Livro-Os Estranhos

22/01/02

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OS ESTRANHOS

 Na vastidão do universo onde o infinito pontilhado de estrelas reflete a obra do Criador, um insignificante ponto se movimenta. Uma grande nave, aparentemente parada, diante da magnitude sideral.

Pequeno mundo abrigando homens e mulheres, colocados no espaço numa viagem sem retorno.

Na sala do comando, Lotus anda de um lado para o outro, pensativo. Vez ou outra seus auxiliares diretos lhe perguntam:

- O que faremos? Não poderemos voltar, sequer possuímos as coordenadas.

- Voltar para nosso mundo fica descartado. Penso apenas em nossa sobrevivência. Quando encontrar uma solução, ficarão sabendo.

O planeta Mag estava a trilhões de quilômetros na periferia da galáxia. A nave estava velha, danificada, lenta, condenada a um tempo limitado de existência.

Dos que haviam iniciado a missão apenas a lembrança. Os atuais ocupantes eram filhos do espaço. A astronave, o “território” que abrigava uma nação de 287 almas.

Há quatrocentos anos perambulavam pelo cosmos procurando novos mundos.

 Como trocar o cristal da central propulsora?

Era impossível, inexistia naquele setor sideral.

A pontiaguda pedra estava partida, comprometendo todo sistema. Anteriormente alcançavam distâncias incríveis em segundos.

Ao navegarem com lentidão, apenas lhes restavam alcançar o planeta que há anos haviam pesquisado.

A vida no habitat metálico estava comprometida, no máximo teriam condições de mais dez anos. Tempo preciosíssimo para decidirem sobre suas existências.

Formavam um grupo homogêneo no conhecimento científico. Eram homens e mulheres, lado a lado, numa pequena rotina de manutenção da nave. Com os dias contados e com uma única saída.

Sem condição de escolha, o local para onde seguiam detinha atmosfera respirável análoga à que utilizavam. Sabiam da existência de água e vegetação, tudo favorável. Por outro lado, teriam de enfrentar um grandeproblema. Tal mundo era habitado por uma raça bem semelhante a eles mas detentora de instintos belicosos, capazes de trucidarem quaisquer invasores.

 No salão de laser, há tempos que a alegria vinha diminuindo, até as crianças recebiam fluidos negativos dos pais. As brincadeiras estavam além das condições mentais das famílias. A insegurança dominava a tripulação.

Taros abraçava Kalina como se a quisesse proteger. O filho Odus segurava um objeto como brinquedo, com olhar perdido e medroso.

Temperamental, Taros vivia a coçar a corcova, saliência no pescoço após a nuca, comum a eles. No esfrega-esfrega, acabou desabafando com a companheira:

- Isto não pode continuar! Este clima que tomou conta de nós precisa terminar. Veja Job e Tani, os Jeses e os demais, está tudo errado! Temos que nos reunir e tentar voltar a sermos como antes.

- Tem toda razão Taros, fale com o comandante, também não estou agüentando, já faz muito tempo que estamos neste estado de espírito.

Procuraramelevar a moral dos amigos, mas de nada adiantou.

O descontrole mecânico e a conseqüente necessidade de abandonarem o navio trouxera o sentimento de medo, coisa que não conheciam. Estavam doentes e não sabiam como agir. Na verdade, temiam o lugar para onde a nave se dirigia, desejavam opção melhor, mas não existia.

Possuíam dados daquele mundo assustador, não entendiam como a dizimação em massa podia acontecer entre seres da mesma espécie. Por eles continuariam a viagem, mas apenas poucos anos os separavam da ruptura total. Assim, contra a vontade, dirigiam-se para o único planeta capaz de acolhê-los, era a última esperança.

O fato estava registrado, fazia parte do ensino interno. Por isto, conhecendo seu histórico, o pânico se justificava.

Quando visitaram o planeta, a astronave estava em plena atividade, com planos de pesquisas delineados.

Tão logo chegaram ao sistema planetário regido pelaestrela de quinta grandeza, perceberam possibilidade de colônia. O terceiro mundo da órbita interna detinha as condições necessárias.

Orbitaram o globo por bom tempo, examinaram a superfície, ... se horrorizaram.

Viram os habitantes e o absurdo da insensatez reinante.

Naves auxiliares analisaram a superfície. Detectaram estranhos movimentos. Viram de perto máquinas aéreas se destroçarem, embarcações serem afundadas e levas de homens se destruírem em infernos de fogo. Perceberam então que os seres que lá viviam se assemelhavam a eles, apenas no físico.

Como formar uma colônia naquele lugar? Um mundo onde a técnica era direcionada para a destruição!

Por trás do belo azul que envolvia o astro, se escondia um negrume de atrocidades, coisas nunca imaginadas.

Observaram milhões serem exterminados impiedosamente, não se poupando nem crianças. Em todas as partes as armas estavam expostas.

Ficaram bom tempo visualizando aquele modo de existência.

Pequenos grupamentos chegaram a descer, registrando de perto os fatos. Visitaram muitos lugares, sempre evitando o contato.

Concluíram ser o planeta impróprio para a proliferação maguiana. Depois de meses em volta daquele astro de visual incomparável, abandonaram o projeto e seguiram viagem.

 Após alguns anos, em pleno vazio sideral, o acidente nunca previsto acontecera. A séria avaria do centro energético trouxera desespero e insegurança à tripulação. A eternidade da nave estava comprometida.

O ocorrido obrigou o comando a tomar a única alternativa, mesmo que incerta de sobreviverem, ou seja, a de descerem no temível mundo.

No retorno, esperar a lenta astronave chegar ao destino significava agonia sem fim, tanto que a tripulação já não suportava.

Taros falou com Job e ambos pediram solução urgente a Lotus. Não eram os primeiros a interpelar o comandante, que vinha sendo pressionado a encontrar uma saída para aliviar o tenso clima que envolvia a todos.

Lotus acabou encontrando uma solução. Convocou todos para uma reunião.

A tripulação ganhou ânimo, o vozerio voltou e opiniões ressoaram nos corredores que levavam ao grande salão. Com exceção das crianças e de pessoas indispensáveis em alguns setores, a maioria tomou lugar frente ao palco de projeções.

O comandante se apresentou e a platéia fez silêncio:

- Companheiros de jornada, ainda está distante o dia de sairmos desta acomodação. No entanto, mesmo assim, vimos experimentando e alimentando instintos que haviam sido banidos de nossa formação.

Temos de reagir para libertarmo-nos desta aberração de comportamento. O melhor caminho é a aceitação imediata de que o mundo para onde vamos será nosso abrigo, não o associando com as hostilidades conhecidas.

Procurando mostrar aspectos positivos, aproveitou para apresentar hologramas envolvendo paisagens tranqüilas, emboras violentas cenas, depois completou:

Para sabermos exatamente a direção de nossos passos, Job, Taros, Micenas e Tunis seguirão imediatamente para lá, levarão tudo que puderem para levantar dados. Após retornarem, tomaremos as medidas necessárias para ocuparmos um lugar no planeta. Deverão se misturar com habitantes locais, aprendendo língua e costumes. Levarão bastante metal amarelo, que serão transformados em pequenos cubos. Suas corcovas serão extraídas, com elas não será possível a missão.

Embora atônitos, os convocados não demonstraram nenhuma atitude negativa.

Terminada a explanação, os presentes aplaudiram a decisão do chefe. A esperança de virem a saber sobre condições recentes aliviara as tensões, a nova perspectiva melhorara os ânimos.

 Não se discutia uma ordem superior, nem junto a familiares, isto fazia parte das regras de disciplina.

Os convocados, por alguns dias, passaram por processos de adestramento para a missão. Terminado os preparativos, foram colocados num dos veículos apensos ao compacto bloco metálico.

Enquanto esperavam a separação da nave-mãe e a patrulha se acomodava no interior do veículo, Taros, acostumado a esfregar a corcova, levava a mão ao pescoço e nada encontrava. Angustiado, olhava os companheiros e pensava:

- Não são os mesmos.

Não somos os mesmos.

Vendo o olhar fixo do irrequieto homem, Tunis perguntou:

- O que houve Taros? Ao que respondeu:

- Não podíamos ter deixado fazerem esta mutilação.

- Você está exagerando, argumentou Job, enquanto se ajeitava na cadeira de comando da pequena nave, completando:

Isto é o mínimo diante da situação que nos encontramos. Nossa missão vai depender de muito desprendimento, nosso povo depende dela.

Um portão se abre para o exterior, sobre o mesmo o pequeno transportador que levaria os astronautas para a TERRA.

Em fração de segundos se desloca do corpo da Astronave, toma velocidade e apenas deixa a ilusão de um facho de luz.

A patrulha avançada levaria dois meses para chegar. Conforme ficara decidido, deveria ficar seis meses em contato com a desconhecida civilização, retornando com dados que facilitassem o objetivo maguiano.

Enquanto a micronave cumpria sua trajetória, diminuindo rapidamente distâncias, Job orientava os demais para aproveitarem o tempo em estudos para o contato.

 O tempo passara e já estavam prestes a entrar na órbita de Plutão, haviam chegado ao sistema. Mais alguns dias e estariam no destino.

Na pequena acomodação, planejavam a estadia junto de pessoas muito estranhas, sem qualquer identificação com eles. Era enorme a responsabilidade imposta, poderiam ser descobertos e prioritário era voltarem.

Micenas registrava num pequeno computador, sempre à mão, todos os passos a darem. Muito capacitado, conhecia com profundidade os dados sobre a Terra, até um pouco das línguas.

Taros, um mestre em mecânica, entendia com facilidade qualquer tipo de equipamento que lhe fosse mostrado.

Tunis, dotado de invejável conhecimento científico, não se impressionava diante das situações. Embora muito jovem, havia granjeado fama de solucionador de problemas.

Job, era o homem de confiança de Lotus, sobre ele pesava a responsabilidade da viagem e o êxito da missão.

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Este site foi atualizado em 22/01/02