Maquiavel foi da renascença?


A Ciência precisa do senso comum?

AUTOR: Anderson Fernando dos Santos


O senso comum baseia-se em conhecimentos espontâneos e intuitivos, uma forma de conhecimento que fica no nível das crenças. Este conhecimento vai do hábito à tradição, muitos deles, aprendemos com os nossos pais que aprenderam com nossos avós ... , que desconheciam de qualquer saber científico, e assim por diante, facilitando nosso dia-a-dia. O homem na medida que se relaciona com os objetos que o cercam, cria interpretações baseadas nas suas experiências, criando crenças que permitem o domínio do ambiente. Fatores como crenças, desejos, tradição, fazem com que haja um apego ao senso comum. Não são raros os casos em que as crenças do senso comum produziram comportamentos preconceituosos, com base numa postura dogmática diante da compreensão dos fenômenos. Durante muito tempo, acreditou-se que o Sol girava em torno da Terra, que uma determinada raça fosse superior a outra. Não raro, o radicalismo em torno dessas crenças levou à condenação de pessoas que foram perseguidas pelo simples fato de criticá-las ou por se enquadrarem como hereges ou como membros de uma etnia inferior. Muitas guerras foram e ainda são travadas devido ao preconceito religioso e cultural.

No entanto há momentos em que as crenças se tornam problemáticas, aí o homem começa a pensar e surgem novas respostas, é neste momento que surge a Ciência. A Ciência compõe-se de conhecimentos sobre um objeto de estudo, que é expresso através de uma linguagem precisa. Suas conclusões são passíveis de verificação e isentas de emoção, possibilitando a reprodução da experiência, podendo o saber ser transmitido e verificado, utilizado e desenvolvido possibilitando através deste o desenvolvimento de novas descobertas.

Sem a presença da análise e crítica científica a tendência do senso comum é estagnar, fechar em si mesmo, por isso, ainda que a Ciência não possa dispensar o senso comum para começar suas análises, precisa ir para além do senso comum, a partir de investigações que filtrem o máximo possível, opiniões e fantasias, pois a Ciência está enraizada à sociedade que se veicula, o que na prática nos mostra que a neutralidade absoluta é um mito. As idéias científicas não são totalmente independentes da filosofia, da religião, das ideologias que impregnam o meio em que vivem os pesquisadores.

René Descartes, por exemplo, inaugurou um método científico a partir de uma dúvida generalizada de todo conhecimento aceito pelo senso comum e adquirido por meio dos sentidos. Em Discurso do Método (1637), Descartes parte da constatação de que a capacidade de julgar é uma coisa inerente e igual em todos os seres humanos. O fato dela não ser bem aplicada é que, ao seu ver, permitiria que surgissem as divergências e os vícios aos quais o ser humano está sujeito(2). Por causa disso ele propõe um método de investigação que, na sua obra seguinte (Meditações,1641), parte de uma dúvida metódica que questiona toda forma de conhecimento adquirida a partir de informações intermediadas pelos sentidos e percepções. Com isso ele tenta encontrar exclusivamente na própria razão o único conhecimento livre das distorções impostas pela experiência, sobre o qual todos os conhecimentos verdadeiros serão fundados.

Assim, todas aquelas verdades assumidas pelo senso comum, que fossem contraditas pela observação apurada da natureza e pelo entendimento, deveriam ser postas de lado, em função de uma verdade que pudesse ser revelada sem a influência dos sentidos ou de qualquer crença e desejo. O método proposto por Descartes é considerado um marco do pensamento ocidental, sendo a ele atribuído à inauguração da Filosofia moderna, fundada no racionalismo. Ao contrário de toda tradição anterior, Descartes voltou-se para aquela capacidade natural que cada um possui e procurou descobrir, fazendo uso apenas da razão, o fundamento da verdade, independente do senso comum. Ocorre no entanto que nem Descartes nem Kant, produziram um conhecimento e que a idéia religiosa estivesse totalmente afastada. No entanto,as bases do senso comum utilizado pela Ciência podem ser- e são - modificadas, retificadas e criticadas a todo instante, essa dinâmica da Ciência é que permite que de um ponto vago e construído sobre alicerces inseguros podemos às vezes, após alguma crítica, ver que estivemos errados; podemos aprender com os nossos enganos, com a compreensão de que fizemos um erro. O cientista usa o conhecimento acumulado para fazer previsões, ou para construir um modelo que explique as suas observações. Embora o cientista parta do senso comum, ele necessita provar ou testar o seu modelo, pois não raramente o senso comum falha. Em uma atividade científica, sempre se parte de algo conhecido, ou ainda esperado, para depois tentar prever as conseqüências. Inicialmente faz-se um modelo do objeto a ser estudado. Baseando-se neste modelo, elabora-se a experimentação para testá-lo. Com os dados obtidos, o modelo é mantido (quando satisfez as previsões) ou é alterado, criando-se um novo modelo para descrever os fatos encontrados.

Ocorrem muitas vezes dificuldades para que um determinado conhecimento científico consiga retificar as idéias arraigadas do senso comum, por isso é que, mesmo a Ciência conseguindo comprovar o mito ou a superstição de certas práticas, as pessoas, ainda assim, se apegam à idéias acentuadamente míticas; presos num conjunto de idéias ingênuas, mantidas pela tradição local ou em idéias que foram Ciência em um passado distante mas, que, verificados posteriormente, demonstraram ser falsos, como a teoria da superioridade racial ou mesmo o conceito de divisão racial entre os seres humanos.

Esta dificuldade ocorre muitas das vezes por culpa da comunidade científica que tem um desinteresse em divulgar para a população os resultados e as conclusões das pesquisas, buscando divulgar as pesquisas na comunidade acadêmica e entre os que podem financiar suas pesquisas, ficando isolados da sociedade, falando em um linguajar incompreensível para os não iniciados no assunto. Demonstrando um apartamento entre a Ciência e a sociedade. Dando a ilusão de que a Ciência pode dispensar o senso comum. Quando na verdade o cientista sempre precisará olhar o senso comum, seja por que a Ciência é feita por homens que vivem em sociedade, produzem suas análises cientificas a partir das relações com o meio que travam, a neutralidade científica absoluta não existe. A subjetividade está dentro mesmo da forma como as formulações científicas são construídas. A construção cientifica é produto de um determinado local, sob a influência de uma determinada cultura, numa determinada época, estando presa mesma as limitações tecnológicas do momento em que vive.

Então vemos que seja para refletir se as suas atitudes frente às pesquisas trazem conteúdos inconscientes que falseiam as análises; seja para descobrir através de análises meticulosas que certos usos do senso comum, trazem alguma veracidade ( é o caso da erva-doce, que após anos e anos de uso pela população, ficou comprovado que realmente tem propriedades terapêuticas). A Ciência precisará estar sempre em contato com o senso comum.

Concluímos assim, concordando com a afirmação de Karl Popper , grande filosofo da Ciência que diz que: " a Ciência parte do senso comum, sendo que é justamente a crítica ao senso comum que permite que este seja corrigido ou substituído. Assim toda Ciência é senso comum esclarecido. (POPPER apud HÜHNE,1989).

BIBLIOGRAFIA:

HÜHNE, L. Miranda. Metodologia científica. Rio de Janeiro, Ed. Agir, 1989.

SANTOS, Boaventura de S. Um discurso sobre as ciências. Porto,Edições Afrontamento, 1991.

STENGER,I. Quem tem medo da ciência. Ciências e poderes. São Paulo, Siciliano, 1990.


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