logo quebrada por Avery, que correu abraçar o irmão com todo o carinho e preocupação que uma criança poderia demonstrar.

- Vem cá, filho - o Walker convidou.

            Nada havia mudado. O afeto nas palavras do pai deixou isso bem claro. O Taylor aliviou sua tensão e toda a vulnerabilidade momentânea o fez sentir-se pequeno de novo. Foi até o sofá, sentando-se entre Walker e Diana. A mãe logo o abraçou, deitando o filho em seu colo, como se estivesse morrendo de saudades. A família Hanson era incrivelmente unida. Durante o crescimento de cada ser humano ali dentro, união e respeito pelo próximo foram as palavras mais ensinadas e cravadas nas personalidades deles.

            Não demorou muito, o Isaac chegou. Havia saído para comprar umas coisas que a Gina tinha pedido e se espantou ao ver aquele quadro familiar.

- Nossa... Será que entrei na casa da família Leery, o meu nome é Dawson e eu não estou me lembrando?

            Todos sorriram.

- Trouxe o temperinho, querido? - a Diana perguntou.

- Mas é lógico. Já está lá com a Dona Gina.

- Obrigada.

- Logo o jantar vai sair - o Walker falou, como se avisasse a todos.

- E o Zac? - o Isaac perguntou.

            Silêncio.

- Nossa, eu disse alguma coisa que não devia?

- Não, Ike, imagine - a Diana sorriu. - É só que... Nós não vimos o Zac ainda. Ele não saiu do quarto o dia todo.

- Desde que ele acordou, ele não desceu?

- Exatamente.

- Mas ele não desceu nem pra almoçar? - o Isaac perguntou, preocupado. - Hoje tinha salmão. Ele adora salmão.

- Deixa ele, Isaac - a Diana pediu. - Quando ele sentir que deve, ele vai descer.

- Eu vou lá chamá-lo - disse, já indo.

- Isaac - o Walker chamou, com a voz firme. O Isaac parou. - Deixa o Zac. Você sabe como ele é. Se ele não saiu do quarto é porque ele ainda não quer ver ninguém.

- Mas ele precisa comer.

- A Gina levou para ele o café e o almoço - a Jessica disse.

- Vocês não estão isolando o Zac ou alguma coisa assim, não é?

- Isaac, é claro que não - a Diana respondeu.

- Você já viu nós fazermos este tipo de coisa com algum dos nossos filhos? - o Walker disse.

- Calma, calma, galera. Eu só perguntei - o Isaac disse. Pausa. - Mais tarde eu acho que vou tentar falar com ele.

- Eu tentei entrar para conversar com ele, convidar para jogar videogame, - o Mackenzie disse. - mas ele não quis jogar comigo. Disse que depois.

            O Taylor permanecia no colo da mãe sem dizer uma palavra.

- Bom, eu vou trocar de roupa. Vou ter que dar uma passada na casa do George para conversar umas coisas e depois eu vou passar no The SS. Tay, quer ir junto?

- Não, o Taylor não quer - o Walker respondeu por ele. - O Taylor continua de castigo.

            Isaac olhou para o Cumprido. Este levantou as sobrancelhas e deu de ombros, como quem diz "fazer o que, não é?", tirando um sorriso de solidariedade do irmão mais velho.

- Você volta para o jantar, querido? - a Diana perguntou.

- Não sei, mãe. Acho que sim - o Ike disse, antes de subir as escadas correndo.

- Que saudade da época em que eu era livre... - o Taylor resmungou, fazendo sua mãe rir.

            No caminho para o seu quarto, o Isaac passou pelo do Zac. E colocou o ouvido na porta para tentar escutar o que se passava lá dentro. O segundo cd do Matchbox 20 tocava baixinho, mais especificamente a música If you're gone. E junto do som da melodia, podia-se ouvir ainda uns barulhos de papel, algo como folhas sendo remexidas.

"Será que o Zac está lendo?", o Isaac pensou.

            Pensou em bater. Hesitou. Então desistiu. Suspirou, chateado pela situação toda, e continuou andando na direção de seu quarto.

 

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