Simbolismo
 

- Alphonsus Guimaraens -

Soneto
"Hão de chorar por ela os cinamomos
Murchando as flores ao tombar do dia.
Dos laranjais hão de cair os pomos,
Lembrando-se daquela que os colhia.

As estrelas dirão: - 'Ai, nada somos,
Pois ela se morreu silente e fria...'
E pondo os olhos nela como pomos,
Hão de chorar a irmã que lhes sorria.

A lua, que lhe foi mãe carinhosa,
Que a viu nascer e amar, há de envolvê-la
Entre lírios e pétalas de rosa.

Os meus sonhos de amor serão defuntos...
E os arcanjos dirão no azul ao vê-la,
Pensando em mim: - 'Por que não [vieram juntos?' "

(Alphonsus Guimaraens).

  Afonso Henrique da Costa Guimarães nasceu a 24 de julho de 1870, em Ouro Preto, Minas Gerais. Após os primeiros estudos no Ginásio Mineiro, cursa a Escola de Minas de Ouro Preto. Em 28 de dezembro de 1888 morre Constança, sua noiva, mas o amor por ela está presente em toda sua vida e obra poética. Transfere-se para São Paulo, em 1891, onde exerce o jornalismo, publica seu primeiro livro de versos ("Kyriale") e matricula-se na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Conclui o curso de Direito em Ouro Preto. Torna-se promotor e depois juiz em Conceição do Serro, Minas Gerais.
  Em 1897, casa-se com Zenaide de Oliveira; em 1906 é nomeado juiz em Mariana, de onde não mais sairia, daí ser conhecido como "o solitário de Mariana", embora vivesse com a esposa e quatorze filhos. Morre em 15 de julho de 1921.
  Sua poesia tem caráter místico-religioso, divinizando sempre a mulher sem deixar lugar para o erotismo. Misticismo, Amor (por Constança e pela Virgem Maria) e Morte, este é o triângulo que caracteriza toda a obra de Alphonsus Guimaraens (é comum a crítica considerá-lo o mais místico poeta da Literatura Brasileira). O seu misticismo e devoção estão bem atestados em "Setenário das dores de Nossa Senhora", que apresenta 49 sonetos divididos em sete grupos de sete sonetos cada, sendo os grupos dedicados a cada uma das sete dores de Nossa Senhora. A morte é a única forma de atingir a sublimação e se aproximar de Constança e da Virgem; daí o amor aparecer sempre espiritualizado. A própria decisão de se isolar em Mariana, sua "torre de marfim", é uma postura simbolista.
  Também pode ser destacada, em sua poesia, a linguagem de sugestão e o uso de aliterações.

A catedral

"Entre brumas ao longe surge a aurora,
O hialino orvalho aos poucos se evapora,
Agoniza o arrebol.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu risonho
Toda branca de sol.

E o sino canta em lúgubres responsos:
'Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!'

O astro glorioso segue a eterna estrada.
Uma áurea seta lhe cintila em cada
Refulgente raio de luz.
A catedral ebúrnea do meu sonho,
Onde meus olhos tão cansados ponho,
Recebe a bênção de Jesus.

E o sino clama em lúgubres responsos:
'Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!'

Por entre lírios e lilases desce
A tarde esquiva: amargurada prece
Põe-se a lua a rezar.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu tristonho
Toda branca de luar.

E o sino chora em lúgubres responsos:
'Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!'

O céu é todo trevas: o vento uiva.
Do relâmpago a cabeleira ruiva
Vem açoitar o rosto meu.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Afunda-se no caos do céu medonho
Como um astro que já morreu.

E o sino geme em lúgubres responsos:
'Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!' "

(Alphonsus Guimaraens).