2º Guerra Mundial
Preâmbulo:
Declarada oficialmente, logo no começo do
conflito, em Setembro de 1939, a neutralidade de Portugal, a sua longínqua possessão de
Timor viveu relativamente em paz os dois anos que se seguiram, mas uma paz já
sobressaltada pela pérfida política externa do Japão que não ocultava aliás, as suas
ambições e afinidades com as Potências do Eixo. Mais fazia avolumar suspeitas e receios
ao governo local a capciosa infiltração de pretensos comerciantes, industriais e
técnicos japoneses que, desde 1936, a pretexto de negócios e colocação de capitais
aportavam continuamente a Dili, percorriam a ilha e, por fim conseguiram que o governo de
Tóquio requeresse a instalação de uma carreira aérea que ligasse diretamente Dili com
a capital nipônica.
Sem fundamentos sérios para recusar, o governo
português ao mesmo tempo que autorizava aos japoneses alguns vôos de ensaio e
reconhecimento, consentia também, para contrabalançar a exigência, que os aviões de
uma companhia australiana fizessem escala por Dili, numa carreira Austrália-Singapura, e
que um avião fretado, com as cores portuguesas, estabelecesse ligação de Dili com os
aviões holandeses da carreira Austrália-Japão que tocavam em Cupão.
Muitos foram os irritantes incidentes
suscitados por esta surda competição das aviações comerciais da Austrália e do Japão
e pelas atividades e pretensões cada vez mais suspeitas de agentes comerciais japoneses
que à boca pequena se dizia serem oficiais do exército. A situação porém, agravou-se
subitamente com o inesperado ataque de surpresa e à falsa fé da aviação japonesa à
base naval americana do Porto das Pérolas (Peor Harbor), a 7/12/1941. A partir de então
não mais houve sossego no Timor português. Dois barcos japoneses que deviam chegar a
Dili com aparelhagem várias foram logo afundados, dias depois, por aviões militares
australianos.
A guerra que ardia já por todo o Pacífico,
até Singapura, começava a rondar Timor. Dez dias depois do rompimento de hostilidades do
Japão com a América, Austrália, Holanda, China e Filipinas, o Comando Aliado, por uma
série de equívocos ainda mal averiguados, enviava de Cupão, sede do Timor holandês, à
baía de Dili um cruzador, três aviões e um transporte de tropas holandesas e
australianas, sob o comando de um tenente-coronel holandês que, de acordo com prévias
negociações entre os respectivos governos, dizia trazer ordem para efetuar o desembarque
das suas tropas e tomar posições em Dili e no seu campo de aviação.
O governador, sem instruções de Lisboa nem força bastante para resistir, mesmo
simbolicamente convocou um conselho de oficiais que, perante a critica situação criada,
foi de parecer unânime que se consentisse o desembarque. O corpo expedicionário aliado,
de cerca de 1.600 homens - 1.280 holandeses e indonésios e 380 australianos -
desembarcou, aquartelou-se e tomou as suas posições no aeródromo e nas montanhas
vizinhas de Dili.
cônsul e os outros japoneses foram logo reduzidos à situação de prisioneiros; o
governador português constituiu-se também, por si próprio, prisioneiro na sua
residência, ordenando a todas as autoridades e repartições a mais estrita neutralidade
e abstenção de qualquer ato de hostilidade ou colaboração.
Começava praticamente o longo calvário de
três anos e meio. A exígua guarnição militar portuguesa - uma companhia indígena -
foi destacada para Aileu; as famílias dos militares e funcionários dispersaram-se pelo
interior; e uma relativa calma, sem incidentes de maior com essas cordatas e corretas
tropas de ocupação, se seguiu durante cerca de sete semanas. Pouco durou essa inquieta
situação de expectativa.
A 08/11/1942 dava-se o primeiro ataque da aviação japonesa às posições holandesas em
Dili. Mas como a todo o momento eram esperadas de Moçambique tropas portuguesas, num
total de 600 homens, para renderem as tropas estrangeiras, confiava-se em que a situação
se esclarecesse muito em breve.
A 19 de Fevereiro, porém, precedido de um
furioso bombardeamento da sua aviação, os japoneses operavam por seu turno um
desembarque em força a 7 km. de Dili. Os breves assaltos que se lhes seguiram às
frágeis posições aliadas, em poucas horas, em coroados de êxito e ao fim do dia a
ocupação militar japonesa era um fato irremediável.
A partir dessa data e até Agosto de 1945, toda a ilha de Timor, sob a brutal ocupação
nipônica , era teatro das consabidas atrocidades da soldadesca japonesa que, ao que
parece, chegou a atingir cerca de 40.000 homens.
Os sobreviventes australianos e holandeses,
internando-se nas montanhas que constituem a espinha dorsal da ilha, passaram então a uma
encarniçada e intrépida luta de guerrilhas, auxiliados pelas populações gentílicas,
que se mantiveram fiéis a Portugal e a que se juntaram muitos civis portugueses.
Não foi, infelizmente, geral essa atitude da
população nativa, mormente a da fronteira e da Maubisse. Vários régulos, aliciados
pela intensa propaganda nipônica, rebelaram-se logo contra o domínio português, fato de
que o comando japonês tirou todo o partido, incitando e armando a organização de
colunas negras que preparavam os assaltos às povoações fiéis ou onde quer que se
suspeitasse de núcleos de resistências anti - nipônica.
Em Dili, onde o governador procurava manter um simulacro de funcionamento de serviços
administrativos, a coberto da declarada neutralidade, começaram em meados do ano os raids
da aviação australiana, já bombardeando a cidade, já reabastecendo por pára-quedas as
guerrilhas nas montanhas.
Resolveu então o governador transferir-se, com
todos os serviços e funcionalismo para o interior (S. Domingos) ainda então afastado do
teatro da guerra. O comando japonês, porém, opôs-se brutalmente, reduzindo-o
praticamente à condição de prisioneiro na sua residência. Perante a funda turbação
causada pelas populações rebeladas, as autoridades portuguesas, invocando a atitude de
neutralidade de Portugal, conseguiram do comando japonês autorização para que três
colunas portuguesas fossem sufocar essas rebeliões, mas cedo se desmascarava a hipocrisia
japonesa, pelo ataque noturno de um coluna negra, em fins de setembro, ao aquartelamento
da Companhia indígena em Aileu, onde perderam a vida onze oficiais e funcionários
portugueses.
Como os australianos não afrouxassem na sua
luta de guerrilhas, causando graves danos aos japoneses, em Outubro foi proposto ao
governador pelo comando japonês a criação de uma zona neutral em Liquiça, onde não se
realizariam operações militares, a fim de que todos os portugueses neutrais se pudessem
ali refugiar com suas famílias, ao abrigo dos indígenas rebeldes e das contingências da
luta dos japoneses contra os australianos.
As guerrilhas australianas, porém, é que não se consideraram obrigadas a respeitar essa
zona neutral, e, por seu turno, ofereceram proteção e auxílio aos portugueses que
quisessem refugiar-se na Austrália, embarcando em praias da costa Sul, onde iriam
buscá-los navios australianos ou aliados.
De fato, desde fins de Novembro até
princípios de Fevereiro de 1943, navios de guerra australianos vieram ao porto de Alas
buscar os portugueses e suas famílias que preferiram o refúgio da Austrália ao campo de
concentração de Liquiça.
Pouco depois, chegava aos resistentes portugueses a notícia de que o comando Aliado na
Austrália desistira de um projetado desembarque em força, por tropas aliadas, para a
libertação de Timor.
Uma poderosa ofensiva nipônica na Nova Guiné
impunha o emprego de todas as forças disponíveis do Norte da Austrália. A missão
militar e as guerrilhas australianas em Timor deviam também retirar. E assim aconteceu.
Os últimos australianos e holandeses
abandonaram a possessão portuguesa. A essa data (princípios de 1943) já as forças
japonesas tinham ocupado toda a ilha, e é então que se registra o admirável ato de
lealismo do chefe indígena D. Aleixo, Nai-Sesso, régulo de Suro, que nas montanhas de
Suro-Lau, cercado com o seus súditos, por mais de 15.000 homens, de tropas japonesas e
nativos das colunas negras, resistiu durante semanas a todas as intimações, até que a
resistência foi esmagada e, aprisionado, o velho régulo reuniu os filhos e, dando um
viva a Portugal, preferiu cair varado de balas e de golpes de catana, a submeter-se ao
invasor nipônico.
Em Agosto conseguiu evadir-se para a Austrália
um último grupo de portugueses que pretendiam treinar-se nos métodos de ataques dos
famosos "comandos" para voltarem um dia a Timor, com tropas aliadas ou
portuguesas para restaurarem a soberania.
Foi só em princípios de 1944 que puderam começar a ser enviados da Austrália a Timor,
em arriscadas missões de reconhecimento, e os primeiros "comandos"
australianos, de que participavam já voluntários portugueses convenientemente
adestrados.
Eram missões arriscadas de que poucos
conseguiam voltar. Cientes desses atos de audácia, os japoneses guarneceram então toda a
Costa Sul, com inúmeros postos de observação e rondas constantes, servidos por tropa
regular e rebeldes indígenas. Assim a situação de Timor se manteve ainda mais onze
meses até que em Agosto de 1945 as bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaqui forçaram o
Japão à suspensão de hostilidades e rendição incondicional aos Americanos.
A 11 de Setembro o brigadeiro australiano Dyke
recebia a bordo de um navio de guerra, na baía de Cupão, a rendição do general
japonês comandante das tropas de ocupação de Timor. Na manhã de 22, Dili era
libertada, com o seu governador e todas as autoridades sobreviventes, de uma ocupação
japonesa de mais de três anos e meio.
SEGUNDA GUERRA MUNDIAL E DEPOIS (*)
Quando os aliados ocidentais declaram guerra
contra o Japão, decidiram usar a ilha de Timor como linha de defesa contra o avanço
japonês em direção ao sul ( apesar dos protestos de Portugal, que era neutro ). Em
meados de dezembro de 1941, apenas dez dias depois do ataque a Pearl Harbor,
aproximadamente 400 soldados das Índias Ocidentais Holandesas e da Austrália chegaram à
parte ocidental de Dili.
Dois meses mais tarde, o Japão atacou a ilha e
rapidamente expulsou os holandeses da metade ocidental. Em Timor Leste, algumas centenas
de comandos australianos e alguns timorenses conseguiram encurralar uns vinte mil soldados
japoneses durante quase um ano. Mas em janeiro de 1943 o Japão controlava toda a ilha.
A ocupação japonesa foi uma das épocas mais
sombrias da história de Timor Leste ( só ultrapassada em crueldade e devastação pelos
indonésios ). Eis como Iwamura Shouachi, que comandou um pelotão japonês em Timor Leste
durante mais de dois anos, descreveu os sofrimentos impostos pelos militares japoneses:
"É doloroso falar hoje dos sacrifícios e fardos que impusemos ao povo do Timor
Leste... Ordenamos a chefes que mobilizassem pessoas em massa para a construção de
estradas...para trabalharem sem receber comida ou compensação.
Devido à escassez de alimentos, pessoas morriam de fome todos os dias. A comida para os
soldados japoneses e cavalos para transportar munição eram confiscados do povo e alguns
soldados da tropa sob meu comando estupraram mulheres timorenses."
Se os australianos e aliados tivessem deixado a
ilha em paz, é bem possível que os japoneses tivessem ignorado Timor, ou no máximo
mandado um contingente simbólico de soldados. Em vez disto, uns 60 mil timorenses
orientais perderam suas vidas em conseqüência da brutal ocupação japonesa e dos
bombardeios aliados que procuravam expulsá-los. A guerra danificou muito Dili e destrui
parcialmente muitas das principais vilas e aldeias do território.
Com a derrota do Japão em agosto de 1945, Portugal voltou e reafirmou seu controle sobre
Timor Leste, que gradualmente voltou ao estado anterior à guerra. Os portugueses
começaram a reconstruir a infra-estrutura colonial que tinha sido devastada, empregando
muitas vezes os mesmos métodos brutais de trabalhos forçados que tinha usado antes da
guerra.
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