Arcadismo
 

- Tomás Antônio Gonzaga -

Marília de Dirceu
Lira XV (2ª parte)
"Eu, Marília, não fui nenhum vaqueiro,
Fui honrado Pastor da tua aldeia;
Vestia finas lãs, e tinha sempre
A minha choça do preciso cheia.
Tiraram-me o casal, e o manso gado,
Nem tenho, a que me encoste, um só cajado."

  Este filho de uma portuguesa com um brasileiro, nasceu na cidade do Porto, Portugal, em 1744. Passou parte da infância no Brasil e formou-se em Direito, na cidade de Coimbra. Aos trinta e oito anos vem em definitivo para o Brasil, indo trabalhar como ouvidor e juiz, em Vila Rica. Estava prestes a se casar com Maria Dorotéia Joaquina de Seixas, a "Marília", quando é preso e condenado ao degredo em Moçambique, por sua participação na Inconfidência Mineira. Lá, casa-se com Juliana de Souza Mascarenhes. Morre em 1810.

  As liras de "Marília de Dirceu", inspiradas em seu romance com Maria Dorotéia, são sua principal obra. Esta obra divide-se em duas partes: a primeira fala sobre a inciação amorosa, o namoro, a felicidade do amante, os sonhos de uma família, a defesa da tradição e da propriedade, sempre com uma postura patriarcal; a segunda, escrita durante os sofrimentos da prisão, apresenta uma série de reflexões desde a justiça dos homens até os caminhos do destino, sempre manifestando o consolo no amor que sente por "Marília".
  Devem ser citados alguns aspectos da obra de Gonzaga: "Marília" é quase sempre um vocativo; a obra é um monólogo, embora tenha estrutura de diálogo; "Marília" é um pretexto, o centro do poema é o próprio Gonzaga. Também é constante a contradição entre sua postura de pastor e sua realidade de burguês.
  Sua obra é completada pelas "Cartas chilenas", poemas satíricos que circulavam em Vila Rica, pouco antes da Inconfidência Mineira. Eram poemas escritos em versos decassílabos, com estrutura de carta. Assinados por "Critilo" - habitante de Santiago do Chile (na verdade, Vila Rica) - narravam os desmandos do governador chileno, o "Fanfarrão Minésio" - na verdade, Luís da Cunha Meneses, governador de Minas Gerais até pouco antes da Inconfidência Mineira - sendo endereçadas a "Doroteu", residente de Madri. Sua linguagem é bastante agressiva e satírica, sendo "Critilo", Tomás Antônio Ganzaga , e "Doroteu", Cláudio Manuel da Costa.

Cartas chilenas
(Carta IX, fragmento)
"A desordem, amigo, não consiste
em formar esquadrões, mas sim no excesso.
Um reino bem regido não se forma
somente de soldados; tem de tudo:
tem milícia, lavoura, e tem comércio.
Se quantos forem ricos se adornarem
das golas e das bandas, não teremos
um só depositário, nem os órfãos
terão também tutores, quando nisto
interessa igualmente o bem do Império.
Carece a monarquia dez mil homens
de tropa auxiliar? Não haja embora
de menos um soldado, mas os outros
vão à pátria servir nos mais empregos,
pois os corpos civis são como os nossos,
que, tendo um membro forte e outros débeis,
se devem, Doroteu, julgar enfermos."

(Tomás Antônio Gonzaga).