A obra poéética Lusitânia, publicada em 1917,
apresenta-se dividida em catorze partes, a saber: "Vales de verdes
pinos tão sózinhos" ( pórtico de abertura ), "O Reino de Camões", "O Mar", "Sagres",
"A Noviça", "Índia", "Os Náufragos", "Jerônimos", "Alcácer Quibir", "Trova", "Aquela
Madrugada...", "O Enviado", "O Regresso" e "Ausentes".
Os poemas em
Lusitânia contam a história gloriosa e trágica do povo português, tendo como
ponto de chegada o ressurgimento de um Portugal forte e soberano com o retorno
do El-Rei D. Sebastião e na parte final entitulada "Ausentes", a obra
apresenta uma série de sonetos evocando
as figuras gloriosas de Portugal.
Podemos dividir
tematicamente a obra Lusitânia em quatro blocos. O primeiro bloco formado pelo poema:
"Vales de verdes pinos tão sozinhos" até
"A Noviça”, que corresponderia à parte geográfica e física de
Portugal, situando-nos sobre a terra, o mar, as construções, as cidades e o povo.
O segundo bloco composto
por : "Índia", "Os Naúfragos" e "Jerônimos", conta-nos sobre as
grandes vitórias e a formação do Império, para que no terceiro bloco, com "Alcácer
Quibir ", "Trova ", "Aquela Madrugada", "O Enviado" e "O Regresso",
tenhamos a queda do Império, a dor do povo e a esperança no retorno do El-Rei. O último bloco, formado pelos poemas de "Ausentes",
dedica-se a enumerar os formadores da Pátria, dando destaque a figuras
históricas e literárias.
Vejamos, pois a
participação, em detalhe, de cada bloco na formação da nacionalidade portuguesa,
na visão de Mário Beirão.
3.2. 1º Bloco: A HISTÓRIA EM ACÃO
Segundo
Pareyson
, "a obra reimerge na história: longe de reduzir-se a um
simples momento do fluxo temporal, é capaz de, ela própria, produzir história,
porque com a exemplaridade de seu valor suscita, atrás de si, uma vida de
imitações, retomadas e desenvolvimentos que, de maneira variada, nela se
inspiram e, com a sua validez universal, solicita uma infinidade de
interpretações leituras e execuções que, de tempos em tempos, a fazem reviver".
Lusitânia revive essa relação de
modo que a História presente em seus versos é uma reintegração criadora deste
universo. Observemos o soneto introdutório à obra: " Vales de verdes pinos tão sòzinhos ", que transcrevemos:
" Vales de verdes pinos tão sozinhos,
Alumiados da graça do Senhor;
E, em arroubos ao Céu, - jardins em
flor
De enlaçadas roseiras sem espinhos...
Ermidas onde ajoelham pobrezinhos,
Sorrindo, como Cristo, à própria dor;
Planícies de enigmático torpor
Onde se escutam vagos murmurinhos...
Por ti, meu pensamento é mais profundo
E o meu canto mais alto se alevanta,
Ó Lusitânia, coração do Mundo!
O mar ergue o teu nome em seus delírios!
E, em tardes de milagre, - ó mais que
santa,
Sobre o teu corpo o céu desfolha lírios!
"
Ele
é significativo porque desde o início
nos revela a importância que o eu
poético dá a palavra "Lusitânia". Nessa escolha percebemos a conotação de valor histórico que
o autor do poema expressa. A formação portuguesa é lusitana. Alexandre Herculano,
sobre esse povo, afirmara: "o povo desde o qual os historiadores têm tecido a
genealogia portuguesa está achado: é o dos lusitanos. Na opinião destes
escritores, através de todas as fases políticas e sociais da Espanha durante
mais de três mil anos, aquela raça de celtas
soube
sempre, como Anteu, erguer-se viva e forte; reproduzir-se, imortal na sua
essência; e nós os portugueses do século XIX temos a honra de ser os seus
legítimos herdeiros e representantes."
Invocando a Lusitânia, o poema invoca e evoca o primordial na formação do povo.
O povo não é simplesmente o português, mas é
o lusitano que emerge para justificar os feitos primorosos da nação.
Nos versos iniciais
temos a idéia da pátria solitária:
" Vales de
verdes pinos tão sozinhos," mas que, embora sejam sozinhos, são "Alumiados da graça do Senhor;".
Nesses dois versos fica evidente a importância da solidão e
da religiosidade. Estes dois elementos resgatam, pela visão do eu-lírico, a
condição da própria pátria : a nação solitária e de grande religiosidade.
Percebemos também que o
eu-poético, ao fazer referência aos " verdes pinos ", evoca o período inicial da
Literatura Portuguesa: o Trovadorismo, na cantiga de D. Dinis:
" Ay, flores, ay flores de verde pino, "
É uma volta às raízes
culturais portuguesas, notadamente porque retira uma evocação característica de
uma cantiga de amigo ( o gênero não
vindo da Provença, mas surgido da própria comunidade popular portuguesa).
Estas duas imagens vão
ao longo do soneto tomando corpo e dimensionando estes dois aspectos:
" Ermidas onde ajoelham pobbrezzinhos,
Sorrindo, como Cristo, à própria dor;
Planícies de enigmático topor
Onde se escutam vagos murmurinhos..."
Estes elementos são
básicos, pois fundam uma visão de mundo, em que tudo, como veremos mais adiante,
na obra, com eles se relaciona: a
solidão do povo português em sua epopéia moderna e a fé como elemento
restaurador da perda do ideário lusíada.
Na segunda estrofe
coloca-se o "povo" de uma forma sutil, relacionado à dor: "Ermidas
onde ajoelham pobrezinhos". Essa visão carinhosa e comovida do "povo
" faz lembrar a poesia de Antônio Nobre,
precursor da onda de nacionalismo do início do século.
Fica claro que o povo é
o maior sofredor em todo o processo de grandeza e decadência da nação , mas que
mesmo o sendo, é aqui destacado como agente participante nesse processo de
constituição histórica portuguesa.
Partindo do geral para o
individual, o eu-poético se apresenta nos tercetos , mostrando toda a sua
reverência em relação à terra amada:
" Por ti, meu pensamento é mais profundo "
A profundidade vai ao
ponto de destacar a Lusitânia como coração do mundo. O esquema rítmico ( E R ), até então 10 ( 6-10 ), decassílabo
heróico, é neste momento modificado para
10 (4 - 8 - 10), decassílabo sáfico, demonstrando ser significativa a carga
emocional sobre a lógica histórica dos acontecimentos:
" Ó Lusitânia,
coração do Mundo! "
4º 8º 10º
O verso todo é
expressivo por si só. Todo o enaltecimento dado pela pontuação nas linhas
anteriores, é resgatado com uma força poética que faz eclodir o desejo de
glorificar a memória, de trazer a soberania que um dia se perdeu. A mudança
rítmica rompe a regra colocando o lado subjetivo do eu-poético em evidência.
A Lusitânia é tratada
como uma pessoa que participa dos acontecimentos:
" Planícies (...) onde se escutam vagos murmurinhos" (p.7)
Em:
" E o meu canto mais alto se alevanta ", o poeta, citando e
parafraseando Camões, reforça a importância da Lusitânia e é por ela que o seu
canto chegará ao ponto mais alto. Ele recoloca
sua terra no lugar em que seu coração
deseja. Personifica atribuindo-lhe um "corpo":
" Sobre o teu corpo o céu desfolha lírios! "
,
A personificação da imagem de Portugal mostra o desejo do
poeta de nos revelar que a nação é um ser vivo, que assim como seu povo sofre a
dor, ela, a pátria, também sente a ausência de um direcionamento.
Nos poemas seguintes:
"O Reino de Camões", "O Mar", "Sagres" evidenciam-se o aspecto físico de
Portugal, preparando o cenário para as inclusões históricas que serão abordadas.
Nesses poemas observamos
a História inserida na obra e a emergência dentro dela ( da obra ), citando
novamente Pareyson esclarecemos este ponto de vista. Ele nos afirma que "a história
se derrama na obra precisamente no ato com que a obra emerge da história, e, por outro lado,
a obra age na história precisamente no ato em que a história age
sobre a obra: estes são os aspectos da história da obra, que,
nascendo como intemporal no tempo, vive temporalmente além do tempo. "
Dessa forma, nesses poemas que se seguirão, presenciaremos
a história a se derramar na obra e a obra agindo na história.
Estruturalmente, em
"O Reino de Camões", o poema é formado por 54 estrofes irregulares que se
mesclam entre versos de variados metros, sendo forte a predominância de
decassílabos ao longo do texto.
A alternância de rimas garante a unidade melódica que,
juntamente com o uso de orações exclamativas, exprimem as cenas "merencórias"
retratadas pelo eu-poético. Observamos que desde o início a pessoalidade
expressa pelo eu-lírico do poema assume um
nível de lamentação, elevando-se a um plano metafísico.
" O Reino de Camões "
coloca-nos duas questões a serem discutidas. A primeira diz respeito ao próprio
título - por que reino de Camões e que características são apresentadas neste
reino? A segunda questão é a atitude do
eu-poético.
Comecemos com a voz poética invocadora do passado:
" Invoco, à luz dos poentes moribundos,
Longes do meu sonhar,
lembranças
doutros mundos," ( p. 11)
A formulação do espaço
poético é feita por meio desse desvendar do passado. Abre-se assim, ao leitor um
painel de momentos históricos representativos da História Portuguesa.
O primeiro painel a ser
descortinado é a "Torre de Menagem", onde o poeta faz uma invocação para
que sua alma seja erguida:
" Ergues, como um pendão, à ventania,
Minha alma tímida de monge!" (p.12)
Na verdade, pede a ela
que lhe dê amplitude suficiente de alma para que possa
ver a sua terra de forma isenta, ser um
observador e narrador da sua própria História. Coloca-se num posto de
superioridade de onde poderá rever e observar os fatos da sua nação.
A partir daí
temos,diante dos nossos olhos, um desfile dos feitos portugueses, a começar
com Afonso Henriques vencendo os reis da Mauritânia. Aos poucos, os olhos do eu-poético
vão apresentando a nós as suas visões:
"Visões que incendiaram outros olhos,
Deslumbram meu olhar!" (p. 12)
Nessa primeira parte do
poema, as imagens evocadas constituem o corpo da História lusitana a ser
contemplado. Nela passam também as aldeias, as ruínas, as imagens peregrinas, as
almas perdidas, os palácios, os sonhos, a melancolia, as velhinhas, as freiras,
as donzelas, as avós e os senhores.
Todas essas imagens estão inseridas dentro da noite, a qual o eu-poético refere-se
da seguinte forma:
"A Noite bruxuleia,
Pelas frinchas das portas mal
cerradas;" (p. 14)
e colocadas num
tom saudosista:
" E na minha saudade, onde hoje moram,
Renascem num presépio, entre pastores!" (p. 14)
O cenário
recriado é um mundo permeado pela nostalgia e surge um desejo de reviver todos
esses elementos evocados, embora esse reviver constitua um processo de amargura
e desencanto:
" De memórias, destroços, recomponho
Os que passam, ao longo do meu sonho,
As lágrimas nos olhos agarenos; " (p.14 )
Significativo é o destaque dado ao mar. Ele aqui é um
elemento que se funde ao eu-poético:
" O mar, em minhas veias, flui, reflui..."
(p.15)
É também um elemento que provoca dolorosas lembranças:
" Porque vindes meu sono pertubar,
Lembranças do que fui? " (p. 15 )
Paulatinamente fica claro que o mar faz parte da vida do
sujeito da enunciação, é o seu ser, mas ainda não nos é revelado quem seria
este narrador e de que forma o mar influiu em sua vida.
Mais adiante, ao nos depararmos com a seguinte estrofe:
" Tardes de Agosto, nacaradas, vivas!
Brilham cortejos músicos de cores,
Miragens, esplendores,
Crepitam no ar os risos das ciganas,
Risos das suas almas excessivas;
Deliram alto os sonhos vagabundos;
E as solenes planícies transtaganas,
- Esplanadas do céu, - descobrem Mundos! "(p.15)
O eu-poético destaca a descoberta do mundo, suspendendo
por momentos o elogio ao mar e enfatizando a importância das planícies e do
povo que as habita. A alma excessiva dos ciganos conduz à realização dos "
sonhos vagabundos " . Contrapondo-se a esta imagem de alegria e euforia, a
estrofe que se segue mostra um mundo cadenciado pela amargura e tristeza:
" A sombra dos montados,
As solidões remotas,
Põem crepúsculos de som, magoados,
Nas vozes cadenciadas dos pastores:
Outonos cismadores
Exalam nas rotas..." (p.15)
De forma suscinta, apresenta uma oposição entre os
navegadores e os pastores. A euforia do primeiro grupo contraposta à solidão
dos pastores parece-nos uma forte referência ao abandono sofrido pela agricultura em Portugal e a necessidade
de valorizar o trabalho rural.
O eu-lírico não questiona esses fatos; de fato, ele
prefere suspender seu pensamento, mudando a direção de seu olhar,pois outro
painel será erguido.
" Alongo o tardo olhar que se desterra
Para os longes confusos da distância," ( p.
16)
Em oposição à atmosfera taciturna anteriormente
suscitada, temos agora a evocação de cores claras e de pensamentos alegres. O
reino é azul, as laranjeiras e as ondas riem de alegria, as donzelas ouvem, "nos
aduares", versos de João de
Deus, as horas são de paz e consoladoras. É a visão de Sagres que surge:
" Do mar, acenam as gaivotaas;<
Sagres desponta, ao largo, entre visões de frotas!
"(p.16)
Nessa estrofe o contemplador escolhe os elementos de
maior valor para a formação do seu quadro histórico nacional, e que continuam
na apresentação do espaço físico lusitano, dando destaque a Sintra, "a
bem-amada" dos seus versos, onde se faz revelar a sina de Portugal :
" A minha sina de Senhor doo Mar! "< (p.17)
Apesar de todas estas colocações, ainda não nos é
revelado quem esse eu e, assim, seu
olhar continua a desvendar outros cenários surgidos em delírios. Aparecem, "libertos
da Morte ", os outros:
" Seus vultos esculpidos pelo Assombro
Radiam esplendor; " ( p. 17)
O cenário
se adensa, como se um turbilhão de "outros" tomasse conta do painel
para que o sujeito poético revele sua
identidade:
" Eis que sou, neste instannte sobree-humano,
Nestes altos de Sintra, à lua triste,
Esse que ainda existe
Da jornada
fatal do Desengano;
Sobrevivente espectro do Passado,
O Desejado!" ( p.19)
Revelada a identidade da voz que diz eu, a serra lusitana
cresce no horizonte e o seu crescimento é relacionado à figura de Viriato:
" Viriato, quebra a brônzea sonolência,
Mais alta voa a luz das madrugadas;" (p. 20)
A voz poética se avulta por outras regiões, como Serra da
Estrela, as àguas do Mondego, Coimbra, Douro e Minho.
Percebemos que esse eu,
antes só fixo na visão do mar, agora tem também a terra para contemplar:
" Sou todo terra lusitana
-- Raiz solta no ar --,
Altas memórias a evocar!" ( p. 22)
Assim como a visão da Lusitânia se expandiu, também o seu
ser se completa nesta relação terra-mar.
Voltando agora à questão inicial, que propusemos no
início da análise, o que é o "Reino
de Camões"?, podemos responder que o poema é uma apresentação do território português,
poeticamente erguido em nome da memória, da saudade e do esplendor.
Por meio da
memória, descortinamos um universo melancólico onde, em algum lugar do tempo,
ainda lateja o desejo de vida:
" Alongo o tardo olhar que se desterra
Para os longes confusos da distância," ( p. 16 )
O uso do "enjambement" nesta estrofe
confere-lhe um movimento de divagação contemplativa que parece sugerir o
distanciamento entre o ponto de onde se olha e o horizonte. Daí, na maioria das
vezes, a memória descritiva do eu-poético recair na saudade.
A saudade
por ele expressa, nessa parte
da obra, é uma saudade-lembrança
sensibiliza o contemplativo comovendo-o até as lágrimas. O passado é o
lugar agradável por excelência.
Segundo Sérgio Filippi, "a lembrança é suscitada por aquelas recordações que
nos trazem recados da pátria, das pessoas amadas e dos tempos felizes. A
recordação do passado passa facilmente de um estado puro, constituído apenas
por factos realmente acontecidos, a um estado misto em que o evento recebe o
influxo da nossa psique actualmente mudada. (...) Regressamos aos lugares por
onde passámos e deixámos a marca da nossa criatividade: Lembrança, visão duma
realidade que nos pertenceu, e que agora é tentativa de parar o tempo no seu
fluir."
Sobreposto a este elemento, há também a presença do
esplendor histórico e de figuras gloriosas como Afonso Henriques, Viriato, João
de Deus e também, de forma genérica, o mar, o povo e a terra.
O eu-poético tem consciência de sua solidão e de que,
neste momento, a sua única ação é o recordar e o rezar junto a seu povo,
principalmente junto os pastores.
A imagem construída num crescente envolve todo o
território português: ora ele é envolto nas sombras, no crepúsculo do outono,
ora na claridade da primavera, sendo que a primeira imagem, a nebulosa, se
sobrepõe à segunda. Dominam as sombras dos sepulcros, a incerteza do presente,
as sombras do passado.
No poema seguinte a "O reino de Camões",
"O Mar", esse elemento é personificado como uma figura que
possui mistérios a serem desvendados e
transpostos:
" Vou teus
mistérios desvendar... " ( p. 26)
O mar é uma pessoa viva, que irradia luz, vida, músicas
de sinos, rola sonhos, é onde a espuma brinca. O eu-poético
constrói duas imagens do mar, aquela que imita com maior realismo a própria
natureza, a visão da luz, e a visão que o mar produz em seus sentimentos. Nesta
segunda perspectiva, o mar adquire um aspecto "Incerto",
exausto, é um mar que "empalidece" o eu da enunciação. Mesmo tendo
aspecto turvo, reforçado por imagens do vento, da noite sem luz, o
eu demonstra respeito pela sua autoridade e incorpora-se às suas
características:
" Ó voz do mar carpindo, à flor do vento,
Soturnas elegias;
Voz do meu pensamento,
Eternecendo as duras penedias;
Mar, escultura viva dos meus versos. " ( p. 27 )
É por meio do mar que o eu poético descobre e desvenda os
novos mundos e é através dele que se volta a Portugal.
O último poema dessa série, "Sagres",
continua a descrição física dessa região de Portugal:
É um rochedo bisonho,
Lavrado pela espuma da maré,
Absorto em sonho,
Ventos do largo, e Fé!" (p. 322 )
Os versos irregulares, ora em 4, 5, 6, 7, 8, 10 ou 12 sílabas, evidenciam um movimento de ir e vir do poema que é
reiterado pela sonoridade das suas rimas misturadas ao longo das estrofes.
Reproduz-se assim, poeticamente, o ir e vir das ondas, o movimento do mar,
temos também nas duas primeiras estrofes os seguintes pares de rimas:
peregrino - Destino /
fundos - mundos / mágoa - água / rocha
- desabrocha / Alguém - Além / morte - ssortte / areia - epopéia.
Essas evocações remetem ao universo das Descobertas,
evidenciando luta e glória. A sonoridade
obsessiva do fonema / o / sugere abertura ou amplitude e faz pensar na localização de Sagres junto ao mar:
"Ó Sagres, - piedosíssimo ooratório,,( ...)
O mar em tua frente, em teu altar, rezando," ( p. 31)
Ao lado desse aspecto geográfico aparece o elemento
humano na figura do eu-poético, contemplador e visionário das cenas evocadas
por esse lugar, tornando-se, assim, íntimo dos acontecimentos:
" Ó primeira
abalada
Das naus, vencendo o Incerto!
Vela o piloto esperto,
Vela o receio dos que vão na armada...
Saudosa, bruxuleia a madrugada,
O céu em flor é como um templo aberto! "( p. 33)
Sagres é a linha divisória entre Portugal e o seu destino
- o mar. É o cenário perfeito para o Inffantte sonhar os " impérios
infinitos" e ter sempre como referência a luz que aí brilha .
3.3. 2º BLOCO: OS GRANDES FEITOS
Teixeira de Pascoaes afirma que, juntamente à idéia de
pátria, devemos incluir a idéia de raça; assim, "Portugal
é uma Raça, porque existe uma Língua Portuguesa, uma Arte, uma Literatura, uma
História ( incluindo a religiosa ) -
uma actividade moral portuguesa; e , sobretudo, porque existe uma Língua e uma
História portuguesas. ( ... ) a vida de Portugal se tem manifestado, através
dos séculos, por meio de factos
históricos
que revelam o seu carácter em acção religiosa, política, militar, econômica,
etc.
Basta falar nas Descobertas que não foram uma obra peninsular, mas exclusivamente
portuguesa, filha da nossa inciativa aventureira, do nosso poder de raça em actividade. (...) As Descobertas foram uma obra essencialmente portuguesa,
porque o gênio português, encarnado em Camões, lhe deu a forma espiritual,
sublimada e eterna. "
Essa longa citação deixa clara a importância que os fatos
históricos adquiriram em Portugal para a formação da raça lusitana. Observamos
que os feitos não são somente as meras ações da conquista, mas também a
materialização daqueles acontecimentos, na obra artística de Camões, figura que
constitui um intermediário no processo
espiritual da raça.
Nessa parte da obra de M.B., vamos observar essa relação
entre matéria e espírito.
O poema "A Noviça" traz a motivação das
ações do eu-poético:
"Por ti, à hora
de novena, ao poente,
Enfeito altares! " ( p. 37 )
Composto por dezesseis estrofes regulares, com quatro
versos cada uma, apresenta sempre o mesmo esquema métrico em 10, 4, 10 e 4.
A presença da noviça é espiritual e passiva, enquanto que
o eu-poético estabelece no poema um movimento de " fugir, esquecer,
lembrar, enfeitar, sentir saudade e tristeza, ter visões e partir".
Notamos
também que a expressão que caracteriza o outro, "por ti",
repete-se 8 vezes ao longo das estrofes como busca de justificativa, por parte
do eu-poético, das ações por ele realizadas.
A
evocação cristã da figura da noviça é a necessidade de relacionar seu ato
a algo de maior para que haja motivação
na concretização de seus sonhos, é a tentativa de unir a realização material
com o espiritual:
" Por ti, meus sonhos seguiirão nas vagas,
Náufragos tristes,
Tràgicamente a perguntar às fragas
Se ainda existes? " ( p. 40)
Adiante a figura, consciente , tenta a memória do eu-poético com as recordações das histórias de Adamastor e da Índia.
O eu-poético revela à natureza o seu estado de clausura,
recordações, dor, tentação:
" __ Visões! Lírios que a Morte despedaça,
Vinde assistir:
Toda cheia de estrelas e de graça,
Eu vou partir! " ( p. 39 )
O poeta segue formando os painéis da memória em versos e
no poema seguinte, "A viagem à
Índia", conta este grande feito histórico .
Nesse recontar poético, reforça-se a idéia do "
incerto" nos caminhos que a natureza lhe apresenta.
A descrição da natureza revela a angústia desse estado d'alma: as noites são "sem
fim" , a escuridão é da "Sorte", o mar "atroa
os céus", o vento é "peregrino", a noite adensa-se
cada vez mais e traz consigo a imagem da morte:
" Ronda, no mar, a Morte...."> ( p. 43)
Na construção do poema, em estrofes e versos irregulares,
a voz de Adamastor aparece "em ira" aos navegantes.
Como em Os Lusíadas, a coragem do
povo é evidenciada e a "lusitana raça" zomba do gigante. Na
décima primeira e décima segunda estrofes, os verbos de ação: debaldar, afrontar, avançar, dobrar,
desafiar, vencer, zombar, reforçam o grande feito de contornar o Cabo.
A figura do Gigante, tal qual na obra de Camões, é vítima
do amor e vencido pelos deuses e por Tétis.
Na décima-quarta estrofe, o poema adquire um tom de
claridade :
"As naus caminham, céleres, ao
vento,
Abrem-se os mares pra lhes dar passagem, " ( p. 45)
E para haver a
idéia do passar do tempo, a saudade da pátria é evocada e só é rompida por um grito de: "- Terra! Terra! " ( p. 46)
O poema
segue caracterizando a Índia como sendo de Prestes João, de D. Francisco de
Almeida, de Albuquerque Terribil, de Castro Forte e por fim, faz uma referência
à batalha dos Rumes - para, desta forma,
consolidar o império:
" Fundar o Império de oiro do Nasceente
Depô-lo aos pés de Deus! " ( p. 47 )
Findo esse poema e continuando a apresentação do
seguinte,
"Náufragos", continua o recontar
dos grandes feitos, tendo como base o medo, a agonia, a espera. Os versos heptassílabos, em sete estrofes irregulares, revelam a voz do coletivo:
" Por toda a
noite velámos" ( p. 51 )
A atmosfera do poema é escura, sendo cortada pela visão eufórica das riquezas vindas do Oriente e pela visão de
dois cometas.
O texto lembra o "Velho
do Restelho", em Os Lusíadas,
quando o velho adverte a população, bem
como os navegantes, acerca dos perigos e dos infortúnios do mar.
Neste poema há também esta voz de advertência:
"Ai dos que sonham impérioss!/o:p>
__ Ai da gente portuguesa! " ( p. 52 )
Em oposição a esse mau presságio, o poema termina fazendo
uma declaração de amor e fidelidade à nação portuguesa:
" Acima, acima, gajeiro,
Àquele mastro real!
Não vês meu amor primeiro,
Areias de Portugal? " ( p. 53 )
No último poema desse bloco, " Jerônimos",
o eu-poético resgata o lado espiritual da conquista. Até o presente momento
tínhamos a amplitude dos espaços. Esse espaço, no entanto, vai paulatinamente fechando-se para
apresentar o lugar onde os grandes heróis da pátria estão encerrados:
" Ó templo em orações alevantado!
Firme solar da Fé! Altar aceso!
Poema dos Lusíadas lavrado!" ( p. 59 )
O verbo "repousar", anaforicamente em
duas estrofes seguidas, reforça o descanso merecido dos grandes, como Vasco da
Gama, João de Deus e Camões.
O espaço
é evocativo para o eu-poético, e por ele passam os vultos, as imagens, as
sombras e a saudade que brilha transportando-o para "regiões
ignotas" até confessar o seu regresso a Portugal:
"Ó Portugal, por cujo amor penei,
Não me cegou a luz da imensidade,
Às tuas praias de oiro regressei!" ( p. 59 )
Estruturalmente, esse poema apresenta todos os versos
decassílabos e estrofes com três versos cada, com exceção da última que
apresenta um a mais, destacando, mais uma vez, a importância do mar na vida do eu-poético :
" Ó minha alma que foste de longada,
Mundos a descobrir, a interrogar,
Descansa, sob a
abóbada sagrada
Do tempo aberto às orações doMar!" ( p. 60)
Novamente, faz-se presente o jogo de espaço escuro e
claro e o eu-poético se revela trazido pela saudade.
3.4. 3º BLOCO : UM DIÁLOGO PERMANENTE
Acreditamos que com esse grupo de poemas entramos no
ponto fulcral da obra - a questão do Sebastianismo.
O poema "Alcácer Quibir" é divido em
quatro partes. A primeira parte tem 25 estrofes, a segunda e terceira têm 5 estrofes
cada e a última, 17. Todas as estrofeses são dísticas com versos heptassílabos
As rimas emparelhadas juntamente com os versos em redondilha maior conferem ao
poema um ritmo de balada popular, entoado pela voz de um eu-poético que observa
uma cena.
Na
primeira parte há pouco uso de verbos de ação. Os verbos que aparecem
descrevem contemplativamente um momento da cena:
" Passa o esplendente cenário
Dum cortejo extraordinário: " ( p. 63 )
Neste quadro é onde surge El-Rei "vestido de seda" e "de quimera
ao peito" , em toda a sua exuberância.
O eu-poético, observador e contemplador, é perspicaz o
suficiente para notar que dentro dos olhos de El-Rei "pasma o torpor
dos desertos". Ele nos constrói uma imagem abrangendo tanto o presente
como o futuro.
Na oitava estrofe, o "Povo" é chamado
para participar dos sonhos que se encerram na figura de El-Rei. Os verbos no
imperativo afirmativo: "chegai",
" vinde", " vede" reforçam o convite para tomar parte do cortejo:
" Vinde ver dos miradoiros<
A Glória colhendo loiros! " ( p. 64 )
O quadro criado é
cheio de euforia e esperança compartilhada em comunhão com a natureza :
" À luz do poente extasiadoo,/o:p>
Passa o cortejo sagrado! " ( p. 65 )
e com Deus:
" Pela sua alta certeza,
Falam Deus e a Natureza! " ( p. 64 )
Paulatinamente temos a construção da figura de El -Rei,
segundo as visões dos que o rodeiam. Dessa forma, refletem-se no rei os desejos
e sonhos da sua corte: para os pajens, o rei reflete " celestes
paisagens", para o povo, é um " milagre novo", para
os sábios e os velhos , é o rei que não "escuta os conselhos".
Atentemos para a seguinte estrofe:
" Pelas suas tentações>/span>
Responde a voz de Camões. " ( p. 64 )
Mais uma vez é feita menção à obra de Camões e cumpre-se
aquele destino solenemente previsto nos irmortais versos da dedicação, que
relembramos:
" E, enquanto eu estes cantto, e a vvós não posso,
Sublime Rei, que não me
atrevo a tanto,
Tomai as rédeas vós do reino vosso,"
Em Lusitânia,
El-Rei toma as rédeas do reino e tem a certeza de estar atendendo a vozes
divinas:
" Deus fala ao seu pensamennto:>
__ Armada ! Panos, ao
vento! (
p. 65 )
A segunda parte
coloca em cena as naus em partida. Assim, a repetição do verbo "ir" na terceira pessoa do plural do presente do
indicativo apresenta uma carga semântica de movimento e de visão
de futuro muito forte:
" Lá vão as naus, lá vão elas"
( ...)
" Vão carregadas ( eu sei! )
Dos sonhos virgens de El-rei. ( p. 66)
E, mais uma vez, o eu-poético mostra a sua relação afetiva
em relação aos fatos.
Pouco a
pouco esse cenário adensa-se ; a natureza torna-se escura:
" As nuvens o ar escurecem;
Vento e vagas endoidecem! ", ( p. 66 )
trazendo mais um presságio do eu-poético:
"Ai da frota resplendente &"< ( p. 66)
A chegada das naus acontece na terceira parte do poema. O eu-poético personifica os elementos da natureza, de modo que a armada chega a
seu destino porque o "vento peregrino" quis. A paisagem,
embora estática: " e nos tardos horizontes" preguiçam " os montes," tem
vida na luminosidade do sol que "
cintila" e "doira a praça".
Os verbos "ver" e "olhar",
no imperativo afirmativo, chamam a atenção do leitor para a fixação da cena e
dos fatos que irão se desenrolar.
A última parte do poema coloca a crescente emotividade do eu-poético e a batalha em Alcácer
Quibir em evidência:
> <"Tristes paragens;
areais,
Chagados do sol, aos ais! ( p. 67 )
O vocábulo " triste" já prenuncia o
destino derradeiro que El-rei terá ao encontrar-se com o "moiro
ferino".
O uso de orações exclamativas e de
reticências, na maioria das estrofes, mostram o envolvimento do eu-poético que
explode em lamentos:
" A Morte ilusões destroça;;
Ai de El-Rei, esperança nossa! ( p. 68 )
É de se notar a linguagem religiosa que perpassa todo o
poema. No caso, uma invocação tirada da "Salve Rainha" que se
aplica a D. Sebastião, visto religiosamente, como o salvador.
A partir daí, as cenas adquirem uma tonalidade vermelha e negra. Temos o sangue a
dimanar "a flux" dos ferimentos de Jesus e a noite a estender
a mortalha " sobre o campo de batalha."
A escuridão é gradativa, indo da noite ao céu sem nenhuma
estrela, até chegar ao silêncio dos "sonhos
mortos". O espaço parece
diluir-se neste abismo de dor
que toma voz em outro lugar, na Lusitânia:
" Longe, nos ecos do mar,
A Lusitânia a chorar! " ( p. 69 )
Em "Trova", o próximo poema, o autor coloca
como mote uma estrofe de um de seus livros, O
Último Lusíada:
" Quando eu canto, o povo eem massa,,
Chora ouvindo a minha voz;
Sou o Camões da Desgraça,
Canto o mal de todos nós! " ( p. 73 )
Este mote servirá de base para a finalização de cada uma
das 4 estrofes regulares que compõem o poema.
Os versos são todos heptassílabos , colocados em primeira
pessoa e apresentam-nos de forma direta o próprio pensamento de D. Sebastião, numa
simplicidade elocutiva que nos leva a
pensar nas cantigas medievais.
A primeira estrofe, com dez versos, dá ênfase à ação
passada do sujeito: andei, puni, fui,
sustive, perdi; revelando-nos dois movimentos: o da sua glória e o da sua
queda.
Em sequência, na segunda estrofe, a angústia do eu-poético é adensada pelo contraste entre o real e o desejo. Há o sonho, mas
este está a "fulgir"; anseia-se por um "novo
mundo", mas estas "miragens" dormem o "sono
profundo". O remorso se evidencia pela ação do verbo "partir":
> /span>" Ai de quem parte!
Partir!
É nada restar de nós! " ( p. 74 )
E também
pela passividade do verbo "ficar":
" Ai dos que ficam a sós,
Na escuridão, de repente! ( p. 74 )
As antíteses partir e ficar expressam a mesma dor que
culmina na perda de algo - é o choro da ausência.
É nessa atmosfera que podemos entender o surgimento de " uma voz ausente", na busca da voz do eu-poético:
" Ao longe, uma voz ausentee
Chora, ouvindo a
minha voz! " ( p. 74 )
A terceira estrofe reitera a perda de tudo por parte do eu-poético:
" Minha guitarra, perdi-a,
Lá onde nem ave esvoaça, " ( p. 74 )
Simbolicamente o
vocábulo " guitarra ", expresso duas vezes nessa estrofe,
representa a alegria que o eu-poético já não possui mais e reforça a idéia
contida na primeira estrofe:
" Poeta perdi a graça."t; ( p. 74 )
Poeta sem graça e sem guitarra, ele se firma melancolicamente,por
meio de aliterações em / d/ e / t/ , como o " Camões da Desgraça".
Por último, na quarta estrofe, há a evocação de dois
cenários: Mauritânia e a Lusitânia.
O primeiro caracteriza-se por ser o cenário da morte,
onde Cristos sobem calvários. O segundo, Lusitânia, é dos "delírios de
incerta voz", da "insânia", onde o eu-poético na "
cruz da Ausência" canta o seu "mal".
O terceiro poema da série, " Aquela
Madrugada", estabelece um diálogo com o soneto de Camões. O poema formado por 6 estrofes,
repete em cada verso inicial o verso de
Camões:
" Aquela triste e leda madrrugada".<
Nesse poema, em gradação, a madrugada é "
desejada ", " celebrada", "anunciada", "memorada";
sendo que o vocábulo "desejada"
repete-se três vezes intercaladamente entre as estrofes.
A madrugada adquire desde a primeira estrofe uma
conotação positiva:
" Doira o cristal das fontes,
Inunda o meu jardim! " ( p. 79 )
A madrugada representa um movimento de abertura. A sua
origem é o passado:
" Vem das sombras confusas do Passado, " ( p. 80 )
E chega até o eu-poético para "descerrar"
seus "olhos de ceguinho". Além de Camões nesse poema, há
Antônio Nobre, nos "Olhos de Ceguinho".
A madrugada,
assim como no poema de Camões, anuncia algo que está prestes a acontecer.
Observamos que o poeta fala sobre o esplendor da madrugada, mas tarda em
esclarecer o porquê da sua vinda. Somente na última estrofe sabemos que ela
vem:
" Doirar o azul
marinho
Da praia
Ocidental!" ( p. 80 )
Encontramos nos primeiros versos de cada estrofe do
poema, os dois adjetivos "triste" e "leda",
constituindo uma antítese que se aplica ao desenvolvimento do poema. A
madrugada é triste porque demorou a surgir, vem das sombras e é saudosa.
Opondo-se a esse estado, a madrugada é leda porque dissipa essa angústia e traz dentro de si a nova manhã.
Vemos, então, que o "triste" dá uma
conotação de profundidade, de expectativa e esperança - é a dor. Ao passo que "leda"
traz a alegria confluente com a claridade azul e descerradora do olhar do
poeta. A madrugada, posta assim, é símbolo do desfecho de um conflito:
> <" Rescende a Paraíso,
Demanda os corações! " (p. 80 )
A madrugada adorna, rescende, demanda, vem, entra,
visita e doira. Ela é ativa e encerra um mundo de ações na reação de quem a
percebe.
Dessa forma, temos a celebração da madrugada que porta
luz, como todas as manhãs, mas que especificamente nessa manhã, anuncia o "descerrar" de um novo
horizonte. Parece-nos que tanto mais intensa é a alegria de sua vinda, quanto
mais íntimo é o desejo dela em si.
A madrugada assegura a unidade do poema e funciona como
uma personagem preparando-nos para o próximo poema, "O Enviado".
Aqui novamente os versos voltam a ser heptassílabos, com treze estrofes dísticas. O poema é um diálogo do eu-poético
com a " donzela", os "
fantasmas", o "Romeiro", os "ciprestes",
a "noviça" e o " rei".
O poema abre com duas
estrofes interrogativas que questionam o destino do rei, para, em seguida, a
grande maioria das orações tornarem-se exclamativas e mostrarem toda a
intimidade com a qual o eu-poético expressa a sua relação com El-Rei:
> /span>__ Senhor de olhar peregrino,
Vem guiar nosso destino! ( p. 84 )
De novo, nestes versos que estilizam orações populares, litanias, há uma forte presença de Antônio Nobre.
Observamos
também o contraste entre o escuro e claro que se faz no poema:
" E partiu... levou a luz &"< ( p. 84 )
e a volta à claridade
em:
" Desponta, ao largo, uma vvela ! " ( p. 84 )
O rei é o agente
divino, que surge por entre a cerração com seu olhar peregrino e a finalidade
de trazer a luz a seu povo.
O último poema desta série " O Regresso ",
reitera em versos heptassílabos o cantar do português e a volta triunfante de El-rei.
Nesse poema, dá-se ênfase aos verbos no presente do
indicativo ( ver, enxergar, escutar,
acordar) todos relacionados ao povo.
Há a preocupação de situar os fatos com o advérbio de
tempo "depois" na primeira e segunda estrofes como a confirmar que este tempo já é passado.
A imagem que vamos formando de El-rei é aquela associada às expectativas do povo, pois é
este que vê a " luz duns olhos
errantes".
Esse povo
é descrito em três momentos:
a. o de assomar aos mirantes;
b. o de sonhar com a manhã redentora;
c. e, finalmente, o de acordar para abraçar a sombra " virgem de um
moço".
O movimento do povo passa da contemplação: vê,
enxerga, escuta, para a ação de acordar,
abraçar e prosseguir a " Idade de Oiro".
El-Rei continua sendo descrito como sagrado
e, nesse cenário, criado pelo eu-poético, aparece ao lado de uma das imagens
supremas da cristandade: Nossa Senhora,
para também compartilhar essa nova era.
O espaço apresenta-se pleno e abbertto :
" Passa nos céus, a fulgir..." ( p. 87 )
e, tal abertura está
foneticamente criada pela assonância em
/ a/: "mar",
"ar ", "barra", "varanda", "guitarra",
etc., que reforça o esplendor da manhã anunciada.
Retomando Os Lusíadas, na Dedicação, Camões já
previa:
" E vós, ó
bem-nascida segurança
Da Lusitânia antiga liberdade,
E não menos certíssima esperança
De aumento da pequena cristandade,
Vós, ó novo temor da maura lança,
Maravilha fatal da nossa idade,
e mais adiante:
" Vós,
poderoso Rei, cujo alto império
O Sol, logo em nascendo, vê primeiro;
Vê-o também no meio do hemisfério,
E quando desce o deixa derradeiro;
Vós, que esperamos jugo e vutupério
Do torpe ismaelita cavaleiro,
Do turco oriental e do gentio
Que inda bebe o licor do santo rio: "
Segundo Ernest Curtis, o herói é um ideal humano
que, na visão de Max Scheler, se completa com a configuração de cinco valores básicos: " a santidade, os valores intelectuais, a nobreza,
o útil e o agradável. A estes valores
correspondem cinco tipos de personalidades ou paradigmas: o santo, o gênio, o
herói, o dirigente da civilização e o artista do prazer. Assim, o herói deverá
ser ( ...) o tipo de pessoa ideal, com o centro de seu ser fixado na nobreza e
nas suas realizações, portanto em valores vitais "puros" e não
técnicos, e cuja virtude fundamental é, naturalmente, a nobreza do corpo e da
alma."
Ambas as figuras construídas por Camões e Mário Beirão, resgatam
o aspecto virtuoso e heróico de D. Sebastião, evidenciando a sua nobreza de
espírito, sua disposição para as grandes realizações. Contudo, em Lusitânia, o herói, paulatinamente
ultrapassa o plano heróico para
inserir-se no plano do sagrado:
" El-Rei a imagem sagrada " ( p. 87 )
Desta forma, vai-se desenhando o aspecto mítico do rei,
pois, como ensina Mircea Eliade " o mito conta
uma história sagrada; ele relata um acontecimento ocorrido no tempo primordial,
o tempo fabuloso do "princípio". Em outros termos, o mito narra como,
graças às
façanhas dos Entes Sobrenaturais, uma realidade passou a existir, seja uma
realidade total, o Cosmo, ou apenas um fragmento: uma ilha, uma espécie
vegetal, um comportamento humano, uma instituição. É sempre, portanto, a
narrativa de uma "criação": ele relata de que modo algo foi produzido
e começou a ser. O mito fala apenas
do que realmente ocorreu, do que se
manifestou plenamente ( ... ) em suma, os mitos descrevem as diversas, e
algumas vezes dramáticas, irrupções do sagrado ( ou do
"sobrenatural") no
Mundo."
A figura do
rei é,pois, ao longo da obra,
dimensionada até ser o elemento
principal para criar uma Nova Era
Portuguesa:
" Os que, libertos da Ausência,
Prosseguem a Idade de Oiro! " ( p. 88 )
Chamamos a atenção para a idéia de recriar-se um novo universo em que D. Sebastião tem a nobreza
de alma, a virtude, o ímpeto, a autoridade, o valor do grande empreendedor e criador
mítico para ser de fato o fundador do novo Portugal e também de um novo
Império.
Lusitânia ao fazer menção à
volta da Idade de Ouro, fecha o ciclo do ressurgir, em que tínhamos os fatos
anteriores a de Alcácer-Quibir, o período da espera e finalmente a volta da
Idade de Ouro. O ciclo, assim exposto, remonta a História na cosmogonia mítica,
em que El-Rei é o renovador de todo o Cosmos; no caso, revelador de um novo
Portugal ou mundo.
A transcendência mítica do rei fundamenta-se também pela
evolução do Sebastianismo em Portugal. Segundo Antônio Quadros, esse foi o
único movimento de feição nacionalista, surgido entre os portugueses, de modo
tão forte como uma religião. Na sua visão, seria um mito que " passaria a constituir um dos principais
elementos da estrutura cultural
portuguesa até os dias de hoje. Mito que teria profundas ressonâncias na psique
nacional, ora na transposição e na sublimação da literatura popular ou erudita,
ora no nível mais profundo do
inconsciente coletivo, aparecendo, adormecendo e reaparecendo sempre ao longo
dos séculos."
4.5. 4º Bloco: A PRESENÇA NA AUSSÊNCIA
Chegamos assim à última parte da obra, "
Ausentes". Este capítulo, de
certa forma isolado do todo da obra, apresenta-nos dezesseis personalidades da
História e da Literatura Portuguesas cantadas em soneto. São elas: Nun'
Álvares, Infante Santo, Afonso de Albuquerque, Vasco da Gama, Gil Vicente, Bernardim Ribeiro, Camões, Dom Sebastião, Frei Agostinho da Cruz, Bocage,
Castilho, Camilo, João de Deus, Antero, Oliveira Martins, António Nobre.
Após ter-nos dado
sua visão histórica de Portugal, nas partes anteriores, o que estaria Mário Beirão pretendendo trazer de
novo para a sua obra ? Que aspectos ligariam essas figuras para serem
especialmente ressaltadas ? Fisicamente,
todas já se encontravam ausentes da vida
portuguesa, quando da publicação do livro e pensamos que para responder
à questão levantada, o mais acertado será proceder à análise dos sonetos em
questão.
Primeiramente, deparamo-nos com o ausente " Nun'
Álvares".
O soneto é escrito em
primeira pessoa:
" Senhor! Por mim, teu espírito visita
O Reino onde servi como soldado;" ( p. 91 )
É por sua
própria elocução que sabemos a tragicidade de sua vida:
" A humilde cela
que o teu filho habita
É um cárcere de lágrimas banhado;" ( p. 91 )
Ao utilizar a imagem "cárcere de lágrimas
banhado", com ênfase na palavra "lágrimas", fica
claro o destaque que se dá ao sofrimento que este "eu-eloquente" presentifica. Há uma visão de desalento
acerca de sua própria história, mas existe também uma esperança de poder sair
desse estado de aprisonamento. Adiante, ao dirigir-se ao "Senhor",
diz:
" Condoa-se do olhar do empparedado,,"
Trava-se uma luta silenciosa entre o olhar de Deus e o
olhar do prisioneiro:
" Condoa-se do olhar do empparedado,,
A luz desses teus olhos infinita!" ( p. 91 )
A sua história, professada em tom de oratório, é
reforçada por aliterações em /s/ e /m/ e, também pela insistente evocação da
palavra "Senhor". No primeiro verso do primeiro quarteto:
" Senhor! Por mim, teu espírito visita
O Reino onde servi como soldado;"
no primeiro verso do primeiro terceto:
" Senhor, perdoa
ao monge arrependido: "
e para terminar o soneto:
" Por teu pranto
humaníssimo, Senhor! "
O eu-poético, reforçando este tom de prece, usa verbos
como: perdoar, condoer-se, merecer, construíndo desta forma a sua súplica.
É sabido que, de fato, Nuno Álvares foi herói e santo
português, mas o aspecto expresso neste soneto é o estado de consciência que
ele atinge, acusando-se por ter sido um dia vencedor de grandes feitos:
> " Soberbo eu fui;
perdoa ao vencedor,
Ao vencedor dos
homens, - o vencido"
Apresenta-se
diante do leitor uma tensão entre o que foi o seu passado e a possibilidade de perdão expressa em
tempo presente. O momento do "agora" rege a dor e a expectativa de
que a justiça seja feita:
" Se ainda não mereço a tua dor,
Reduz-me à escuridão do eterno olvido!
Em sequência temos um soneto dedicado ao " Infante
Santo ".
Neste soneto em terceira pessoa, o Infante é comparado a Job, mostrando as
dificuldades de seu destino, sendo seu fado
mais cruel :
" Job não soltou mais lastiimosos trrenos,
Nem foi mais crua a estrela do seu fado:" (p.92)
O universo poético construído pelo narrador é de dor e
comiseração. Para descrever este estado utiliza adjetivos como: "crua"
para falar de seu destino, "escravizado" referindo-se aos
infiéis a quem foi entregue, "gemidos" relatando o seu estado
, "compungidos" e
destinados a exprimir os seus olhos " marejados".
Além desse universo de dor, há também ênfase no
esquecimento que a nação lhe dedicou:
> <" Morto por sua pátria,
sem que ao menos,
Por ela fosse, em lágrimas, lembrado! " (p.92)
Apesar de destacar elementos tão dolorosos, o eu-poético
chama a figura do Infante, pedindo-lhe
que saiba perdoar:
> " Se te move o
Perdão, ó desterrado,
Vem para nós de alma isenta e olhos serenos!
" ( p. 92)
O Infante D. Fernando é o santo que, ao encontrar-se
com seu povo, é capaz de absorver os
crimes deste e purificá-los por meio da " estranha luz de Além",
característica de seu olhar.
Enfatiza-se mais uma
vez a questão da espiritualidade e do herói. O Infante Santo foi mártir e
morreu pela pátria. O soneto resgata o aspecto da integridade espiritual dessa
personalidade, não só pela comparação com a personagem bíblica Job, como também
pelo enaltecimento do seu "olhar" que é " sereno",
"compungido" e "marejado de luz". É uma personagem capaz de ver o passado e possui a capacidade de transformar as
pessoas no momento presente, dada a sua fé e santidade.
Ao ser chamado : "Vem para nós de alma isenta e
olhos serenos", percebemos que a tensão entre passado e presente se
rompe pelo reconhecimento que se faz da sua pessoa:
" Descansa em novos céus Jeerusalém!! " (p. 92)
O uso do verbo "descansar" convida a que as pazes sejam efetivadas,
nesta relação de esquecimento e reconhecimento, que, embora tardio, é de extrema importância.
Seguindo a análise, o outro poema é dedicado a Afonso de
Albuquerque. No soneto é retratado o momento de seu funeral:
"Vai aos ombros dos mudos ccavaleiroos," ( p. 93)
Há uma descrição
da cena utilizando-se de uma forte integração entre o fato em si, a morte de
Albuquerque, e o envolvimento da natureza no desenrolar deste processo.
A natureza participa do evento, desde o início da cena
até o seu final:
" A noite acende fúnebres luzeiros
Que o vento
ruim apaga, de repente;" <(p.93)
A natureza personifica-se para prestar a sua homenagem a
tão ilustre Governador de Goa:
" Do Vizo-Rei espectral... O céu prrofundo
Veste pompas de grã solenidade!" (p.93)
O universo construído pelo eu-poético é o de uma imagem
em que a natureza, embora muda, expressa a sua dor de forma mais profunda que a
dos próprios homens. Os cavaleiros que conduzem o Rei são mudos, a "desvairada
gente" de Goa ouve dos pássaros os "pios agoireiros".
No soneto sobrepõe-se o sentimento
expresso pela natureza como a
enaltecer a figura de Afonso de Albuquerque; a natureza "veste pompas
de grã solenidade"; já os homens são descritos como "mudos", ou "desvairados".
O "olhar" do morto é ausente, mas em
contra partida, "o Espectro sonha". A visão espectral que se
cria do Vizo-Rei é uma fusão do seu ser material com a natureza e a
religiosidade. O elemento religioso é reforçado pela cruz que o Rei tem em suas mãos.
É interessante observamos
a posição em que o ser
" espectral" sonha:
" O Espectro sonha, de alumiado
aspeito,
Em frente ao mar... " ( p. 93 )
Se o olhar já se faz ausente, o sonho se faz inspirado no
mar e na fé.
O desfile dos ausentes continua no soneto seguinte com a figura de Vasco da
Gama.
O eu-poético faz uso da anáfora " perpassa em
Glória" no início dos dois quartetos para reforçar a idéia do herói, do
desbravador Vasco da Gama. A esta anáfora, junta-se outra - " vencendo
"-, para também evidenciar a
idéia do herói:
" Vencendo a própria natureza humana!( ...)
> Vencendo o
Adamastor na fúria insana!" (p.944)
A figura de Vasco da Gama é construída ressaltando dois
aspectos em questão: "Homem ou Deus" ?
A sua pessoa é associada à do "mar". É o
mar que lhe cinge o corpo e leva a "sua alma à Terra Prometida".
É o mar também que embala o seu "coração desfeito " .
Notamos que, mais uma vez, o elemento espiritual é
destacado. Vasco da Gama é um homem, mas é um homem sobre quem o próprio eu-poético
se questiona se também não será Deus . Em suma, ele é o desafiador dos
mares, o que peleja nos ares, o vencedor.
O poema mostra o
confronto entre Vasco da Gama e o gigante Adamastor:
" Vencendo o Adamastor na ffúria inssana " ( p. 94 )
O herói não é recriado realizando o seu feito real,- a
viagem às Índias -, mas sobre a personagem concebida por Luís de Camões em Os Lusíadas de Camões. O narrador-
poético busca no antológico episódio o rigor da força da personagem camoniana
para que ela se construa com mais vigor e efeito.
Outro elemento destacado são os "olhos"
de Vasco da Gama "já sem vida", mas que, embalados pelo mar,
trazem " o Sonho que não coube no seu peito!"
Depois de celebrar estas quatro personalidades históricas,
os sonetos começam a explorar o campo literário. A primeira personagem a ser
destacada é Gil Vicente.
Os verbos estão no presente do indicativo, dando a exata
sensação de que realmente estamos presenciando uma festa no paço. Na
verdade, não se destaca Gil Vicente em
si, mas o mundo vivido por ele. Assim os substantivos: paço, corte, farsa, riso, El -Rei, máscara, retratam o espaço que o
cerca. A sua obra é mais forte que sua presença física:
" E dos lábios do Mestre a mofa em riste
Rasga a sombra do século, aos clarões; " (p. 95 )
Autor e obra fundem-se para criar esta visão que será
ainda reforçada pela característica mais marcante da obra de Gil Vicente: o
riso.
" Reino em delírio! Máscaras de Entrudo,
Rindo os risos diabólicos da Farsa!" ( p. 95 )
De forma indireta, o eu-poético traz à tona a expressão
latina que foi tão caracterizadora do trabalho de Gil Vicente:
" ridendo castigat
mores”,ou
seja, por meio do riso corrigem-se os costumes que o dramaturgo visava corrigir
de sua época.
Juntamente com a sua figura, destaca-se também a presença
do Rei e do seu olhar sobre o que se passa:
" El-Rei atende, estranhamente mudo;
Em seu olhar
de lúgubre comparsa,
Alagam trevas reflectindo tudo... "
O olhar do Rei na verdade é o próprio olhar de Gil
Vicente, uma vez que é um "olhar de lúgubre comparsa" - um se
reflete no outro e ambos refletem sobre tudo.
Cronologicamente, nesta apresentação dos "
Ausentes” passamos para o soneto
seguinte " Bernadim Ribeiro" , ele, literato tão bem conhecido
pela sua obra História de Menina e Moça,
de densa interioridade, fatalismo e melancolia.
Na descrição de Bernardim, destaca-se a palava "fonte”:
" uma fonte rompeu”, " a fonte da tua alma", " a
fonte chora", " ó fonte onde naufragam meus sentidos”
A alma de Bernardim é isso: a fonte, a origem de algo de
divino que marca a alma portuguesa:
" Lá, num deserto bíblico, sem fim,
__ Tristeza morta, pântanos, livores...
Uma fonte rompeu por entre flores, " ( p. 96 )
É interessante observar que não se destaca o
"olhar " do poeta, mas algo mais forte: a alma.
A alma dele é uma alma que " chora, pela noite
ruim", que é "melindrosa". É a alma da sensibilidade:
" Por que sufocas de ais? Que fundas mágoas
Arrepiam teu curso de gemidos?" ( p. 96)
Dentro dessa visão, Bernardim traz um " cântico
de amores" à Literatura que então resplandesce de dor e melancolia; é
o resgate da saudade amorosa.
O
eu-poético, dada a força da alma de Bernardim, deixa-se fundir com ela, como se a alma dele fosse
também uma fonte de inspiração:
" Ó fonte onde naufragam meeus sentiidos," (p.96)
Bernardim é a fonte, que saiu do "deserto
biblico" e que "rompeu, por entre flores”.É a alma que
encontra a luz e a leva aos outros.
Em "Camões", o próximo soneto , o poema
em primeira pessoa expõe a voz do poeta que ressurge " no curso das
memórias".
Destaca-se de imediato a imagem do "mar"
associada a sua figura. Esta imagem associa-se também à solidão em que ele se encontra:
" Em frente ao
mar, à solidão medito;" ( p. 97 )
Contudo, este estado é
interrompido pela " nocturna sombra" que invade o seu olhar.
O discurso poético presentifica elementos relacionados ao curso da sua vida :
> /span>" Índias, miragens, pegos
de saudade..." (p.97)
Num crescente,
que passa da sombra à luz e o define como o ser que desperta do seu sonho,
evidencia-se o seu ressugir:
" Dentro de mim... Das penas do Profundo
Ressurjo mártir, cavaleiro, Poeta!" ( p. 97)
O ser que desperta é o Poeta, e é significativa esta
gradação, uma vez que, nesta escolha, a função do poeta é a maior. É ele o que
cria o "novo mundo". Nele a raça portuguesa se introjeta e ele constitui o agente catalisador capaz
de recriar o mundo lusitano:
" À voz de
Deus, Lusíadas componho;
E dou ao Mundo um lusitano mundo:
Alta verdade de supremo sonho! " ( p. 97 )
Nessa descrição, o elemento que nos chama mais a atenção
é a questão da "sombra", que vai ganhando espaço e
adensando-se no decorrer do poema. Essa imagem se estabelece de duas formas.
Primeiramente, a sombra é noturna e invade o seu olhar e, depois , a sombra é a
raça portuguesa que nele se projeta .
A apresentação de Camões é platônica , já que arquetípica : ele é a projeção de uma raça.
Ele tem consciência da importância da sua obra - Os Lusíadas - onde se cria
um mundo de "alta verdade".
Na sequência dos
poemas "Ausentes", há uma
quebra da apresentação de personalidades literárias e temos a figura de D. Sebastião no próximo soneto de
mesmo nome. O eu-poético utiliza-se novamente da primeira pessoa para dar voz a
sua criação:
" Subo aos eirados e, saudooso, incllino
Meus olhos pelos vagos
horizontes: " (p.98)
Nesse soneto, a questão do tempo parece ser o ponto chave
para a descrição do Rei:
" Para que além dos séculos despoentes,
Senhor das nossas vidas e destino," (p.98)
A visão que o Rei tem de si mesmo da idéia da amplitude de seu "olhar". Ele é o senhor soberano que pode ver
todo o horizonte; contudo, não podemos esquecer que os horizontes são "
vagos " , e vai-se criando, aos poucos, a imagem do peregrino, cheio
das incertezas e ausências que povoam o seu universo:
" E sigo por desertos e altos montes
Os passos dum incerto peregrino..." ( p. 98 )
Nesse momento, os
tercetos mudam a voz da primeira para a terceira pessoa, trazendo à tona a verdadeira
magnitude da figura do Rei. Há uma veemente invocação de sua pessoa,
acompanhada de uma ardente súplica.
" Ó Rei! sol de claríssima pureza,
Senhor da nossa Fé, -- vem alumiar
Com teus olhos a terra portuguesa!" ( p. 98 )
O Rei é o sol de primeira grandeza que ilumina os olhos
de seu povo. O olhar, antes incerto ,
instalado nos "vagos horizontes", passa a ser um olhar iluminador, o olhar da chama da
esperança.
O Rei tem consciência de que é o "Senhor"
da vida e do destino português, mas para que seu destino se cumpra é necessária
a fé das outras pessoas. Esta relação
de dependência é reforçada também pelo elemento da natureza:
" Por ti, as ondas quebram, a chorar,
Dos sinos, à noitinha, tombam ais,
E marulham saudades os pinhais!" ( p. 98 )
A natureza também sabe da sua importância e por isso ela
personifica os atos de "chorar" ou o de ter "saudades"
. O poeta traz aqui elementos que reforçam a soberania do Rei, não só em
relação a seu povo, como também em relação à natureza.
A saudade dos pinhais,
leva-nos a fazer uma conexão com as cantigas
trovadorescas de amigo. A natureza reflete a ausência do ser amado, o
Rei, por todos.
Para continuar no
cantar da saudade é-nos dado, em seguida, um soneto sobre Frei Agostinho da Cruz, poeta pré-barroco
que cantou a saudade contínua do céu e o remorso vivo de um passado que o
magoou.
Apresentado em terceira pessoa, a personagem é colocada desde o início em comunhão com a
natureza:
" Ai de ti, doce irmão das avezinhas
E das ervas rasteiras e de mim;" ( p. 99)
para em seguida ser
destacada a sua característica mais marcante, a saudade:
" E mais saudoso que as sauudades miinhas! "(p.99)
A sua saudade vem das profundezas de sua alma e na sua
poesia evidencia-se um tom de
melancolia:
" Choram teus cantos lágrimas sem fim..."(p.99)
No soneto , Frei Agostinho da Cruz é também o
intermediário de que Deus se utiliza para encarnar a natureza:
" Por ti, encarna Deus a Naatureza",, ( p.99)
ou a comunhão entre os homens:
"Por
ti, Deus vem sentar-se à nossa mesa, "(p.99)
Assim como fez no
soneto "Bernardim Ribeiro", aqui o eu-poético destaca a alma
do poeta, sua força e a potencialidade
adquiridas, além de ele constituir-se num elo de integração entre Deus e a natureza ou entre Deus e o
povo português.
Com a apresentação do soneto seguinte, "Bocage",
há uma ruptura da sequência saudosista e melancólica das figuras até então
descritas.
O painel que se desenha
ao leitor sobre o poeta é dada pelas imagens do "cruel"
e do "desengano" :
" Funesta imagem de ilusão cruel"/span> ( p.100)
retratando o próprio destino vivido por ele, Bocage.
Parece-nos que o eu-poética constrói a partir do soneto:
" Meu ser evaporei na lida insana
Do tropel de paixões, que me arratava:
Ah! Cego eu cria, ah! mísero eu sonhava
Em mim quase imortal a essência humana: "
do próprio Bocage toda
uma caracterização que evidencia uma
apropriação de palavras bocagianas para trazê-lo ao presente.
De fato, há por parte
do eu-poético uma preocupação em reconstruir o universo literário ou histórico
da figura a que ele se refere.
Os adjetivos empregados - "cruel" e "amargoso"
- associados aos substantivos "iilusão"/i> e " fel ",
respectivamente, reforçam o duro caminho trilhado pelo poeta .
Esse soneto se constrói impressionisticamente pela impregnação
indireta da cor vermelha. Assim o fel é sorvido em "taças de inebriante
vinho" e a imagem dele, Bocage,
"sangra num painel". Esta configuração da cor é
entremeada pelo recorte do abandono em que ele próprio se deixou:
" Ó santo, a quem deteve noo caminhoo,
Das paixões o fantástico tropel, " ( p.100)
e pela história de
desavenças que é condenada pelo
eu-poético:
> /span>" A tua imagem sangra num
painel
Que o Tempo mostra à multidão,
escarninho!"( p. 100)
mas, mesmo assim, o eu-poético pede socorro à
natureza para ajudá-lo a sair do "escuro eterno" :
> /span>" -- Estrelas, alumiai o
peregrino, " ( p.100)
Neste soneto se
descreve a figura de Bocage com um
certo tom de negatividade, pois ele é o poeta do desengano, o poeta que sangra,
o poeta pálido, o poeta da escuridão. Entretanto, há esperança de que encontre o caminho, pelo fato, talvez, de
ser poeta, ainda que errante. Talvez o
caminho de Deus, uma vez que Bocage sonha na sua escuridão com os "
doces olhos pulcros" da Virgem Maria. Alude-se, deste modo, à
conversão do poeta no final de sua vida.
A relação temporal cria uma certa tensão entre o passado
do poeta: " passaste como o vento..." e a sua condição
presente: " a tua imagem sangra". O conflito não se resolve
uma vez que o poeta ainda se encontra
na escuridão e não vê a luz para tirá-lo dessa condição.
Em oposição a esse estado de cegueira em que se encontra
o nosso poeta, temos o soneto seguinte, " Castilho", cheio de luz:
> /span>" Teus olhos cegos, sempre em claridade!
"( p.101)
Castilho é descrito nos
jardins da Antiguidade, sendo acompanhado da imagem iluminada de Virgílio.
O espaço aberto do soneto ( jardins) é um ambiente idílico, pastoral, leve, suave, risonho. A
única coisa que perturba este cenário são os
" acentos de
saudade " provenientes de Ovídio.
O maior e surpreendente destaque feito é em relação
ao olhar de Castilho, que é comparado às manhãs de idílio, ou caracterizado
pela " claridade".
surpreendente é a ênfase sobre o olhar de um poeta cego, paradoxal, a
claridade que se lhe atribui. Apesar destes aspectos positivos, destaca-se
também que são esses olhos o motivo do seu aprisionamento:
" Cativo de ti mesmo, - a oolhar, seem tino," ( p. 101)
Mas,
mesmo assim, é o olhar que vai ajudar
Ovídio em seu exílio:
" Tacteando sombras, vais eem seu auuxílio," ( p.101)
Castilho, o "
romeiro do passado", é
peregrino como Bocage, só que não errante, porque tem a luz do olhar.
O próximo soneto, " Camilo " , começa em
primeira pessoa:
> /span>" Eu fui o mal, o assomo
de rudeza" ( p.102)
A visão que o eu-poético tem de si próprio é a do desencanto: "assomo de
rudeza", possui o coração "tenebroso da tristeza", é
o "gênio estranho", o "fantasma das noites",
o "caminheiro das estradas", e mais ainda, "o coveiro
do próprio coração".
Para descrever seu coração, destaca a imagem do lírio,
mas de uma forma também negativa:
" Meu coração desabrochou num lírio,
No lírio tenebroso da Tristeza! "(p.102)
No segundo quarteto existe a relação da flor "lírio"
com a figura da "mística Tereza", evidenciando a nobreza de
sua alma, que "brilha como a luz do círio! ", ficando Camilo
em segundo plano.
Mesmo o lado bom do amor, da caridade, da benevolência
não se encontra nele, mas naqueles que são mártires e edificam com o puro amor
a terra portuguesa. Entretanto, temos de ressaltar o primeiro verso do primeiro
terceto:
" -- Eu sou o gênio estranhho de umaa raça, " ( p. 102 )
Ele é o gênio porque consegue entender o grande mal do
coração e escrever a respeito dele, uma vez que ele mesmo se caracterizou como
o "coveiro do coração".
Ao destacar, em seguida,
a pessoa de João de Deus, no soneto de igual nome, parece-nos que o
narrador quer polir a atitude lírica das expressões do coração.
O soneto, em terceira pessoa, exalta a figura de João de
Deus como pessoa exímia na poetização do sentimento ao produzir seus versos.
Ressalta que a beleza dos seus cânticos não se compara à dos versos do Rei Salomão, nem aos sonhos das virgens. O ato de ouvir seus hinos é passado
sinestesicamente, pelo eu-poético , como um sentimento de "afago" em que a "alma se torna serena como
a luz dum lago". Posto desta forma, os seus cânticos adquirem um aspecto "purificador",
pois falam do Amor como estado pleno de sentimento:
" Vai alto o luar, mais altto vai o Amor!" ( p. 103 )
Neste soneto, como foi em "Gil Vicente",
enfatiza-se muito mais a característica da obra do que o autor. Assim sendo, o
amor é o estado supremo da criação de João de Deus.
O ante-penúltimo soneto "Antero",
resgata a problemática da obra de Antero de Quental - a questão do ser e do
não-ser:
" Para além do Nirvana que tentastee," ( p. 104 )
Destaca-se o "Nirvana" como a busca
máxima na sua obra. Contudo, este caminho é negado pelo eu-poético no segundo quarteto,
porque não é o alvo de uma alma cristã:
" As estradas que, em lágriimas, traaçaste,
Não nos conduzem, não, à Terra Santa;"
( p. 104 )
Ele
parece não se conformar com o espírito inquisidor de Antero:
" Por
que interrogas, aflitivamente,
A noite, Deus, o vento em desatino?"(p.104)
O conflito é estabelecido pela visão de mundo que o
eu-poético possui, diferente da de Antero. Para ele, eu-poético, o destino se revela no sonhar:
> /span>" Morrer, mas a sonhar, --
eis o destino! " ( p. 104)
Trava-se um diálogo com Antero, no intuito de convencê-lo
de que o seu questionamento não conduz a nada:
" __ Susta o curso das lágrimas, ó Dor!
--
Detém o rasgo da corrida ardente," <
Se para Antero a morte é o único processo de libertação
das forças inconscientes que determinam o destino do Homem, para o eu-poético
não é bem assim, para ele o sonho é mais forte.
No penúltimo soneto, "Oliveira Martins",
não podemos dizer que há ruptura quanto a sua colocação ao lado das figuras
literárias, uma vez que ele, além de historiador, sociólogo, economista, foi
também escritor, pois suas obras encontram-se a meio caminho entre a História e
a ficção. Entretanto, apresenta-se uma ruptura pela forma negativa como ele nos
é apresentado e julgado :
" Debalde ergueste a voz, nnegando aa Vida
E a pátria, __ deusa de formoso jeito:
"( p. 105 )
Oliveira Martins é caracterizado pela sua voz , que
desafiou e negou a pátria - a voz da
desesperança. À voz de Oliveira Martins, contrapõe-se o desejo do "povo
eleito" que "espera ainda a Terra Prometida". Contudo, ele , Oliveira Martins, foi o
elemento desequilibrador desta esperança e, por isso, é acusado de ter deixado
o povo nas trevas.
O eu-poético não
perdoa este aspecto e o coloca no "painel de temeroso aspeito"
e pede, no último terceto, que se cale:
" Cala a nocturna voz de
mau agoiro:" (p.105 )
Dentro desta
visão negra, ele ( o eu-poético) se incumbe de trazer luz e esperança a seu
povo:
" Já sobre as almas brilha a claridade
Da manhã mais que todas desejada:
> /span>Rasga a tela da torva tempestade! " [(p.105)
O conflito se resolve porque ele ( o eu-poético) julga e conduz o desfecho das ações:
> "
As naus demandam as areias de oiro! " (p.105)
Toda essa rejeição de Oliveira Martins e de sua obra pode
ficar bem clara pelo anti-sebastianismo desse autor que, juntamente com o
criador da peça Pátria-Guerra
Junqueiro -adotou uma posição cética e desesperançada frente à conjuntura
histórico-social portuguesa nos finais do século XIX. É toda a geração de 70,
com seu anti-sebastianismo, que é criticada no soneto.
" Os Ausentes " se fecha com o soneto, dedicado a António Nobre.
Parece que, em oposição a voz " agoira" de
Oliveira Martins, opõe-se a voz do poeta que " embala o mundo ".
O narrador relaciona a sua voz ao mar:
> " O
mar é a tua voz, ao abandono..." (p.1006 ))
Parece-nos que a sua voz, sendo tão ampla quanto o mar,
pode atingir todos os lugares e ser ouvida por todos.
Há entre o eu-poético e o poeta descrito uma relação de
dependência, na qual o primeiro se coloca a serviço deste. É interessante
observar que se destaca a palavra como instrumento para o despertar do povo.
Nos tercetos, deixa-se a figura do poeta, para destacar a
visão da "Nau Catrineta" e seus caminhos "cheios de
naufrágios", "nau" que é imagem de Portugal. O mar embala a dor, mas se o mar é a voz do
poeta, na verdade é o próprio poeta Nobre que embala a dor portuguesa do
presente. Na visão do eu-poético, só o chão regado de lágrimas é que dará flor:
" ( ...) O chão da sepulturra <
Só regado de lágrimas dá flor! " ( p. 106 )
Ao tratar nesses sonetos, da ausência em si, de fato, o
autor nos remete a uma outra possibilidade de interpretação, isto é, a
presença.
Destacando esses personagens, na atual dormência de
Portugal, faz o processo de trazê-los à nossa presença como elementos
formativos da história da nação lusitana.
De fato ausência e presença relacionam-se e completam-se
entre si, na medida em que uma necessita da outra para existir . Só sabemos da
ausência de um determinado elemento quando um dia o tivemos presente, porque,
de fato, não estamos nos referindo a qualidades estáveis e sim a estados que
continuamente mudam de um para outro.
A ausência é uma denúncia da perda de um bem que outrora
se possuiu ou se viveu e no momento em que o autor quer modificar essa
situação, diante dessa ausência, imperiosamente impõem-se a presença daquele
bem.
O imperativo de presença não é um fator somente
literário; é também uma questão ideológica: a tarefa de reencontrar o ser
nacional, o gérmem da pátria que esteve, segundo o autor, ausente durante
séculos, ou anos, e que agora ele quer reviver por meio de seus sonetos.
O autor não quer trazer simplesmente a figura histórica
das personagens, mas também o mundo de valores e idéias contido em cada uma
delas e que, na sua visão, acha-se esquecido na atualidade.
O ato
de trazer ao presente esses elementos é o imperativo de presença que o autor
persegue e deseja ao passado, que ele
pensa ser heróico; enganchar o passado
com um presente que ele acusa de vazio:
" Os que, libertos da Ausência,
Prosseguem a Idade de Ouro! " (p. 88)
Pretende, assim ser o intérprete desta continuação
histórica e projetá-la no futuro super-valorizado o papel político do poeta na
sociedade:
" ( ...) O Poeta é, assim, em última palavra,
como seu supremo intérprete, o homem da
lei, o orientador, o político. Junto dos governos, deveria assistir um Conselho de Poetas. ( ...) Que seria de nós,
no concerto dos Estados, se não fossem alumiar-nos as lâmpadas votivas da
Pátria: os poetas de heróico, místico, sentimental dizer - Cavaleiros do Amor, de Deus e da Lusitânia? (...) Só a memória nos faz viver e, portanto, cultivar
a tradição é cultivar a memória: viver integralmente. "
Como intérprete da história, ele é o juiz
selecionador dos elementos constitutivos deste mundo. Ele é um juiz parcial
porque não só seleciona os mitos fundadores, mas contribui igualmente para a
formação dos mitos através da seleção dos fatos que ele acha notáveis,
julgando-os e impulsionando ao louvor
ou à execração ( poemas " Bocage" ou "Oliveira
Martins", por exemplo).
Os seus sonetos, ou painéis, são por ele criados numa
visão maquineísta, em que uns personagens encarnam o Bem e outros o Mal, não havendo a possibilidade de uma figura se
reconhecer mesclada de bem e de mal. A sua primeira preocupação é a formação do
painel onde ele coloca, subjetivamente, as personagens em concordância com o
seu propósito ideológico. Depois, olha para esse painel fazendo a divisão entre
os que ele considera imaculados e os não bem sucedidos. Dentre os primeiros,
estão os que ele acha dignos de resgatar como alicerces da nova nação. Por meio
da metáfora dos olhares bons, evidencia as características desses homens
ilustres.
Nos sonetos em primeira pessoa, Mário Beirão empresta sua
voz aos poetas, como em "Camões", por exemplo, para que digam
o que ele próprio quereria dizer, para que falem de sua própria vontade de
recomeçar vindo do passado até o presente e tentar projetar o futuro:
" E dou ao Mundo um lusitano mundo:
Alta verdade de supremo sonho!" ( p. 97)
A verdade é colocada como um sonho- os seu sonho - ... "
um lusitano mundo"...
Na constituição desses painéis observamos a vontade do
eu-poético em trazê-las ao "agora", extraíndo-as do mundo da
ausência. Assim, as personagens por ele resgatadas, refletem a sua visão de
mundo em situações relacionadas com a questão da ausência e presença .
Desse modo, Mário Beirão, segundo seu modo de ver,
destaca os mitos fundadores da raça portuguesa que, por um aspecto ou outro,
apresentam elementos enaltecedores da alma lusitana e decisivos para formar o
universo da glória da nação que ele tenta, enquanto poeta, restabelecer e
conduzir.
Bibliografia