OPINIÃO:

 

Se a informação pudesse dar cipoadas em quem a usa para falsear a verdade, haja cipós e lombos ardidos!

INFORMAR OU DESINFORMAR 

Verdade ou mentira, eis a questão

 

(sobre onze notícias hipotéticas na mídia)

 

Nota 1 - hipocrisia

  

             Deu no jornal: "Governador do Estado e Presidente da República ganham R$8.000,00 por mês cada. Só aqui existem mil funcionários públicos que ganham, cada um, R$9.000,00 mensais.  Como pode ser isso? Um servidor público ganhar mais que o Governador ou o Presidente"?

           A notícia acima é hipócrita. Ambas as autoridades recebem  R$8.000,00 de salário monetário. Mas ganham também, para si e sua família, casa, comida, roupa lavada, empregados domésticos, carro fixo com motorista, passagem de avião ou o próprio avião, estadias em hotéis, bons vinhos, boas conversas, festas e tudo mais pago pelo dinheiro público. Não compram nada para sua manutenção, exceto, talvez, alguns objetos de uso pessoal. É a famosa mordomia que deve valer, por baixo, 100 mil reais por mês e com a qual os que ganham R$9.000,00 sequer podem sonhar! É claro que essa mordomia é legal, mas não deixa de ser salário indireto para quem a recebe. Quem não gostaria de tê-la, embora com salário monetário de apenas 500 reais por mês? Dizer, pois, que ditas autoridades ganham só o salário monetário é enganação, pura hipocrisia, conversa pra boi dormir.

         A notícia seria honesta se dissesse: "Governador e Presidente ganham R$8.000,00 cada, mais a mordomia". A partir daí seria inócuo falar em quem ganha R$9.000,00 sem mordomia, a não ser para comparar com milhões que têm salário de fome.  

          É claro que é preciso conter os supersalários. Mas daí a querer cortar o salário melhor de quem o conquistou com méritos próprios, além de ser uma tremenda injustiça, pode ser uma evidente hipocrisia, de acordo com o´pretexto usado para o corte.

Nota 2 - média engana

             
Entre mil pessoas da vila "Vai Levando", metade está sem emprego. A outra metade ganha mil reais por mês cada uma. Com base nisso, informa o jornal: "Salário médio da vila Vai Levando é de quinhentos reais", dando idéia de que cada um ganha isso por mês, mais ou menos. 

           É um caso de média aritmética que é apenas uma medida. Dá uma idéia da coisa, porém pode encobrir a verdade como nesse caso.  O custo de vida é medido por média pouco diferente, que pode conter os mesmos defeitos, além de poder ser manipulada. A média pode falsear qualquer assunto. Depende dos números usados. A notícia seria honesta se dissesse: "Salário médio de grupo de mil pessoas da vila Vai Levando é de quinhentos reais, mas desemprego médio aí é de cinquenta por cento".

 

Nota 3 - outro engano da média

              "Renda per capita mensal no País sobe para dois mil dólares. Daí, tantos automóveis"
--  deu na televisão. A notícia faz crer que todos, agora,  têm chance de comprar seu veículo particular.

          Outro caso de média aritmética. Divide-se a renda total pelo número de habitantes, e obtém-se a tal renda per capita.. A notícia acima dá uma idéia falsa. Seria honesta se dissesse: "Renda per capita mensal subiu no País para dois mil dólares, mas a distribuição de renda ainda é uma das piores do mundo".

 

Nota 4 - comparação errada

              Marias do Jucá, do Cajueiro Verde, que ganhavam um real por dia, passam a ganhar três reais por dia. O rádio, então, informa:
“Marias do Jucá tiveram incríveis 200% de aumento nestes tempos de inflação baixa”, sem descer a detalhes.

           As Marias aí  continuam abaixo da linha de pobreza. A situação anterior (base) não vale para comparar porque é péssima. O ruim ante o péssimo parece bom ou ótimo.  A manchete honesta poderia ser: "Marias do Jucá tiveram 200% de aumento, mas ainda estão na pobreza extrema"

 

Nota 5 - outra comparação errada

              Em 2001 a safra de bananas no sítio Bananal caiu de vinte para duas toneladas. Em 2002 a mesma safra subiu para quatro toneladas. A imprensa dá o furo:
“Safra de Bananal teve em 2002 aumento de 100%", sem dizer como foi a variação da safra em 2001.

            Cai no mesmo caso. Menos ruim diante de ruim (base) parece bom. O confronto teria de ser feito com a última safra regular (20 toneladas). A notícia  correta  poderia ser: “Safra de Bananal recupera-se um pouco, mas é só 20% da safra em 2000”.

 

Nota 6 - Quem caiu foi a taxa e não a inflação

             No mês anterior a taxa de inflação foi de 3%. No atual, 2%. A televisão comunica:
“Inflação caiu neste mês”, dando idéia ao menos avisados de que os preços baixaram.

           Se a inflação caiu, não quer dizer que os preços baixaram. O título certo poderia ser:  “Taxa de inflação foi menor que a do mês anterior”. Em outras palavras, os preços subiram menos este mês, porém subiram.

 

Nota 7 - Houve deflação

 

            A mídia informa: "Houve deflação no mês passado". Ora, deflação é o contrário de inflação, ou seja, redução geral de preços. Mentira, porque os preços subiram no mês anterior! Pode ter havido queda de preços em algum item ou índice, mas no geral, não. Os preços podem ter subido menos. Aliás, podem dizer à vontade que houve deflação, mas só quem pode comprovar isso é o bolso do freguês. Há deflação em certo mês quando tudo, tudo mesmo, baixa de preço nesse mês. E essa coisa (a gente sabe) é muito difícil de ocorrer. Então, a notícia honesta seria, mais ou menos, esta: "Houve deflação em tal produto ou índice no mês passado", isto é, baixou o preço do produto X ou índice tal no mês passado. 

 

Nota 8 -buraco geral engole superávit

             As exportações em dado mês superaram as importações em 2,5 bilhões de dólares.  A mídia divulga a boa nova:
“Balança comercial tem superávit de 2,5 bi”, sem falar no déficit existente nas contas externas.

           Outra desinformação. Nos últimos 12 meses, por exemplo, o saldo positivo na balança comercial pode ter sido engolido pelo saldo negativo nas transações correntes. Por que não se fala no balanço de pagamentos como um todo? A notícia honesta seria: "Superávit de 2,5 bi alivia o déficit nas contas externas". Mais informes sobre o assunto podem ser vistos em Globalização

 

Nota 9 - mais importante é a condição de vida do povo

              "Grande potência, décima economia do mundo"
é a manchete do jornal, ao copiar palavras de destacado político, sem nada dizer quanto à distribuição de renda no país.

           O político e o jornal seriam honestos se tivessem dito: "Décima economia do mundo, mas sexta pior distribuição de renda do mundo". A grandeza de um país não se avalia só pelo seu produto (PIB); mede-se, sobretudo, pelas condições de vida dignas de seu povo. Com certeza, o político em questão ainda não ouviu o grito dos excluídos. Milhões vivem apenas com até meio salário mínimo.

          
Nota 10 - dois caminhos diferentes, dois resultados

             Duas entidades  pesquisam o desemprego ao mesmo tempo. A imprensa divulga o resultado em dias consecutivos:
"Desemprego aqui é de 7%"-- diz entidade "A".  "Segundo entidade "B", desemprego aqui é de 21%".  Agora, as duas informações deixam o leitor perdido no escuro.

            Os resultados divergem porque diferentes foram os critérios usados. No primeiro caso, empregado é quem está a fazer algo, até mesmo biscates. Nesse conceito, desempregado é só o vagabundo a azeitar o eixo do Sol. Já no outro caso, empregado é apenas o que tem emprego formal ou exerce alguma atividade autônoma normal. Questão de conceitos e de métodos. Faltou dizer isso. 

 

Nota 11 - Estilos cifrados

 

             Deu no jornal popular: "Taxa de rendimento do capital obtido em operações paralelas é superior à lucratividade da empresa", informa o economista. "Paciente foi acometido de forte cefaléia", diz o médico. "O meu cliente exerce apenas o jus postulandi", declara o advogado. O primeiro fala "economês". O segundo, "medicinês". O último, "juridiquês". São idiomas que comunicam mal, sobretudo num jornal que todos lêem. O mundo desses profissionais está cheio dessas línguas. A má comunicação aí equipara-se à desinformação. 

            O economista teria dito a mesma coisa com clareza e rapidez se tivesse dito: "Taxa de juros cobrada por agiotas é maior que o lucro da empresa".  O médico teria sido claro e objetivo se dissesse: "Doente teve forte dor de cabeça". O advogado teria falado com exatidão se declarasse: "O meu cliente exerce só o direito de pedir".

            Falar um português, que possa ser entendido por todos em comunicações desse tipo, é sempre bom.

Duas asas

 

 

            A informação é uma vasilha de duas asas: tanto se pode usar a asa certa como a errada. Uma informa certo ou compara números de forma correta. Outra o faz de modo inverso, com resultados falsos. Em matéria de comparações, base ideal nem sempre é a última do período (ano, mês, semana, dia), mas a que não se mostra baixa ou alta demais, ou seja, a que fica dentro da normalidade.

.          Há muitos outros casos de meias verdades ou mentiras     inteiras. São vícios da informação ou faces da desinformação. Cabe ao leitor, se puder, fazer uma leitura crítica dos informes da mídia para separar o joio do trigo.

 

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Atualizada em 12/02/2004

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