Alguns dias mais tarde, a cidade começava a sentir os efeitos do término
do namoro mais comentado entre o povo de Tulsa.
Jordan Taylor Hanson não saía mais de casa para farrear, nem para
passear de carro pelos bairros mais freqüentados. Conseqüentemente, seus irmãos
também não, pois não sentiam-se estimulados a fazer bagunça por aí vendo o
Taylor na fossa daquele jeito. Além disso, não havia ânimo para se divertir
numa cidade, a qual tinha provocado tantos acontecimentos ruins na vida do
Cumprido, com direito a toques de crueldade e tudo.
E nessas de não querer sair mais é que o Isaac, o Taylor e o Zac
fizeram, sem querer, a cidade parar. Isso mesmo, parou. Sabendo que os irmãos
Hanson não saíam mais, a parcela feminina adolescente não via motivo algum
para sair à noite.
Grande parte das fanáticas pelo Taylor até iam ao The SS vez ou
outra, na torcida de encontrar com ele em alguma noite dessas, mas tudo em vão.
Ele não queria sair. As fãs do Zac persistiam em ir ao parque de sempre pela
manhã para vê-lo correr, mas ele agora corria em um local diferente todo dia.
Não era mais tão fácil topar com o Zac. E acreditem, ficar invisível era com
ele mesmo. O Isaac aparecia no seu bar apenas à tarde para cuidar dos assuntos
que pediam sua presença. À noite, todas as responsabilidades ele havia
depositado nas mãos do George. Era ele quem mandava nos funcionários e em toda
a estrutura durante o funcionamento do estabelecimento.
Se Tulsa costumava ser parada, agora ela estava em um constante estado de
inércia: precisava de uma força muito ninja para tirá-la do lugar.
Já a Patrícia, nunca mais tinham sequer ouvido falar dela. Nem o Taylor
tivera notícias da Futemminha. Não que ele não tentasse. Quase todos os dias
ele ligava uma, duas, três vezes para a casa dos Futemma para tentar conversar
com a ex-namorada. Mas ela sempre pedia para a sua mãe Maria dizer que ela não
estava em casa ou que estava ocupada. Ao invés de triste, o Taylor ficava puto.
Segurava-se para não arremessar o telefone a anos-luz de quilômetros de jardas
de distância.
Numa tarde, dez dias depois, o Taylor pegou as chaves do carro de seu pai
e foi até a casa de telhado azul. No caminho, ligou para o Zac do celular para
explicar algumas coisas e para pedir um favor. Ligação feita, o Taylor
estacionou mais para a frente do portão para não ser visto e apertou o botão
do porteiro eletrônico.
-
Alo? - a Patty atendeu.
O Taylor não disse nada.
-
Alo? - ela repetiu.
Ele voltou a ficar quieto.
-
Alo?!
Silêncio. Então a Patty desligou. O Taylor apertou mais uma vez e ela
voltou a atender:
-
Alo? - Silêncio. - Quem está aí? Alo? - Sem resposta. O Taylor não dizia uma
palavra.
A Patty desligou. E o Cumprido apertou mais uma vez o botão do
interfone.
-
Olha aqui, eu não estou no humor para brincadeiras, então por favor, dá pra
você parar com isso?! - sua voz saiu nervosa no aparelho. - Se for alguma
garota, eu já terminei com o Taylor! Agora me deixa em paz! - Silêncio. - Vai
falar ou não? - Vendo que não, ela desligou mais uma vez.
Incansável, o Taylor repetiu a ação. Desta vez, ninguém atendeu. Não
demorou muito, ouviu-se o barulho do portão de madeira maciça sendo aberto à
chaves.
-
Vamos ver quem é o crianção! - a Patty já chegou falando, mas calou-se e
arregalou os olhos ao ver quem era.
- Só
assim pra você falar comigo - o Taylor disse. A Patty continuava em silêncio.
- Desculpe ter feito isso, mas se eu disssesse que era eu, você não iria falar
comigo.
-
Eu... Eu iria sim.
-
Você tem fugido de mim a uma semana e meia, Patty. Se eu dissesse que era eu,
provavelmente você diria que está "ocupada", ou que está "no
banho", ou que "agora não pode falar"...
A Patty olhou para baixo envergonhada enquanto o ex-namorado numerava
todas as desculpas que a Futemminha pedira para sua mãe Maria dizer toda vez
que o Taylor ligava.
-
Será que a gente pode conversar? - o Taylor perguntou.
-
Quer entrar?
- Não.
Eu prefiro ir para outro lugar.
-
Tay, olha, eu não queria sair em público com você de novo.
-
Eu sabia que você não ia querer e já pensei nisso. O Zac está com o meu
carro e está passeando pelos pontos da cidade em que... Bom, você sabe.
- O
ponto em que as garotas ficam esperando você ou um dos seus irmão passarem.
-
É... Provavelmente deve ter um monte de gente sabendo que eu estou dando umas
voltas de carro por Tulsa. Mas não sou eu, é o Zac. Eu falei para ele não
abrir o vidro que nunca vão saber que não sou eu quem está lá dentro.
A Patty pensou um minuto.
- E
eu estou com o carro do meu pai - o Taylor completou. - Não tem perigo, Patty.
-
Vamos então.
Avisou que estava saindo, fechou o portão e junto do Taylor, a Patty
entrou no veículo. Durante o percurso, ninguém falava.
- E
como você está? - ela quis saber.
-
Em que sentido?
-
Ah, tudo. Como você está em relação a tudo.
-
Do mesmo jeito que você - o Taylor respondeu, sério, sem olhá-la nos olhos,
atento ao trânsito.
A Patrícia sabia do que ele estava falando.
Então o observou dirigir e lembrou do quanto aquele garoto fazia falta
na vida dela. Usando o seu babylook preto e calça jeans, o Taylor estava
simples, mas tão lindo quanto se estivesse incrivelmente produzido. E a
Futemminha sabia o quanto a beleza do Cumprido mexia com ela. Não estamos
falando aqui apenas da beleza física. É uma beleza única... A beleza do
Taylor. O sorriso dele, o jeito de ele se preocupar com o bem-estar das pessoas
que ele gostava, a educação com que ele tratava todos os seres vivos ao seu
alcance... Ou até as pequenas coisas: o jeito que ele protegia seus olhos azuis
do sol porque "ardiam em contato com luz forte", como ele mesmo dizia,
aquele negócio de ele falar junto com os irmãos, mas sem fazer sons, o
jeitinho de ele coçar o nariz quando tentava explicar algo, as covinhas que se
formavam ao lado da boca assim que o Cumprido abria um sorriso, a mania dele de
falar difícil, a cara de perdido despontando no rosto do Taylor assim que uma dúvida
nascia em sua mente, a magreza saradinha tão orgulhosamente conquistada por ele
com a ajuda dos aparelhos de academia, os pelinhos loiros da perna dele que a
Patty adorava brincar, a insistência incrivelmente insistente que o Jordan
carregaria sempre com ele.
Novamente o silêncio. O Taylor jogou os cabelos para trás de qualquer
jeito e suspirou. A Patty sorriu, reparando, e disse:
- O
seu cabelo continua te incomodando?
Pela primeira vez no dia, o Taylor olhou-a desarmado e abriu um sorriso.
- O
meu cabelo vai sempre me incomodar - respondeu.
Não querendo entrar em conversas felizes para evitar que o clima
estamos-bem-de-novo rolasse, a Patty sorriu e ficou quieta.
Cuidando para não ser visto, o Taylor entrou no estacionamento do...
- The
SS? - a Patty questionou. - O que a gente vai fazer aqui?
-
Conversar. Não tem ninguém aqui nesse horário e eu queria ficar sozinho com
você em um lugar que você não pudesse fugir de mim - o Taylor respondeu, sério.
Entraram. Era estranho ver o lugar vazio daquele jeito. Sem ninguém, nem
o pessoal da limpeza, nem o George falando alto enquanto o Isaac tenta
trabalhar, nem a Isadora arrumando as coisas no bar. Ninguém, nem uma alma
penada. A decoração toda em branco e o teto de vidro deixavam o lugar de dia tão
bonito quanto à noite, com uma claridade forte, a qual deixava o local ainda
mais confortável.
-
Vem - o Taylor a convidou. - Quer alguma coisa? - ele olhava dentro da geladeira
do bar. - Eu não sou tão bom quanto a Isadora, mas eu acho que posso
preparar... vamos ver... Um copo d'água?
- Não,
Tay, obrigada - ela sorriu, sentando-se no sofá branco de veludo. - Eu só
quero conversar com você e voltar logo para casa.
Um pouco chateado, o Taylor foi até o sofá. Tirou os sapatos e sentou
de frente para a Patrícia, com um dos pés sobre o veludo. Encarou-a um minuto
e disse:
-
Eu sinto a sua falta.
A Patty olhou para baixo e ficou em silêncio por alguns segundos.
Segundos estes que quase mataram o Taylor de angústia. Ela suspirou e falou,
finalmente:
-
Eu também sinto.
-
Então volta a ser minha namorada.
-
Taylor, é complicado...
-
Por quê?
-
Porque eu quero a minha vidinha normal de volta. Eu não quero ficar conhecida,
eu não quero ninguém me perseguindo o tempo todo... Eu quero ficar bem, só
isso.
-
Comigo você não estava bem?
Triste, a Patty o encarou por um segundo. Então respondeu, hesitando:
-
Eu acho que não. - Pausa. - Quer dizer, eu estava, mas não estava. Eu amava
estar com você, mas assim que nós nos afastávamos, eu voltava a temer todos
em volta de mim. Era como se eu estivesse sonhando. Você era a parte boa,
aquela que durava pouquinho. E as garotas eram a parte ruim, a realidade, que
ficavam com todo o restante do meu tempo.
-
Você ainda gosta de mim?
- Lógico.
-
Então volta comigo. Você não pode desistir da gente agora.
-
Eu já desisti, Tay.
-
Mas que merda, Patrícia! - o Taylor se exaltou. Levantando do sofá. - A gente
estava feliz!
-
De que parte da nossa felicidade você está falando? - ela ficou séria. -
Taylor, eu apanhei! Você por acaso está esquecendo disso?
-
Parece que você está fugindo do problema ao invés de tentar resolvê-lo!
- A
gente já discutiu isso. Será que você não vê que não tem o que fazer?
-
Claro que tem! Tudo tem uma solução!
- E
o que você sugere?
-
Eu... Eu não sei! - ele gesticulou. - Mas terminar não me parece a solução
perfeita.
-
Por que você está tão bravo?
O Taylor pensou um minuto, olhando para ela.
-
Porque... Porque eu sei que você gosta de mim e está se afastando por puro
medo. Dá a impressão que o quê você sente por mim, por mais forte que seja,
não vale as dificuldades que você tem que passar para ficar comigo. E isso me
faz pensar que... Que você é fraca.
Silêncio. A Patty fitou-o chateada e disse:
-
Taylor, o que você esperava? Que eu enfrentasse meia cidade por amar você e
que, no fim, nós nos casaríamos apaixonados, comigo em uma cadeira de rodas,
paraplégica de tanto apanhar? Eu não sou uma heroína!
- Não!
Eu só queria que você resistisse mais, mostrasse mais que você me ama e não
quer me perder assim, tão fácil!
- Fácil?
Taylor, não está sendo fácil pra mim!
-
Pois não é o que você está demonstrando.
-
Por que você acha que eu fugi tanto de você? Hein? Porque eu não quero ficar
te vendo o tempo todo para ficar relembrando o quanto você é importante para
mim e o quanto eu gosto de você!
-
Você foge de mim, foge do nosso namoro, foge das garotas! Do que mais você
foge? Hein?
-
Taylor, não fala assim... - a Patty pediu, chateada.
-
Você foge o tempo todo e não resolve nada!
-
Mas não tem como resolver isso tudo!
-
Se você tivesse feito tudo diferente desde o começo, teria como resolver
agora!
-
Tay, eu quis te poupar de sofrer! Eu fiz isso pensando em você!
-
Pois fez errado! - ele gritou. - O que adianta ter me poupado antes, se você
está me causando uma dor sete mil vezes maior agora?
-
Eu também estou magoada!
-
Isso tudo poderia não ter acontecido se você tivesse me contado e me deixado
participar desde o princípio.
-
Que diferença iria fazer, caramba? - ela questionou em um alto tom de voz.
-
Toda a diferença! Nós estaríamos mais unidos, eu estaria do seu lado te
protegendo... Meu Deus, nós éramos namorados! Você não podia ter escondido
de mim o que estava acontecendo com você!
-
Eu fiz tudo errado, pode até ser verdade. Mas eu fiz pensando em você!
-
Se você estivesse com uma doença grave, por acaso eu só ia ficar sabendo no
dia em que te encontrasse morta?
- Não
fala besteira...
-
Ou se o Eduardo começasse a te ligar de novo, eu também só saberia no dia em
que eu topasse com vocês dois no shopping, conversando de mãos dadas?
-
Eu nunca faria uma coisa dessas, Taylor!
-
Como não, se você fez?! Você omitiu, guardou tudo sozinha por um ano e depois
que se encheu, explodiu e jogou a pólvora na minha cara, deixando EU machucado!
Eu fiquei sabendo que você não estava bem porque eu fui na sua casa para te
ver e dei de cara com você toda estourada! Chego lá, você começa a gritar
comigo dizendo que a sua vida tinha virado um inferno depois que eu apareci e
termina o namoro comigo. Você acha isso justo?
- Não
se trata de justiça. Eu não iria agüentar ficar do seu lado pagando um preço
tão alto. Sabendo você de tudo ou não.
Puto da cara, o Taylor a olhava. Sua sobrancelhas apontadas para baixo e
próximas aos olhos enfatizavam ainda mais sua revolta. Ele disse:
-
Então pra você é bem mais cômodo namorar alguém "normal", como
você diz, do que lutar pelo o que você quer e passar por alguns obstáculos.
Você quer tudo certinho, sem dificuldades, como num manual. É isso?
Entre suspiros chateados, a Patrícia respondeu:
-
É, eu acho que é isso sim.
O Taylor então finalmente entendeu de que manual seu pai falava cada vez
que perguntava como estava indo o namoro do filho com a Futemminha.
Ele encarou o chão uma vez e encarou os olhos puxados da Patty a seguir.
Levantou, apanhou suas chaves e disse:
-
Talvez terminar tenha sido mesmo uma boa. - Colocou os óculos na cabeça, entre
os cabelos. - Porque o "normal" é algo que eu nunca vou poder te
oferecer, Patty. - Pausa. - Eu não quero passar nenhuma parte da minha vida com
alguém que segue a porra do manual o tempo todo.
E saiu. Sem hesitar, o Taylor deixou o The SS e a Patty lá
dentro, chorando triste, sozinha. No caminho, apanhou seu celular e discou os números
do telefone do Isaac.
-
Alo?
- Ike, é o Tay. Será que você podia fazer um favor para mim? Passa no The SS e leva a Patty para casa. Eu quem deveria fazer isso, mas no momento eu não quero nem olhar para ela.
Capítulo
38 / Índice / Capítulo
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