Um mês depois, a Isadora ganhou na justiça o direito de ter seu filho morando com ela. E o pai estava autorizado judicialmente a ver o menino quando achasse que devia. O Isaac disse que não poderia acompanha-la ao julgamento final, mas que estaria torcendo por ela. Estava ansioso para saber o que o juiz havia decidido. Preferiu não acompanhar o processo tão de perto, pois não queria se envolver tanto, já que ele e sua funcionária não tinham mais nada um com o outro. E só uma semana após o veredicto, a Isadora apareceu no trabalho. E estava toda feliz.

- E aí, Isadora? Como foi? - o Isaac já a parou com perguntas.

- Eu... Eu ganhei!

            Aí os dois se abraçaram, empolgados. O Isaac ficou super feliz, pois sabia o quanto era importante para ela ter seu filho morando com ela.

- Eu nem acredito, sabia? - a Isadora disse.

- Eu imagino... - ele sorriu. - Agora a sua vida vai mudar totalmente.

- Vai mesmo... Ainda mais com o casamento.

- Casamento? - o Isaac não entendeu.

- Eu não te contei? Eu e o Jack nos acertamos. Nós vamos morar juntos.

- Desculpe, eu acho que entendi errado... O que você acabou de dizer?

- Que eu e o pai do Joshua vamos nos casar.

            O Isaac não disse nada. Pudera, ia falar o quê? Sorriu meio amarelo, decepcionado com a atitude besta da barwoman e lembrou-se das palavras dela ao descrever o pai do Joshua sempre que ia falar dele: "Ele é mais velho, mas é um bosta. Filhinho de papai em plenos 30 anos de idade. Eu sei o que você deve estar pensando... Como eu me apaixonei por um cara assim? Eu era uma idiota. Me encantei".

Ainda bem que ela era uma idiota, não é..., o Isaac pensou.

            Veio-lhe à cabeça a entrega do prêmio Framboesa. Disparado, vencendo a Isadora.

- Você tem certeza disso? - o Isaac quis saber.

- Acho que eu tenho sim. Vai ser o melhor para o nosso filho.

- Bom, de “meu filho” passou para “nosso filho”. Realmente é um progresso - o Isaac disse. - Acho que você deve esstar certa do que está fazendo.

- Obrigada, Isaac. Eu não sei o que eu faria sem você.

Eu sei. Ia arranjar outro trouxa pra pagar advogado pra você, o Isaac pensou, nervoso. E disse:

- Imagine, Isadora.

            É lógico que ele ficou puto da cara com essas histórias. O que mais o irritou foi a folga da Isadora. O Isaac pagou uma fortuna para ela investir nos melhores advogados para, no fim, ela fazer as pazes com o tal do Jack, que do nada, mudou de personalidade. Era como se o Isaac tivesse comprado um final feliz para a vida da Isadora. Se esse tal de Jack era tão rico, podia então pelo menos devolver o dinheiro para ele. Não que fosse fazer falta, por uma questão de consideração mesmo. Mas do jeito que o Isaac andava meio revoltado com mulher, ele achou melhor não dar tanta importância para o fato...

- Ike, você é uma pessoa maravilhosa. Eu nem acredito no quanto você me ajudou. Eu sou muito grata.

- Tudo bem, Isadora. Não precisa agradecer - ele disse. “Só precisa me pagar”, o Isaac pensou.

- O Jack se surpreendeu com o tanto que você me ajudou. Ele mandou um abraço para você de agradecimento - ela sorriu. - O Jack já comprou um apartamento para gente recomeçar a nossa vida. O pai dele nos deu de presente. Eu sinto que agora vai dar certo. Quer dizer...

- Isadora, eu estou muito feliz por você, mas... - o Isaac interrompeu. - Eu preciso perguntar isso.

- Pergunte.

- Ele não era um bosta? O que aconteceu?

            A Isadora ficou quieta e fechou a cara. Respondeu:

- Eu acho que isso sou eu quem decido.

- Claro, sem dúvida alguma. Tanto que foi você mesma que me disse que ele era um bosta, filhinho de papai.

- Isaac, você está sendo grosseiro.

- Eu estou? Mas foi só uma pergunta.

- Uma pergunta indiscreta.

- Tudo bem, era mais uma curiosidade mesmo... Eu queria saber o truque do Jack de como mudar de “bosta filhinho de papai” para pai perfeito. O cara deve ser ninja mesmo.

            A Isadora ficou puta porque sabia que o Isaac estava certo. Para o Isaac, a verdade era que a Isadora tinha levado um baita chute na bunda do tal do Jack e mesmo depois de anos, continuou apaixonada por ele. Ou isso, ou ela era muito masoquista de querer voltar com um cara tão horrível como ela sempre o descrevera.

            Passado isso, o ritmo de trabalho voltou ao normal. No começo foi complicado agüentar a Isadora contando o tempo todo o quanto o Jack era maravilhoso, o quanto o Jack era incrível, o quanto o Jack era isso, o quanto o Jack era aquilo... Blá blá blá. Em resumo, a Isadora tinha virado um porre.

            Uns dias mais tarde, ela apareceu no The SS querendo conversar com o Isaac. Sentaram-se na mesa dele:

- Ike, eu estou aqui para pedir demissão.

- Demissão? Mas Isadora, você é a melhor barwoman. Eu preciso de você aqui.

- Eu já pensei nisso. E já arranjei alguém para me substituir. É um amigo, o Allan. Ele é tão bom quanto eu.

- Mas por que você está indo embora?

- Isso vai soar meio esnobe, mas... O Jack disse que eu não preciso mais trabalhar, Ike. A gente tem dinheiro e... E eu quero cuidar do meu filho. Ele é o mais importante para mim neste momento da minha vida.

- Eu entendo. Quer dizer, você lutou tanto por isso... Deve estar querendo aproveitar.

- É, estou sim - ela sorriu. - Ah, eu já estava esquecendo.

            A Isadora abriu a bolsa e fuçou lá dentro. Tirou então um cheque e entregou ao Isaac.

- Isso deve cobrir tudo o que você gastou comigo. Eu nunca vou saber como te agradecer. Obrigada de verdade, Ike.

            Nossa, o Isaac se sentiu péssimo por ter pensado tantas coisas ruins dela. Não sabia nem o que dizer. Até em não aceitar o cheque ele pensou, mas dinheiro não era a questão principal porque, pelo jeito, estava sobrando para ela. A Isadora queria mesmo era agradecer pela atenção que o Isaac dedicou a ela esse tempo todo. E se ele negasse o cheque, com certeza estaria a ofendendo.

- Você foi a única pessoa que até hoje se importou de verdade com o meu problema. E me ajudou. Eu acho que nunca vou conseguir te dizer o quanto isso significou para mim.

            Ele sorriu. E disse:

- Você vai ficar bem?

- Eu sei que deve estar parecendo que virei uma submissa, que o Jack agora manda em mim...

Realmente, o Isaac pensou.

- ...e que vou ser só uma dona de casa sem personalidade. Mas a verdade é que... Eu estou precisando ser cuidada. Eu quero sentir que tem alguém me protegendo e tomando as decisões mais difíceis por mim. Eu posso até parecer corajosa, mas acredite, ser valente o tempo todo cansa. Acho que estava na hora de eu ter uma vida mais... Tranqüila - ela sorriu. - Eu quero ficar em casa, eu quero deixar a minha vida na mão do Jack, eu quero cuidar da minha família. Eu quero isso. Por isso, a resposta para a sua pergunta é sim, eu vou ficar ótima.

            O Isaac a abraçou e lhe desejou boa sorte.

            Quando a Isadora foi se despedir do pessoal do The SS, apenas o George lamentou porque ninguém mais a agüentava por lá por causa das histórias de Jack pra cá e Jack pra lá. Observando a Isadora pegar suas coisas e dar tchau para o pessoal, o Isaac foi o único que realmente entendeu: a Isadora estava feliz. Pela primeira vez na vida dela, estava feliz de verdade. E não teve medo do que iam pensar, mudou toda o seu estilo de vida, jogou tudo para o alto e foi viver da maneira que ela achou ser o melhor para si. Quando ela se agachou para amarrar suas botinas, o Isaac sorriu... Tinha certeza de que, se um dia ela se enchesse, chutava o tal do Jack e voltava a viver do jeito antigo. Definitivamente, a Isadora era alguém para se admirar. Porque ela ia atrás do que ela queria.

 

            Já no mês seguinte, o Zac e a Lynne pararam de ficar. Não estava dando muito certo porque as brigas que eram freqüentes tornaram-se constantes. E tinha mais stress do que alegria. Ficaram como amigos uma semana exatamente.

            No oitavo dia, após terem decidido que amizade era o que prevaleceria, o Zac convidou a Ló para acompanha-lo a pagar umas contas no banco que a Diana tinha pedido. O Zackito odiava esse tipo de coisa, então chamou a Lynne para compartilhar a chatice com ele.

            Chegando no banco, o Zac foi direto para a fila, que estava enorme. A Ló se manifestou:

- Zachary, você não sabe pagar por débito automático?

- Sei, mas eu não quero.

- Como assim, não quer?

- Não quero.

- Olha o tamanho dessa fila, Zachary. A gente vai sair daqui só amanhã. Paga no caixa automático que o pagamento sai direto da conta da sua mãe. Não precisa nem ficar manuseando dinheiro.

- Não quero.

- Você prefere ficar nessa fila? A gente vai ficar horas parado aqui - ela dizia, indignada.

- Você está com pressa?

- Não é questão de pressa, Zachary. É questão de praticidade.

- A conta pra pagar é sua ou é minha? Minha. Então fica quieta.

- Ai, Zachary! Às vezes você parece uma mula de tão empacado que é - a Ló reclamou.

- Com licença, mas a Mala Sem Alça acabou de me chamar de mula?

- O difícil de carregar aqui é você. Você é que é mala.

- Ótimo, Alynne Lóide. Você já conseguiu me irritar. Agora cala a boca.

- Tá na boca, chupa.

- Você anda bem mal-criada, sabia?

- Você ainda não viu nada.

- Que agressividade - disse, cínico.

- Com você, Zachary, tem que ser na base do coice.

            Então, aquela sábia voz rouquinha:

- Um casal tão bonito, brigando desse jeito... Que tristeza.

            O Zac e a Ló olharam para ver de quem se tratava. Era uma senhora de idade, de cabelinho grisalho e vestido amarelo de bolinhas pretas. Ela estava atrás deles na fila e havia escutado toda a conversa.

- Um moço com um cabelo tão bonito não pode tratar deste jeito uma mocinha linda como essa - a velhinha completou.

- A senhora não sabe o que é esta mocinha linda quando resolve encher o meu saco - o Zac resmungou.

- Vocês são um casal lindo, sabia? Combinam tanto... - a vovó suspirou. - Não podem brigar.

- A gente não é um casal - a Lynne esclareceu.

- Não são? Puxa, que pena... - a senhora lamentou. - Espero que um dia então venham a se apaixonar. Assim, quem sabe, pararão de brigar - disse, com aquele porte de mulher sábia.

            Depois disso, nenhum dos dois disseram uma palavra. A fila andou rápido e logo estavam fora do banco. A Ló estava puxando conversa, sem ressentimentos. Tinha se comovido com as palavras da velhinha e por isso resolvera esquecer da discussão. Mas o Zac estava mudo. E de cara fechada. No caminho para casa, a Ló foi falando e falando e o Zac quieto. Ela estava começando a se irritar com aquilo. Quando ele estacionou na frente da casa dela, a Ló disse:

- Zachary, coopera. Eu estou tentando ficar de bem com você.

            Ele quieto e emburrado.

- Posso saber o por quê do beiço? - ela perguntou.

- Você é uma mala mesmo.

- O que foi que eu fiz?

- Você mentiu pra vovó. E eu não admito mentiras.

- Quê?!

- Precisava ter dito com tanta convicção pra velha que a gente não era um casal? A gente já ficou de rolo, ué. Portanto, você mentiu pra ela.

- Espera, espera... Você está puto comigo por eu ter dito que a gente não era um casal?

- Claro! Você mentiu. E sabe muito bem que eu não admito mentiras.

            A Ló deu uma gargalhada. E disse:

- Ah, eu sei é? Desde quando você virou o justiceiro da verdade?

- Eu nunca gostei de mentiras.

- Zachary, você está puto porque queria que eu tivesse dito qualquer coisa do tipo "a gente tem um relacionamento conturbado, Dona Vovozinha". Admita.

- Não. Eu só acho que você não devia ter mentido.

- Claro, claro... - ela ria. - Zachary, apenas admita.

- Eu não tenho porra nenhuma pra admitir.

- Vai, Zachary. Admite. Você queria que eu dissesse que eu era a sua namorada.

- Rá! - ele riu. - Isso é o que VOCÊ queria.

            A Ló encostou-se no banco, olhando para frente, de braços cruzados. Silêncio. Ela então suspirou, chateada:

- Você só faz jogo duro mesmo, né? Será que você já parou pra pensar que isso enche?

            E já estava saindo do carro quando o Zac segurou o braço dela.

- Agora vai fazer o quê? Dar um coice à queima-roupa? - a Lynne falou.

- Tá, tá! E daí se eu não gostei que você disse aquilo? Grande merda. Eu só acho que você deveria ter explicado melhor sobre... A gente - ele resmungou por fim.

- Explicar o que se nós decidimos ser só amigos?

- Ah, sei lá! Explicar que... Que... - ele gesticulava, meio perdido. - Que, sei lá, que a gente tinha uma amizade colorida... Ou dizer aquelas coisas que mulher sempre diz de "a gente briga, mas um não vive sem o outro"... Qualquer porra dessa. Mas não "a gente não é um casal".

            Pausa. A Lynne olhava para o Zackito com a maior cara de boba, sorrindo encantada. O Zac percebeu que tinha falado demais e tentou corrigir na mesma hora:

- E outra: se fosse eu que tivesse dito aquilo, você teria me dado um tapa na cara, teria saído chorando, fazendo o maior drama.

- Teria nada. A gente decidiu amizade e eu estava bem com isso. Só não sabia que você continuava a fim de mim - ela sorriu, toda convencida.

- Eu? A fim de você? Garota, você deve ter brisa no lugar dos raciocínios...

            A Lynne se irritou com aquilo. E deu o ultimato:

- Zachary, se eu sair desse carro agora sem ouvir um "Lynne, eu gosto de você", eu juro pela minha mãe que está mortinha, eu juro pelo meu pai, eu juro até pelo meu karaokê... Eu nunca mais te dou um beijo na boca. E amassos na sala lá de casa quando meu pai tiver saído você também pode esquecer.

- Você tá louca?

- Não. Eu só acho que eu não tenho que ficar implorando pra você, um garoto escroto e orgulhoso, admitir o que todo mundo já sabe e já viu. Seu jogo duro era charmosinho no começo, Zachary. Agora encheu o meu saco.

            Silêncio. A Ló então disse:

- Eu estou me virando para a porta do seu carro para sair de dentro dele. Você tem exatos cinco segundos para se resolver. 5... 4...

- Eu odeio esse tipo de coisa! Você sabe disso!

- Problema seu. 3...

- Porra, Alynne, mas que merda! Eu não sei falar essas coisas!

- Foda-se. 2...

- Eu não vou dizer nada disso!

- 1... 0,5... Zero. Estou indo... Amigão.

- Tá, tá, tá!

            A Lynne largou o trinco da porta do carro e voltou-se para ele.

- Você estava dizendo...? - ela disse.

- Merda...

- Não começa com os palavrões. Vai, anda, estou esperando.

- Eu não funciono a base de pressão.

- E eu não funciono a base de coice. Tchau.

- Tá, eu falo, eu falo! - A Lynne sentou-se novamente. - Eu gosto de você - o Zackito disse MUITO baixinho.

- O quê? Não ouvi.

- Eu gosto de você.

- Ainda não estou ouvindo.

- Eu gosto de você! Eu adoro você! Eu te venero! Eu coleciono as suas caspas! Eu tenho um altar em casa com uma estátua da sua cara feita com os fios de cabelo que caem da sua cabeça! Eu coletei 2.543 bactérias da sua pele e mantenho todas elas em colônias no meu quarto! Pronto? Feliz agora?

            A Ló riu. E disse:

- Viu? Não foi tão difícil.

- Pra você que estava assistindo, pode ser.

            Então a Ló sentou no colo do Zackito e ficou olhando para ele. Com as mãos, passeou pelas bochechas dele, pela testa, tirou os cabelos das laterais do rosto, colocando-os atrás das orelhas. O Zac a encarava. A Lynne continuou o passeio, acariciando agora os lábios do Zac, o nariz, o queixo.

- Não é feio gostar de alguém, Zacarias - a Ló falou baixinho.

- Eu sei que não.

- Então por que você faz essas coisas?

- Porque eu sou o Zac.

            A Lynne passou os dedos pelos cabelos uma outra vez e o beijou na boca. E os tão amados amassos que o Zac temia que fossem cancelados, rolaram ali no carro naquela hora.

            Aí o negócio virou namoro de vez. Continuavam brigando de cinco em cinco minutos, mas fazer as pazes era o que eles mais gostavam.

 

            E também nesses dois meses a vida da Patrícia finalmente sossegou, como ela tanto queria. Ainda havia algumas mais perdidas que a provocavam na rua, mas era só a Patty avisar "eu não estou mais com o Taylor", que pronto. A garota saía de perto toda envergonhada e ficava tudo bem.

            Nos últimos dias em que passeou pela cidade, a japonesinha andou na rua tranqüilamente, sem ser seriamente incomodada. Não, a Patty não morreu de coágulos na cabeça de tanto levar pancada. Últimos dias refere-se ao fato de ela ter se mudado com os pais de Tulsa. Isso aí, a Patty foi embora. O Seu Futemma tinha decidido sair da cidade porque a situação financeira da família não estava das melhores. O pai e a mãe da Patty viram então na proposta da irmã de Maria, Midori, de montar um restaurante japonês na cidade em que esta morava, a solução para os seus problemas.

            Um pouco antes de partir, a Patty sofria ainda pelo Jordan, mas ao mesmo tempo sentia-se aliviada por ter conquistado sua vidinha normal de volta. Nas semanas seguintes à última discussão que tivera com Taylor no The SS, a Patty não teve mais nenhum tipo de contato com ninguém da família Hanson. Até o Isaac, que costumava ser seu grande amigo, parou de ligar para ela. Cumprimentavam-se nas poucas vezes em que se esbarravam pela cidade, mas conversas profundas nunca mais aconteceram. O mesmo servia para o Zachary.

            O clima não era de briga, mas sim de afastamento. Nem o Isaac nem o Zac odiavam a Patty pelo o que tinha acontecido, é lógico. Mas manter relações com a ex-namorada do irmão do meio simplesmente não soava como a melhor das idéias, considerando que o Taylor continuava lutando para esquecer a Futemminha. Portanto, para não magoar nem o Tay nem a própria Patty, o Isaac e o Zac se afastaram dela.

            Para o Taylor, esses dois últimos meses foram diferentes. Basicamente concentrou-se em ficar bem longe da Patrícia. Evitava ir aos lugares onde ele sabia que ela estaria, não falava o nome dela e se, em uma roda de conversa, alguém viesse a perguntar ao Taylor sobre o namoro terminado ou especular algum dado curioso sobre o rompimento, ele saía educadamente de perto. Tinha certeza de que falando e ouvindo sobre a Patty, não se desligaria dela tão cedo. E por machucar como machucava, o Taylor fazia de tudo para acelerar o processo de esquecimento.

            Para facilitar, ele manteve-se ocupado as 24 horas de todos os seus dias: ajudou o Isaac com o bar, voltou a compor e escreveu músicas novas, passou a fazer Cooper diariamente com o Zac, fez apresentações no The SS só ele, o violão (ou o piano, dependia do humor do Taylor) e o microfone... Até cozinhar o Taylor aprendeu com a ajuda da Gina. Volta e meia lá estava ele na pia inventando algum prato gostoso para o almoço ou jantar. No começo, apareciam uns suflês de chuchu adocicados e umas lasanhas apimentadas à fogo, mas com o tempo o Taylor ficou craque. E não tinha quem não o elogiasse assim que provava sua comida.

            Mas sair à noite, sair mesmo, com o George para a balada, isso ele nunca mais fez. Ia sim ao The SS, mas mais para ajudar o Isaac com o serviço do que para aproveitar a noite. E como agradecimento, o Ike estimulava o Taylor a tocar cada vez mais no palco do seu bar. Para o Cumprido era ótimo.

 

            Chegou então o dia em que a Patty ia embora. Ela estava no quarto dela, terminando de encaixotar algumas das suas coisas e pensando no que faria assim que terminasse com aquilo ali. Do celular do seu pai, ligara para Belle e Lary apenas para dar um último tchau. Já tinha se despedido devidamente das amigas, queria só dar um tchau mesmo, aquele último alozinho.

            Feito isso, ela voltou-se para as caixas. O que a perturbava de verdade era não saber se deveria ou não ligar para se despedir do Isaac, do Zac e, principalmente, do Taylor. Fazia dois meses que não falava com nenhum dos irmãos.

- E a gente está tão afastado... - falou sozinha. - Acho que não tem muito a ver eu ligar pra dar tchau.

            Lembrou-se do dia em que, andando na rua, viu o Zac e a Lynne passeando de mãos dadas, conversando sobre algo deveras engraçado. Riam empolgados e a Ló falava alto pra burro. A Patty passou por eles, um pouco sem jeito, mas morrendo de vontade de parar para conversar. Mas no momento em que se cruzaram, não foi bem como a Patty planejou. O Zac lhe dirigiu um sorriso restante das risadas com a namorada e disse um normal, até simpático, oi. A Ló foi quem mais se empolgou ao ver a Futemminha. Porém nem ele, nem ela pararam para puxar papo. Não por mal, mas simplesmente não tinham mais o que conversarem. Não tinha mais assunto, não tinham mais nada em comum. Não existia mais uma amizade.

            E isso só ficou mais evidente na tarde em que a Patty estava andando, alguns dias depois, na calçada com algumas sacolas e um carro na rua começou a andar devagar ao seu lado:

- Oi, Patty - o Isaac disse, do banco do motorista.

- Isaac, oi! - ela sorriu.

- Quer uma carona?

- Lógico.

            Ela entrou no carro e eles foram.

- E você, como está? - o Isaac perguntou.

- Estou ótima. E você?

- Tudo bem - ele sorriu.

- Que bom.

            Pode parecer ridículo, mas a conversa limitou-se a isso. O resto do caminho eles fizeram todo em silêncio. A Patty tentava pensar em algo, mas nada, absolutamente nada lhe vinha à cabeça. Estava uma situação desesperadora. Sentindo-se desconfortável também, o Isaac fingia estar muito concentrado no trânsito. Como se a concentração fosse tanta, que não sobrava atenção para dedicar à conversa alguma. Patético porque tanto ele quanto ela sabiam que o problema real não era a concentração do Isaac. Mas para a situação, tal fingimento até foi conveniente, já que a Patty fingia entender os falsos motivos do silêncio. Como se o trânsito morto do bairro em que morava precisasse de cuidados extras...

            Então, depois de alguns minutos intermináveis, o Isaac finalmente chegou à casa dos Futemma. A Patty se despediu e saiu do carro correndo. Jurou para si mesma que andar a pé a partir daquele momento seria sua prioridade.

- É, eu acho que não tem nada a ver eu ligar mesmo... O que eles vão falar pra mim? "Boa sorte no futuro"? - ela pensava alto, olhando para a caixa da mudança cheia de livros.

            Foi quando lembrou de Jordan Taylor Hanson, o garoto mais incrível que já passara por sua vida. Talvez fosse culpa da Patty que não teve lá um grande número de namorados e supervalorizou o que o Taylor tinha para oferecer. Ou o Taylor que estava apaixonado demais e elevou a sua capacidade de ser querido em níveis exagerados. Talvez fosse. Mas a Patrícia podia dizer que o Cumprido foi a coisa mais bonita que já tinha acontecido com ela. E como toda coisa bonita, o Taylor também era difícil de manter. Pena que namora-lo foi demais para a Futemminha...

- Ai, merda... - ela pensou alto de novo. - E agora?

            A Patty não queria mais falar com o Taylor, é verdade. Mas achava que seria uma puta falta de consideração não dar tchau para ele. Ao mesmo tempo, achava que se despedir dele daria a entender que eles continuavam tendo algum tipo de ligação.

- "Olha o tipo dessa garota... A gente nem tem mais nada e ela fica me ligando pra dizer que está indo embora" - a Patty falou o que pensava que o Taylor falaria assim que ela se despedisse. - É, nada a ver, Patrícia... - Pausa. - Mas eu tenho que me despedir do Taylor, meu Deus. Quer dizer... É o Taylor. Talvez se eu escrevesse uma carta... Mas o que eu ia dizer? "Querido Taylor... Mesmo você me odiando porque eu terminei com você, eu queria dizer que eu ainda te adoro. Tudo bem que faz dois meses que a gente não se fala, e eu também sei que você não faz questão de falar comigo, mas olha, eu queria te dar tchau mesmo assim" - a Patty falou em voz alta. Bateu na sua própria testa. - Que estúpido. - Respirou fundo. - Melhor deixar pra lá...

- Tudo pronto aí, filha? - a Maria perguntou, da porta do quarto.

- Quase, mãe.

- Depois que terminar, chame seu pai para te ajudar a levar isso para a sala.

- Quando que vão vir pegar a nossa mudança?

- Amanhã cedo. Nós nem estaremos mais aqui.

- É, eu sei...

- Pá? - A Patty olhou para a mãe. - Você ligouu para o Taylor?

- Não.

- E vai ligar?

- Não sei... Você acha que eu devo?

- Você está com vontade de ligar?

- Até estou, mas eu sei que assim que ele atendesse, eu me arrependeria até a morte de ter ligado.

- Entendo... Não saberia o que dizer, não é?

- É. Ainda mais do jeito que nós terminamos. A última vez que eu falei com ele foi lá no The SS e a gente brigou meio feio. Depois disso, nunca mais sequer vi o Taylor.

- É, filha, não ligue então. Talvez ele tenha finalmente te esquecido e ligar pode trazer algumas mágoas de volta.

            A Patty sorriu desanimada.

- Não fique assim, Pá. Lá em Albuquerque você fará novos amigos, conhecerá gente nova... Vai ser bom pra você.

- Vai sim...

            A Maria sorriu e desceu as escadas da casa. Chateada, a Patty colocou o último livro na caixa e fechou tudo com a fita isolante. Continuou pensativa... Havia esquecido da briga no The SS...

 

- Taylor, o que você esperava? Que eu enfrentasse meia cidade por amar você e que, no fim, nós nos casaríamos apaixonados, comigo em uma cadeira de rodas, paraplégica de tanto apanhar? Eu não sou uma heroína!

- Não! Eu só queria que você resistisse mais, mostrasse mais que você me ama e não quer me perder assim, tão fácil!

- Fácil? Taylor, não está sendo fácil pra mim!

- Pois não é o que você está demonstrando.

- Por que você acha que eu fugi tanto de você? Hein? Porque eu não quero ficar te vendo o tempo todo para ficar relembrando o quanto você é importante para mim e o quanto eu gosto de você!

- Você foge de mim, foge do nosso namoro, foge das garotas! Do que mais você foge, Patrícia?

- Taylor, não fala assim...

- Você foge o tempo todo e não resolve nada!

- Mas não tem como resolver isso tudo!

- Se você tivesse feito tudo diferente desde o começo, teria como resolver agora!

- Tay, eu quis te poupar de sofrer! Eu fiz isso pensando em você!

- Pois fez errado! O que adianta ter me poupado antes, se você está me causando uma dor sete mil vezes maior agora?

- Eu também estou magoada!

- Isso tudo poderia não ter acontecido se você tivesse me contado e me deixado participar desde o princípio.

- Que diferença iria fazer, merda!

- Toda a diferença! Nós estaríamos mais unidos, eu estaria do seu lado te protegendo... Meu Deus, nós éramos namorados! Você não podia ter escondido de mim o que estava acontecendo com você!

- Eu fiz tudo errado, pode até ser verdade. Mas eu fiz pensando em você!

(...)

- Então pra você é bem mais cômodo namorar alguém "normal", como você diz, do que lutar pelo o que você quer e passar por alguns obstáculos. Você quer tudo certinho, sem dificuldades, como num manual. É isso?

- É, eu acho que é isso sim.

- Talvez terminar tenha sido mesmo uma boa. Porque o "normal" é algo que eu nunca vou poder te oferecer, Patty. Eu não quero passar nenhuma parte da minha vida com alguém que segue a porra do manual o tempo todo.

 

            Ela não lembrava que havia sido tão terrível.

- Definitivamente, eu não tenho que ligar para ele. A gente ficou dois meses sem se falar... Isso deve significar alguma coisa. Talvez ele tenha me esquecido mesmo. - Pausa. - O que eu estou falando? Eu terminei o namoro. Eu! Eu não posso ligar - Outra pausa. - Nossa... Por pouco eu faço a cagada do ano. Melhor levar essas coisas lá para baixo de uma vez. Paaaai!

            Assim que escutou o berro da filha, o Reginaldo correu para o ex-quarto da Patty pegar as caixas restantes. Só faltava ela para que pudessem viajar. Levavam em suas malas apenas roupas e coisas mais leves. Os móveis iriam apenas depois, graças a uma empresa especializadas em mudanças mais distantes. O preço era até camarada.

            Então, dois meses depois do término do namoro com o Taylor, nesses dois meses que a Isadora conquistou o direito de morar com o filho e o Zac e a Ló começaram a namorar, a Patty foi embora para Albuquerque, no estado do Novo México. Demorou para que os lucros começassem a aparecer, mas depois de alguns apertos, o restaurante decolou. A tia Midori e a Maria eram responsáveis pelos pratos e temperos, enquanto Reginaldo (pai da Patty) ficou encarregado da parte administrativa. Claro que, como todo estabelecimento alimentício, o dos Futemma tinha também suas épocas de menor movimento. Havia semanas em que o restaurante ficava às moscas, no maior dos abandonos. Mas com o tempo, ele foi conquistando certo respeito e estabeleceu-se de vez no mercado.

            Agora o que não se sabia era que, três dias mais tarde, coincidência ou não, seria aniversário da Futemminha. Ela partira de Tulsa três dias antes de completar 20 anos. E nesse dia, o Taylor resolveu fazer uma visita para a ex-namorada para entregar-lhe um presente. Aquele brincos que há um ano ele havia comprado, o brinco com os sóis simpáticos, e nunca tinha dado a ela. Foi deixando, deixando, deixando... E deixou. Terminou o namoro e acabou não entregando a ela.

            Mas agora era a oportunidade perfeita. Ele daria o par de brincos e pronto, presente dado. Sem cartões ou palavras melosas. Apenas os brincos. E no caminho para a casa da Patty, o Taylor ia chegando a conclusão de que não teria nada demais. Se tivesse ainda um cartão toooodo sugestivo ou um discurso pomposo preparado, ela até poderia suspeitar de que aquilo era uma tentativa de voltar com o namoro. Mas não, era apenas um presente...

- ...de alguém que já gostou muito dela - o Taylor pensou em voz alta. - Isso aí. Nada de mais.

            Estacionou a BMW ZT na frente da casa de telhado azul. Ao olhar em direção ao portão, hesitando no que estava prestes a fazer, o Taylor deparou-se com a enorme placa na sacada do segundo andar: Vende-se. E logo abaixo ao aviso, o telefone para contato.

"Como assim, vende-se?", foi a primeira coisa que o Taylor pensou.

            Totalmente perdido, desceu do carro e apertou o interfone. Lógico, ninguém atendeu. O Taylor não compreendia. Até pouco tempo, a Patty estava morando ali. E o que mais o agoniava era que ela podia ter se mudado naquele instante ou há um mês atrás, o Taylor não teria como saber.

            Fez então a primeira coisa que lhe ocorreu: ligou para o telefone do cartaz.

- Imobiliária, bom dia - uma mocinha atendeu.

            O Taylor não se deu ao trabalho nem de responder, desligou na hora. Pensou mais alguns segundos encostado no carro.

- As amigas dela - ele pensou em voz alta. - Eu devo ter o número daquela Belle no meu celular...

            E ele tinha. Apertou o send  e aguardou que atendessem sentado no banco do motorista da BMW.

- Alo? - uma voz feminina.

- A Belle, por favor.

- Sou eu.

- Belle, aqui é o Taylor.

- Taylor? Taylor Hanson?

- Isso.

- Eu até imagino o por quê de você estar me ligando...

- Para onde ela foi? - o Taylor cortou o papo inútil.

- A Patty se mudou para o Novo México.

            Se o Taylor estivesse de pé naquele momento, com certeza teria caído sentado. Ele ficou mudo um tempinho, com as mãos na testa, olhando fixo para o nada. Sabe quando o seu cérebro simplesmente não consegue decifrar a informação? Patty, Novo México... O Cumprido não acreditava. Achou que ela havia se mudado para outra casa, outro bairro... Mas mudar de estado?

- O quê? - ele sussurrou, perplexo.

- Cidade de Albuquerque, para ser mais exata.

- Mas isso é muito longe! - ele aumentou o tom de voz. - Como? Quando foi isso?

- Ela se mudou faz três dias. Os pais dela montaram com a tia da Patty um restaurante japonês lá.

- E por que ninguém me avisou? - o Taylor questionou, puto.

- Olha... Isso eu já não sei. A Patty não falou sobre isso comigo.

            Sem dizer mais nada, o Cumprido desligou o telefone, arrasado. Colocou a cabeça para trás no banco e fechou os olhos. Respirou fundo e tentou organizar os pensamentos dentro da sua mente. A Patty estava agora em outro estado. Talvez se eu tivesse chegado um pouco mais cedo..., ele pensava. Como isso foi acontecer sem que ele percebesse? O Taylor não compreendia... Tentara se afastar dela por aqueles dois meses e agora que ela estava longe de verdade, ele sentia nada a não ser pânico. Era assustador pensar que não a veria mais tão cedo.

            Ergueu-se e tirou do bolso da blusa a caixinha com os brincos.

- O que eu vou fazer com essa merda agora? - falou sozinho.

            Com essa merda de brinco ou com essa merda de dor no coração?

            Desanimado, o Taylor voltou para casa. Estava meio perdido ainda. Talvez ter desistido da Futemminha assim não tivera sido uma idéia tão boa.

            Ao entrar na mansão, a Gina já notou alguma coisa de errado no Taylor. E correu enche-lo de perguntas sobre o que poderia estar acontecendo com ele:

- Você está com dor? Se machucou? Alguém brigou com você? É o George, ele fez alguma besteira? Alguma garota? Está com vontade de vomitar? Dor de barriga? É dor de coração? É isso, Cumprido? É o seu coração que está apertado?

            A Gina podia até demorar, mas ela sempre descobria o que estava acontecendo com o Taylor. Levou-o para o quarto dele e o deitou na cama. O Cumprido não falava, mas também não demonstrava grande sofrimento. Estava em estado de choque ainda, perdido, tentando imaginar o que seria dele sem a Patty por perto. Quer dizer, era diferente tê-la longe na mesma cidade e tê-la longe em outro estado.

            O escândalo da Gina chamou a atenção do Isaac e do Zac. Não demorou muito, eles apareceram na porta do quarto do irmão do meio para ver o que se sucedia. A Gina, tadinha, tentava explicar o que não sabia e entender o que não havia sido exposto pelo Taylor. E aquela afobação dela não estava ajudando muito.

- Gina, prepara alguma coisa para o Tay. Deixa que eu e o Zac conversamos com ele - o Isaac finalmente pediu.

- É, eu vou fazer isso, eu vou fazer isso...

            E saiu.

- Agora fala, Tay - o Zac pediu.

- O que aconteceu que te deixou assim? - o Isaac perguntou.

- A Patty... Ela foi morar em Albuquerque, Novo México.

            O Isaac e o Zac levaram um susto.

- Ela foi? - o Zac perguntou. - Mas quando?

- Faz três dias. E ela nem se despediu de mim. Ela não me ligou, não me disse nada... Que merda, por que ela fez isso? - o Taylor disse, nervoso. - Ela vai embora para outro estado e nem sequer me liga?

- Vocês não tinham mais nada, Tay... Talvez ela tenha pensado assim - o Isaac tentou achar uma explicação.

- Ela tinha que ter me ligado! E por mais que nós não estivéssemos mais juntos... A gente já esteve! Ela tinha que ter me ligado.

            O Taylor estava com os olhos brilhando, cheios de lágrimas. Tirando forças não sei da onde, o Isaac conseguia falar algumas palavras mais confortantes para o irmão. Ao contrário do Zac que não tinha idéia do que dizer. Ficou imaginando se a Ló fosse embora sem avisar, o que ele sentiria. Só assim para ele entender pelo menos um pouquinho do que o Taylor estava passando.

            Aquela tarde, os três passaram conversando sobre as coisas da vida. O Cumprido, depois de ouvir muitas coisas do tipo "talvez seja melhor assim" e "ela não te ligou, mas pode te ligar ainda", passou a se sentir um pouquinho melhor. Pouquinho, não muita coisa. O susto que levara ao saber da partida da ex-namorada ainda o abalava. Parecia um espanto constante.

 

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