A morte foi presença
constante: a morte prematura de seu irmão; a morte de seus colegas de
faculdade; a "dor no peito" que cedo o levaria. É essa presença da morte
que mais lhe atiça a vontade de viver, numa contradição compreensível.
Também é importante salientar que a morte em sua poesia tem uma conotação
de fuga, sendo reflexo da sensação de impotência frente a um mundo conturbado.
Seu livro "Noite na taverna" é um dos maiores exemplos da
literatura "mal do século". É um livro em prosa, onde seis estudantes,
bêbados, narram suas mais estranhas aventuras (são histórias marcadas
por sexo, bacanais, incestos, assassinatos, traições, mistérios e morte).
O drama intitulado "Macário" representou
uma "tentativa para o teatro" do poeta. Era uma obra confusa, que apresentava
o jovem Macário, estudante de Direito, poeta, que vive uma dualidade:
ora irônico e macabro, ora meigo e sentimental - em resumo, o próprio
Álvares Azevedo, anjo e demônio.
Lembrança
de morrer
"Quando em meu peito rebentar-se a fibra
Que o espírito enlaça à dor vivente,
Não derramem por mim nem uma lágrima
Em pálpebra demente.
E nem desfolhem na matéria impura
A flor do vale que adormece ao vento:
Não quero que uma nota de alegria
Se cale por meu triste passamento.
Eu deixo a vida como deixa o tédio
Do deserto, o poento caminheiro
- Como as horas de um longo pesadelo
Que se desfaz ao dobre de um sineiro;
Como o desterro de minh' alma errante,
Onde fogo insensato a consumia:
Só levo uma saudade - é desses tempos
Que amorosa ilusão embelecia.
Só levo uma saudade - é dessas sombras
Que eu sentia velar nas noites minhas....
De ti, ó minha mãe! pobre coitada
Que por minha tristeza te definhas!
De meu pai... de meus únicos amigos,
Poucos - bem poucos - e que não zombavam
Quando, em noites de febre endoidecido,
Minhas pálidas crenças duvidavam.
Se uma lágrima as pálpebras me inunda,
Se um suspiro nos seios treme ainda,
É pela virgem que sonhei... que nunca
Aos lábios, me encostou a face linda!
Só tu à mocidade sonhadora
Do pálido poeta deste flores....
Se viveu, foi por ti! e de esperança
De na vida gozar de teus amores.
Beijarei a verdade santa e nua,
Verei cristalizar-se o sonho amigo...
Ó minha virgem dos errantes sonhos,
Filha do céu, eu vou amar contigo!
Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecidas,
À sombra de uma cruz, e escrevam nela:
- Foi poeta - sonhou - e amou na vida.
Sombras do vale, noites da montanha,
Que minh' alma cantou e amava tanto,
Protegei o meu corpo abandonado,
E no silêncio derramai-lhe canto!
Mas quando preludia ave d' aurora
E quando à meia-noite o céu repousa,
Arvoredos do bosque, abri os ramos...
Deixai a lua prantear a lousa!"
(Álvares de Azevedo).
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